Pagamento de honorários

Ilegitimidade do MP na ação não justifica sucumbência

Autor

19 de abril de 2006, 17h15

Mesmo que se reconheça a ilegitimidade de ação proposta pelo Ministério Público, não se caracterizando a má-fé do órgão, não há hipótese que autorize sua condenação em sucumbência. Com este entendimento, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu livrar o Ministério Público do pagamento de custas e despesas processuais por propor ação em favor de pessoa pobre.

A ação proposta pelo MPE do Rio Grande do Sul pretendia garantir a realização de exame de tomografia computadorizada em uma paciente pelo Sistema Único de Saúde.

A primeira instância concedeu liminar e julgou procedente a ação. No entanto, o Tribunal de Justiça local determinou a extinção do processo com o argumento de que não é possível o Ministério Público atuar em favor de interesse individual. Em Embargos de Declaração, condenou o MP a arcar com os honorários do advogado da outra parte.

O Ministério Público recorreu ao STJ, afirmando deter legitimidade para defesa de direito indisponível, como a vida de uma pessoa debilitada que necessite de exame médico. A condenação em honorários e custas processuais também não seria cabível, exceto em caso de má-fé, o que não teria ocorrido.

O ministro José Delgado acolheu as alegações do MP quanto aos honorários de sucumbência, mas não quanto à legitimidade para propor a ação. Para o relator, o Ministério Público somente pode atuar como substituto processual em defesa de interesse individual nos casos expressos em lei, além das hipóteses de legitimação genérica para propositura de Ação Civil Pública em defesa de interesses transindividuais.

No entanto, os ônus de sucumbência não devem ser pagos pelo MP, entendeu o relator. Citando o parecer do Ministério Público Federal, o ministro afirmou que a condenação do órgão estadual em honorários e custas só é possível se comprovada sua litigância de má-fé no ajuizamento da ação, o que não ocorre no caso, mesmo que reconhecida a ilegitimidade ativa do MP gaúcho para atuar como substituto processual em defesa da paciente.

Resp 740850

Leia a íntegra da decisão

RECURSO ESPECIAL Nº 740.850 — RS (2005⁄0058273-9)

RELATOR: MINISTRO JOSÉ DELGADO

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RECORRIDO: SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE SANT ANA DO LIVRAMENTO

ADVOGADO: CARLOS FABRÍCIO DE OLIVEIRA SILVEIRA E OUTROS

EMENTA

RECURSO ESPECIAL PELAS LETRAS “A” E “C” DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. INTERESSE INDIVIDUAL. SAÚDE. TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA. ILEGITIMIDADE. ALEGATIVA DE INFRINGÊNCIA AOS ARTIGOS 267, VI, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E 25, IV, “A”, DA LEI 8.625⁄93. CONDENAÇÃO NOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, PELA ALÍNEA “C”.

1. Nos autos de ação ordinária com pedido de antecipação de tutela proposta pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul foram prolatados acórdão assim ementados:

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPA. INTERESSE INDIVIDUAL. SAÚDE. TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA. INVIABILIDADE DA DEMANDA.

Não se exibe adequada, quando menos por ilegitimado ativo o Ministério Público, ação ordinária visando declaração de direito de determinada pessoa à realização de exame em face de nasocômio, porquanto a tutela de interesse individual, ainda que respeitando à saúde, refoge ao âmbito constitucional de atribuições daquele órgão do Poder Executivo.

ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. EXTINÇÃO DO PROCESSO POR CARÊNCIA DE DE AÇÃO.

APELAÇÃO PROVIDA.” (fl 112).

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. OMISSÃO. EMBARGOS ACOLHIDOS”. (fl. 123).

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. SUCUMBÊNCIA. MINISTÉRIO PÚBLICO.

A diretriz em tema de sucumbência é a de que deve satisfazer as despesas do processo, inclusive honorários advocatícios do procurador da parte contrária, o vencido (art. 20 do CPC) não havendo razão para, por analogia, invocar-se restrição estabelecida em çei especial (art. 18 da LACP).

Se carente de legitimidade, agiu o Ministério Público, o que vem a ser reconhecido judicialmente, arcará com as despesas da derrota.

Não há de falar, assim em omissão de acórdão, em embargos de declaração que, colmatando lacuna do acórdão embargado, aplica o princípio acolhido pelo art. 20 do CPC.

