Ciúme fatal

STJ mantém acusação por motivo torpe para Pimenta Neves

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18 de abril de 2006, 19h17

O jornalista Pimenta Neves não conseguiu se livrar da acusação de homicídio da jornalista Sandra Gomide por motivo torpe. A decisão é do ministro Hélio Quaglia Barbosa, do Superior Tribunal de Justiça, que negou novo apelo da defesa do jornalista.

Os advogados de Pimenta Neves ingressaram com Agravo Regimental para reverter decisão anterior que manteve a acusação. Eles solicitaram a reconsideração quanto aos itens da tempestividade do Recurso Especial (dentro do prazo legal) e a alegação de divergência jurisprudencial.

Ao analisar o pedido, o ministro reconsiderou a sua decisão anterior, de março deste ano, na questão referente à tempestividade do Recurso Especial ao reconhecer a existência de protocolo que valida a admissibilidade do pedido. Mas entendeu que o recurso não apresentou fundamentação suficiente para possibilitar o afastamento da acusação.

Leia a íntegra da decisão:

AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 702.363 – SP (2005/0135056-7)

RELATOR : MINISTRO HÉLIO QUAGLIA BARBOSA

AGRAVANTE : ANTÔNIO MARCOS PIMENTA NEVES

ADVOGADO : ILANA MULLER E OUTROS

AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

EMENTA

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO PENAL. CERTIDÃO DE INTERPOSIÇÃO DO RECURSO ESPECIAL ILEGÍVEL. EXISTÊNCIA DE DOCUMENTO COMPROVANDO A TEMPESTIVIDADE DO RESP. RECONSIDERAÇÃO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA TESE. AGRAVO DE INSTRUMENTO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

DECISÃO

1. Cuida-se de agravo regimental interposto por ANTÔNIO MARCOS PIMENTA NEVES em face da r. decisão singular que não conheceu do agravo de instrumento, ementada nestes termos:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO PENAL. CERTIDÃO DE INTERPOSIÇÃO DO RECURSO ESPECIAL ILEGÍVEL. POSTERIOR JUNTADA DE DOCUMENTO COMPROVANDO A TEMPESTIVIDADE DO RESP. IMPOSSIBILIDADE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA TESE. AGRAVO NÃO CONHECIDO.”

Sustenta o agravante a tempestividade do recurso especial, bem como a existência de demonstração da divergência jurisprudencial; pugna para que se dê provimento ao presente agravo regimental, para reformar a decisão guerreada.

Este, o sucinto relatório.

Decido.

2. O recorrente fora pronunciado pela 1ª Vara da Comarca de Ibiúna/SP como incurso nas penas do art. 121, § 2º, I e IV, do Código Penal; dessa decisão recorreu ao Tribunal Paulista, sendo-lhe negado provimento, motivo que deu ensejo ao recurso especial, que foi inadmitido na origem, sob o amparo da Súmula 7 desta Corte de Justiça.

3. A decisão monocrática anteriormente exarada há de ser reconsiderada no que toca à tempestividade do especial.

Não obstante estar ilegível protocolo daquele recurso, insta destacar que há outro protocolo no lado oposto da página mencionando que no dia 23 de julho de 2004 a referida peça recursal já estava no Tribunal a quo. Ainda, a decisão de admissibilidade constante às fls. 2.733/2.736 informa que houve paralisação do Judiciário paulista entre a data de 30 de junho de 2004 a 13 de outubro de 2004.

4. No entanto, o agravo de instrumento não merece provimento, pois ausente a alegada divergência jurisprudencial; não há similitude fática entre o acórdão paradigma e o recorrido, de modo que não restou comprovada a alegada divergência jurisprudencial.

