Vínculo aparente

Justiça reconhece vinculo empregatício de sócia de cooperativa

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29 de novembro de 2005, 16h24

Contratar mão de obra através de cooperativas na tentativa de descaracterizar vínculo empregatício é fraude. O artifício deve ser considerado ilegal e tanto a empresa quanto a cooperativa são devedoras das obrigações trabalhistas correspondentes. O entendimento é do juiz Grijalbo Fernandes Coutinho, da 19ª Vara do trabalho de Brasília.

Mariana Cardoso de Jesus alegou que foi contratada como cobradora pela Cooperativa dos Profissionais de Crédito e Cobrança para trabalhar na empresa de cobrança Operator Serviços. Afirmou que houve fraude no contrato de trabalho porque jamais foi cooperada mas empregada da própria cooperativa. Por isso, quer receber os direitos devidos da relação de trabalho como aviso prévio, diferenças salariais, férias integrais e proporcionais, 13°s salários, FGTS, horas extras, salário família e seguro desemprego.

A empregada também pediu que fosse anulada a sua condição de cooperada, nos termos do artigo 9º, da CLT porque jamais exerceu essa função, já que, segundo a falsa cooperada, seria uma falsa cooperativa que atua como uma falsa empresa fornecedora de mão-de-obra.

A cooperativa alegou que a empregada não tinha vínculos empregatícios, já que era cooperada. A empresa de cobrança assegurou que manteve vínculo direto com a empregada apenas a partir de janeiro de 2004. No período anterior, a prestação de serviços se deu por intermédio da cooperativa, o que afasta a possibilidade do reconhecimento da relação de emprego.

A empregada trabalhou para a cooperativa entre janeiro de 2002 e dezembro de 2003. A partir de 2004 até 2005 teve contrato de trabalho firmado com a real empregadora, a empresa de cobrança.

Nenhuma condenação deve abarcar o período em que esteve corretamente contratada pela empresa de cobrança, na opinião do juiz. Mas ele entendeu que as duas empresas devem responder pelo período em que a trabalhadora estava prestando serviços para a cooperativa e pelos danos causados à empregada.

Para o juiz a atitude dos empregadores ofendem os princípios da dignidade humana (artigo 1º, inciso III, da Constituição) ; o princípio fundamental do valor social do trabalho(artigo 1º, inciso IV da CF); o princípio da primazia da realidade(inerente ao Direito do Trabalho e consagrado na CLT, artigo 442); o princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas(inerente ao Direito do Trabalho) entre outros. Ao colocar a empregada como cooperada, as empresas cometeram um ato fraudulento para não arcar com os direitos empregatícios que prevê a CLT.

Grijalbo declarou nulo o contrato de cooperada e reconheceu o vínculo de emprego da trabalhadora com a cooperativa, até o dia 31 de dezembro de 2003, quando foi dispensada sem justa causa. Assim, a empregada deve receber aviso prévio indenizado, além de todos os direitos que pressupõe o vínculo empregatício. A empresa de cobrança, no entendimento do juiz, na qualidade de tomadora dos serviços prestados pela empregada, é responsável subsidiária pelo cumprimento das obrigações assumidas pela cooperativa, como prevê o enunciado 331, do Tribunal Superior do Trabalho.

Leia a ata de audiência:

ATA DE AUDIÊNCIA

PROCESSO : 00640-2005-019-10-00-2

RECLAMANTE: MARIANA CARDOSO DE JESUS

RECLAMADA : COOPERATIVA DOS PROFISSIONAIS DE CRÉDITO E COBRANÇA ADM. DE COBRANÇA E TLMK OPERATOR SERVS. E SISTEMAS DE COBRANÇA LTDA

Aos vinte e nove dias do mês de agosto do ano de 2005, perante a Eg. 19 VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA-DF, sob a direção do MM. Juiz do Trabalho Titular GRIJALBO FERNANDES COUTINHO, realizou-se a audiência relativa ao processo identificado em epígrafe.

A audiência teve início às 17h59, momento em que foram apregoadas as partes.


Presentes os que assinam esta ata.

SENTENÇA

I – RELATÓRIO

MARIANA CARDOSO DE JESUS ajuizou ação trabalhista em desfavor da CCCOOP- COOPERATIVA DE TRABALHO DE PROFISSIONAIS E COBRANÇA, e da empresa OPERATOR -SERVIÇOS E SISTEMAS DE COBRANÇA LTDA ,alegando, em síntese, que foi contratada pela primeira reclamada, na função de cobradora, para trabalhar para a segunda reclamada, empresa que teria se beneficiado da prestação de serviços, apontada pela autora como responsável subsidiária pelo adimplemento das parcelas deduzidas na petição inicial(tomadora de serviços).Em síntese, aduz a reclamante que houve uma fraude ao contrato de trabalho, vez que jamais foi cooperada, mas empregada da primeira reclamada,responsável pela criação do artíficio antes mencionado. Tem a reclamante a pretensão de receber, na qualidade de empregada lesada durante todo o período em que prestou serviços,parcelas referentes ao aviso prévio indenizado, integração das comissões, diferenças salariais, férias integrais e proporcionais, acrescidas do abono de 1/3/ 13sº salários, FGTS e multa de 40%, RSR, comissões, horas extras, salário família, multa rescisória do artigo 477, §8º,da CLT, seguro desemprego,além da concessão dos benefícios da justiça gratuita e da aplicação da multa do artigo 467, da CLT tudo nos termos da peça de fls 02/05, que veio acompanhada dos documentos de fls 06/08..