Embargos de declaração desacolhidos.” (fl. 135).

Irresignado, o Ministério Público interpôs dois recursos especiais: o primeiro (fls. 145⁄154) pela letra “a” da permissão constitucional, contra o acórdão de fls. 112⁄115, alegando afronta aos artigos 267, VI, do Código de Processo Civil e 25, IV, “a”, da Lei 8625⁄93 e o segundo com fulcro no art. 105, III, alíneas “a” e “c”, contra os acórdãos de fls. 123⁄124 e 135⁄139, sustentando a violação dos artigos 267, VI, do Código de Processo Civil e 25, IV, “a”, da Lei 8625⁄93, bem como divergência jurisprudencial em relação à sua condenação nos ônus sucumbenciais.


2. Não obstante tenha sido o primeiro recurso especial interposto pela letra “a” e o segundo pelas letras “a” e “c”, é possível a análise do segundo por ambas as alíneas, porque, conforme se depreende dos autos, apenas com o segundo acórdão é que restou complementado o julgamento, tendo sido reiterados no segundo recurso especial os fundamentos aduzidos pela alínea “a” e expostos aqueles que levaram à sua interposição pela letra “c”, encontrando-se a matéria abarcada em um só ato processual legítimo.

3. Falece legitimidade ativa ao Ministério Público para propor ação ordinária, como substituto processual, no sentido de defender interesse individual de determinada pessoa a exame médico, mormente quando existe, na localidade, Defensoria Pública. O Parquet pode, como representante ou substituto processual, agir na defesa do interesse de determinado indivíduo desde que declinadas as razões da representação ou da substituição, uma vez que só em casos específicos é que atua em favor do representado ou substituído. In casu, o fundamento no qual o recorrente se apóia para defender a sua legitimidade “ad causam” é o artigo 25, IV, “a”, da Lei 8.625⁄93 que dispõe, apenas, acerca de sua legitimidade para propor ações civis públicas. Portanto, não carece de reparos o decisório objurgado que, com base no artigo 267, VI, do CPC extinguiu o processo, por ilegitimidade ativa do Ministério Público.

4. A condenação do Parquet nos ônus sucumbenciais somente é possível se comprovada a litigância de má-fé deste no ajuizamento da ação, não caracterizada na hipótese em que o Ministério Público atuou como substituto processual de pessoa pobre, condição que não pode ser afastada, mesmo se reconhecida sua ilegitimidade ativa ad causam.

5. Recurso especial conhecido e parcialmente provido para afastar a condenação do Ministério Público nos ônus da sucumbência.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Francisco Falcão, Luiz Fux, Teori Albino Zavascki e Denise Arruda votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 21 de março de 2006 (Data do Julgamento)

MINISTRO JOSÉ DELGADO

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 740.850 — RS (2005⁄0058273-9)

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO (Relator): Cuidam os autos de Ação Ordinária com pedido de antecipação de tutela proposta pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul com pedido do seguinte teor (fls. 2⁄11):

“a) considerando a relevância dos fundamentos e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final (…) inaudita altera pars (…) imediatamente, providencie a realização do exame de tomografia computadorizada do cérebro da Sra. (…), realizando-o diretamente, custeando-o junto a terceiros ou providenciando a remoção da paciente para centro de referência do Sistema Único de Saúde — SUS, tudo conforme critério médico, em qualquer das hipóteses sem nenhum ônus para a paciente ou sua família;

b) em caso de descumprimento da medida judicial (…) multa diária de R$ 5.000,00 (…);

c) a citação da Santa Casa de Misericórdia de Sant’Ana do Livramento para contestar (…);

d) (…) julgada procedente a presente ação”

Concedida a tutela antecipada e julgada procedente a ação por sentença prolatada nos seguintes termos (fls. 62⁄64):

Isso posto, mantida a tutela, e afastada a denunciação, julgo procedente a presente ação para declarar a responsabilidade da ré pela prestação do exame, devendo comprovar no prazo de cinco dias o cumprimento da medida liminar já deferida, sob pena de pagamento de multa diária que fixo no valor de R$ 1.000,00 corrigido pelo IGP-M, devendo esta, se incidente, ser revertida ao Fundo Municipal de Saúde.

Condeno a demandada ao pagamento das custas e despesas processuais, só que com suspensividade haja vista pedido de AJG ora concedido.

