Necessidade urgente

Plano de saúde deve pagar tratamento considerado experimental

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16 de novembro de 2005, 14h09

Plano de saúde deve custear tratamento considerado experimental no país. A decisão é da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Os desembargadores não concordaram com a defesa da empresa que alegou que determinado tratamento de combate ao câncer é experimental, já que é feito apenas no exterior.

A 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça gaúcho manteve pedido de Antecipação de Tutela a um cliente da Golden Cross Assistência Internacional de Saúde, determinando que a empresa pague o tratamento do paciente pela técnica Folfox 4.

Esse tipo de tratamento ainda não é reconhecido no Brasil, mas tem sido usado como padrão em países da Comunidade Européia e nos Estados Unidos. O segurado sofre de adenocarcinoma colorretal (tipo de câncer de intestino).

A Tutela Antecipada foi concedida pela 1ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre. Na ocasião, a primeira instância determinou à seguradora que arcasse com os gastos do tratamento, sob pena de multa diária de R$ 100 mil, durante 60 dias.

No recurso ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a Golden Cross sustentou que qualquer tratamento sem a aprovação dos órgãos de saúde brasileiros escapa da alçada de responsabilidade das administradoras de planos de saúde.

O relator, desembargador Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura, discordou. “Não há prova cabal a respeito de ser ou não experimental o tratamento requisitado. Em um juízo de cognição sumária, não o reputo experimental, pois já vem sendo adotado como padrão nos Estados Unidos e na Comunidade Européia”, considerou.

Fontoura alertou, ainda, para a necessidade urgente da terapia, diante do alto risco do reaparecimento da doença.

Processo 70010585354

Leia a íntegra da decisão

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE SAÚDE. TUTELA ANTECIPADA. QUIMIOTERAPIA. NEGATIVA FUNDADA PELO FATO DE SER O TRATAMENTO EXPERIMENTAL.

Tratamento adjuvante e sistêmico calcado na quimioterapia com o esquema FOLFOX4 (DeGrammont) utilizado como padrão nos Estados Unidos e na Europa, em um juízo de cognição sumária, não pode ser considerado experimental. Precedente jurisprudencial. Previsão contratual de cobertura para tratamento quimioterápico.

Urgência configurada pelo alto risco de o paciente apresentar recidiva.

Presentes os requisitos autorizadores para a concessão da medida antecipatória, uma vez que são relevantes os fundamentos e que há risco de ineficácia do provimento final, mantida deve ser a decisão agravada.

Agravo de instrumento desprovido.

AGRAVO DE INSTRUMENTO — SEXTA CÂMARA CÍVEL

Nº 70010585354 — COMARCA DE PORTO ALEGRE

GOLDEN CROSS ASSISTÊNCIA INTERNACIONAL DE SAÚDE — AGRAVANTE

ANTÔNIO CORTES RODRIGUEZ — AGRAVADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Cacildo de Andrade Xavier, Presidente, e Des. Artur Arnildo Ludwig.

Porto Alegre, 09 de março de 2005.

DES. ANTÔNIO CORRÊA PALMEIRO DA FONTOURA,

Relator.

RELATÓRIO

DES. ANTÔNIO CORRÊA PALMEIRO DA FONTOURA (RELATOR)

GOLDEN CROSS ASSISTÊNCIA INTERNACIONAL DE SAÚDE interpôs agravo de instrumento contra decisão que deferiu pedido de tutela antecipada nos autos de ação ordinária que lhe move ANTÔNIO CORTES RODRIGUES, ora agravado.

A medida antecipatória determinou que a requerida autorizasse tratamento quimioterápico, sob pena de multa diária no valor de R$ 100,00 (cem reais), no período de sessenta dias.

Inicialmente, referiu que o agravado é beneficiário de contrato de saúde firmado pela empresa UNIFERTIL – UNIVERSAL FERTILIZANTES LTDA., ou seja, trata-se de contrato empresarial, precedido de negociação na qual são estipuladas as cláusulas de cobertura e valores de reembolso, ao contrário dos contratos de adesão individuais.

