Partes iguais

Tribunal do Júri: advogado quer ficar à altura do promotor

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7 de novembro de 2005, 15h29

A posição do promotor de Justiça, ao lado direito do juiz, na hora do julgamento, causa desigualdade entre as partes. Por entender assim, o advogado Edson Pereira Belo da Silva contesta na Vara do Júri da Comarca de Guarulhos (SP), a disposição do Plenário do Júri. Pede ao juízo que no dia do julgamento de seu cliente, em fevereiro de 2006, a promotoria e a defesa ocupem espaços em igualdade de condições.

Segundo o advogado, a disposição da bancada de acusação, quase ombro a ombro com o juiz, por si só, é capaz de influenciar a convicção do jurado. Ao ver o promotor ao lado do juiz, o jurado pode ser levado a interpretar que o promotor é uma espécie de auxiliar do juiz-presidente e por isso pode ter razão no que pede.

Belo da Silva afirma ainda que a disposição beneficia nitidamente a promotoria, “contraria os princípios da isonomia, da igualdade processual e da paridade de armas; como se não bastassem as algemas, as vestes de presidiário e o banco dos réus, que já desequilibram as partes”.

O defensor pede para que o juiz titular da Vara do Júri, quando do julgamento do seu cliente, em 15 de fevereiro de 2006, às 13 horas, adote uma disposição igualitária para ambas as partes, a acusação e a defesa.

Leia o pedido do advogado

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DO JÚRI DA COMARCA DE GUARULHOS – SP.

Autos: n.º 305/2003.

RUI BARBOSA: Com a lei, pela lei e dentro da lei porque fora da lei não há salvação!!!

EDSON PEREIRA BELO DA SILVA, defensor constituído adiante assinado, e NELSON FELICIANI NETO, acusado nos autos da presente Ação Penal Pública Incondicionada que lhe move a JUSTIÇA PÚBLICA paulista, vêm, com fundamento no artigo 5.º, caput, e inciso XLI, da Constituição Federal, artigos 6.º, caput, e 7.º, inciso XI, da Lei 8.906/94 e demais disposições aplicáveis à espécie, perante Vossa Excelência, tendo em vista as ofensas a garantia da isonomia e igualdade processual dos peticionários, REQUERER O QUANTO SEGUE:

As questões a que se referem os peticionários são: (i) a disposição física do plenário de julgamento em que a bancada da acusação é uma extensão da mesa do juiz que preside o julgamento; (ii) o uso desnecessário de algemas no acusado primário; (iii) e o uso inoportuno ou obrigado das vestis próprias do Sistema Penitenciário no dia de julgamento do acusado. Julgamento designado para o dia 15 de fevereiro de 2006, às 13h.

I – DA DISPOSIÇÃO FÍSICA DO PLENÁRIO DE JULGAMENTO QUE VIOLA OS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA PARIDADE DE ARMAS.

Ilustre magistrado, noto, há muito, que o membro do Ministério Público paulista se acomoda em uma posição física na disposição do Plenário de Julgamento que afronta a igualdade entre as partes, mas que ele, certamente, não precisa, porém não abre mão, por que, provavelmente, vem dela tirando algum proveito para influir a consciência dos jurados.

Vale dizer, que o simples fato de o órgão acusador assentar-se praticamente ao lado do juiz presidente – no mesmo móvel e a sua direita, destaque-se – faz crer aos jurados, sem sombra de dúvidas, que magistrado e promotor são uma só pessoa ou órgão, ou se trata da mesma equipe, situação absurda que viola gravemente o sagrado e consagrado princípio constitucional da isonomia. E o que mais nos indigna é que o órgão acusador não se toca, não percebe tal ofensa constitucional ou finge não perceber.

O argumento, ou tese, criado para sustentar o insustável diz encontrar apoio no artigo 41, inciso XI, da Lei n.º 8.625/93 (denominada de Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), que prever como prerrogativa do membro do Ministério Público, o assento à direta do juízo de primeiro grau, Presidente de Tribunal, Câmara ou Turma.

No entanto, a expressão acima sublinhada não pode ser interpretada de forma a violar o princípio maior em tela, como, não é de agora, vem ocorrendo. Sentar-se à direita não significa tomar assento ao lado ou do lado, sobretudo na mesma mesa de trabalho do magistrado que preside determinado julgamento, conforme vem se sucedendo há décadas.

O assento à direita deve ser interpretado como uma forma apenas de demonstrar que aquele profissional do direito que ali assenta foi quem deu início ao processo, isto é, promoveu a ação judicial em curso. Tal exegese aplica-se tanto no âmbito do processo civil como no processo penal, desde que o Ministério Público seja parte.