À causa foi atribuído o valor de R$ 35.500,00.

À audiência de conciliação e julgamento, compareceram as duas reclamadas, CCCOP e OPERATOR (fls 15/16), quando apresentaram defesas,escrita e oral, respectivamente. A primeira demandada (CCCOP) sustenta a tese da inexistência do vínculo empregatício,amparada na alegação de que a autora era sua cooperada, sendo esta a condição da prestação de serviços .Impugnando os pedidos, protestou pela improcedência da reclamatória (fls 17/33).Juntou documentos (fls 34/185). A segunda reclamada (OPERATOR ) assegura que manteve vínculo direto com a reclamante apenas a partir de janeiro de 2004. No período anterior, a prestação de serviços se deu por intermédio da primeira reclamada, com quem manteve contrato civil, o que afasta a possibilidade do reconhecimento da relação de emprego.Contesta alguns pleitos e requer a improcedência da reclamatória (fls 15/16).Documentos às fls 187/196.

Réplica da autora às fls 198/199

Na audiência em prosseguimento, colhidos depoimentos pessoais , produzida a prova testermunhal (fls 205/211) e após vista concedida à reclamada de atas de audiência exibidas pela parte contrária (fls 213/239 e 244/245 ), a instrução processual foi encerrada (fl 246 ).

Razões finais orais.

Infrutíferas as tentativas conciliatórias.

Resumidamente, é o relatório.

II – FUNDAMENTOS

1- RELAÇÃO DE EMPREGO – REQUISITOS – PROVA – COOPERATIVA DE TRABALHO – POSSIBILIDADE DE RECRUTAMENTO DE MÃO-DE-OBRA – EFEITOS – RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA

1.1 – DO VÍNCULO DE EMPREGO COM BASE NA PROVA PRODUZIDA NOS AUTOS – REQUISITOS DO CONTRATO DE TRABALHO – CONTRATO DE 27.01.2002 A 31.12.2003

A reclamante alega que foi admitida em 27 de janeiro de 2002, na função de cobradora, tendo sido dispensada, injustamente, em 31 de dezembro de 2003. Acentua que foi contratada pela primeira reclamada (CCCOP) para trabalhar nas dependências da segunda (OPERATOR ), razão pela qual requer o reconhecimento do vínculo de emprego com a cooperativa e a decretação da responsabilidade subsidiária da empresa tomadora de serviços, muito embora postule a decretação da nulidade do ato de cooperada, nos termos do artigo 9º, da CLT. A pretensão, nos termos ora propostos, está expressa na inicial e na réplica de fls 198/199.

No entanto, a autora faz uma grande confusão na sua peça de ingresso.Quer o reconhecimento do vínculo empregatício com a cooperativa de trabalho até o ano de 2003, mas postula, depois, “reconhecimento do vínculo empregatício no período de 27/01/2002 a 31/01/2005” (fl 04).


É incontroverso, nos autos, o fato de que a reclamante, a partir de janeiro de 2004, passou a ser empregada da segunda reclamada, com o registro do contrato em CTPS. A cooperativa desapareceu da relação a partir desta data.

Não constrói a reclamante uma explicação lógica capaz de justificar posicionamento tão contraditório, criando algumas dificuldades para a análise de seus pedidos, dada a contradição existente entre a causa petendi e a postulação.

Não estamos tratando da hipótese de um único contrato de trabalho, matéria que poderia ter sido deduzida sob o fundamento de que a cooperativa funcionou apenas como uma intermediária na contratação da mão-de-obra.

Em resumo, a reclamante lançou pedidos com referência a um único contrato (até 2005), muito embora tenha indicado que manteve com a primeira reclamada relação de emprego até o ano de 2003.

É que no segundo período, de 2004 a 2005, apenas a segunda reclamada participa da relação, como real empregadora.

Excluindo, no entanto, o pleito do item 1 (04), que devo receber como lamentável equívoco, verifico que as demais reivindicações estão vinculadas apenas ao período compreendido entre 27 de janeiro de 2002 a 31 de dezembro de 2003.

Apesar da menção feita pelas reclamadas, o litígio em debate está restrito ao lapso temporal descrito no parágrafo anterior.

Não há discussão quanto ao contrato formalizado entre a reclamante e a segunda reclamada.

Nenhuma condenação, eventualmente imposta às reclamadas, abrangerá o contrato de trabalho de 2004 a 2005.

A primeira reclamada, CCCOP – COOPERATIVA DE TRABALHO DE PROFISSIONAIS DE CRÉDITO E COBRANÇA -, vale-se da sua condição de cooperativa de trabalho para negar a existência do contrato de trabalho. Sustenta, ainda, que não manteve qualquer vínculo empregatício com a reclamante, tendo a obreira prestado serviços para a segunda reclamada de maneira absolutamente autônoma. Indica a sua condição de sociedade cooperativa de trabalhadores , regida pela Lei Nº 5.764/71, bem como a observância, de forma rigorosa, das exigências ali contidas.Finalmente, admite que a autora prestou serviços na “qualidade de sócia-cooperada no projeto do tomador Operator: de 25 de janeiro de 2002 a dezembro de 2003 “e destaca a redação do parágrafo único, do artigo 442, da CLT, como fator a inibir a pretensão veiculada na exordial.

