Fato cotidiano

Cobrança de dívida já paga não gera dano moral

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7 de setembro de 2005, 15h00

Empresa só pode reclamar indenização por danos morais quando sua imagem é atingida. E isso só acontece quando suas relações comerciais são abaladas, seu crédito é restringido e sua saúde financeira no mercado é comprometida.

Com esse entendimento, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul rejeitou apelação do comércio Café Jacuí e confirmou sentença que negou seu pedido de indenização contra a Schmidt Indústria, Importação e Exportação.

O Café recebeu da empresa seis boletos bancários de cobrança de dívida que já tinha sido quitada. Um das cobranças foi a protesto. Por isso, o Café Jacuí entrou com a ação contra a Schmidt.

A primeira instância entendeu que o Café deveria comprovar o prejuízo e que o dano não ficou configurado, rejeitando o pedido. Isso porque o protesto não chegou a se consumar.

O Café Jacuí apelou ao TJ pedindo R$ 10 mil de indenização com o argumento de que não se tratava de mero incômodo, uma vez que houve apresentação de protesto por dívida já paga. Alegou, ainda, ser inafastável a responsabilidade da empresa pelo dano causado.

Para o relator do caso no Tribunal gaúcho, desembargador Odone Sanguiné, “não se mostra viável acolher pleito indenizatório por afronta à honra da empresa quando se está frente a mero envio de correspondências contendo boletos bancários para pagamento de dívida inexistente”.

A empresa Schmidt foi representada pela advogada Olga Giti Loureiro, do escritório Monteiro, Dotto e Monteiro Advogados Associados. Para o sócio do escritório Pablo Dotto, “este caso é típico daqueles em que não há danos morais, mas sim meros aborrecimentos que fazem parte do cotidiano. A vida em sociedade se tornaria insuportável se não houvesse um mínimo de tolerância”.

Leia a íntegra do acórdão

Apelação Cível. Responsabilidade Civil. Danos Morais. Envio de boletos bancários de cobrança relativos a dívida já paga. Protesto que não chegou a se efetivar. Danos à pessoa jurídica não verificados. É de se rechaçar pleito indenizatório em face de envio de correspondências à pessoa jurídica em função de débito já saldado, vez que o ato perpetrado não teve o condão de arranhar sua honra objetiva. Desprovida de honra subjetiva, não há falar em abalo à intimidade da empresa. Apelação a que se nega provimento. Unânime.

APELAÇÃO CÍVEL: Nº 70012008405

NONA CÂMARA CÍVEL

COMARCA DE CACHOEIRA DO SUL

CAFE JACUI LTDA: APELANTE

SCHMIDT INDURSTRIA, COMERCIO, IMPORTACAO E EXPORTACAO LTDA: APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. LUÍS AUGUSTO COELHO BRAGA (PRESIDENTE E REVISOR) E DESA. ÍRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA.

Porto Alegre, 10 de agosto de 2005.

DES. ODONE SANGUINÉ,

Relator.

RELATÓRIO

DES. ODONE SANGUINÉ (RELATOR)

Trata-se de Apelação Cível interposta por CAFÉ JACUÍ LTDA contra sentença que julgou improcedente pedido formulado em Ação de Indenização por Danos Morais ajuizada pela ora apelante em face de SCHMIDT INDÚSTRIA, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA.

Na espécie, a sentença considerou não se cuidar de causa hábil a ensejar o ressarcimento pleiteado a cobrança equivocada de seis boletos bancários (fls. 19/25), em uma delas tendo havido, inclusive, apresentação a protesto, o qual entretanto, não chegou a se consumar, consoante se dessume da análise dos autos.

Considerou que, no referido caso, deveria a demandante ter comprovado o prejuízo sofrido, vez que a hipótese não se enquadra dentre aquelas nas quais presumidamente resta configurado o dano. Condenou a demandante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios à parte adversa, os quais restaram fixados em R$ 500,00.

Em suas razões (fls. 67/70), repisa a apelante a argumentação de não se tratar de mero incômodo ocasionado, visto que cobrada seis vezes indevidamente no lapso de apenas um mês, consoante prova acostada nas fls. 19/25, sendo que, em uma oportunidade, houve inclusive a apresentação a protesto da dívida já satisfeita. Aduz ser inafastável a responsabilidade da requerida, pois perpetrou ato absolutamente censurável, merecendo reforma a decisão prolatada. Requer o provimento do apelo com a conseqüente fixação do quantum indenizatório em R$ 10.000,00.

