Teto salarial

MP entra com ação contra salários na Câmara e no Senado

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11 de novembro de 2005, 18h55

O Ministério Público Federal no Distrito Federal ajuizou Ação Civil Pública contra a Câmara dos Deputados e o Senado para que as duas casas cumpram o teto salarial estipulado pela Constituição Federal na remuneração de parlamentares e servidores. A regra é a de que os salários não podem ultrapassar a remuneração de ministro do Supremo Tribunal Federal: R$ 21,5 mil.

Depois de analisar informações sobre os valores pagos em diversos órgãos do funcionalismo, os procuradores afirmam que a Câmara e o Senado não respeitam o teto salarial. As casas argumentam que muitos servidores acumulam vencimentos de outros órgãos, inclusive estaduais e municipais. A ação é assinada pelos procuradores da República Carlos Henrique Martins de Lima, Peterson de Paula Pereira e Michele Rangel de Barros.

Segundo os procuradores, não existe “razão para que os demais órgãos dos poderes da União cumpram efetivamente o teto renumeratório dos ministros do Supremo Tribunal Federal e somente à Câmara e ao Senado Federal seja dado o írrito privilégio de não observarem a norma constitucional!”.

A ação pede que seja concedida liminar para reduzir os subsídios, vencimentos, aposentadorias e pensões dos parlamentares, servidores, aposentados e pensionistas ao limite máximo do teto renumeratório dos ministros do STF. Os procuradores também pedem que os beneficiários declarem os valores recebidos para que possam optar entre seus diversos vencimentos até o limite estabelecido em lei.

Leia a íntegra da inicial

Exmo. Sr. Juiz Federal da __ ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal

O Ministério Público Federal, pelos Procuradores signatários, com base no artigo 129, II e III da Constituição Federal, nos artigos 5º e 6º da Lei Complementar n.º 75/1993 e na Lei n.º 7.437/85, vem ajuizar a presente:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA com pedido LIMINAR em face da

União (Câmara dos Deputados e Senado Federal), entidade de direito público interno, a ser citada na pessoa do Procurador Regional da União, no Setor de Autarquias Sul, Quadra 02, Bloco “E”, 2º andar – sala 206, Ed. PGU, – Tel.: 3315-7698, CEP: 70.0709-06, Brasília, Distrito Federal.

Pelos seguintes fundamentos de fato e de direito.

I. Introdução

A presente Ação Civil Pública teve origem a partir de procedimento administrativo(1) instaurado ex officio no âmbito da Procuradoria da República no Distrito Federal visando verificar a aplicação, na esfera do Poder Legislativo, do teto remuneratório instituído pela Emenda Constitucional n.º 41, de 19 de dezembro de 2003. In verbis:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(…)

XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;”

Foram oficiados, inicialmente, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados requisitando-lhes informações acerca do cumprimento por aquelas casas legislativas do teto constitucional. Posteriormente, requisições foram feitas à Presidência da República, ao Supremo Tribunal Federal, ao Superior Tribunal de Justiça, ao Tribunal Superior do Trabalho, ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região e, ao final, aos ramos do Ministério Público da União.

Todos eles, com exceção da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, responderam às requisições, informando que cumprem corretamente o determinado pela Emenda Constitucional n.º 41/2003.

Frustadas as tentativas para se fazer valer a efetiva aplicação do teto remuneratório no âmbito do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, não restou alternativa ao Ministério Público Federal senão o ajuizamento da presente Ação Civil Pública. Assim, pela presente ação, pretende este Órgão Ministerial o cumprimento pelas citadas casas legislativas do que foi estabelecido pelo artigo 37, inciso XI da Constituição Federal, nos termos da nova redação dada pela Emenda Constitucional n.º 41/2003.


II. Teto Constitucional

Preliminarmente é preciso tecer algumas considerações acerca do teto constitucional de que trata a ação em apreço. Vejamos.

Anteriormente à redação dada pela EC n.º 41/2003, o artigo 37, inciso XI da CF/88 tinha a seguinte prescrição:

“XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal”.