A segunda reclamada, quanto ao período em análise, afirma que a autora lhe prestou serviços por intermédio da primeira reclamada (cooperativa de trabalho), sem a presença dos requisitos próprios dos contrato de emprego.

Ao admitir que houve prestação de serviços, pela autora, de forma pessoal, sob a modalidade do trabalho autônomo (cooperativo), atividades desenvolvidas para a consecução do objetivo central da segunda reclamada, a cooperativa de trabalho, primeira reclamada, atrai para si o ônus probandi deste fato, vez que presumível, em tais circunstâncias, a existência do contrato de trabalho stricto sensu, com a presença da subordinação jurídica e dos demais requisitos prescritos nos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT, artigos 769 e 818; CPC, artigo 333, II). Idêntico tratamento processual deve ser dispensado à segunda reclamada (empresa que recebeu a mão-de-obra).

Com o objetivo de corroborar as suas assertivas, a primeira reclamada trouxe aos autos a prova documental de fls 34/186, resumida na Ata de Assembléia de sua fundação (fls 34/39);na Ata de Assembléia Geral Ordinária de 27 de março de 2004 (fls 40/49); no seu Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (fl 51); no seu Estatuto Social (fls 53/75); no Contrato de Prestação de Serviços firmado com a segunda reclamada(fls 113/119) .

Ainda vieram aos autos os seguintes documentos : 1- Ficha de Matrícula – Termo de Adesão assinado pelo reclamante ; 2- Relação dos Trabalhadores e pagamentos efetuados; 3- Protocolo de Envio de Arquivos ; 4- Ata de Assembléia Geral da Cooperativa ; 5- Estatuto Social da Cooperativa; – Ata de Constituição da Cooperativa e Identificação da Diretoria fl; Folhas de Remuneração dos Cooperados e comprovantes dos pagamentos efetuados à reclamante; Relação de Trabalhadores Inscritos no INSS e GPS


Ao emitir pronunciamento sobre a defesa e documentos que a acompanharam, a autora reafirmou a tese da inicial, acentuando que jamais foi cooperada, inclusive porque a primeira reclamada não é uma cooperativa de verdade, mas uma irregular empresa fornecedora de mão-de-obra.

É indiscutível que o debate, no caso concreto dos autos, está concentrado na existência ou não de subordinação jurídica na relação que foi mantida entre as partes, capaz de configurar o vínculo de emprego ou afastá-lo, caso não esteja presente o requisito em questão.

E assim o é porque os demais pressupostos que dão ao trabalhador a condição de empregado (CLT, artigo, 3º), quais sejam, a pessoalidade na prestação laboral (todo o trabalho envolveu a prestação pessoal de serviços pela reclamante); a não eventualidade (trabalho realizado de forma contínua de 2003 a 2204) e o pagamento de salário(ainda que esta denominação esteja restrita à forma de retribuição dos empregados, houve pagamento pelos serviços prestados durante todo o período, podendo vir a ser salário ou não, o que dependerá dos outros elementos caracterizadores do vínculo de emprego), surgem nos autos à vontade e com toda evidência.

Há nos autos, realmente, um termo de adesão (ficha de matrícula) assinado pela reclamante, com a expressão referência à sua qualidade de cooperada , como também foi colacionado o contrato de cessão de mão-de-obra firmado pelas duas reclamadas, além do Estatuto da primeira.

1. 2 – DO PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE

Desde logo, consigno que não é definitivo para o enfrentamento da controvérsia a mera anotação de uma suposta relação autônoma no contrato de prestação de serviços. No Direito do Trabalho, mais do que em qualquer outro ramo do ordenamento jurídico, vigora o princípio da primazia da realidade, pouco importando o nome jurídico ou a qualificação formal atribuída a determinado documento quando, na verdade, os fatos reais desafiarem ou estiverem a colocar em xeque as artificiosas formalidades. Examinando, assim, a prova documental carreada aos autos, tenho que a reclamada não conseguiu se desincumbir do encargo processual que lhe fora atribuído anteriormente, eis que inexiste a demonstração inequívoca da ausência de subordinação jurídica ou da denominada dependência hierárquica.

Ao prestar depoimento pessoal, a reclamante ratificou a totalidade do contexto narrado na peça de ingresso, sem que fosse alcançada a confissão relativa à ausência do vínculo de emprego (fl 205).

A preposta da segunda reclamada , por seu turno, admitiu que a reclamante, na qualidade de cobradora, sempre trabalhou realizando os mesmos serviços e nas mesmas condições de trabalho, inclusive no período anterior à contratação como empregada, ou seja, quando esteve cedida pela primeira reclamada (cooperativa). A única diferença residia na forma da cessão da mão-de-obra (fls 206/207).

As duas testemunha trazidas pela reclamante, de forma uníssona, confirmaram que não havia nenhuma relação de trabalho ligada ao verdadeiro cooperativismo. Existia tão somente um contrato, entre as reclamadas, do oferecimento de mão-de-obra com preço bem menor e sem direitos trabalhistas (fls 207/209).

