Limites do monitoramento

Tecnologia é para garantir segurança, e não violar intimidade

Autor

  • Alexandre Atheniense

    é advogado pesidiu a Comissão de Tecnologia da Informação do Conselho Federal da OAB e é coordenador do curso de Pós Graduação em Direito de Informática da ESA OAB-SP.

27 de abril de 2006, 7h00

O uso dos aparelhos da tecnologia da informação tem se multiplicado diariamente. Até fins da década passada, a grande rede era formada, principalmente, por computadores pessoais. A tendência acentuada com o aumento do poder de processamento e espaço de memória em aparelhos móveis é propiciar os mesmos recursos que outrora estavam somente atrelados à mesa de trabalho para aparelhos móveis.

Com isto, a internet e a tecnologia destroçaram de vez os conceitos impostos pelos limites geográficos. Prova disso é que até o final do ano há a estimativa de que teremos no Brasil mais de 100 milhões de linhas de aparelhos celulares em uso.

A interatividade instantânea tem aumentado sobremaneira por meio de inúmeras novidades como celulares com câmeras e acesso à internet, webcams, palmtops, notebooks, câmeras digitais, redes sem fio cada vez mais abrangentes, além de sistemas de segurança sofisticados que proporcionam um monitoramento remoto de pessoas.

Há notícia de que em Chicago, além das câmeras existentes no centro da cidade para combate ao crime, estão instalando potentes antenas para captação de áudio originados das conversas dos pedestres com a venda de receptores deste sinal a preços módicos.

Os serviços de relacionamento através de redes sociais na internet constituem sucesso no Brasil e nos Estados Unidos, especialmente na faixa etária mais jovem. O brasileiro prima-se pelo exibicionismo e adora as novidades tecnológicas sem se preocupar muito com os riscos que estas poderão causar-lhe, revelando ingenuidade diante dessa sociedade interconectada.

Não há dúvidas de que os avanços tecnológicos sempre irão potencializar o risco da privacidade das pessoas. É lamentável que a nossa legislação penal não tenha sido adaptada para punir com maior rigor os danos causados pelos crimes contra honra praticados pelo meio eletrônico, embora se espere que as indenizações reparatórias aos danos causados pela múltipla disseminação incontrolável dos dados pela rede seja compatível com a lesão causada a imagem das pessoas.

Não temos ainda uma noção exata do alcance do perigo dessa exposição. Isto é justificável, pois ainda que mais de 30 milhões de brasileiros façam uso da internet e celulares diariamente, só começaram a lidar com essa troca de informação em larga escala há pouco mais de dez anos.

Atualmente, os jovens ou mesmo as crianças têm acesso a um computador e a um aparelho celular ainda na infância. E o que isto significa? Certamente os pais não estão preparados para educar seus filhos a lidar com superexposição. Os recursos dos aparelhos que estes jovens irão utilizar daqui a dez anos propiciaram talvez que estes tenham muito mais experiência que nós para lidar com os problemas de privacidade online. Com o tempo, eles terão muito mais experiência que nós.

A dúvida que paira diante destes problemas é a seguinte: qual é o limite do monitoramento eletrônico? Será que os detentores da infra-estrutura tecnológica têm o direito de monitorar eletronicamente qualquer cidadão pelo simples fato de ter implantado o big brother sustentado pela necessidade de preservar sua segurança?

Embora os tribunais brasileiros tenham decidido de forma casuística, na maioria das vezes, a favor das empresas, considerando como lícitas as provas coletadas do meio eletrônico para demitir funcionários, estas decisões não se atrelam apenas ao fato de atribuir o direito de monitoramento àqueles que detêm a infra-estrutura.

O aspecto principal para aferir se há possibilidade do monitoramento está veiculado à incidência da violação à intimidade, personalidade e à privacidade das pessoas.

Muitas vezes, aqueles que detêm a infra-estrutura podem estar manuseando, até mesmo de forma intencionada, diversos dados sensíveis à intimidade e à privacidade das pessoas, mas não poderão tomar atitudes contrárias a estas, fundamentado neste conhecimento. Se isto acontecer, é bem provável que esta prova seja considerada como ilícita.

As garantias aos direitos à individualidade, à personalidade, à liberdade ou à privacidade, não obstante serem asseguradas constitucionalmente, não serão interpretadas de forma absoluta, em confronto a outras garantias igualmente relevantes como insubordinação, o dever da empresa de ser responsável pelos atos de seus funcionários, divulgação de dados sigilosos e segredo profissional ou combate a práticas de pedofilia e pirataria de softwares.

Isto demonstra como a questão é complexa. Os recursos tecnológicos devem ser utilizados sem a expectativa explícita de invasão de privacidade ou intimidade de terceiros. A expectativa ideal é a de que quem monitora possa usar dos recursos tecnológicos para sua segurança no esclarecimento do responsável por ilícitos sem cometer abusos às garantias dos cidadãos de forma moderada, generalizada e impessoal.

É de se esperar que as próximas decisões sobre monitoramento eletrônico continuem a ser analisadas caso a caso, buscando definir e exemplificar os limites do monitoramento eletrônico.

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    é advogado em Belo Horizonte, presidente da Comissão de Tecnologia da Informação do Conselho Federal da OAB e coordenador do curso de Pós Graduação em Direito de Informática da ESA OAB-SP.

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