Stent não é prótese

Bradesco Saúde tem de arcar com implante de dois stents

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2 de abril de 2006, 7h00

Stent não é prótese. Portanto, os planos de saúde têm de arcar com implante do aparelho, necessário para a realização da cirurgia de angioplastia. A decisão é do juiz Josias Menescal Lima de Oliveira, da 11ª Vara Cível do Ceará, que condenou a Bradesco Saúde a arcar com a implantação de dois stents, no valor de R$ 41 mil, para um de seus segurados. Cabe recurso.

No mês de fevereiro deste ano, Ivan Barros de Siqueira Campos teve de se submeter a uma cirurgia urgente de angioplastia e cateterismo, que ocorreu no Hospital Monte Klinicum. Entretanto, ao procurar o plano de saúde para custear o tratamento, a empresa se recusou a autorizar a compra dos stents alegando que a apólice assinada não previa cobertura para próteses.

Há uma grande discussão em relação à classificação do aparelho. A Bradesco Saúde considera o stent como uma prótese e em seu contrato há uma cláusula que informa sobre a não cobertura de próteses. No entanto, o juiz Josias Menescal Lima de Oliveira destacou que os tribunais, em diversas decisões, entendem que stents não são próteses.

Para confirmar o argumento, ele citou o voto de um desembargador do Tribunal de Justiça gaúcho: “o stent não pode ser considerado como prótese, apesar da utilização do termo endoprótese, pois não há substituição da artéria coronariana. O stent é uma estrutura metálica que mantém as paredes da artéria dilatadas, não se amoldando na definição técnica de prótese”.

O juiz concedeu a liminar solicitada, determinando que a Bradesco Saúde efetue o pagamento dos dois stents diretamente ao hospital Monte Klinikum, num prazo máximo de 48 horas. Fixou, também, multa diária de R$ 5 mil, em caso de descumprimento da sentença.

Processo 2006.0006.0146-2

Leia a íntegra da decisão

PODER JUDICIÁRIO

ESTADO DO CEARÁ

COMARCA DE FORTALEZA

11ª VARA CÍVEL

Ref.Proc. n.º03922/06 (2006.0006.0146-2)

Classe: Obrigação de Fazer

Autor(a)(es): Ivan Barros de Siqueira Campos

DESPACHO

R. H.

Vistos, em permanente e contínua correição.

Cuida-se de Obrigação de Fazer formulada por IVAN BARROS DE SIQUEIRA CAMPOS em desfavor de BRADESCO SAÚDE S/A, no qual foi formulado pedido de antecipação de tutela consistente à determinação ao Promovido para que pague diretamente ao hospital Monte Klinikum S/C Ltda., onde foi realizada a cirurgia na pessoa do Autor, no máximo prazo de 48 (quarenta e oito) horas, o valor de R$41.250,00 (quarenta e um mil e duzentos e cinqüenta reais), correspondentes a 2 (dois) STENTS da marca TAXUS, implantados no Autor a 19 de fevereiro, quando o mesmo foi submetido a uma angioplastia e cateterismo cardíaco urgente, com a cominação de pena, para o caso de descumprimento do preceito.

A questão começou quando o Autor, usuário do plano de saúde BRADESCO SAÚDE, na categoria livre escolha, teve que se submeter a uma angioplastia e cateterismo urgente, com a implantação de 2 (dois) STENTS de marca TAXUS, o que ocorreu no Hospital Monte Klinicum.

Ao buscar, entretanto, o plano de saúde para o custeamento de tal intervenção, este teria se recusado a autorizar a compra de tais STENTS sob o pálio de que a apólice do Autor não preveria cobertura para próteses.

Ao pedido, juntou a documentação de fls. 21 a 52, repousando as custas às fls. 53, 54, 55 e 56.

Relatei sinteticamente o presente.

Passo, pois, a decidir, única e exclusivamente em relação ao pedido de antecipação de tutela.

Antes de mais nada, determino à Secretaria identifique os presentes como prioritários, em consonância com o determinado pelo Estatuto da Terceira Idade.

Examino, agora, o pedido formulado.