Quanto aos outros depoimentos prestados, assinalo que não vislumbrei nenhuma segurança nas declarações prestadas pelas testemunhas indicadas pela primeira reclamada, especialmente no que se refere ao afirmado pelo Sr. Leonardo Lima Mourão (fls 209/210 ), cujo estado de ânimo não era dos mais agradáveis (respondia às perguntas de forma desinteressada, desviava o olhar o tempo todo, estava inseguro e não parava de bocejar ). Um depoimento que não merece a menor credibilidade.Veio cumprir uma obrigação, mas não teve nenhum talento para desempenhar o papel que lhe fora destinado A segunda testemunha, Jairo de Almeida Sousa, profissional comprometido com a primeira reclamada, é um dos seus gestores, agiu como verdadeiro representante da cooperativa.


Não me resta nenhuma dúvida de que houve maior firmeza, simplicidade, e sinceridade nas palavras das testemunhas arroladas pela autora. Ainda que fosse diferente a minha conclusão, não existiria elemento para reconhecer a autonomia na relação jurídica mantida entre as partes.

Mas essa não é a única, nem a mais importante questão definidora da controvérsia em debate.

Da leitura do contrato social da primeira reclamada, é possível extrair, sem um esforço maior, que o fornecimento de mão-de-obra a terceiros é a sua razão de ser, a sua finalidade precípua, cujos interesses ali postos não coincidem ,necessariamente, com os anseios dos trabalhadores que, frente ao desemprego contínuo e ao quadro de miséria reinante no país, aceitam as mais adversas condições de trabalho.

O Juiz do Trabalho Jorge Vieira, profundo conhecedor das formas mais cruéis de exploração do trabalho humano no Sul do Pará, responsável pela condenação sistemática de escravocratas “modernos”, em recente debate na Câmara dos Deputados, descreveu o desespero do povo sofredor deste imenso Brasil com a chaga do desemprego estrutural, que o leva a se submeter a todo tipo de humilhação quando está buscando trabalho para o sustento da família, a ponto de, na sua definição, “enfrentar até fila para se inscrever numa disputa por vaga em trabalho escravo”.

Será que ao dar o seu “consentimento”, o trabalhador está sujeito a isso?

É evidente que não. O Estado existe, dentre outras razões, para não tolerar o intolerável, para dar aos cidadãos dignidade e respeito, para cumprir e fazer cumprir os mandamentos constitucionais e para não permitir que a desigualdade real entre as partes não seja reproduzida nas demais relações sociais.

O Direito do Trabalho, dentro deste contexto, surgiu para minimizar a força do capital frente ao trabalho, reconhecendo o Estado que a liberdade absoluta da contratação, por parte do poder econômico, não é verdadeiramente uma liberdade, ou como dizia Lacordaire, “ entre o forte e o fraco, entre o rico e o pobre, é a liberdade que escraviza, é a lei que liberta”.

Estão consagrados como princípios do Direito do Trabalho o da proteção do hipossuficiente para compensar a desigualdade formal; o do in dubio pro operario; o da norma mais favorável quando houver conflito entre normas distintas; o da condição mais benéfica.; o da irrenunciabilidade de direitos; o da continuidade; o da igualdade de tratamento e o da primazia da realidade, exaustivamente avaliados pelo jus laboralista Luiz de Pinho de Pedreira da Silva, em clássico da literatura trabalhista brasileira (in, Principiologia do Direito do Trabalho, Editora LTr, 2ª Edição, 1999, São Paulo-SP).

Será que é possível existir uma cooperativa de trabalho voltada exclusivamente para fornecer mão-de-obra aos empreendimentos empresariais (principalmente para a atividade-fim), como solução para a redução dos custos da produção?

Não tenho nenhuma dúvida da absoluta ilegalidade da situação, violadora dos mais elementares princípios do Direito do Trabalho. Nem mesmo os entusiastas de um novo direito do trabalho, desregulamentado e propício às regras do mercado, podem desprezar a frágil rede de proteção ainda existente no ordenamento jurídico vigente.

Como dito antes, o princípio da primazia da realidade, de uma só vez, aniquila todo o conjunto da prova documental carreada aos autos pelas duas primeiras reclamadas. Uma cooperativa criada para vender ou dar mão-de-obra a grupos econômicos, cujo propósito reside apenas, de maneira escancarada, na diminuição dos custos da empresa e no aumento da margem de lucros, causando gravíssimos prejuízos sociais aos trabalhadores, não é cooperativa de verdade. Aliás, o objetivo central está na fuga ao cumprimento da velha Consolidação das Leis do Trabalho.

E assim o é porque a cooperativa é formada a partir da reunião (união) de homens e mulheres com objetivos e necessidades comuns, envolvidos no mesmo processo, por eles controlado de maneira democrática, sem patrão e sem finalidade lucrativa, cuja prestação laboral não pode ser objeto de exploração econômica por qualquer pessoa, como também é incompatível com a figura do intermediário. É o que acontece com as verdadeiras cooperativas de produção, onde predomina o regime de autogestão pelos próprios trabalhadores.


Com extrema precisão o Professor, o Jurista afinado com o seu tempo, e Juiz Jorge Luiz Souto Maior, define as cooperativas de produção: “As cooperativas de produção (nas quais se poderia agasalhar a “cooperativa de trabalho”), agasalhadas pelo nosso sistema jurídico, pressupõem que os instrumentos da produção estejam na posse dos cooperados, além da total disponibilidade quanto ao produto do seu trabalho. Ou seja, várias pessoas podem unir esforços para, com o trabalho conjunto e sem fins lucrativos, suprir a necessidade que lhes era comum (construção de moradias, por exemplo). O trabalho e o resultado desse trabalho executados são usufruídos pelos cooperados e não por terceiros. Não há, por assim dizer, a comercialização desse trabalho, pois do contrário estar-se ia diante de uma sociedade comercial como qualquer outra, não de uma cooperativa. Neste sentido, “cooperativas de trabalho em que o resultado do trabalho é utilizado por terceiro(construção de casas para uma construtora, colheita de laranjas para citricultores, colheita de lixo para um Município e prestação de serviços médicos para empresas de saúde ou um Município, por exemplo) não são propriamente cooperativas” (in, O Direito do Trabalho como Instrumento de Justiça Social – Editora Ltr, 2000, 1ª Edição, Página 323, São Paulo-SP).

