Atividade suplementar

Incide ISS sobre curso de habilitação de condutores

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27 de abril de 2006, 13h10

Incide o ISS sobre o curso de habilitação de condutores, quando esta não é a atividade essencial da instituição. O entendimento é da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça não acolheu recurso do Senac de Canoas (RS). A instituição vai ter de pagar o Imposto Sobre Serviços sobre as atividades desenvolvidas em seu centro de habilitação de condutores.

O Senac apelou ao STJ contra a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que votou pela incidência do imposto. A relatora do recurso, ministra Eliana Calmon, manteve o acórdão. Considerou que, quando as alegações apresentadas em recurso não foram analisadas anteriormente, não cabe ao Superior Tribunal de Justiça fazer o reexame das provas.

“Isso porque o reexame necessário, instituído como mecanismo de proteção do interesse público, tem por finalidade devolver ao tribunal o conhecimento, tão-somente, das questões decididas em prejuízo do Estado”, explicou a relatora.

O recurso especial do Senac também não pôde ser analisado em relação a limitações ao poder de tributar, impostas pela Constituição Federal ao município, já que tais questões também não podem ser analisadas pelo STJ.

Resp 628502

Leia a íntegra da decisão

RECURSO ESPECIAL Nº 628.502 — RS (2004/0016540-1)

RECORRENTE: SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM COMERCIAL – SENAC

ADVOGADO: TADEU LUIZ DUTRA FEIJO E OUTROS

RECORRIDO: MUNICÍPIO DE CANOAS

PROCURADOR: IRAN BALSON ARAÚJO E OUTROS

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: Trata-se de recurso especial interposto, com fulcro na alínea “a” do permissivo constitucional, em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul assim ementado:

DIREITO TRIBUTÁRIO. ISS. IMUNIDADE. SENAC.

São imunes a impostos apenas o patrimônio, a renda ou os serviços das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos vinculados às suas finalidades essenciais. Não se reconhece a imunidade de ISS dos serviços prestados que não estejam dispostos no art. 150, VI, ‘c’, da Constituição Federal. CONFIRMARAM A SENTENÇA EM REEXAME NECESSÁRIO. (fl. 373)

Opostos embargos de declaração, foram esses rejeitados.

A recorrente, de início, aponta violação do art. 535, II, do CPC, argumentando que o Tribunal a quo:

a) não observou a orientação jurisprudencial do STF sobre a ratio essendi da regra jurídica do art. 150, § 4º, da CF/88, que repetiu a normatividade do art. 14, §2º, do CTN;

b) no reexame necessário da sentença definitiva:

b.1) não se ateve à regra jurídica de isenção prevista pelo art. 7º, caput, do Decreto-lei 8.621/46, cujo enunciado prescreve que os serviços de caráter educativo organizados e dirigidos pelo serviço social autônomo ora recorrente são isentos de todo e qualquer imposto federal, estadual e municipal;

b.2) não observou que a interpretação sistemática dos arts. 5º, 6º, I, 74, caput, 79, 148, § 1º, e 156 do Código Brasileiro de Trânsito; 1º e 3º do Decreto-lei 8.621/46; e 1º, 2º, “b”, e 3º, “a”, “c” e “d”, do Decreto 61.843/67 revela ser a educação para o trânsito uma das finalidades do serviço social autônomo; e

b.3) omitiu-se ao apreciar a fundamentação da sentença que rejeitou a argüição de inconstitucionalidade material da regra do art. 68, I, da Lei Municipal 1.783/77, em razão da ofensa a princípios constitucionais. Em seguida, alega malferimento dos arts. 2º, § 2º, da LICC e 7º, caput, do Decreto-lei 8.621/46, sustentando que, em virtude do princípio da especialidade, a regra de isenção do art. 7º, caput, do Decreto-lei 8.621/46 exclui a incidência do art. 150, § 4º, do CF/88, por não sujeitar a isenção tributária perquirição da relação entre a atividade e a finalidade do serviço autônomo ora recorrente. Mais adiante, indica inobservância do art. 14, § 2º, do CTN, dizendo que mesmo não estando as atividades desenvolvidas pelo Centro de Habilitação de Condutores – CHC relacionadas diretamente com os objetivos do serviço social autônomo, não incide a regra do mencionado art. 14, pois o seu exercício gera renda para o recorrente alcançar os objetivos previstos no Decreto-lei 8.621/46. Aduz violação dos arts. 5º, 6º, I, 74, caput, 79, 148, § 1º, e 156 do Código Brasileiro de Trânsito; 1º e 3º do Decreto-lei 8.621/46; e 1º, 2º, “b”, e 3º, “a”, “c” e “d”, do Decreto 61.843/67, por entender que a educação para o trânsito constitui uma das finalidades essenciais do serviço social autônomo, sendo inclusive um serviço auxiliar do comércio. Por fim, sustenta desobediência ao comando do art. 142 do CTN, afirmando que o julgador singular, ao modificar o ato administrativo de lançamento tributário, realizou tarefa para a qual não tem competência. Com as contra-razões subiram os autos, por força de agravo de instrumento.


