Os filhos e o divórcio

Na guarda compartilhada, pais partilham responsabilidade legal

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4 de abril de 2006, 7h00

Os país são responsáveis pela formação emocional e intelectual de seus filhos do momento do seu nascimento até a sua maioridade, quando não, por vezes, durante a vida toda. Por meio de exemplos e ensinamentos, os pais devem manter uma relação de amizade e carinho entre si tão necessária para o desenvolvimento humano de seus filhos.

Conforme nossa Constituição Federal, nos artigos 5º, 227 e 229, os pais têm direitos e deveres iguais na relação com os filhos:

“Artigo 5º — Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I — homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;

(…)

Artigo 227 — É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

(…)

Artigo 229 — Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.

Estão previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente os direitos dos filhos, bem como os direitos e deveres dos pais:

“Artigo 3º — A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

(…)

Artigo 15 — A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.

(…)

Artigo 21 — O pátrio poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência.

Artigo 22 — Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais”.

(grifos nossos)

O Código Civil brasileiro assegura direitos e deveres relativos ao poder familiar e a guarda dos filhos:

“Artigo 1579 — O divórcio não modifica os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos.

(…)

Artigo 1583 — No caso de dissolução da sociedade ou do vínculo conjugal pela separação judicial por mútuo consentimento ou pelo divórcio direto consensual, observar-se-á o que os cônjuges acordarem sobre a guarda dos filhos.

Enunciado 101 — sem prejuízo dos deveres que compõem a esfera do poder familiar, a expressão “guarda de filhos”, à luz do artigo 1.583, pode compreender tanto a guarda unilateral quanto a compartilhada, em atendimento ao princípio do melhor interesse da criança.)

(…)

Artigo 1.630 — Os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores.

(…)

Artigo 1632 — A separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável não alteram as relações entre pais e filhos senão quanto ao direito, que aos primeiros cabe, de terem em sua companhia os segundos.

(…)

Artigo 1.634 — Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:

I — dirigir-lhes a criação e educação;

II — tê-los em sua companhia e guarda;

III — conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;

IV — nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;

V — representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;

VI — reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;

VII — exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição”.

(grifos nossos)

Dispõe a Declaração Universal dos Direitos da Criança, tratado internacional do qual o Brasil é signatário, que o direito de convivência entre pais e filhos separados e a igualdade na responsabilidade de criação dos filhos pelos pais devem ser respeitados:

“Artigo 9 — A criança tem o direito de viver com um ou ambos os pais exceto quando se considere que isto é incompatível com o interesse maior da criança. A criança que esteja separada de um ou ambos os pais tem o direito a manter relações pessoais e contato direto com ambos os pais.

Artigo 18 — Os pais têm obrigações comuns no que diz respeito à criação dos filhos e o governo deverá prestar assistência apropriada”.

(grifos nossos)

À luz de todos esses dispositivos legais, os pais podem, então, optar, neste momento, pela guarda compartilhada, conforme direito assegurado pelo Código Civil Brasileiro, em seu artigo 1.583, citado acima.

Em conformidade com a nossa legislação e doutrina, a guarda compartilhada pode ser entendida como a guarda jurídica em que ambos os pais exercem o poder familiar e se atribui igualitariamente as prerrogativas dos pais perante seus filhos.

A guarda é indissociável da presença física da criança. Apesar da ruptura do casal e das diferenças pessoais que daí possam decorrer, os pais continuam a exercer, em comum, a autoridade parental, mantendo, assim, o poder familiar, sempre buscando o melhor interesse da criança.

O objetivo da guarda compartilhada é estender aos pais, após a separação, as mesmas prerrogativas na tomada de decisões acerca dos destinos de seus filhos. Deve-se manter a mesma relação pai e filho que havia anteriormente à separação.

Na guarda compartilhada, não interessa quem estará detendo a custódia física dos filhos, mas a efetiva partilha da responsabilidade legal sobre eles, ao mesmo tempo. Assim, ambos são responsáveis pela criação, educação, saúde e lazer dos filhos.

Um dos pais pode deter a guarda física dos filhos, mas ambos, pai e mãe, têm os mesmos direitos e deveres para com eles, mantendo, assim, a mesma relação de direitos e deveres para com os filhos da época em que viviam como casados.

A convivência com ambos os pais é fundamental para a construção da identidade social e subjetiva da criança. A diferença das funções de pai e mãe é importante para a formação dos filhos, pois essas funções são complementares e não implicam na hegemonia de um sobre o outro.

É importante salientar que quando o casamento termina, cessa apenas a relação de conjugalidade, mantendo-se, então, a relação de parentalidade, que vai ser exercida e compartilhada entre pais e filhos, para sempre.

A guarda compartilhada significa, em poucas linhas, que ambos os pais serão responsáveis pela educação dos filhos e que poderão participar da vida dos mesmos, sem um regime de visitas rígido, respeitando, é claro, a privacidade de cada ex-cônjuge.