Posteriormente, a EC n.º 41/2003 acrescentou ao inciso XI do artigo 37 a seguinte regra:

“(…)aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;”

Nos termos do artigo 8º da citada Emenda(2), o novo texto era auto-aplicável, uma vez que determinou que o teto remuneratório geral, correspondente ao valor do subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, será considerado, para os fins do limite remuneratório, o valor da maior remuneração atribuída por lei na data da publicação da emenda constitucional a Ministro do Supremo Tribunal Federal, a título de vencimento, de representação mensal e da parcela recebida em razão de tempo de serviço.

Segundo a lição de Alexandre de Moraes:(3)

“A EC 41/03, portanto, afastou o entendimento, da necessidade de edição de lei ordinária, de iniciativa conjunta do Presidente da República, dos Presidentes da Câmara e do Senado Federal e do Presidente do Supremo Tribunal Federal, para a fixação do teto salarial, e, consequentemente, para concessão de aplicabilidade ao texto constitucional. A citada emenda constitucional afastou, também, a própria iniciativa conjunta para fixação do subsídio de Ministro do Supremo Tribunal Federal, dando nova redação ao inciso XV, do art. 48, da Constituição Federal.”

Desse modo, o Supremo Tribunal Federal, na primeira sessão administrativa do ano de 2004 determinou:

“Às dezessete horas, reuniu-se o Supremo Tribunal Federal, em sessão administrativa, presentes os Ministros Maurício Corrêa (Presidente) (…), para apreciação da seguinte pauta: 1) Processo 319.269 – Após analisar as inovações introduzidas pela Emenda Constitucional n.º 41/2003, o Tribunal decidiu, por maioria, nos termos do voto do Ministro Maurício Corrêa – Presidente, que o valor do limite fixado pelo artigo 8º da referida Emenda corresponde a R$ 19.115,19 (dezenove mil, cento e quinze reais e dezenove centavos), maior remuneração atribuída por lei, na data de sua publicação, a Ministro do Supremo Tribunal Federal, a título de vencimento, representação mensal e parcela recebida em razão de tempo de serviço e cuja composição é a seguinte: (…)”

Hoje, nos termos da Lei n.º 11.143, de 26 de julho de 2005, o subsídio mensal de Ministro do Supremo Tribunal é de R$ 21.500,00 (vinte e um mil e quinhentos reais) e, a partir de 1º de janeiro de 2006 passará para o valor de R$ 24.500,00 (vinte e quatro mil e quinhentos reais).

III. Da legitimidade ativa do Ministério Público Federal

A Constituição Federal de 1988, ao definir o Ministério Público como Instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbiu-lhe da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (artigo 127 da CF/88), e estabeleceu, em seu artigo 129, suas funções institucionais, destacando-se:

“Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

(…)

II – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;

III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;”

A Lei Complementar n.º 75/1993, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União, por sua vez, prescreveu:


“Art. 5º São funções institucionais do Ministério Público da União:

(…)

III – a defesa dos seguintes bens e interesses:

b) o patrimônio público e social;

Art. 6º Compete ao Ministério Público da União:

VII – promover o inquérito civil e a ação civil pública para:

a) a proteção dos direitos constitucionais;

b) a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, dos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;”

Assim, a legitimidade do Ministério Público Federal, decorre tanto do já referido artigo 129, inciso III, da Constituição, como, em base infraconstitucional, dos artigos 5.º e 6.º da Lei Complementar n.º 75/1993.

Tratando-se de ação civil pública que visa dar cumprimento ao que determinou a Emenda Constitucional n.º 41 de 2003, nada mais se está a buscar do que a defesa do patrimônio e, por conseguinte, do erário.

Desse modo, a não observação pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados do disposto na citada Emenda Constitucional vulnera os Princípios da Igualdade e da Moralidade, como também o Princípio Republicano.

Tem-se, portanto, evidenciada a legitimidade ativa do Ministério Público Federal para composição deste feito.