Com as contra-razões, subiram os autos.

Distribuídos, vieram conclusos à minha relatoria.

É o relatório.

VOTOS

DES. ODONE SANGUINÉ (RELATOR)

Eminentes Colegas:

Tenho que não deva prosperar a irresignação esgrimida pela recorrente.

No âmbito desta Colenda Câmara, tem-se decidido pela ocorrência de danos morais na situação em que o protesto indevido é levado a efeito, ou mesmo equivocadamente mantido, após o pagamento da dívida. Os danos que ressaem da perpetração da referida conduta revestem-se de caráter in re ipsa, prescindindo de provas, mostrando-se presumidos ante o cometimento do descabido ato.

Todavia, é outro o caso do presente feito.

Compulsando os autos, acuso que o protesto em relação à dita cobrança indevida não chegou a ser deflagrado, tão-somente tendo sido verificada a apresentação, com a respectiva intimação (fl. 23) para que fosse efetuado o pagamento, pena de se concretizar a restrição.

Destarte, não há falar em abalo moral por parte da empresa demandante, visto que o ato perpetrado pela apelada não teve o condão de tornar pública a suposta inadimplência. Neste contexto, tendo em vista que a pessoa jurídica não detém a denominada honra subjetiva, não pode ser atingida em sua intimidade a fim de viabilizar a indenização pleiteada.

O dano moral em relação à pessoa jurídica é verificado quando afetada sua imagem perante a sociedade, restringindo seu crédito, abalando suas relações comerciais, comprometendo sua higidez no mercado. Não se mostra viável acolher pleito indenizatório por afronta à honra da empresa quando se está frente a mero envio de correspondências contendo boletos bancários para pagamento de dívida inexistente. Outrossim, intimação a fim de que se efetive pagamento, pena de restar protestado o respectivo título, não consubstancia a indispensável publicidade para fins de reconhecimento do dano moral que alega a autora ter experimentado. Portanto, vale dizer, do referido envio das missivas não decorreram maiores conseqüências à empresa. O ressarcimento moral, para se afigurar devido, reclama, inarredavelmente, a publicização das informações inverídicas, de modo a atacar, frise-se, a honra objetiva da sociedade mercantil.

Nesse sentido já se manifestou este Egrégio Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. COMPRA E VENDA DE MOBILIÁRIO. CHEQUES SUSTADOS. PESSOA JURÍDICA. NÃO-DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO À HONRA OBJETIVA. Danos Morais. Não-caracterização. A pessoa jurídica é passível de sofrer abalo moral quando atingida sua honra objetiva, consubstanciada esta no bom conceito que mantém na praça (Súmula 227 do STJ), mas não é passível de sofrer desconforto e constrangimento, que são sentimentos ínsitos à honra subjetiva. (…) (Apelação Cível Nº 70008543761, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabianne Breton Baisch, Julgado em 06/07/2005)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Reputa-se dano moral o ataque ao nome ou imagem da pessoa jurídica, quando o comportamento de alguém ofender a honra objetiva a ponto de interferir na credibilidade social, o que inocorreu no caso. (…) (Apelação Cível Nº 70011754306, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Maria Rodrigues de Freitas Iserhard, Julgado em 08/06/2005)

APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. PESSOA JURÍDICA. HONRA OBJETIVA. PROVA DO DANO. PRECLUSÃO. Tratando-se de dano moral à pessoa jurídica, mister a comprovação do dano efetivamente suportado, por se tratar de ofensa à honra objetiva, descabendo a presunção de dano moral puro inerente à pessoa física. (…) (Apelação Cível Nº 70009165309, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Vinícius Amaro da Silveira, Julgado em 25/11/2004)

Nestes lindes, andou bem a douta magistrada a quo ao repelir a pretensão veiculada.

Destarte, ante as alegações expendidas, voto no sentido de negar provimento ao recurso manejado por CAFÉ JACUÍ LTDA.

DES. LUÍS AUGUSTO COELHO BRAGA (PRESIDENTE E REVISOR) — De acordo.

DESA. ÍRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA — De acordo.

DES. LUÍS AUGUSTO COELHO BRAGA — Presidente — Apelação Cível nº 70012008405, Comarca de Cachoeira do Sul: “À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO APELO.”

Julgador(a) de 1º Grau: TRAUDELI IUNG

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