Elemento caracterizador

Associação de ex-revendedores não podem usar a marca Ford

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28 de abril de 2006, 14h46

A expressão Ford é o elemento caracterizador das marcas da Ford Motor Company e Ford Motor Company Brasil e não pode ser usada por qualquer outra instituição. A decisão é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça que proibiu a Abedif — Associação Brasileira dos ex-Distribuidores Ford de utilizar a expressão Ford em seu nome.

As empresas entraram com uma ação pedindo a proteção legal de seus nomes comerciais e marcas, com o reconhecimento do direito à exclusividade do uso da expressão Ford e, a partir daí, a exigência de alteração da denominação da associação. Além disso, devido aos prejuízos advindos da “indevida utilização de elemento caracterizador de seus nomes comerciais e marcas pela associação”, as Ford pediram indenização por danos materiais e morais.

Em primeira instância o pedido foi acolhido de forma parcial, determinado que a associação se abstivesse de usar o termo Ford em sua denominação social. No entanto, rejeitou o pedido de indenização.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal acolheu o recurso da associação. O colegiado admitiu que ela mantivesse o nome Ford em sua denominação, visto que a entidade não “desenvolve quaisquer atos mercantis, o que importa na impossibilidade de concorrência com as autoras”. No entanto, em Embargos Infringentes ajuizados pelas empresas prevaleceu a decisão pela não-utilização da expressão Ford.

No Superior Tribunal de Justiça, a Abedif alegou que, ao ser-lhe vedado o uso de tal expressão em sua denominação social, há ofensa ao princípio da veracidade do nome empresarial. Sustentou, ainda, que, não realizando atos de comércio, não enseja confusão de consumidores, concorrência desleal e tampouco ofensa ao direito das empresas à proteção especial em todos os ramos de atividade mercantil de suas marcas, consideradas de alto renome, ante a notoriedade dos veículos que identificam.

O ministro Castro Filho, relator, seguido pelo ministro Humberto Gomes de Barros, acolheu o recurso por considerar “não se trata de litígio envolvendo empresas disputando mercado, mas sim, de um lado, duas empresas com fins comerciais e do outro uma associação civil sem fins lucrativos. A toda evidência, a proteção especial de que cuidam os artigos 125 e 126 retro transcritos não alcança as atividades desenvolvidas pela Abedif, uma vez que esta congrega em seu quadro ex-concessionários Ford, cujos fins estatutários nada têm a ver com objetivos mercantis.”

Os ministros Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito divergiram do relator, sob a fundamentação de que, “(…) sendo a marca o objeto de uma propriedade, seu titular tem o direito exclusivo ao respectivo uso em qualquer âmbito, sempre que, registrada no Brasil, for considerada de alto renome ou for notoriamente conhecida em seu ramo de atividade. Em qualquer caso o uso é proibido”.

Com a votação empatada e à vista do impedimento da ministra Nancy Andrighi, determinou-se a convocação de membro da 4ª Turma do STJ, encaminhando os autos do processo ao ministro Jorge Scartezzini. Ao votar, o ministro considerou que é inviável a manutenção do nome social da associação, integrado pelo elemento caracterizador Ford, simultaneamente contido nas denominações, previamente registradas, das empresas.

“Entendo viável que a reputação da marca Ford, pertencente às empresas recorridas, venha a ser maculada pelas atividades associativas da recorrente, sendo inteiramente irrelevante o fato de tais ações encontrarem-se desprovidas de caráter lucrativo”, afirmou o ministro Scartezzini.

