Limites da inocência

Supremo define limites do princípio da presunção de inocência

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22 de abril de 2006, 7h00

A exemplo do que fez com a lei dos crimes hediondos, quando definiu o significado do termo “individualização das penas”, o Supremo Tribunal Federal deverá definir o limite do princípio da presunção de inocência. Quando ele se esgota e o condenado passa a ser, de fato, o culpado pelo crime? A decisão estava marcada para quarta-feira passada (18/4), mas a matéria foi retirada da pauta.7

A questão será analisada durante o julgamento de quatro pedidos de Habeas Corpus. Caberá aos ministros a tarefa de decidir se o réu condenado em segunda instância pode aguardar em liberdade o julgamento de recursos especiais para o Superior Tribunal de Justiça e para o STF.

Nessa seara, são duas correntes majoritárias. Uma delas defende a presunção de inocência a todo e qualquer custo. Se a sentença ainda não transitou em julgado — o que ocorre só depois de esgotadas todas as possibilidades de apelação —, o réu deve sim ficar em liberdade. Só deve ser mantido preso se elementos necessários para a prisão preventiva estiverem presentes, como por exemplo o risco de fuga e de prejudicar a tramitação do processo.

A outra corrente acredita que, uma vez condenado em segunda instância, o réu tem de ser preso já para iniciar a execução da pena. Isso porque, acreditam o seguidores, ao STJ e STF não cabe analisar mais as provas dos autos, mas apenas julgar ilegalidades.

O professor Celso Sanchez Vilardi, coordenador do curso de Direito da Faculdade Getúlio Vargas, faz parte da primeira corrente. Para ele, prender condenado, ainda sem sentença transitada em julgada, viola a presunção de inocência. “Se ainda há recursos, existe a possibilidade de reverter a condenação”, explica.

Vilardi também alerta para a importância da decisão do Supremo. A exemplo do que houve com a possibilidade de progressão para os condenados por crimes hediondos, a decisão do limite da presunção de inocência não tem caráter vinculativo. No entanto, mostra o posicionamento da corte suprema e, conseqüentemente, orienta os outros juízes dos tribunais.

Outras questões

Durante o julgamento dos Habeas Corpus, os ministros do Supremo Tribunal Federal devem analisar outras questões importantes. Eles vão decidir pela validade ou não de dispositivos do Código de Processo Penal e da lei de combate à lavagem de dinheiro.

Estão em discussão os artigos 594 e 595 do Código de Processo Penal. Ambos dispositivos impossibilitam que o condenado responda em liberdade, em determinadas ocasiões, embora a condenação não tenha transitado em julgado. O artigo 594 afirma que se o réu não tiver bons antecedentes, não pode apelar em liberdade. Já o artigo 595 considera deserta a apelação se o condenado fugir.

O Supremo ainda deve discutir se o artigo 3º da Lei 9.613/98, de combate à lavagem de direito, é constitucional. Pela legislação, os crimes de lavagem de dinheiro são inafiançáveis e o acusado não pode responder em liberdade. O texto também prevê que, se o réu for condenado, caberá ao juiz decidir se ele pode responder em liberdade ou não.

Segundo o professor Vilardi, os três dispositivos em discussão têm sido derrubados pela jurisprudência dos tribunais. Os do Código de Processo Penal, segundo ele, por terem sido editados antes da Constituição de 1988 e não terem sido acolhidos por ela. “O entendimento que tem prevalecido é que o réu pode apelar, mesmo que tenha sua prisão decretada e tenha fugido”, explica. Quando à lei de lavagem, ele acredita que o Supremo deve ter o mesmo entendimento que teve para a lei dos crimes hediondos: o respeito ao princípio da individualização da pena.

Relatoria

Dos quatro pedidos de Habeas Corpus, dois têm como relator o ministro Marco Aurélio. Os outros estão com o ministro Joaquim Barbosa e Sepúlveda Pertence. Três deles já começaram a ser analisados, mas o julgamento foi interrompido por um pedido de vista da ministra Ellen Gracie. Por enquanto, o placar em todos os três é favorável ao direito de apelar em liberdade. Vale lembrar que a maioria dos ministros ainda não se manifestou sobre o assunto.

HCs 83.868, 85.591 e 85.961

RHC 83.810

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