Inconformada a parte ré, A Santa Casa de Misericórdia de Santana do Livramento, interpôs recurso de apelação que foi provido por acórdão assim ementado (fl. 112):

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. INTERESSE INDIVIDUAL. SAÚDE. TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA. INVIABILIDADE DA DEMANDA.

Não se exibe adequada, quando menos por ilegitimado ativo o Ministério Público, ação ordinária visando declaração de direito de determinada pessoa à realização de exame em face de nosocômio, porquanto a tutela de interesse individual, ainda que respeitando à saúde, refoge do âmbito constitucional de atribuições daquele órgão do Poder Executivo.

ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. EXTINÇÃO DO PROCESSO POR CARÊNCIA DE DE AÇÃO.


APELAÇÃO PROVIDA.

Opostos embargos de declaração pela apelante, o julgamento destes remanesceu assim espelhado (fl. 123):

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. OMISSÃO. EMBARGOS ACOLHIDOS”.

O Ministério Público também opôs embargos de declaração que receberam acórdão de seguinte súmula (fl. 135):

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. SUCUMBÊNCIA. MINISTÉRIO PÚBLICO.

A diretriz em tema de sucumbência é a de que deve satisfazer as despesas do processo, inclusive honorários advocatícios do procurador da parte contrária, o vencido (art. 20 do CPC) não havendo razão para, por analogia, invocar-se restrição estabelecida em lei especial (art. 18 da LACP).

Se, carente de legitimidade, agiu o Ministério Público, o que vem a ser reconhecido judicialmente, arcará com as despesas da derrota.

Não há falar, assim, em omissão de acórdão, em embargos de declaração que, colmatando lacuna do acórdão embargado, aplica o princípio acolhido pelo art. 20 do CPC.

Embargos de declaração desacolhidos.”

Irresignado o Ministério Público do Rio Grande do Sul interpôs dois recursos especiais. O primeiro (fls. 145⁄154) pela letra “a” da permissão constitucional, contra o acórdão de fls. 112⁄115, alegando afronta aos artigos 267, VI, do Código de Processo Civil e 25, IV, “a”, da Lei 8625⁄93 e o segundo com fulcro no art. 105, III, alíneas “a” e “c”, contra os acórdãos de fls. 123⁄124 e 135⁄139, sustentando a violação dos artigos 267, VI, do Código de Processo Civil e 25, IV, “a”, da Lei 8625⁄93 bem como divergência jurisprudencial em relação à sua condenação nos ônus sucumbenciais.

Assim estabelecem, respectivamente, os preceitos ditos vulnerados:

“Art. 267.Extingue-se o processo, sem julgamento do mérito:

VI — quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual”.

“Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:

IV — promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:

a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos”.

Afirma que, nos termos da legislação pertinente, o Ministério Público detém a legitimidade para propositura de ação que visa a tutela de direito indisponível, ou seja, a vida de uma pessoa debilitada em sua saúde e necessitando do exame médico requerido, sendo esse, inclusive, o entendimento deste egrégio Sodalício como se colhe do seguinte acórdão (fl. 164):

“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. LEGITIMIDADE.

1. Consoante entendimento preconizado por esta Corte, o Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública, com vistas à defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, na espécie a proteção do direito ao salário-mínimo dos servidores municipais. Precedentes.

2. Recurso conhecido e provido. (ac. un. da 6ª Turma do STJ, rel. Min. Fernando Gonçalves, REsp n.º296905⁄PB, j. em 22.10.2002)”

Aduz, também, não caber a condenação do Ministério Público em honorários e custas processuais exceto nos casos em que agir com manifesta má-fé, o que, evidentemente, não é o caso dos autos, encontrando-se o decisório reclamado divergente do entendimento jurisprudencial, conforme ementa que colaciona às fls. 167⁄168 acórdão assim sumulado:

“PROCESSUAL CIVIL. MINISTÉRIO PÚBLICO. HONORÁRIOS.

1. O Ministério Público só merece ser condenado ao pagamento da verba de honorários advocatícios, quando atua como órgão público visando defender direito individual indisponível — a proteção à saúde do cidadão, se ficar comprovado que agiu de má-fé.

2. Não se justifica a condenação em honorários advocatícios só pelo fato do Ministério Público ter sido considerado parte ilegítima para a ação.

