A cor da tinta

Juiz levanta suspeita de fraude em recurso no TST

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9 de novembro de 2005, 15h24

A suspeita de falsificação nos autos de um processo deixou em polvorosa o Tribunal Superior do Trabalho, noticiou o jornalista Cesar Giobbi, na coluna que leva seu nome no jornal O Estado de S.Paulo.

O caso envolve um dos maiores escritórios especializados em direito trabalhista de Brasília. A suspeita é a de que, depois de uma decisão, para garantir a tempestividade de um recurso, alguém autenticou documentos de forma irregular.

O TST chegou a decidir remeter a encrenca para a Polícia Federal abrir inquérito e fazer as necessárias investigações. Rapidamente, porém, as partes teriam preferido elas mesmas contratarem a perícia para resolver o caso. Uma liminar foi pedida, e concedida, para evitar o inquérito policial.

Na semana passada ficou pronta a perícia. Quem teve acesso ao laudo não tem dúvida de que se forjou, de fato, uma tempestividade que não houve. O escritório acusado diz que tudo não passou de um mal entendido agravado pela diferença de critérios entre juízes que aceitam a autenticação de cópias por parte dos advogados e outros que não admitem essa forma de racionalização.

O escritório é o Advocacia Maciel, que representa, entre outros grandes clientes, o Banco Santander/Meridional que, no caso em questão, litiga com o ex-empregado Cleber Manoel Batista. A suposta fraude foi constatada num recurso rejeitado pelo juiz convocado da 5ª Turma, José Pedro Camargo, pela falta de autenticação em alguns documentos. Depois da decisão, alega-se, alguém entrou nos autos e autenticou, de forma forjada, os documentos, sobrepondo carimbo e assinatura sobre os registros oficiais.

A 5ª Turma do TST decidiu encaminhar o caso para investigação da Polícia Federal, mas o escritório acusado entrou com Mandado de Segurança sustentando que as peças estavam sim autenticadas e o juiz não tinha percebido isso. Os advogados também pediram para que a perícia pudesse ser feita por particulares e o caso resolvido sem a participação da polícia. A ministra Cristina Peduzzi acolheu o pedido.

A perícia ficou pronta e abriu-se prazo para as partes examinarem o resultado. Quem viu os laudos garante que a constatação é evidente: a cor preta da tinta de uma caneta se sobrepõe irregularmente à tinta de cor azul do número seqüencial dos autos.

Já o advogado José Alberto Couto Maciel, do escritório em questão, desqualificou, dentro do tribunal, a conduta do juiz Pedro Camargo que, inconformado com a suspeita, chegou a pedir para voltar ao Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região.

O mérito da causa, segundo Couto Maciel, trata da reclamação de um empregado que pede expurgos inflacionários sobre os 40% do FGTS. O valor em questão não ultrapassaria R$ 500.

Segundo o advogado, não se trata de falsificação, mas de um carimbo sobreposto no número de uma página. Couto Maciel afirma que no Agravo de Instrumento, na primeira vez em que foi apreciado, um outro juiz convocado entendeu que o advogado não teria legitimidade para autenticar, porque isso foi feito antes da modificação do Código de Processo Civil.

Outro recurso foi interposto com a alegação de que os autos estavam carimbados e que a autenticação era válida. Dois anos depois, o processo chegou às mãos do juiz convocado José Pedro Camargo, que levantou a questão. Para ele, o carimbo foi colocado depois do despacho do juiz, o que é proibido por lei.

Pedro Camargo mandou ouvir outra parte, que confirmou as alegações do escritório do advogado Couto Maciel. As partes fizeram um acordo e decidiram remeter o processo à perícia judicial. A intenção do juiz era que o caso fosse remetido à Justiça Criminal e os documentos submetidos à Polícia Federal.

Segundo o advogado, o juiz nomeou um perito de uma cidade do interior de São Paulo. A investigação da fraude ficou em R$ 10 mil. O perito teria analisado somente uma página, das 117 que constam no processo. No parecer, entendeu que a tinta estava sobreposta.