Prossegue o Magistrado e Professor da USP, numa das melhores obras opinativas da atualidade de Direito do Trabalho, realçando os efeitos perversos do falso cooperativismo, opinião que compartilho integralmente, ao acentuar “que não é com a prestação de trabalho, mediante o sistema de cooperativas, sem a formação de vínculo empregatício, que os trabalhadores irão alcançar melhores condições de vida, até porque, nesse sistema desvirtuado, os trabalhadores não deixam de ser meros prestadores de serviços, não participam da atividade econômica e não usufruem, portanto, livremente, do produto de seu trabalho. Apenas recebem uma contraprestação pecuniária pelo serviço prestado, como ocorre no sistema trabalhista, com o evidente prejuízo de não terem sua integridade física e mental protegida pelas regras pertinentes à segurança e higiene no trabalho, além de tal situação exercer influência negativa no custeio das garantias sociais, apesar das regras contidas na Lei Complementar. A verdade das cooperativas de trabalho é que, com freqüência cada vez maior, essas ‘cooperativas’ reúnem no topo pessoas ligadas ao meio empresarial e, na base, operários ou lavradores que mal sabem rabiscar o nome, não têm a menor idéia do que significa ser cooperado e recebem apenas o salário do dia efetivamente laborado – sem férias, repousos e qualquer outra proteção”.

De forma mais moderada, o talentoso jovem Procurador do Trabalho do Rio de Janeiro, Rodrigo de Lacerda Carelli, em magnífico estudo sobre as cooperativas de trabalho, afirma que há, sim , cooperativa de verdade, “Desde que não realize fornecimento de trabalhadores para outra empresa, e que constitua uma unidade de produção, cuja organização será realizada conjuntamente pelos trabalhadores por meio de cooperativa. É justamente o caso das famosas e multicitadas espécies de cooperativismo de trabalho legal, como a de médicos, a de taxistas e de artesãos, bem como aquelas autogestionárias. Nesses casos, não há intermediação de mão-de-obra, não há fornecimento de trabalhadores, e sim união de esforços (cooperativismo) para a prestação de serviços por parte da cooperativa para a obtenção de um objetivo comum dos associados, qual seja a melhoria das condições econômicas por intermédio da melhor organização da sociedade cooperativa. É o velho ditado: “se separados não somos ninguém, juntos poderemos ser alguém”. O caso da UNIMED. São médicos trabalhando autonomamente, e utilizando os serviços da cooperativa para angariação de clientes em forma de plano assistencial. Não há intermediação de mão-de-obra, não há relação empregatícia, e sim cooperativismo. Note-se que esses médicos podem atéser empregados de algum hospital, o que não impede a sua relação jurídica com a cooperativa” (in, Cooperativas de Mão-de-Obra – Manual contra a fraude , Editora LTr, Ano 2002, 1ª Edição, São Paulo-SP, Página 47).

Definitivamente, a prova documental dos autos é frágil e não resiste ao menor sopro de realidade. O mestre Plá Rodriguez, citado pelo jurista Pinho Pedreira, numa simples e objetiva exemplificação do princípio antes destacado, declara o seguinte: “significa que em caso de discordância entre o que ocorre na prática e o que surge dos documentos e acordos deve se dar preferência ao primeiro, isto é, ao que sucede no terreno dos fatos” (obra citada de Pinho Pedreira, Página 205).


Assim é o Direito do Trabalho, pronto, a partir dos seus princípios, da sua gênese, dos seus fundamentos históricos,constitucionais e legais, e da ação dos seus operadores, para reagir contra toda e qualquer operação destinada ao seu descumprimento, por mais inventivos que sejam os autores da obra. Se algum dia for esse o caminho adotado pelo Parlamento brasileiro, de desconstrução do Direito do Trabalho, até mesmo o constituinte originário não terá carta branca para destruir as bases sobre as quais se assentam a matéria. Em termos de direitos sociais, direitos humanos que são por excelência, é inadmissível qualquer retrocesso,conforme pontuam, dentre outros respeitáveis juristas, J.J. Canotilho, Fábio Konder Comparato e José Celso de Melo.

1.3- DO PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE DOS DIREITOS TRABALHISTAS

Se não fosse suficiente o desmoronamento da situação artificial criada pela duas primeiras reclamadas, que não se sustenta quando observamos o princípio da primazia realidade, a natural indisponibilidade dos direitos trabalhistas está a militar contra a pretensão empresarial. Estamos tratando de normas de ordem pública, cogentes, portanto, que não podem ser derrogadas pela simples assinatura de um documento submetido como condição essencial para que a autora pudesse trabalhar. O vício do ato é evidente, atentatório contra o princípio da irrenunciabilidade de direitos.