3. Recurso provido.” (REsp 20941⁄RS, Rel. Min. José Delgado. DJU 22;06⁄99)

Com respaldo nesses argumentos, apresenta pedido do seguinte teor (fl. 170):

“Pelo exposto, restando demonstrado à saciedade que a respeitável decisão contrariou o art. 267, inciso VI, do Código de Processo Civil, e negou vigência ao artigo 25, inciso IV letra ‘a’, da Lei 8625⁄93. bem como divergiu de decisões do Superior Tribunal de Justiça, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL propugna seja admitido o presente RECURSO ESPECIAL e, ao final, seja integralmente provido nessa Superior Instância, aos efeitos de, reconhecendo, a legitimidade ativa do Parquet, anulando-se o decisum proferido pela Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, para que outra decisão seja declinada, desta feita enfrentando o mérito da questão posta em juízo, ou, em sendo mantida essa decisão de extinção do feito, afastar a condenação do Ministério Público nos ônus da sucumbência.”


Foram apresentados recursos extraordinários pelo recorrente às fls. 172⁄181 e 182⁄192.

Sem contra-razões.

Em juízo prélibatório os recursos especiais foram admitidos, e o recurso extraordinário de fls. 172⁄181 em respeito ao princípio da unicidade dos recursos.

Parecer ministerial às fls. 202⁄212.

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 740.850 — RS (2005⁄0058273-9)

EMENTA

RECURSO ESPECIAL PELAS LETRAS “A” E “C” DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. INTERESSE INDIVIDUAL. SAÚDE. TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA. ILEGITIMIDADE. ALEGATIVA DE INFRINGÊNCIA AOS ARTIGOS 267, VI, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E 25, IV, “A”, DA LEI 8.625⁄93. CONDENAÇÃO NOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, PELA ALÍNEA “C”.

1. Nos autos de ação ordinária com pedido de antecipação de tutela proposta pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul foram prolatados acórdão assim ementados:

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPA. INTERESSE INDIVIDUAL. SAÚDE. TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA. INVIABILIDADE DA DEMANDA.

Não se exibe adequada, quando menos por ilegitimado ativo o Ministério Público, ação ordinária visando declaração de direito de determinada pessoa à realização de exame em face de nasocômio, porquanto a tutela de interesse individual, ainda que respeitando à saúde, refoge ao âmbito constitucional de atribuições daquele órgão do Poder Executivo.

ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. EXTINÇÃO DO PROCESSO POR CARÊNCIA DE DE AÇÃO.

APELAÇÃO PROVIDA.” (fl 112).

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. OMISSÃO. EMBARGOS ACOLHIDOS”. (fl. 123).

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. SUCUMBÊNCIA. MINISTÉRIO PÚBLICO.

A diretriz em tema de sucumbência é a de que deve satisfazer as despesas do processo, inclusive honorários advocatícios do procurador da parte contrária, o vencido (art. 20 do CPC) não havendo razão para, por analogia, invocar-se restrição estabelecida em çei especial (art. 18 da LACP).

Se carente de legitimidade, agiu o Ministério Público, o que vem a ser reconhecido judicialmente, arcará com as despesas da derrota.

Não há de falar, assim em omissão de acórdão, em embargos de declaração que, colmatando lacuna do acórdão embargado, aplica o princípio acolhido pelo art. 20 do CPC.

Embargos de declaração desacolhidos.” (fl. 135).

Irresignado, o Ministério Público interpôs dois recursos especiais: o primeiro (fls. 145⁄154) pela letra “a” da permissão constitucional, contra o acórdão de fls. 112⁄115, alegando afronta aos artigos 267, VI, do Código de Processo Civil e 25, IV, “a”, da Lei 8625⁄93 e o segundo com fulcro no art. 105, III, alíneas “a” e “c”, contra os acórdãos de fls. 123⁄124 e 135⁄139, sustentando a violação dos artigos 267, VI, do Código de Processo Civil e 25, IV, “a”, da Lei 8625⁄93, bem como divergência jurisprudencial em relação à sua condenação nos ônus sucumbenciais.

2. Não obstante tenha sido o primeiro recurso especial interposto pela letra “a” e o segundo pelas letras “a” e “c”, é possível a análise do segundo por ambas as alíneas, porque, conforme se depreende dos autos, apenas com o segundo acórdão é que restou complementado o julgamento, tendo sido reiterados no segundo recurso especial os fundamentos aduzidos pela alínea “a” e expostos aqueles que levaram à sua interposição pela letra “c”, encontrando-se a matéria abarcada em um só ato processual legítimo.