A antecipação de tutela encontra albergue no Código de Processo Civil, mais precisamente no art. 273 deste, in verbis:

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 1º Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 2º Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 3º A execução da tutela antecipada observará, no que couber, o disposto nos incisos II e III do art. 588. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 3º A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4º e 5º, e 461-A. (Redação dada pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)

§ 4º A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 5º Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 6º A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso. (Incluído pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)

§ 7º Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado. (Incluído pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)

No presente caso, é nítida a prova inequívoca dos fatos, consistente na própria Exordial, bem como dos documentos que a acompanham. Há, pois, notoriamente, a verossimilhança das alegações.

Também vislumbro existir, no caso em comento, fundado receio de dano irreparável ou, ao menos, de difícil reparação, vez que o Autor terá que arcar com o pagamento de tal material cirúrgico, que implica no considerável valor de mais de quarenta mil reais.

É preciso consignar, por imperioso, que o presente deve e está sendo examinada à ótica do Código de Defesa do Consumidor – CDC, já que, por óbvio e cristalino, a relação existente entre Autor e Promovido é, inegavelmente, de consumo.

Assim sendo, é de se reconhecer a hipossuficiencia do Autor, máxime diante da potência que é o conglomerado financeiro ao qual pertence o Promovido.

Infelizmente, o Poder Público tem, desde há muito, negligenciado a saúde pública, assim como todas as demais áreas de obrigação, tudo em prol do pagamento da – impagável – dívida externa e para a elevação do superávit primário – contribuindo, com isso, inclusive, para os altíssimos lucros das instituições financeiras, inclusive a que faz parte o Promovido.

Neste diapasão, tributos criados para o fim de ajudar a saúde acabam sempre caindo na imensa vala para a realização do superávit, quando não é sugado pelos inúmeros tentáculos da corrupção.

À classe média resta, então, apelar para os planos de saúde, no desespero de evitar as terríveis armadilhas do SUS – Sistema Único de Saúde, onde dramas de vida e morte por absoluto descaso são diários e, infelizmente, comuns.

O Autor não foge desta – triste – realidade.

O mínimo, portanto, que tem direito é uma prestação de serviço condigna.

Documentalmente, provou suas alegativas.

Neste diapasão, parece-me extremamente humano deferir seu pleito.

Ademais, a própria alegação do Promovido para negar o pagamento dos STENS, consistente de que estes se constituiriam de próteses, não tem fundamento à doutrina.

De fato, os Tribunais vêm entendendo que STENS não são próteses.

A este respeito, transcrevo a lição do Des. Pedro Luiz Rodrigues Bossle, relator da apelação cível nº 70013671763 que em seu voto consignou o seguinte:

O stent não pode ser considerado como prótese, apesar da utilização do termo endoprótese, pois não há substituição da artéria coronariana. O stent é uma estrutura metálica que mantém as paredes da artéria dilatadas, não se amoldando na definição técnica de prótese.

Referido processo foi assim ementado:

EMENTA: SEGUROS. PLANO DE SAÚDE. REEMBOLSO DE DESPESAS. Reembolso das despesas relacionadas aos procedimentos de hemodinâmicas. Preliminar de não conhecimento do apelo. Acolhimento parcial. Aplicação da Lei n. 9.656/98. Possibilidade no caso concreto. Procedimento de colocação de stent. Cobertura. Reembolso. Preliminar parcialmente acolhida. Apelo parcialmente conhecido e provido.

Este não é, friso, entendimento isolado. De fato, tal posicionamento é fortemente proeminente à jurisprudência.

Por fim, consigno que não há qualquer possibilidade de irreversibilidade do provimento, dado que, se improcedente a demanda, dado que, caso improcedente a final a demanda, sempre poderá o Promovido cobrar o ressarcimento ao Autor.

Em assim sendo, CONCEDO a liminar requestada para determinar ao Promovido que efetue o pagamento, diretamente ao hospital Monte Klinikum S/C Lta., onde foi realizada a cirurgia na pessoa do Autor, no máximo prazo de 48 (quarenta e oito) horas, do valor de R$41.250,00 (quarenta e um mil e duzentos e cinqüenta reais), correspondente a 2 (dois) STENTS da marca TAXUS, implantados no Autor a 19 de fevereiro, quando o mesmo foi submetido a uma angioplastia e cateterismo cardíaco urgente.

Para o remoto caso de descumprimento do preceito, fixo multa diária no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais).

Cite-se e intime-se, pela urgência, o Promovido.

Dê-se, mais, ciência ao Autor.

Fortaleza, 15 de março, 2 006.

Josias Menescal L. de Oliveira

Juiz de Direito

12ª Vara Cível

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