É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 628.502 — RS (2004/0016540-1)

RELATORA : MINISTRA ELIANA CALMON

RECORRENTE : SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM COMERCIAL – SENAC

ADVOGADO : TADEU LUIZ DUTRA FEIJO E OUTROS

RECORRIDO : MUNICÍPIO DE CANOAS

PROCURADOR : IRAN BALSON ARAÚJO E OUTROS

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (RELATORA): Ao contrário do que afirma o recorrente, não se vislumbra contrariedade ao disposto no art. 535, II, do CPC. Pondero, em relação ao item “a” do relatório, que o Tribunal de origem manifestou-se adequadamente acerca da tese, havendo se posicionado no sentido de que as atividades desempenhadas junto ao Centro de Habilitação de Condutores — CHC, porque não vinculadas às finalidades essenciais da instituição, estão submetidas à incidência do ISS. Ademais, registro que os embargos declaratórios têm por objetivo a supressão de omissões, obscuridades ou contradições verificadas na decisão impugnada, sendo descabida sua oposição para os casos em que se pretende obter uma interpretação distinta de determinada norma, porque o recurso destinado a tal fim é outro.

Com referência ao item “b”, entendo igualmente inexistir omissão, uma vez que o Tribunal de origem, havendo apreciado a questão somente em sede de reexame necessário, estava desobrigado de emitir pronunciamento a respeito de qualquer das teses ali estatuídas.

Isso porque o reexame necessário, instituído como mecanismo de proteção do interesse público, tem por finalidade devolver ao Tribunal o conhecimento, tão-somente, das questões decididas em prejuízo do Estado. Não por outra razão, “… não há como sustentar a existência de efeito devolutivo no reexame necessário. O que ocorre, na realidade, é a translação das matérias decididas contrariamente à Fazenda” (TOSTA, Jorge. Do reexame necessário. São Paulo: RT, 2005, p. 171).

Assim, divirjo do posicionamento daqueles para quem a remessa necessária possibilita ao Tribunal o exame integral da sentença, porque, no meu entendimento, eventual reforma da decisão na parte desfavorável à Fazenda Pública, sem que exista recurso voluntário da parte adversa, implica a reformatio in pejus.

Tanto é verdade o que ora se dispõe que esta Corte, por meio de sua Súmula 45, expressou: “no reexame necessário, é defeso, ao Tribunal, agravar a condenação imposta à Fazenda Pública”. Em conseqüência disso, tem-se que, nas hipóteses em que aplicável a remessa obrigatória, o vencido em relação aos temas decididos favoravelmente ao ente público há de interpor o cabível recurso sob pena de, não o fazendo, operar-se a preclusão com respeito a essas questões. A respeito disso, escreve Jorge Tosta: Destarte, em relação à parte da sentença que beneficiou a Fazenda e, conseqüentemente, prejudicou seu adversário, operar-se-á a preclusão se este não recorrer. Corolário do exposto, jamais poderá o Tribunal, sob o argumento de haver no reexame necessário translatividade plena, reformar a sentença de primeiro grau em favor do particular que não recorreu, porque isso violaria o instituto da preclusão e atentaria, nessa parte, contra o princípio dispositivo. Além do mais, como já ressaltado anteriormente, faria prevalecer o interesse individual sobre o interesse público, o que é inadmissível no atual momento de nossa civilização. Nunca foi da natureza do reexame necessário o beneficium commune. Seu surgimento no processo civil só se justificou para tutelar interesses públicos corporificados pela Fazenda e reputados relevantes pela lei; jamais para prejudicá-los.