IV. Da competência da Justiça Federal

Cuidando a presente de ação de ato lesivo ao erário praticado pela Câmara dos Deputados e Senado Federal, órgãos componentes do Poder Legislativo e, constituindo este, nos termos do artigo 2.º da Constituição Federal, um dos Poderes da União, manifesto o interesse da União na presente lide, incidindo, portanto, o disposto no artigo 109, I, da Constituição Federal de 1988.

Por outro lado, tratando-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal competente será a Justiça Federal para o processamento do feito. Isso porque o Ministério Público Federal é órgão da União e ainda nos termos do artigo 109, I da Constituição Federal aos juízes federais compete processar e julgar as causas em que “a União, entidade autárquica ou empresa púbica federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes”.

Portanto, de se reconhecer o entendimento de que a atuação do Ministério Público Federal, enquanto órgão federal, implica na competência da Justiça Federal. Assim o decidido pelo Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TUTELA DE DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS. MEIO AMBIENTE. COMPETÊNCIA. REPARTIÇÃO DE ATRIBUIÇÕES ENTRE O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E ESTADUAL. DISTINÇÃO ENTRE COMPETÊNCIA E LEGITIMAÇÃO ATIVA. CRITÉRIOS.

1. A ação civil pública, como as demais, submete-se, quanto à competência, à regra estabelecida no art. 109, I, da Constituição, segundo a qual cabe aos juízes federais processar e julgar “as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e a Justiça do Trabalho”. Assim, figurando como autor da ação o Ministério Público Federal, que é órgão da União, a competência para a causa é da Justiça Federal.

3. (…)

4. (…)

6. No caso dos autos, a causa é da competência da Justiça Federal, porque nela figura como autor o Ministério Público Federal, órgão da União, que está legitimado a promovê-la, porque visa a tutelar bens e interesses nitidamente federais, e não estaduais, a saber: o meio ambiente em área de manguezal, situada em terrenos de marinha e seus acrescidos, que são bens da União (CF, art. 20, VII), sujeitos ao poder de polícia de autarquia federal, o IBAMA (Leis 6.938/81, art. 18, e 7.735/89, art. 4º ).

Recurso especial provido.

(Resp 440002/SE – Mininstro Teori Albino Zavascki – Primeira Turma – Julgamento: 18.11.2004 – DJ 06.12.2004)

“Se o Ministério Público Federal é parte, a Justiça Federal é competente para conhecer do Processo”

(CC 4.927-0-DF, rel. Min. Humberto Gomes de Barros)

V. Dos Fatos e do Direito

Conforme já mencionado, com o advento da Emenda Constitucional n.º 41/2003, que alterou o inciso XI do artigo 37, ficou instituído que

“(…) a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal (…)”.


Foram encaminhados ofícios à Presidência da República, Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunal Superior do Trabalho, Ministério Público Federal, Ministério Público do Distrito Federal e Território, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Militar e ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região no sentido de que prestassem informações a este Órgão Ministerial acerca do cumprimento do que determinou a Emenda n.º 41/2003, recebendo resposta positiva de todos os órgãos acima mencionados.

Entretanto, a mesma resposta não foi obtida pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados.

A Câmara argumentou que não cumpre o dispositivo constitucional tendo em vista a “ausência de norma regulamentar, indispensável, no caso, (…), para se conferir aos atos administrativos necessários à aplicação do novel ordenamento o predicado indispensável da legalidade, especialmente no que alude à autorização para acesso a informações reputadas como de caráter privado” (fl. 10 do PA 1.16.000.000733/2004-61).

Alegou que há dificuldade nos casos em que ocorre a acumulação de cargos ou proventos “oriundos de orçamentos de diferentes esferas ou níveis de poder, envolvendo inclusive unidades federativas distintas, seja quanto ao limite a ser aplicado, seja quanto à competência para determinar sua aplicação, e eventualmente determinar o corte de vencimentos e proventos, ou ainda quanto à destinação dos saldos orçamentários decorrentes.”