O decisum vergastado pelo recurso especial assim expôs:

“Como forma de estirpar as majorantes, quer o chancelamento do ciúme, que defende o recorrente não compor o motivo torpe. Constitui-se o ciúme, segundo Antonio de Morais Silva, Novo Dicionário Compacto da Língua Portuguesa, volume 2, Editora Confluência, receio de perder alguma coisa. Em tese, o Desembargador Hélio de Freitas, desta Corte, já disse que não há ciúme nem vingança em situações, como na espécie, porque o que se quer é que a pessoa lhe pertença e não a mais ninguém, donde adviria a torpeza do móvel criminoso (conforme Ap. Crim. nº 265.455-3/0). Em assim sendo, se a qualificadora de motivo é excluída ou não, os jurados dirão. Mas o motivo torpe se faz presente, ainda que em abstrato; e também o recurso que impossibilitou a defesa da vítima, frente à descrição das testemunhas e ao desfechar dos tiros nas costas e no ouvido, especialmente quando a vítima fugia com as mão limpas.” (fl. 2.555 – grifei)

Desse modo, há que se reconhecer que o Tribunal de Justiça de São Paulo infirma a tese requerida pelo recorrente relativa à existência do ciúme como motivo torpe. Ao contrário, é cristalino em expor que “não há ciúme nem vingança em situações, como na espécie”, mas torpeza, ainda que de forma abstrata.

Lado outro, as decisões colacionadas aos autos, referentes à comprovação da divergência jurisprudencial, são uníssonas ao afirmarem que o ciúme não é considerado motivo torpe, a fim de qualificar o crime de homicídio.

5. Diante das normas legais regentes da matéria (art. 541, parágrafo único do Código de Processo Civil, c/c o art. 255 do Regimento Interno do STJ), necessária se faz a comprovação do dissídio através do confronto entre o acórdão recorrido e as decisões divergentes apontadas. Para tanto, não basta a simples transcrição de ementas ou trechos de acórdão sem a correspondente identificação com os casos confrontados, que devem ser assemelhados; é indispensável a demonstração analítica da divergência invocada e a indicação das circunstâncias que identificam como semelhantes os casos confrontados.

Apresenta-se, à colação, os seguintes precedentes :

“AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.

DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. NÃO COMPROVAÇÃO.

1. Malgrado a tese de dissídio jurisprudencial, há necessidade, diante das normas legais regentes da matéria (art. 541, parágrafo único, do CPC c/c o art. 255 do RISTJ), de confronto entre o acórdão recorrido e trechos das decisões apontadas como divergentes, mencionando-se as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados – indispensável inclusive nas hipóteses de divergência notória. Ausente a demonstração analítica do dissenso, incide a censura súmula 284 do Supremo Tribunal Federal.

2. Agravo regimental improvido.”(AgRg nos EDcl no AG 618.949/SP, Quarta Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 11.04.2005).

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR

PÚBLICO ESTADUAL. OMISSÃO. COMPLEMENTAÇÃO DE PENSÃO. LEIS ESTADUAIS NºS 4.819/58 E 200/74. REVOGAÇÃO.

(…)- Ausência de similitude fática entre os acórdãos paradigma e recorrido.Divergência jurisprudencial não demonstrada.- Agravo regimental improvido. ” (AgRg no REsp 702.166/SP, Sexta Turma, de minha relatoria, DJ de 06.03.2006)

6. Por derradeiro, há que se salientar, quanto ao pedido relativo ao afastamento da qualificadora da impossibilidade de defesa da vítima, que o recurso especial não apresentou fundamentação suficiente a possibilitar a cognição deste tema. A mera alusão do dissídio sem particularizar a disparidade de teses não enseja a abertura da estreita via especial.

7. Ante o exposto, RECONSIDERO a decisão anterior para afastar a intempestividade do recurso especial e, assim, conhecer do agravo de instrumento; ato contínuo, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento, pois ausente a alegada divergência

jurisprudencial.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília (DF), 06 de abril de 2006.

MINISTRO HÉLIO QUAGLIA BARBOSA

Relator

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