Asseverou que o tratamento pleiteado pelo agravado – quimioterapia pelo esquema FOLFOX 4 – é experimental, ainda não regulamentado, razão pela qual a cobertura lhe foi negada. Citou cláusula contratual de exclusão de cobertura deste tipo de tratamento. Sustentou que estes tratamentos não fazem parte da análise atuarial dos contratos e que, enquanto não aprovados e regulamentados pelos órgãos médicos competentes, não têm reconhecimento no Brasil, não cabendo às operadoras custeá-los. Aduziu não ter havido migração para nenhum contrato que tenha cobertura regulada pela nova legislação e que a Lei nº 9.656/98 somente é aplicável aos contratos firmados a partir de sua edição. Requereu a concessão de efeito suspensivo ao recurso e, ao final, o seu provimento.

O efeito suspensivo pleiteado foi indeferido, conforme despacho de fl. 58.

Contra-razões às fls. 61/69.

É o relatório.

VOTOS

DES. ANTÔNIO CORRÊA PALMEIRO DA FONTOURA (RELATOR)

Conheço do recurso, porquanto adequado, tempestivo e preparado, nos termos do artigo 511, do CPC.

O agravado propôs ação pleiteando, em suma, a nulidade de cláusulas contratuais abusivas em razão da negativa de cobertura da agravante ao tratamento recomendado pelo médico que o assiste.

Sofre o agravado de “adenocarcinoma colorretal” e o tratamento que lhe foi recomendado pelo Doutor José Luiz Miranda Guimarães teve a seguinte descrição (fl. 25):

“(…)

“Frente ao caso exposto, optamos por propor um tratamento adjuvante sistêmico calcado na quimioterapia com o esquema FOLFOX4 (De Grammont). A indicação é sustentada pelo alto risco de o paciente apresentar recidiva, em função do quadro agudo apresentado quando do diagnóstico e sobretudo da peritonite associada. A sustentação científica, entretanto não é de todo sólida, com resultados discordantes dos estudos IMPACT B2 e NSABP C01 A C04.

“(…) Os Estados Unidos e os países da Comunidade Européia consideram, a partir destes resultados, o regime FOLFOX4 como o novo esquema dito padrão para estes pacientes. Diante destes resultados, é consenso entre os especialistas o benefício potencial em termos de ganho de sobrevida global, àqueles pacientes que se apresentam com quadros obstrutivos, perfurações, peritonites associadas, tumores aneuplóides, estabilidade de microssatélite, etc. (…)

Irrelevante o aspecto de ter sido o contrato entabulado com a empregadora do agravado, pois é este o seu beneficiário, razão pela qual detém plena legitimidade para discutir em juízo a abusividade das cláusulas contratuais. Nesse sentido já tive a oportunidade de decidir, conforme acórdão cuja ementa foi assim redigida:

“SEGURO. PLANO DE SAÚDE EMPRESARIAL. ESTIPULAÇÃO EM FAVOR DE TERCEIRO. LEGITIMIDADE ATIVA DO BENEFICIÁRIO PARA DISCUTIR EM JUÍZO CLÁUSULAS CONTRATUAIS. SENTENÇA DE CARÊNCIA DE AÇÃO. DESCONSTITUIÇÃO.

“É parte legítima para discutir em juízo cláusulas contratuais o beneficiário da apólice de seguro, uma vez que há relação de direito material entre ele e a seguradora, consistente na possibilidade de, ocorrido o sinistro, a obrigação do segurador ser prestada em favor do segurado ou em favor de seu dependente. Precedentes. Carência de ação afastada. Sentença desconstituída. Apelo provido”.

(APELAÇÃO CÍVEL N. 70001963149, SEXTA CÂMARA CÍVEL EM REGIME DE EXCEÇÃO, JULG. EM 28.08.2002).