Citou, ainda, inúmeros motivos que impediam a aplicação do teto constitucional disciplinado na Emenda n.º 41/2003. Finalizou discorrendo que a disciplina do artigo 37, inciso XI da CF/88 fora submetida para apreciação da Mesa Diretora, que seria o órgão competende para deliberar sobre as providências a serem adotadas.

O problema da acumulação de cargos oriundos de diferentes orçamentos, por evidente e com maior intensidade, repete-se no Senado Federal.

Ora, inexiste razão para que os demais órgãos dos Poderes da União cumpram efetivamente o teto remuneratório dos Ministros do Supremo Tribunal Federal e somente à Câmara e ao Senado Federal sejam dados o írrito privilégio de não observarem a norma constitucional !!!!!!

O artigo 37, inciso XI da Constituição Federal de 1988 é norma imperativa, bem como garantia constitucional que deve ser cumprida por todos os órgãos da Administração Direta e Indireta. Permanecerem, o Senado e a Câmara Federal, inertes quanto a esse dispositivo significa desrespeitar norma constitucional, bem como infringir os Princípios Republicano e da Moralidade.

Ademais, as citadas Casas Legislativas são as responsáveis pela discussão, votação e promulgação das Emendas Constitucionais(4) e, por isso, devem dar efetivo cumprimento ao que votaram e discutiram em processo legislativo no âmbito do Congresso Nacional.

O argumento da dificuldade por orçamentos de “diferentes esferas” pode ser superado com simplicidade. Com efeito, e tal conduta já deveria ter sido tomada, cabe ao ordenador de despesas indagar, sob pena de responsabilidade, aos beneficiários se recebem proventos, benefícios ou qualquer outra espécie de remuneração de outra fonte pública. Com a identificação dos casos, poderá ser efetivado o corte para restringir o somatório ao limite constitucionalmente imposto. Mácula alguma haverá, por exemplo, se for concedido ao beneficiário a possibilidade de escolha, desde que o somatório não ultrapasse o teto.

VI. Da Concessão da Liminar

Abordando especificamente a ação civil pública, o legislador pátrio, de forma moderna, positivou no art. 12 da Lei n.º 7.347/85:

“Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo.”

A previsão, mais que oportuna, é fundamental para a adequada tutela dos bens eleitos pelo ordenamento constitucional, principalmente à luz da visão instrumentalista do processo. Na sintética e precisa lição de Luiz Guilherme Marinoni:

“O processo, em outras palavras, é instrumento que apenas tem valor quando serve ao direito material e aos escopos da jurisdição.” (Novas Linhas de Processo Civil, 3ª Edição, São Paulo, Malheiros, 1999, p. 100)

Nesta linha, necessário fixar dogmaticamente o conceito de provimento liminar como o concedido de modo fundamentado pelo Poder Judiciário início do processo, cujo objetivo é resguardar o interesse público individualizado na demanda.

Encontra amparo constitucional no princípio da proporcionalidade, que acaba por resolver o conflito entre a efetividade do processo e o contraditório. Com efeito, sacrifica-se provisoriamente o contraditório em nome da efetividade do processo e da própria credibilidade da jurisdição, poder do Estado.


No caso concreto, a plausibilidade da fundamentação que ampara o pleito liminar – fumus boni juris – restou plenamente articulada no corpo desta petição inicial, legitimando a sua concessão.

O periculum in mora se encontra presente em razão de que a espera pelo julgamento final da presente ação fará com que parlamentares, servidores, aposentados e pensionistas dos órgãos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal continuem a perceber subsídios, vencimentos e aposentadorias superiores aos dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, descumprindo deliberadamente o que prescreve o inciso XI do artigo 37 da Constituição Federal e o artigo 8º da Emenda Constitucional, que, conforme anteriormente explanado, é dispositivo auto-aplicável.

