MP do mal

Ajufesp critica emenda à Medida Provisória 252

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10 de outubro de 2005, 15h03

A proposta de emenda ao artigo 17 da Medida provisória 252, conhecida como MP do Bem quer “retardar o trabalho da Justiça Federal e mais ainda dos Juizados Especiais”. A opinião é da Ajufesp — Associação dos Juízes Federais do Estado de São Paulo e Mato Grosso do Sul em nota divulgada nesta segunda-feira (10/10).

Para a associação, a modificação “promove a irresponsabilidade de governantes, tornando mais demorado o pagamento de débitos do Governo, principalmente na área previdenciária”.

“Isso já se faz há muito tempo no Brasil, em outros setores. O sistema de pagamento de dívidas conhecido como ‘precatório’, lamentavelmente, tem sido empregado para ‘empurrar’ dívidas de um governo para o outro. A culpa acaba sendo assumida pela Justiça, que nada pode fazer, mas o verdadeiro caloteiro é o governo”.

Na nota, a Ajufesp afirma que “o mais cruel dessa história é que o governo (supostamente dos trabalhadores) estaria atingindo, com essa medida ‘do mal’ precisamente os credores carentes, na maioria beneficiários que têm contas a acertar com a previdência social”.

“A outra ponta da crueldade é que seria fácil jogar a culpa no Judiciário (afinal, a Justiça é mesmo demorada) e assim, o governo também evitaria os ônus políticos da medida impopular”, afirma a associação.

Leia a íntegra da nota

A MP n. 252, intitulada “do bem”, tem o seu lado escuro, oblíquo e enganador, em emenda proposta pelo Ministério da Fazenda (emenda essa ao artigo 17 da Medida Provisória).

Basicamente, a modificação visa a retardar o trabalho da Justiça Federal – mais especificamente o dos Juizados Especiais Federais – e promover a irresponsabilidade de governantes, tornando mais demorado o pagamento de débitos do Governo, principalmente na área previdenciária.

Isso já se faz há muito tempo no Brasil, em outros setores. O sistema de pagamento de dívidas conhecido como “precatório”, lamentavelmente, tem sido empregado para “empurrar” dívidas de um governo para o outro. A culpa acaba sendo assumida pela Justiça, que nada pode fazer, mas o verdadeiro caloteiro é o governo.

O tal sistema, dizendo de modo simplificado, opera assim: toda vez que o Estado é condenado, o juiz deve solicitar o pagamento por via de um ofício.

Todos os ofícios expedidos são reunidos pelo presidente do Tribunal, que envia uma única requisição, em julho, para o governo. Este teria a obrigação de incluir, no orçamento do ano seguinte, verba suficiente para pagar os débitos judiciais. Só que, se ele não o fizer, nada acontece. Não existe nenhuma medida jurídica eficaz para obrigá-lo. Às vezes, um ou outro jurista sugere alguma. Mas não se encontrou ainda uma que funcionasse, na prática.

Desse modo, é negócio para o governo “subfaturar” a verba orçamentária para pagamento de precatórios. A dívida torna-se eterna e, na pior das hipóteses, cairá no colo do sucessor. De vez em quando, o Congresso aprova uma emenda constitucional permitindo o parcelamento dos atrasados, em condições bem generosas. Obviamente que a satisfação dessa “farra caloteira” não é partilhada pelos credores do Estado.

E o que isso tem a ver com a “MP do bem” (do bem?)? O Ministério da Fazenda queria envolver os Juizados Especiais Federais, que são mais rápidos na cobrança, no mesmo esquema. Eles cobram as dívidas, depois que há condenação do Estado (por exemplo, um atrasado devido pela Previdência para o segurado) em sessenta dias. Em comparação com o mínimo de dois anos da Justiça comum, é bem melhor. Mas a diferença não para por aí. Se o devedor (o governo) não depositar, o juiz manda sequestrar a verba necessária (nas contas bancárias). É por isso que o desempenho dos Juizados tem sido bem superior. Não tem choro, não tem parcelamento, tem de pagar e pronto. O credor aplaude, mas o Governo não gosta.

A reação do Ministério foi inserir, em uma Medida Provisória que tratava de outros assuntos, um artigo que acabava com essa velocidade. Ficaria assim: os Juizados continuariam recebendo, na medida em que houvesse disponibilidade prevista no orçamento. Quando ela se esgotasse, a previsão (e o pagamento) seria adiado para o ano seguinte. Então, seria simples burlar os juizados: bastaria que, a cada ano, os recursos fossem “subfaturados”, quer dizer, limitados para garantir o calote oficial.

O mais cruel dessa história é que o governo (supostamente dos trabalhadores) estaria atingindo, com essa medida “do mal” precisamente os credores carentes, na maioria beneficiários que têm contas a acertar com a previdência social. São vítimas fáceis, porque desprotegidas e sem grande voz política.

A outra ponta da crueldade é que seria fácil jogar a culpa no Judiciário (afinal, a Justiça é mesmo demorada) e assim, o governo também evitaria os ônus políticos da medida impopular.

E, em terceiro lugar, o governo tentou passar a perna no Congresso Nacional, que estava para a aprovar a emenda, posta em “letras miúdas” em uma Medida Provisória que misturava vários assuntos.

AJUFESP

São Paulo, 10 de outubro de 2005.

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