É verdade que mudanças profundas têm ocorrido no mundo do trabalho, com intensa desregulamentação e precarização das relações de trabalho, lamentáveis quando postas sob a cruel perspectiva da redução de direitos trabalhistas.

Por outro lado, a normatividade vigente, constitucional e legal, como já assinalado, ainda é capaz de manter alguns dos paradigmas clássicos da relação de emprego intactos, que nem a intenção mais bem articulada dos arautos desses novos tempos da empresa sem empregados pode extirpá-los do ordenamento jurídico pátrio, cabendo ao juiz, no exame do caso concreto que lhe é submetido, dar-lhes aplicação.

1-.4 – DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DO VALOR SOCIAL DO TRABALHO

Ainda que não tenha sido a Carta Política dos sonhos de alguns setores excluídos da sociedade nacional , a cidadania brasileira passou a contar, a partir de 05 de outubro de 1988, sem nenhuma dúvida, com valiosos instrumentos a serviço de uma maior democracia nas relações entre o capital e o trabalho. A expressão mais significativa está na constitucionalização de inúmeros direitos sociais, alguns absolutamente novos, conferidos aos trabalhadores deste imenso País.

Outros direitos, nem sempre tão visíveis, do mesmo modo, compõem o conjunto de garantias de uma nação que pretende ser verdadeiramente democrática. E antes dos direitos em sentido estrito, encontram se os Princípios Fundamentais da República Federativa do Brasil (artigo 1º), estando ali o da dignidade da pessoa humana e o do valor social do trabalho.

Pois bem. Estou convencido que não há norma constitucional meramente programática, de conteúdo vazio, sobretudo quando se trata de Princípio Fundamental. Ao poder público compete fazer cumprir os mandamentos expressos na Constituição Federal.Na análise do caso concreto que lhe é submetido, o juiz deve velar pela aplicação de tais regras como expressão do êxtase da soberania nacional, antes mesmo da subsunção de outras normas jurídicas inferiores.

Para Aurélio, Dignidade é o que confere ao indivíduo “respeitabilidade, autoridade, honestidade, decência, decoro, amor próprio e honra”, dentre outros atributos nobres inerentes a qualquer ser humano.

O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana é notoriamente incompatível com qualquer atitude que reduza o trabalhador a um mero vendedor da mão de obra, sem amor próprio e sem a capacidade de conduzir o seu próprio destino. É por essa razão que ao desrespeitar a reclamante, tratando-a sob uma condição de despossúída em grau mais elevado do que qualquer empregado de sua categoria, como se não fizesse jus ao mais elementar direito trabalhista, fazendo desaparecer algo que o dinheiro, nem mesmo o mais ousado cartão crédito compra — a dignidade — , o empregador viola preceito constitucional.


E assim o é porque o trabalho, seja qual for o ofício profissional, do carpinteiro, do gari, do operário, do advogado, do magistrado, do pedreiro, do jardineiro e de tantos outros valorosos trabalhadores, detém uma extraordinária diferença em relação aos insumos da produção capitalista.

O dinheiro pode trocar as máquinas, os computadores, impulsionar a revolução cibernética desprezar fatores antes considerados relevantes e descartar um monte de outras coisas. Não deve, porém, ter a ousadia de tentar colocar no mesmo liquidificador o valor trabalho.

O protagonista do trabalho humano é o homem, sendo este fato suficiente para lançar, em primeiro plano, à proteção de sua dignidade.Assim procedeu o constituinte de 1988, quando, ao lado da dignidade da pessoa humana, considerou como Princípio Fundamental o do valor social do trabalho.

Com a atitude, a empregadora descumpriu os Princípios Fundamentais da Dignidade da Pessoa Humana e do Valor Social do Trabalho (CF, artigo 1º, incisos III e IV).

1.5 – DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 442, DA CLT E DO ARTIGO 9º – PRINCÍPIOS E DISPOSITIVOS DESRESPEITADOS

A inclusão do parágrafo único no artigo 442, da CLT, ainda que de uma extraordinária inoportunidade, fato reconhecido posteriormente até mesmo pelo parlamentar autor da proposta legislativa em questão, não agasalha a tese da cooperativa e de sua parceira quanto ao recrutamento irregular de mão-de-obra. Não precisava o texto consolidado dizer o que é uma conseqüência lógica da verdadeira relação cooperativada, incompatível com a presença dos requisitos dos artigos 2º e 3º da CLT. Tem servido a nova redação do artigo 442, da CLT, como estímulo à prática de irregularidades país afora, no mesmo nível das que estão sendo aqui reveladas. Mas o fato é que o dispositivo em debate afasta a relação de emprego quando houver a real relação jurídica entre a cooperativa e o cooperado, estando longe de representar uma “licença para matar” direitos trabalhistas.

Considero, assim, que as duas primeiras reclamadas, a denominada cooperativa de trabalho e a empresa qualificada na inicial , por ação e atitude dos seus sócios e diretores, praticaram atos que ofendem, dentre outros, os següintes princípios e dispositivos:

a) Princípio da dignidade da pessoa humana (CF, artigo 1º, inciso III) ;

b) Princípio Fundamental do valor social do trabalho (CF, artigo 1º, inciso IV);

c) Princípio da primazia da realidade (inerente ao Direito do Trabalho e consagrado na CLT, artigo 442);

d) Princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas (inerente ao Direito do Trabalho);

e) Princípio da proteção do hipossuficiente (inerente ao Direito do Trabalho);

f) Princípio previsto no artigo 9º , da CLT.