Ademais, conforme sabido, tais verbas dificilmente retornarão ao erário, em razão de sua natureza alimentar e da dificuldade em comprovar-se a má-fé em casos como tais. Com efeito, as esferas administrativas, e mesmo judiciais, de controle têm sido bastante complacentes com os argumentos utilizados para a não-reposição de valores, tudo levando a crer que, uma vez pagos, tais recursos jamais serão revertidos ao Poder Público.

De ver-se que o raciocínio contrário não se aplica, ou seja, uma vez julgada improcedente a presente ação, as diferenças remuneratórios serão indubitavelmente pagas aos beneficiários. Inexiste, assim, o periculum in mora inverso.

Assim, e diante da argumentação acima exposta, necessária a concessão liminar no intuito de determinar ao Senado Federal e à Câmara dos Deputados a redução dos subsídios, vencimentos, aposentadorias e pensões dos parlamentares, servidores, aposentados e pensionistas ao teto remuneratório dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

VII. Dos Pedidos

Diante de todo o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, nos termos da Lei n.º 7.347/1985, requer:

a) a citação da União, a ser citada na pessoa do Procurador Regional da União, no Setor de Autarquias Sul, Quadra 02, Bloco “E”, 2º andar – sala 206, Ed. PGU, – Tel.: 3315-7698, CEP: 70.0709-06, Brasília, Distrito Federal;

b) LIMINARMENTE, seja determinado à UNIÃO (Senado Federal e Câmara dos Deputados, nas pessoas de seus ordenadores de despesa – Diretor-Geral do Senado Federal e Diretor-Geral da Câmara dos Deputados), sob pena de multa diária a ser aplicada PESSOALMENTE ao AGENTE PÚBLICO que der causa ao descumprimento, o que segue:

b.1) o efetivo cumprimento do que determinou o artigo 37, inciso XI nos termos da redação alterada pela Emenda Constitucional n.º 41, de 19 de dezembro de 2003, reduzindo-se os subsídios, vencimentos, aposentadorias e pensões do parlamentares, servidores, aposentados e pensionistas ao teto remuneratório dos Ministros do Supremo Tribunal Federal;

b.2) para os casos em que o limite do teto seja ultrapassado pela cumulação de fontes diversas dentro da esfera federal, ou de diversos níveis da administração pública (esferas federal, estadual e municipal), E QUE AINDA NÃO TENHAM SIDO IDENTIFICADOS, seja promovida a identificação mediante declaração dos beneficiários, sob as penas da lei, e posteriormente sejam reduzidos aos limites constitucionais, caso em que poderá haver opção do beneficiário pela fonte a qual deseja receber, desde que, cumulativamente, não seja excedido o teto constitucional;

c) Ao final, seja julgada procedente a presente ação civil pública, confirmando os efeitos da liminar anteriormente deferida, tornando-a definitiva, para condenar a UNIÃO (Câmara dos Deputados e Senado Federal) na obrigação de promover todas as medidas para que o teto remuneratório Constitucionalmente estabelecido seja observado.

Requer provar o alegado por todos os meios em direito admitidos.

Dá a causa o valor de R$ 1.000,00.

Brasília, 10 de novembro de 2005.

Carlos Henrique Martins Lima

Procurador da República

Peterson de Paula Pereira

Procurador da República

Michele Rangel de Barros

Procurador da República

Notas de rodapé

1- Procedimento Administrativo n.º 1.16.000.000733/2004-61

2- “Art. 8º Até que seja fixado o valor do subsídio de que trata o art. 37, XI, da Constituição Federal, será considerado, para os fins do limite fixado naquele inciso, o valor da maior remuneração atribuída por lei na data de publicação desta Emenda a Ministro do Supremo Tribunal Federal, a título de vencimento, de representação mensal e da parcela recebida em razão de tempo de serviço, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento da maior remuneração mensal de Ministro do Supremo Tribunal Federal a que se refere este artigo, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos.”

3- Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional, Editora Jurídico Atlas, 4ª Edição, 2004, p. 866/867.

4- Artigo 60, § 2º da Constituição Federal/1988: “§ 2º – A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros”.

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