3. Falece legitimidade ativa ao Ministério Público para propor ação ordinária, como substituto processual, no sentido de defender interesse individual de determinada pessoa a exame médico, mormente quando existe, na localidade, Defensoria Pública. O Parquet pode, como representante ou substituto processual, agir na defesa do interesse de determinado indivíduo desde que declinadas as razões da representação ou da substituição, uma vez que só em casos específicos é que atua em favor do representado ou substituído. In casu, o fundamento no qual o recorrente se apóia para defender a sua legitimidade “ad causam” é o artigo 25, IV, “a”, da Lei 8.625⁄93 que dispõe, apenas, acerca de sua legitimidade para propor ações civis públicas. Portanto, não carece de reparos o decisório objurgado que, com base no artigo 267, VI, do CPC extinguiu o processo, por ilegitimidade ativa do Ministério Público.

4. A condenação do Parquet nos ônus sucumbenciais somente é possível se comprovada a litigância de má-fé deste no ajuizamento da ação, não caracterizada na hipótese em que o Ministério Público atuou como substituto processual de pessoa pobre, condição que não pode ser afastada, mesmo se reconhecida sua ilegitimidade ativa ad causam.


5. Recurso especial conhecido e parcialmente provido para afastar a condenação do Ministério Público nos ônus da sucumbência.

VOTO

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO (Relator): Inicialmente, entendo, com a devida vênia de entendimentos contrários, que, não obstante tenha sido o primeiro recurso especial interposto pela letra “a” e o segundo pelas letras “a” e “c”, é possível a análise do segundo recurso especial por ambas as alíneas, porque, conforme se depreende dos autos, apenas com o segundo acórdão é que restou complementado o julgamento, tendo sido reiterados no segundo recurso especial os fundamentos aduzidos pela alínea “a” e expostos aqueles que levaram à sua interposição pela letra “c”, encontrando-se a matéria abarcada em um só ato processual legítimo.

Conheço o recurso por ambas as alíneas . Passo ao mérito.

Pela letra “a”, não vislumbro o cometimento de afronta aos artigos 267, VI, do Código de Processo Civil e 25, IV, “a”, da Lei 8.625⁄93.

Efetivamente, no que pese o judicioso Parecer Ministerial, falece, no presente caso, legitimidade ativa ao Ministério Público para propor ação ordinária, como substituto processual, no sentido de defender interesse individual de determinada pessoa a exame médico, mormente quando existe, na localidade, Defensoria Pública.

O Parquet pode, como representante ou substituto processual, agir na defesa do interesse de determinado indivíduo desde que declinadas as razões da representação ou da substituição, uma vez que só em casos específicos é que o Ministério Público atua em favor do representado ou substituído, como bem exposto por Hugo Nigro Mazilli, in “A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo,” 16ª edição, p. 90:

“A possibilidade de o Ministério Público agir como autor no processo civil supõe autorização taxativa na lei, salvo as hipóteses de legitimação genérica nas ações civis públicas em defesa de interesses transindividuais.”

Saliente-se, ademais, que o fundamento no qual o recorrente se apóia para defender a sua legitimidade “ad causam” é o artigo 25, IV, “a”, da Lei 8.625⁄93 que dispõe apenas acerca de sua legitimidade para propor ações civis públicas conforme se observa do teor do preceito citado:

“Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:

IV — promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:

a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos”.

Portanto, o dispositivo legal indicado como violado não pode ser tido como vulnerado, pois está a indicar, tão-somente, a legitimidade do Parquet para a propositura da Ação Civil Pública e não para Ação Ordinária com Antecipação de Tutela, que é o tipo de ação versada nos autos.

Correto, nesse aspecto, o acórdão que extinguiu o processo com base no artigo 267, VI, do CPC por ilegitimidade do Ministério Público.

Destarte, nego provimento ao recurso especial pela letra “a”.

Dou provimento, contudo, à insurgência recursal pela alínea “c”, para afastar a condenação do recorrente nos ônus sucumbenciais, utilizando-me, para tanto, do louvável parecer ministerial que expõe às fls. 209⁄212:

“(…) Considerando as circunstâncias do caso concreto, já analisadas acima, ratifico o entendimento sobre a legitimidade do Ministério Público para ajuizar ação em defesa de interesse individual indisponível, no caso, a saúde de pessoa pobre.