A guarda compartilhada mantém o status quo da relação do pais para com seus filhos, mesmo depois de separados. Assim entendem nossos Tribunais em julgamentos recentes:

“ALTERAÇÃO DE GUARDA, DE VISITAÇÃO E DE ALIMENTOS — GUARDA COMPARTILHADA — LITÍGIO ENTRE OS PAIS – DESCABIMENTO – 1. Não é a conveniência dos pais que deve orientar a definição da guarda, mas o interesse do filho. 2. A chamada guarda compartilhada não consiste em transformar o filho em objeto, que fica à disposição de cada genitor por um semestre, mas uma forma harmônica ajustada pelos genitores, que permita ao filho desfrutar tanto da companhia paterna como da materna, num regime de visitação bastante amplo e flexível, mas sem que o filho perca seus referenciais de moradia. Para que a guarda compartilhada seja possível e proveitosa para o filho, é imprescindível que exista entre os pais uma relação marcada pela harmonia e pelo respeito, onde não existam disputas nem conflitos. 3. Quando o litígio é uma constante, a guarda compartilhada é descabida. (TJRS – AC 70005760673 – 7ª C.Cív. – Rel. Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves – DOERS 26.03.2003)

SEPARAÇÃO JUDICIAL CONSENSUAL — GUARDA COMPARTILHADA — INTERESSE DOS MENORES — AJUSTE ENTRE O CASAL — POSSIBILIDADE — Não é a conveniência dos pais que deve orientar a definição da guarda, e sim o interesse do menor. A denominada guarda compartilhada não consiste em transformar o filho em objeto à disposição de cada genitor por certo tempo, devendo ser uma forma harmônica ajustada pelos pais, que permita a ele (filho) desfrutar tanto da companhia paterna como da materna, num regime de visitação bastante amplo e flexível, mas sem perder seus referenciais de moradia. Não traz ela (guarda compartilhada) maior prejuízo para os filhos do que a própria separação dos pais. É imprescindível que exista entre eles (pais) uma relação marcada pela harmonia e pelo respeito, na qual não existam disputas nem conflitos. (TJMG – AC 1.0024.03.887697-5/001(1) – 4ª T. – Rel. Des. Hyparco Immesi – DJMG 24.02.2005)”

(grifos nossos)

Deve-se optar pela guarda compartilhada principalmente quando o casal tem uma boa relação entre si e não há conflito em relação à educação dos filhos.

Assim, uma vez adotada a guarda compartilhada, cabe aos pais definir, nesse momento, a custódia física dos filhos e o regime de convivência a ser adotado. Aqui é melhor não usar o termo “visita” e sim adotar o de “convivência”, com regras bem definidas para não suscitar dúvidas futuras.

Cabendo a custódia física dos filhos à um progenitor, caberá ao outro o livre acesso às crianças, conforme regras bem determinadas que, a título de sugestão, podem ser as seguintes:

a. Regime de convivência com cada pai ou mãe em finais de semana alternados;

b. em feriados alternados;

c. No dia do aniversário de uns dos pais, os filhos poderão passar o dia com o aniversariante;

d. Por ocasião do aniversário dos filhos, o dia será dividido em dois períodos, cada um com um de seus pais individualmente;

e. Por ocasião das férias escolares, as mesmas serão divididas em dois períodos, cada um com um de seus pais individualmente;

f. Ambos os pais deverão ser comunicados e as decisões tomadas consensualmente em caso de mudança de colégio ou faculdade, de cidade, viagens, escolha de profissionais médicos, cursos extracurriculares, participação em reuniões de pais nas escolas e demais situações importantes;

g. Caso um dos pais não puder ficar com seus filhos no fim de semana ou feriado determinado, deverá ceder ao outro genitor esse direito;

h. Aquele que não tiver a guarda física poderá ver os filhos todos os dias da semana, de segunda a sexta-feira, desde que combinado previamente e respeitada a privacidade do ex-cônjuge;

i. No caso acima, não havendo concordância entre os pais para a visitação na casa dos filhos, estes poderão sair com seu pai ou mãe, desde que com a ciência do outro e respeitados os horários habituais das crianças.

Aquele que não detiver a guarda física dos filhos será o responsável por uma pensão mensal a ser paga ao ex-cônjuge. Esta pensão deve ser definida de acordo com a possibilidade de cada um dos pais e a necessidade dos filhos. Ambos os pais são os responsáveis, proporcionalmente às suas rendas, ao pagamento das despesas de seus filhos.

É importante esclarecer que não há, na lei brasileira, nada que vede a adoção da guarda compartilhada. Deste modo, este tipo de guarda estará em consonância com a igualdade de direitos e com o respeito à dignidade da pessoa humana, tanto dos pais como de seus filhos, legitimamente garantida pela Constituição Brasileira.

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