Nos termos da decisão agravada, verifica-se que o contrato de fls. 31/55 prevê cobertura para a especialidade de oncologia (fl. 38) e, em especial, para o serviço de quimioterapia anti-neoplásica em regime hospitalar ou ambulatorial (fl. 40).

Não há prova cabal a respeito de ser ou não experimental o tratamento requisitado. Tal questão deverá ser melhor aferida através da competente prova técnica. Em um juízo de cognição sumária, não o reputo experimental, pois, como acima restou consignado, já vem sendo adotado como padrão nos Estados Unidos e na Comunidade Econômica Européia. Além disso, em caso semelhante, restou assentado:

“SEGURO-SAÚDE. CLÁUSULA EXCLUINDO DA COBERTURA TRATAMENTO EXPERIMENTAL NÃO APROVADO PELO SNFM. BENEFICIÁRIA PORTADORA DE CÂNCER, COM QUADRO CLÍNICO TERMINAL ANTE A INEXISTÊNCIA, NO BRASIL, DE OUTRO TRATAMENTO DISPONÍVEL PARA EVITAR A ACAO PROGRESSIVA DA DOENÇA. TRATAMENTO NO EXTERIOR MEDIANTE A UTILIZAÇÃO DE ANTINEOPLASTONS, COM RESULTADOS FAVORÁVEIS, APRESENTANDO MELHORA NO QUADRO CLINICO. EMBORA UTILIZADO POR UM SÓ MÉDICO E EM UM SÓ ESTADO DA FEDERAÇÃO NORTE-AMERICANA, TENDO SIDO RECONHECIDA JUDICIALMENTE A SUA LEGALIDADE, COM SUCESSO INDISCUTÍVEL, POR MAIS DE UMA DÉCADA, NÃO PODE MAIS SER CONSIDERADO COMO EXPERIMENTAL. ADEMAIS, TRATANDO-SE DE TRATAMENTO REALIZADO NO EXTERIOR, NÃO SE PODE ACEITAR A LIMITAÇÃO DA APÓLICE COM VALIDADE APENAS NO BRASIL. DE QUALQUER MODO, AINDA QUE EXISTISSEM DÚVIDAS, TRATANDO-SE DE CONTRATO DE ADESÃO, NÃO PODERIAM SER SOLUCIONADAS EM FAVOR DA SEGURADORA. POR OUTRO LADO, ELA SE MOSTRA INADEQUADA PARA A FINALIDADE DO PRÓPRIO CONTRATO, RELACIONADA COM A SAÚDE E, PORTANTO, COM O DIREITO À VIDA, DIREITOS QUE INTEGRAM OS CHAMADOS DIREITOS DA PERSONALIDADE, PORTANTO, ABSOLUTOS. INADMISSIBILIDADE DA EXCLUSÃO DO TRATAMENTO DA COBERTURA DO SEGURO. PROCEDÊNCIA DAS AÇÕES. EMBARGOS REJEITADOS. (EMBARGOS INFRINGENTES Nº 595161639, SEGUNDO GRUPO DE CÂMARAS CÍVEIS, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: TAEL JOÃO SELISTRE, JULGADO EM 15/12/1995)

Por fim, a urgência na concessão da medida está presente pelo alto risco de o agravado apresentar recidiva (fl. 25).

Assim, presentes os requisitos autorizadores para a concessão da medida antecipatória – relevância dos fundamentos e risco de ineficácia do provimento final – correta a decisão agravada ao concedê-la.

Isso posto, nego provimento ao agravo de instrumento.

É o voto.

DES. ARTUR ARNILDO LUDWIG – De acordo.

DES. CACILDO DE ANDRADE XAVIER (PRESIDENTE) – De acordo.

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 70010585354, DE PORTO ALEGRE. A DECISÃO É A SEGUINTE: “NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME”.

Julgadora de 1º Grau: MUNIRA HANNA

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