Outro lado

Em e-mail enviado à redação da Consultor Jurídico, o advogado Couto Maciel dá a sua versão para os fatos:

O agravo de instrumento no qual discute-se se um carimbo foi colocado antes ou depois das folhas numeradas de cópias nele anexas, carimbo este assinado pela Dra. Karina Mariz, de quem sou advogado no processo e não autor do ato duvidoso, encontra-se com apresentação de laudo pericial contraditório, com vista às partes para apresentarem laudo de assistente técnico.

Neste processo as duas partes, agravante e agravado, estão de acordo que não houve qualquer irregularidade por parte da advogada, sendo que apenas o juiz convocado, querendo confirmar um possível equivocado despacho insiste na discussão.

Novamente esclareço que o referido processo corre em segredo de justiça por determinação do próprio Tribunal Superior do Trabalho, não podendo dele ser extraída qualquer notícia pública sob as penas da lei, na forma do art. 155 do CPC e demais normas que regulamentam a matéria.

O agravo de instrumento é um recurso que se faz quando o processo principal não é admitido. Este agravo é feito com cópias do processo principal nas quais o advogado afirma, mediante carimbo, que são autênticas. Faz mais de dois anos que o presente agravo em discussão foi feito e a advogada Karina Mariz juntou as cópias devidamente autenticadas. Na época existia um Juiz convocado no TST que não aceitava a tese de que o advogado podia autenticar as cópias e indeferiu por isso o agravo. Da decisão dele foi feito agravo regimental, dizendo que aqueles carimbos eram válidos. Passaram dois anos e um novo Juiz convocado, sem saber que na época se discutia a validade do carimbo, e querendo garantir como certo o despacho de seu antecessor, disse que a Dra Karina teria colocado os carimbos nas 117 fls, após o despacho daquele Juiz, e que este carimbo estaria sobreposto.

Foi então ouvido o advogado da parte contrária, diretamente interessado no processo e ele então confirmou que retirou os autos para contra arrazoar o agravo e que os carimbos e assinaturas da Dra Karina já existiam e estavam corretos. Mesmo assim, este Juiz convocado enviou o processo para uma perícia judicial, mas não em Brasília onde corre o processo e no qual, como advogado apresentei perito assistente, mas em cidade próxima a Campinas, para perito seu conhecido, tendo este peritado apenas uma página, em um total de 117, dizendo que talvez a tinta preta da Dra. Karina estivesse sobreposta à tinta azul da numeração das páginas. Desta decisão EM PROCESSO QUE CORRE EM SEGREDO DE JUSTIÇA E QUE, PORTANTO, NÃO PODE HAVER PUBLICIDADE SOBRE O MESMO, SOB AS PENAS DA LEI, estamos com vista do processo por cinco dias, para indicar nulidades e requerer a perícia do perito que se encontra com despacho já deferindo seus trabalhos. É só isto que está se discutindo. Não se discute nenhum ato ilegal, criminoso, ou falsificação, pois ninguém colocou em dúvida que as fotocópias são idênticas às copias originais. O que se discute é se eticamente a advogada teria colocado seu carimbo antes ou depois de numeradas as folhas nestas fotocópias.

O processo trata de reclamação de um empregado pedindo expurgos inflacionários sobre os quarenta por cento do FGTS, e seu valor não ultrapassa quinhentos reais, sendo que a matéria já é sumulada contra as empresas de todo o país. Portanto, mesmo se houvesse qualquer irregularidade no carimbo, o processo seria perdido pela empresa, o que torna absurda a tese de ser carimbado indevidamente. Acho que, dessa forma, fica bem esclarecida a matéria, sendo de se estarrecer que alguém do Poder Judiciário tenha vazado notícias públicas de um processo que corre em segredo de justiça.

Atenciosamente, José Alberto Couto Maciel.

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