Reforma sem Constituinte

OAB aprova proposta de Busato para discutir reforma política

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7 de agosto de 2006, 17h15

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil aprovou a proposta do presidente nacional da entidade, Roberto Busato, para a instalação do Fórum Nacional da Reforma Política. O objetivo é discutir o tema e propor um anteprojeto ao futuro Congresso Nacional.

O coordenador do Fórum será o professor Fábio Konder Comparato.

Representantes da sociedade civil e dos partidos políticos serão convidados pela OAB a integrar o fórum.

Para Busato, não há mais como adiar a reforma política. “O país paga hoje o alto preço de não tê-la feito há mais tempo. Mensalão, sanguessugas, anões do orçamento que são anomalias subprodutos de um quadro político viciado e deteriorado”, afirmou.

Leia a proposta de Busato apresentada na abertura da sessão plenária do Conselho Federal da OAB

Sras. e srs. Conselheiros Federais

O tema que trago ao exame deste Plenário é dos mais urgentes e fundamentais para a superação da crise político-institucional deste país – crise que se arrasta já há alguns anos e que, de alguns meses para cá, agravou-se sobremodo.

É um tema que tem sido postergado por todos os governos que com ele se defrontam — e a cada adiamento aprofunda-se a crise. Refiro-me à reforma política. De adiamento em adiamento, chegamos ao limite.

Ou por outra, creio que já o ultrapassamos amplamente – e o resultado é o ambiente de ceticismo e perplexidade que hoje permeia o processo político brasileiro, em plena campanha eleitoral para a eleição do futuro Congresso, das Assembléias Legislativas, dos governadores e do Presidente da República.

Todos os partidos e correntes ideológicas, sem qualquer exceção, proclamam a reforma política prioritária e urgente – mas ninguém até aqui se movimentou objetivamente para que se materializasse.

O resultado é a deterioração progressiva da imagem e do conceito das instituições republicanas, com gravíssimos prejuízos para a governabilidade e o próprio destino de nosso regime democrático.

Semana passada, jornais e telejornais estamparam com destaque o encontro do presidente da República, no Palácio do Planalto, com um grupo de dez eminentes juristas, como foi noticiado pela imprensa, para tratar de proposta de regulamentação das Comissões Parlamentares de Inquérito, de modo a conter eventuais abusos em seu funcionamento.

No curso da conversa, o grupo de dez advogados ouviu do presidente proposta de convocação de uma Miniconstituinte exclusiva para fazer a reforma política. Pelo que depreendi, essa Miniconstituinte funcionaria independentemente do Congresso, estaria limitada ao tema da política e não recrutaria seus membros apenas nos partidos, mas também na sociedade civil.

O fato de esse grupo de dez juristas ser integrado por quatro ex-presidentes da OAB, membros vitalícios deste Conselho Federal, fez com que a mídia achasse que se tratava de iniciativa desta Casa. Mas não é.

Como já tive a oportunidade de esclarecer, por meio de nota oficial, semana passada, a decisão de convidá-los e o tema proposto ao exame, regulamentação das CPIs foram iniciativas do governo federal, sem qualquer interferência ou consulta à nossa entidade.

Somente após o encontro daquele grupo de advogados com o Presidente Lula é que esta Presidência foi procurada pelo ministro Tarso Genro, propondo-nos que discutisse o tema – nova regulamentação das Comissões Parlamentares de Inquérito, abordando também a importância do debate sobre a reforma política e fazendo a afirmação das palavras do Presidente da República em relação à convocação de Assembléia Constituinte exclusiva.

A OAB, como tribuna da sociedade civil brasileira, comprometida estatutariamente com a defesa da Constituição e das instituições do Estado democrático de Direito, vem se batendo há tempos – e com obstinação – pela reforma política.

Essa é uma preocupação que precede, em muito, o meu mandato e este governo.

Mas em momento algum chegou a OAB a propor a forma específica de encaminhamento da reforma política – se pelo Congresso, se por uma Constituinte exclusiva ou derivada.

O conteúdo, sim, já o discutimos exaustivamente — e já dispomos, inclusive, de elementos para formular e encaminhar ao exame dos partidos e da sociedade civil um anteprojeto de reforma política, que sirva de ponto de partida para essa discussão, que deve mobilizar não apenas as instituições do Estado, mas a cidadania em seu conjunto.

Portanto, volto a esclarecer: não é nossa a proposta que tanta polêmica causou na mídia e nos partidos políticos de fazer a reforma política por meio de uma Miniconstituinte exclusiva.

Mas já que o tema está proposto – e por ninguém menos que o próprio presidente da República -, queremos inseri-lo num contexto mais amplo e objetivo, sem conotação casuística ou eleitoreira. Queremos que a reforma política – forma e conteúdo – seja avaliada de maneira democrática e plural, sob a chancela da sociedade civil brasileira.

Proponho, nesses termos, a este plenário, que seja instalado, aqui, no âmbito do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, um Fórum Nacional da Reforma Política.

Esse Fórum reunirá representantes dos partidos políticos e da sociedade civil para não apenas discutir a reforma e elaborar um anteprojeto a ser encaminhado ao futuro Congresso, mas, sobretudo, para comprometer os candidatos à Presidência da República com essa iniciativa.

Não há mais como adiá-la.

O país paga hoje o alto preço de não tê-la feito há mais tempo. Mensalão, sanguessugas, anões do Orçamento – que são essas anomalias senão subprodutos de um quadro político viciado e deteriorado?

Profundamente deteriorado. Mortalmente deteriorado.

É preciso reagir e dar sentido construtivo e regenerador ao salutar sentimento de indignação que a todos atinge, em face da sucessão de escândalos que sacudiram os alicerces morais da República.

Mas é preciso evitar a todo custo que esse tema — inadiável e fundamental — se transforme em mera mercadoria eleitoral, mais uma promessa destinada ao limbo do esquecimento.

Queremos que este Fórum da Reforma Política seja uma instância de compromisso solene dos candidatos à Presidência da República – aos quais diremos com toda a veemência e clareza que iremos cobrar o cumprimento do compromisso assumido. Se necessário, iremos às ruas cobrá-lo.

Já o disse anteriormente — e o repito agora: a OAB não servirá de palanque a nenhum candidato, nem permitirá que um tema dessa gravidade e relevância – a reforma política – sirva a qualquer outro propósito que não o de contribuir para a elevação de nossas práticas públicas e o saneamento de nossa vida política.

Diante deste quadro abro a discussão neste douto Plenário para que, uma vez mais, se manifeste a respeito desta proposta, republicana, democrática e voltada aos interesses da cidadania nacional, como sempre se portou o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

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