Obras musicais

Cinema é condenado a pagar percentual de bilheteria ao Ecad

Autor

28 de agosto de 2006, 15h56

A Cinematográfica Jaraguá, proprietária das salas de cinema do Shopping Jaraguá, foi condenada a pagar 2,5% da venda de bilheteria, ao Ecad — Escritório Central de Arrecadação e Distribuição, por violação de direitos autorais desde janeiro de 2002. A decisão é do juiz João Battaus Neto, da 1ª Vara Cível de Araraquara, São Paulo. Cabe recurso.

De acordo com o processo, desde a inauguração de suas salas a Cinemateca Jaraguá passou a exibir diariamente obras musicais sem pagar direitos autorais.

Assim, o Ecad ajuizou ação de cobrança por perdas e danos das contribuições devidas. Em sua defesa, a Cinemateca alegou que os direitos autorais das obras musicais já haviam sido pagos na contratação dos direitos de exibição. Alegou, também, ilegitimidade do Ecad para ajuizar a ação. O juiz rejeitou o argumento.

Para ele, a associação “tem legitimidade para propor ação de cobrança de contribuições devidas em razão de direito autoral, independentemente da comprovação da filiação e de autorização dos autores das músicas executadas”.

Ele também mandou suspender a exibição dos filmes até o pagamento devido, além das custas processuais e honorários advocatícios no valor de 10% sobre o valor atualizado da causa.

Outros processos

O Cine RBM Osasco, que tem três salas no Osasco Plaza Shopping, e o Cine Estação também foram condenados a pagar os direitos autorais. Ambos foram condenados por falta de pagamento desde a abertura das salas.

Os pedidos judiciais foram feitos com base na Lei 9.610/98, que prevê a autorização para a utilização pública de obras musicais por qualquer modalidade de execução, incluindo a exibição cinematográfica.

Processo 690/06

Leia integra da sentença

Vistos

ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO — ECAD, já qualificado, ajuizou a presente AÇÃO DE CUMPRIMENTO DE PRECEITO LEGAL c.c PERDAS E DANOS contra CINEMATROGRÁFICA JARAGUÁ LTDA, também qualificada, aduzindo na inicial, em síntese, que:

a) a requerida desde a inauguração de suas salas de cinema no Shopping Jaraguá passou a exibir diariamente películas cinematográficas, hoje denominadas simplesmente “audiovisuais”, onde estão inseridas obras musicais e litero-musicais;

b) por isso, a ré deve pagar ao autor os direitos autorais, desde a abertura das salas, à razão de 2,5% de sua venda de ingressos (receita bruta), em consonância com o regulamento de arrecadação e tabela de preços;

c) requer, também, seja paralisada a exibição dos filmes até o pagamento devido.

A inicial foi instruída com os documentos de fls. 14/288.

A antecipação da tutela foi indeferida (fls. 294).

Regulamente citada, a requerida ofereceu contestação (fls. 320/348), sustentando que:

a) ilegitimidade ativa;

b) impossibilidade jurídica do pedido;

c) No mérito: as obras musicais são partes indissociáveis da obra cinematográfica;

d) os direitos autorais das obras musicais já foram pagos na contratação dos direitos de exibição;

e) o valor pleiteado não é devido.

Houve réplica (fls. 365/388).

Em síntese, o relatório.

Fundamento e decido.

O pedido merece procedência.

Conheço diretamente do pedido nos termos do artigo 330, I do Código de Processo Civil.

A defesa processual articulada na resposta deve ser repelida.

A legitimidade do ECAD tem amparo no artigo 99 da Lei n° 9.610/98:

“As associações manterão um único escritório central para a arrecadação e distribuição, em comum, dos direitos relativos à execução pública das obras musicais e lítero-musicais e de fonogramas, inclusive por meio da radiodifusão e transmissão por qualquer modalidade, e da exibição de obras audiovisuais.”

§ 2° O escritório central e as associações a que se refere este Título atuarão em juízo e fora dele em seus próprios nomes como substitutos processuais dos titulares a eles vinculados.