Enfim, toda vez que o Tribunal, no julgamento do reexame necessário, impuser à Fazenda Pública situação menos favorável que a estabelecida na sentença, e não existindo recurso da outra parte, tal importará em extrapolação do efeito translativo, o que, a nosso juízo, pode ser corrigido por simples petição, pois se trata de vício relativo aos pressupostos processuais de existência, não transitando em julgado o acórdão na parte em que prejudicou a Fazenda. (TOSTA, Jorge. Op. cit, p. 173)

Registro, ademais, a existência de arestos deste Pretório que se harmonizam com o entendimento defendido neste voto:

PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. SENTENÇA “CITRA PETITA”. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. PRECLUSÃO. REEXAME NECESSÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DECISÕES IRRETOCÁVEIS.

1. Decidindo a sentença aquém da pretensão deduzida no mandado de segurança, incumbe ao autor opor embargos declaratórios e, caso rejeitados, interpor recurso de apelação. Não fazendo nem uma coisa nem outra, preclui o seu direito de obter no reexame necessário, que só aproveita à Fazenda Pública, a extensão da decisão de primeira instância a todo o pedido formulado na inicial.

2. Os sucessivos embargos declaratórios oferecidos foram corretamente julgados no Tribunal “a quo”, que não infringiu qualquer dispositivo de lei federal.


3. Recurso especial não conhecido. (REsp 209.341/PI, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS,

SEGUNDA TURMA, julgado em 05.08.1999, DJ 18.10.1999 p. 225) RECURSO ESPECIAL. AUTORA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE A REMUNERAÇÃO DE ADMINISTRADORES, AUTÔNOMOS E AVULSOS. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. PRECLUSÃO.

Cabível a restituição do indébito contra a Fazenda, sendo o prazo de decadência/prescrição de cinco anos para pleitear a devolução, contado do trânsito em julgado da decisão do Supremo Tribunal Federal que declarou inconstitucional o suposto tributo (AGA n. 404.938/GO, rel. o subscritor deste, julgado em 3.9.2002).Em relação aos temas dos juros de mora, correção monetária e honorários, impõe-se o não conhecimento do recurso especial, diante da ausência do prequestionamento da Lei Federal objurgada (Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal), entendido como o necessário e indispensável exame da questão pela decisão atacada.

A respeitável sentença de primeiro grau, ao apreciar a contróversia, decidiu desfavoravelmente à autora, que, nada obstante, deixou de interpor recurso de apelação e deu causa à preclusão da matéria. O fato de ter havido reexame necessário não é capaz de modificar esse desate, uma vez que se trata de instituto criado em benefício do Poder Público, vedada a reformatio in pejus. Recurso especial parcialmente provido.

(REsp 435.645/SP, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO, SEGUNDA TURMA, julgado em 19.11.2002, DJ 19.05.2003 p. 187) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. COMPENSAÇÃO ENTRE TRIBUTOS DE DIFERENTES ESPÉCIES. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. REEXAME NECESSÁRIO. AMPLA DEVOLUTIVIDADE DOS RECURSOS. ART. 515, § 1º, DO CPC.

1. Não há falar em reexame necessário em matéria da qual a Fazenda Nacional não foi sucumbente.

2. O exame de questão relativa à compensação de tributos, não-devolvida nos recursos voluntários das partes e de forma a tão-somente reiterar os fundamentos da decisão monocrática não configura a hipótese de translação consubstanciada no art. 515, § 1º, do CPC, que tem como objeto as questões de ordem pública.

3. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no REsp 543.495/MG, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13.12.2005, DJ 01.02.2006 p. 434)

Então, à mingua da interposição do recurso de apelação, entendo inexigível pronunciamento quanto aos temas explicitados pela parte, restando não-configurada a aludida contrariedade ao art. 535, II, do CPC. No restante, observo que o Tribunal a quo resolveu a controvérsia com base em fundamento exclusivamente constitucional, na medida em que solucionou a questão a partir da interpretação do art. 150, VI, “e”, e § 4º, da CF/88, sendo descabida a interposição de recurso especial. Com essas considerações, conheço parcialmente do recurso e, nessa parte, nego-lhe provimento.

É o voto.

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