Entendo, ainda, que a condenação em honorários somente é possível se comprovada a litigância de má-fé do Ministério Público no ajuizamento da referida ação, não caracterizada na hipótese, em que o Ministério Público atuou como substituto processual de pessoa pobre, condição que não pode ser afastada, mesmo se reconhecida sua ilegitimidade ativa ad causam.

Nesse sentido, correto entendimento desse Colendo Superior Tribunal de Justiça:

‘MINISTÉRIO PUBLICO. CUSTAS E HONORÁRIOS DE ADVOGADO. MOVENDO AÇÃO EM NOME DO ECONOMICAMENTE FRACO, O MINISTÉRIO PÚBLICO, SE VENCIDO NA DEMANDA, AINDA QUE RECONHECIDA A SUA ILEGITIMIDADE PARA ATUAR COMO SUBSTITUTO, NÃO RESPONDE PELAS CUSTAS NEM PELOS HONORÁRIOS DE ADVOGADO. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO ART. 81 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.”

(REsp 61367⁄MG – Terceira Turma – Rel. Min. Nilson Naves — DJ 23.10.1995 p. 35663).

‘PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANOS AMBIENTAIS. MINISTÉRIO PÚBLICO FIGURANDO COMO AUTOR DA DEMANDA. PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO. PRETENSÃO À SUCUMBÊNCIA PELO PARQUET. IMPOSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DA LEI N.°7.437⁄85, ART. 18.


1- É descabido fazer com que o órgão ministerial experimente a sucumbência em se tratando de ação civil pública pelo fato de a mesma haver sido julgada parcialmente procedente, tendo em vista que, em relação a um dos réus, o processo foi julgado extinto sem julgamento de mérito, face à sua ilegitimidade para figurar na demanda.

2 — A teor do art. 18 da Lei 07.347⁄85, a regra é que “Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais”.

3 — Para que o acórdão prosperasse seria necessário provar cabalmente a má-fé do Ministério Público, o que não ocorreu in casu.

4 — Recurso provido.’ (REsp 198827⁄SP –Primeira Turma – Rel. Min. José Delgado – DJ 26.04.1999 p. 66).

‘PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. LEI N.° 7.347⁄85 ART. 17. LEI N.° 8.078⁄90 ART. 115.

1. A legitimidade do Ministério Público para agir como autor da Ação Civil Pública é ponto luminoso no cenáculo constitucional das suas atividades, com expressa previsão, arts. 127 e 129, III, C.F., Lei Comp. 75⁄93, art. 6°, art. 5°, Lei n.° 7.347⁄85.

2. Existente fundamentação razoável, vivificados os objetivos e funções do órgão ministerial, cuja participação é reputada de excepcional significância, tanto que, se não aparecer como autor, obrigatoriamente, deverá intervir como custos legis § 1º, art. 5º, ref., não se compatibiliza com o espírito da lei de regência, no caso da improcedência da Ação Civil Pública, atribuir-lhe a litigância de má-fé art. 17, Lei ant., c⁄c o art. 115, Lei n.° 8.078⁄90, com a condenação em honorários advocatícios.

3. No caso, além do mais, a pretensão não se mostra infundada, não revela propósito inadvertido ou clavado pelo sentimento pessoal de causar dano à parte ré ou que a ação resultante de manifestação sombreada por censurável iniciativa. Tanto que a solução judicial dependeu de laboriosa prova técnica.

4. A litigância de má-fé reclama convincente demonstração.

5. Recurso provido.’ (REsp 406767⁄SP – Primeira Turma – Rel. Min. Milton Luiz Pereira – DJ 11.03.2002 p. 175).

‘PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS E CUSTAS.

1. É descabida a condenação do Ministério Público em verbas sucumbenciais em ação civil pública, exceto quando comprovada má-fé.

2. Recurso especial provido.’ (REsp 178088⁄MG – Segunda Turma – Rel. Min. Castro Meira. (grifo nosso)”

Em face do acima exposto, conheço do recurso especial e dou-lhe parcial provimento apenas para afastar a condenação do Ministério Público nos ônus sucumbenciais.

É como voto.

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