Além da expressa previsão legislativa, o entendimento jurisprudencial que vem prevalecendo assinala tanto a legitimidade do ECAD para a cobrança dos direitos autorais como a desnecessidade de comprovação do ato de filiação dos titulares dos direitos reclamados. Oportuna a transcrição dos seguintes arestos:

DIREITO AUTORAL — Legitimidade ativa do ECAD. Possui o ECAD legitimidade para promover a ação de cobrança das contribuições devidas pela execução pública de composições musicais, independentemente da comprovação do ato de filiação feita pelos titulares dos direitos reclamados. Precedentes do STJ. (STJ — REsp. n° 95.803 — MG — Rel. Min. Barros Monteiro — J. 20.08.96 — DJU 04.11.96).

DIREITO AUTORAL — ECAD — Comprovação de filiação e autorizo dos compositores de músicas — Desnecessidade, O ECAD é associação civil responsável para promover a cobrança de direitos autorais devidos em razão de retransmissão de músicas, sendo desnecessário provar a filiação dos compositores, bem como sua autorização para o ingresso em Juízo. (STJ — REsp. n° 8.069 — PR — Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira — J. 10.12.96 — DJU 24.02.97).

DIREITOS AUTORAIS — ECAD — Legitimidade ativa.

I – Após o advento da Constituição de 1988, o ECAD tem legitimidade para propor ação de cobrança de contribuições devidas em razão de direitos autoral, independentemente da comprovação da filiação e de autorização dos autores das músicas executadas.

II – Recurso Especial conhecido e provido. (STJ — REsp. n° 174.819 — MG — 3ª T. — Rel. Min. Waldemar Zveiter — DJU 14.12.1998).

No que toca à matéria de fundo, tenho que melhor sorte não se reserva à ré.

Além de não se exigir a específica menção às obras musicais cuja cobrança dos direitos autorais pretende-se desenvolver, a melhor exegese que se faz do texto da Lei n° 9.610/98 indica que o pagamento dos direitos autorais quando da produção da obra cinematográfica não excluem a obrigação de honrar os mesmos direitos em razão das sucessivas exibições da película.

Nesse sentido:

“Os exibidores são responsáveis pelo pagamento de direitos autorais das trilhas sonoras dos filmes. Outrossim, não é necessário que seja feita identificação das músicas e dos respectivos autores para a cobrança. (STJ — REsp n° 526.540-RS — Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito — J. 14.10.2003).

Por esta razão é que não merece acolhida a alegação da requerida no sentido de que a obra musical é peça indissociável da obra cinematográfica.

Outrossim, a letra do artigo 86 da Lei n° 9.610/98 é clara ao dispor que:

“Os direitos autorais de execução musical relativos a obras musicais, lítero-musicais e fonogramas incluídos em obras audiovisuais serão devidos aos seus titulares pelos responsáveis dos locais ou estabelecimentos a que alude o parágrafo terceiro do artigo 68 desta Lei, que as exibirem, ou pelas emissoras de televisão que as transmitirem.”

Como se vê, a cobrança dos direitos autorais em relativos a obras audiovisuais é viável mesmo em relação à obra musical inserida na película cinematográfica.

Ademais, a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça deixou pacificado que:

É firme a jurisprudência da Corte no sentido de que os exibidores devem direitos autorais pelas obras musicais incluídas em trilhas sonoras de filmes apresentados em cinemas e o ECAD é parte legítima para cobra-los. (AgRg no AgRg no RECURSO ESPECIAL N° 403.544 — RJ (2002/0004726-9) — RELATOR: MINISTRO CASTRO FILHO — DJ 07.04.03)

No que toca às obras de autores estrangeiros, o ECAD acostou aos autos documentos que retratam as devidas autorizações para cobrança (fls. 58/135), não impugnados pela requerida.

O percentual reclamado tem respaldo no Regulamento de Arrecadação de fls. 137/152.

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido deduzido na inicial para o fim de condenar a requerida a pagar ao autor a quantia correspondente aos direitos autorais devidos desde a abertura das salas de cinema indicadas na inicial, à razão de 2,5% da receita bruta auferida, quantia que será apurada em liquidação de sentença e atualizada a partir do ajuizamento da ação, contando-se juros de mora de 1% ao mês da citação. Arcará a requerida com as custas, despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa.

P.R.I.

Araraquara, 14 de agosto de 2006.

João Battaus Neto

Juiz de Direito

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!