Mediante ato fraudulento, lesaram a reclamante-empregada quando invocaram a formação de uma relação de trabalho de cooperada, não existente, tudo a justificar, assim, a devida comunicação do fato ao Ministério Público.

Diante dos fundamentos constitucionais e legais apontados (CF, artigo 1º, CLT, artigo 9º) declaro nulo o contrato de cooperado, celebrado entre a reclamante e a primeira reclamada (assinado, na verdade ).

2 – DOS EFEITOSVERBAS RESCISÓRIAS

Nos exatos limites da postulação, reconheço a existência do vínculo de emprego entre a reclamante e a primeira reclamada, no período de 27 de janeiro de 2002 a 31 de dezembro de 2003, data em que foi dispensada a obreira, sem justa causa, fazendo jus ao recebimento de parcelas relativas ao aviso prévio indenizado (30 dias ) e respectiva integração ao seu tempo de serviço para todos os fins, férias integrais de 2002/2003 e de 2003/2004 (11/12), 13ºs salários de 2002 (08/12) de 2003 (integral ) de 2004 (1/12 – integração do aviso prévio), FGTS de todo o período, com o acréscimo da multa de 40%, além da multa rescisória do artigo 477,§ 8º, da CLT e do Salário Família (3 filhos – durante todo o contrato de trabalho – até dezembro de 2003).


A primeira reclamada anotará a CTPS obreira, observando os comandos desta decisão, no prazo de 48 horas, pena de assim proceder a Secretaria da Vara.

Rejeito o pleito de seguro desemprego, eis que após o rompimento da relação jurídica com a cooperativa, a autora foi admitida imediatamente pela segunda reclamada, agora na condição de empregada e como tal reconhecida.

3- COMISSÕES – DIFERENÇAS SALARIAIS – RSR SOBRE AS COMISSÕES – BASE DE CÁLCULO

Diz a reclamante que a sua remuneração média mensal importava em R$ 1.280,00 (um mil e duzentos e oitenta reais), constituída de salário fixo (R$ 380,00) e de comissões (R$ 900,00 ), não tendo recebido, no entanto, o salário fixo no período de agosto de 2002 a outubro de 2003, nem o RSR sobre as comissões. Acrescenta, ainda, que é credora de R$ 520,00 a título de comissão do mês de dezembro de 2003.

Sobre as alegações, a primeira reclamada aduziu o seguinte:

A reclamante foi devidamente remunerada pelos serviços prestados. Como visto, na qualidade de cooperada, aufere sua remuneração de acordo com sua produtividade. Ademais, a Reclamante estava ciente de sua remuneração no momento em que recebeu o convite/comunicado para fornecimento de serviços. Não há que se falar , desta forma, em diferença salarial e comissões” (fls 30/31, da defesa).

Como se percebe da transcrição, não houve contestação específica a nenhum dos fatos apresentados pela autora, no que se refere à remuneração, à ausência de quitação do Repouso Semanal Remunerado,à forma mista composta de salário fixo e comissões, e também ao não pagamento de comissões e do fixo em algumas ocasiões, assuntos que deixaram de ser abordados, da mesma maneira, pela segunda reclamada.

A omissão patronal atrai a aplicação do artigo 302, do CPC, de aplicação subsidiária ao Processo do Trabalho (CLT, artigo 769 ), sendo forçoso reconhecer como verídica a remuneração apontada na exordial. De idêntico modo, considero que os valores devidos deixaram de ser pagos, exatamente como afirma a reclamante.

Como conseqüência, as comissões serão integradas à remuneração obreira. E, levando em consideração o reflexo sobre o Repouso Semanal Remunerado, o valor remuneratório, para fins de apuração das verbas ora deferidas, importará em R$ 1.555,75.

Devidas as diferenças salariais, a diferença da comissão do mês de dezembro de 2003 e o Repouso Semanal Remunerado sobre as Comissões.

A contadoria apenas atualizará os valores indicados nos itens da inicial, de 03 a 12 e de 14 a 16, a partir da data do ajuizamento da presente reclamatória, valores que não foram impugnados de forma específica.

4 – HORAS EXTRAS

A reclamante alega que laborava das 08: às 18:20 horas, de segunda a sexta feira, com 01:30 horas de intervalo, e das 08:00 às 12:30 horas, aos sábados, horário de trabalho que foi impugnado pela primeira reclamada.

A prova do labor em regime de sobrejornada é da autora (CLT , artigos 769 e 818; CPC, artigo 333, I).

Os cartões de ponto colacionados aos autos, evidentemente, pertencem a período que não é atingido pela presente controvérsia.

As duas testemunhas trazidas pela autora confirmaram a jornada da petição inicial (fls 206/207), com a ressalva de que o trabalho aos sábados era alternado (sábado sim, sábado não), fato confessado pela própria reclamante (206) e apenas até às 12:00 horas.

Trabalhando das 08:00 às 18:20 horas, com 01:30 horas de intervalo, de segunda a sexta-feira, e aos sábados, de maneira alternada, das 08:00 às 12:00 horas , a reclamante faz jus ao recebimento de tantas quantas horas extras ultrapassem a jornada semanal de 44 horas, com o acréscimo do percentual de 50%, com reflexos sobre RSR, FGTS, férias e abono de 1/13, 13º salário e aviso prévio, de todo o pacto laboral, valor que não pode ultrapassar a quantia postulada no item 13, da inicial.