Resp 758597

Leia a íntegra da decisão

RECURSO ESPECIAL Nº 758.597 – DF (2005/0097460-7)

TERCEIRA TURMA – 07.02.2006

VOTO-VISTA

EXMO SR. MINISTRO ARI PARGENDLER:

1. Nos autos da ação ordinária proposta por Ford Motor Company e Ford Motor Company Brasil Ltda., a MM. Juíza de Direito Dra. Iracema Miranda e Silva julgou o pedido procedente, em parte, para condenar Abedif – Associação Brasileira dos Ex-Distribuidores Ford “…a abster-se, definitivamente, de se utilizar do nome comercial e marca Ford, inclusive retirando-o de sua denominação social no prazo de 60 dias, sob pena de aplicação de multa pecuniária diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), devidamente atualizada até o efetivo pagamento” (fl. 108, 1º vol.). Em grau de embargos infringentes, o tribunal a quo, Relatora a Desembargadora Haydevalda Sampaio, manteve a sentença nos termos do acórdão assim ementado:

“EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO COMINATÓRIA CUMULADA COM PERDAS E DANOS. USURPAÇÃO DO DIREITO DE PROPRIEDADE. NOME COMERCIAL E MARCA.

1. O nome empresarial e a marca não se confundem. O primeiro refere-se ao sujeito de direito e a segunda serve para identificar produtos e serviços.

2. A marca Ford possui alto renome, tendo ficado notoriamente conhecida do público em decorrência dos veículos que fabrica, constituindo patronímico de seu fundador. Para sua utilização, necessário autorização.

3. Recurso conhecido e parcialmente provido. Maioria” (fl. 265, 2º vol.). Daí o presente recurso especial, interposto por Abedif – Associação Brasileira dos Ex-Distribuidores Ford, cujas razões – no que têm de substancial – alegam a violação dos arts. 122, 123, 125 e 126 da Lei nº 9.279, de 1996 (fls. 309/346, 2º vol.). Pedi vista dos autos, depois dos votos do Ministro Castro Filho, relator, e do Ministro Gomes de Barros, conhecendo do recurso especial e dando-lhe provimento. 2. A divergência que se manifestou no tribunal a quo e que se repete, agora, nesta instância, resulta da circunstância de que a marca “Ford”, na espécie sub judice, foi apropriada por uma empresa sem fins lucrativos. “A toda evidência” – está dito no voto do Ministro Castro Filho –, “a proteção especial de que cuidam os artigos 125 e 126 retro transcritos não alcança as atividades desenvolvidas pela Abedif, uma vez que esta congrega em seu quadro ex-concessionários Ford, cujos fins estatutários nada têm a ver com objetivos mercantis”.

A evidência, quando se trata da interpretação de normas jurídicas, parece ter duas faces. Aquela que me é dado ver induz à conclusão de que, sendo a marca o objeto de uma propriedade, seu titular tem o direito exclusivo ao respectivo uso em qualquer âmbito, sempre que, registrada no Brasil, for considerada de alto renome (Lei nº 9.279/96, art. 125) ou for notoriamente conhecida em seu ramo de atividade (art. 126).

Nada importa o uso que o terceiro, desautorizado, faça dela, seja com objetivos comerciais ou não. Em qualquer caso, o uso é proibido. Com maior razão aqui, em que a entidade que incluiu na denominação social a marca “Ford” tem como objetivo, nos termos do voto do Ministro Castro Filho, “a defesa dos interesses dos ex- Distribuidores Ford em relação a essa montadora”.

Qualquer ruído na relação entre uma empresa e seus representantes prejudica a marca, ainda mais no comércio de automóveis, no qual as montadoras se relacionam com os consumidores por meios das chamadas concessionárias. Qual a confiança do consumidor na marca, se souber da existência de ex-distribuidores descontentes com ela ? Enfim, a marca só tem sentido enquanto protegida. Pergunta-se: protege a marca quem a usa para reunir forças contra o respectivo titular ?

O recurso especial, data venia, só poderia ser conhecido e provido se essa indagação pudesse ser respondida afirmativamente. Não havendo, portanto, o julgado contrariado as normas legais alegadamente violadas nem discrepado dos precedentes judiciais arrolados, voto no sentido de não conhecer do recurso especial.

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