Mas aqui, ao contrário das demais verbas deferidas, não se fará uma simples atualização da importância, e sim a apuração conforme os parâmetros ora fixados.

5- DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA SEGUNDA RECLAMADA

Na qualidade de tomadora dos serviços prestados pela reclamante, a segunda reclamada é responsável subsidiária pelo cumprimento das obrigações assumidas pela primeira (Enunciado nº 331, do TST).

Acolho o requerimento.

6 – CONTRIBUIÇAO PREVIDENCIÁRIA NÃO RECOLHIDA(INSS )

Reconhecido o vínculo de emprego, impõe-se o recolhimento da contribuição previdenciária sobre a remuneração mensal auferida durante todo o contrato de trabalho, sem prejuízo da contribuição sobre outras parcelas salariais que devem ser pagas a partir da rescisão contratual, nos exatos termos do artigo 276, § 7º, do Decreto 3.048/99.

A interpretação restritiva feita não encontra amparo no texto constitucional, sendo certo que o artigo 114, inciso VIII, da Constituição Federal, estabelece a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar “a execução, de ofício, das contribuições previstas no artigo 195, I, a , e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir”.

Quaisquer contribuições previdenciárias devidas sobre salários, diferenças salariais e sobre outras parcelas reconhecidas pela Justiça do Trabalho, estão sob a sua alçada. E assim o é porque o texto da Carta Política não faz a restrição antes anunciada. Aliás, não seria sequer razoável deslocar a competência do órgão que cabe reconhecer a parcela principal, um fracionamento que, definitivamente, estaria a militar contra a unidade de convicção e de jurisdição.

Estou absolutamente convicto de que compete à Justiça do Trabalho determinar o recolhimento da contribuição previdenciária sobre a totalidade das verbas salariais deferidas e também declarara incidência da contribuição mensal regular sobre o salário, na hipótese do reconhecimento judicial da relação de emprego, e sobre suas diferenças, quando a remuneração real não tiver sido considerada pelo empregador como base de cálculo durante o contrato de trabalho.

Na legislação inferior, o artigo 276, § 7º, do Decreto 3.048/99, estabelece o seguinte:

Se da decisão resultar o reconhecimento de vínculo empregatício, deverão ser exigidas as contribuições, tanto do empregador como do reclamante, ainda que o pagamento das remunerações a ele correspondentes não tenham sido reclamadas na ação, tomando-se por base de incidência, na ordem, o valor da remuneração paga, quando conhecida, da remuneração paga a outro empregado de categoria ou função equivalente ou semelhante, do salário normativo da categoria ou do salário mínimo mensal, permitida a compensação das contribuições patronais eventualmente recolhidas

A reclamada deve providenciar o recolhimento das contribuições previdenciárias devidas durante todo o contrato de trabalho (recolhimento integral de 27 de janeiro de 2002 a 31 de dezembro de 2003), com base na remuneração mensal de R$ 1.555,75).

Também haverá incidência sobre as parcelas salariais ora deferidas (13ºs salários, diferenças de comissões, RSR, diferenças salariais e horas extras).

6- BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA

Declarando ser pobre (fl 07 ), faz a reclamante jus aos benefícios da justiça gratuita.

7 – OFÍCIOS AOS ÓRGÃOS FISCALIZADORES

A secretaria deverá encaminhar ofícios aos órgãos fiscalizadores (Receita Federal, Fisco do Distrito Federal,INSS, DRT-DF E CEF), em face das irregularidades constatadas.

8 – ARTIGO 467, DA CLT

A controvérsia que se estabeleceu sobre a totalidade das verbas, por si só, afasta a aplicação do artigo 467, da CLT.

09- COMUNICAÇÃO AO MPT

Os fatos evidenciados nos autos justificam o encaminhamento da presente decisão ao Ministério Público do Trabalho.

III – CONCLUSÃO

Ante o exposto, julgo procedentes, em parte, os pedidos para condenar as reclamadas, CCCOOP- COOPERATIVA DE TRABALHO DE PROFISSIONAIS E COBRANÇA e OPERATOR -SERVIÇOS E SISTEMAS DE COBRANÇA LTDA, a última de forma subsidiária, a pagar à autora, MARIANA CARDOSO DE JESUS ,no prazo legal, as parcelas constantes da fundamentação precedente, que fica integrando o presente dispositivo.

Juros e atualização monetária na forma da lei.

Recolhimentos previdenciários, na forma do Provimento 01/96, da CGJT, sob pena de execução de ofício (artigo 114, § 3º, da CF), incidentes sobre as parcelas antes indicadas. Deve-se observar a alíquota da contribuição previdenciária do empregado e do empregador, estando a reclamada autorizada a reter a parcela devida ao reclamante (art 30, inciso I, alínea “a”, da Lei nº 8.212/91), devendo a empresa comprovar o recolhimento ao INSS no prazo legal (Lei nº 8.212/91, artigo 30, inciso I, alínea “b” ).

Recolhimentos fiscais, conforme Provimento 03/2005 da CGJT.

Ofício aos órgãos fiscalizadores.

Custas de R$500,00 , pelas reclamadas, calculadas sobre R$ 25.000,00 valor arbitrado à condenação especialmente para essa finalidade.

Intimem-se as partes

GRIJALBO FERNANDES COUTINHO

Juiz Titular da 19ª VT de Brasília

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