Importante enfatizar, que em duas Comarcas deste Estado, JACAREÍ e SANTO ANDRÉ — onde este defensor-peticionário já esteve atuando —, foi possível verificar detalhadamente que a disposição do Plenário de Júri era totalmente distinta da que existe nesta Comarca de Guarulhos. Em Jacareí, as bancadas de acusação e de defesa ficam de frente para a mesa da presidência do julgamento, no típico estilo americano tão conhecido. Já em Santo André as mesmas bancadas estavam dispostas lateralmente a do presidente, porém afastadas o suficiente.


Esta última disposição citada lembra muito àquela que ainda existe no Tribunal do Júri do Palácio da Justiça da Praça da Sé, que hoje serve de visitação, pois integra o acervo do Museu do Tribunal de Justiça do Estado, valendo ressaltar que tal Tribunal Popular foi desativado em 1988, consoante informação encontrada no próprio “site” (“www.tj.sp.gov.br”, “link” Museu da Justiça).

A disposição física do Plenário de Julgamento, como é cediço, fica a cargo do juiz presidente, inexistindo Lei — e não ato administrativo —, que regule tal questão de ordem estrutural; de maneira que nada impede que este r. juízo possa modificar a atual estrutura para atender ao preceito constitucional invocado, equilibrando as armas entre as partes.

Da forma que está atualmente, não só ofendendo a aludida garantia, como também servindo de meio para que o acusador possa, eventualmente, influir na consciência dos jurados, deixa a defesa no patamar inferior ou menor aos olhos dos juízes do fato, sobremaneira pela notoriedade circunstancial de o defensor e o acusado assentar-se na ESQUINA DAS AVENIDAS IPIRANGA COM A SÃO JOÃO.

Deixa transparecer, indiretamente, que a defesa e seu defendido são inferiores, são da escória e que a defesa não compõe a tríade do direito. Não é esse o tratamento do qual somos merecedor. É claro que O juízo jamais pensou em permitir tal tratamento, muito pelo contrário; porém, não consegue entender os peritos, e muito menos dos leigos, o motivo para que o acusador esteja assentado na mesma mesa da presidência do julgamento — ombro a ombro —, todavia, à direita.

Ademais, o douto acusador sabe muito bem fazer um bom uso da circunstância que lhe é favorável, mantendo constantes conversa quase que no ouvido do magistrado togado, intrigando de alguma forma os jurados, que se distraem e ficam curiosos para saberem o teor da conversa. Isso é não é bom para o julgamento, tanto que pode influenciar na decisão do jurado.

O Ministério Público não precisa manter tal privilégio, até porque possui excelentes tribunos que, por vezes, sabem fazer a diferença na Tribuna, de maneira que deveria ser ele o primeiro a exigir a eliminação da absurda disparidade da qual vem se beneficiando a longos anos, e, salvo melhor juízo, faz questão de manter.

Imaginamos: Qual seria a posição do órgão ministerial se fosse o contrário? Ou seja, a defesa se assentaria bem ao lado do juiz presidente, sob alegação de que ela é a parte mais fraca na relação processual penal comparando-se ao poder e a estrutura do Estado postos à disposição do Ministério Público.

Entretanto, nós não almejamos isso, senão equilíbrio de armas entre as partes que contendem em processo onde está em jogo a liberdade de uma pessoa.

É verdade que mesmo com essa patente desvantagem, muito defensores têm conseguido aprovação de suas teses perante o Conselho de Sentença; contudo, se há desigualdade ou ofensa a direitos, tal superação deste ou daquele obstáculo pouco importa.

É preciso ter em mente que o Ministério Público, na esfera criminal, notadamente nas ações penais públicas, atua como parte e não como fiscal da lei. Portanto, a nosso ver, a exegese do inciso XI, do artigo 41 da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, é no sentido de que o assento à direita do Juiz só se justifica quando o membro do “parquet” atuar como “custos legis”.

Há que se enfatizar, também, que a desigualdade em referência afronta, gravemente, as prerrogativas do defensor-advogado, posto que a disposição física atual do Plenário de Julgamento o deixa em um alto grau de inferioridade para com o acusador, fazendo presumir — aos olhos dos jurados, principalmente, e do público leigo presente — que existe certa hierárquica ou subordinação, o que é vedado pelo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 6.º, caput, da Lei n.º 8.906/94).

Em outros termos, sem querer afirmar que é a intenção do juízo, o defensor não está em pé igualdade com a acusação nas condições aqui retratada, tanto que a sua bancada fica, ao mesmo tempo, distante do Conselho de Sentença e da presidência do julgamento; ao passo que em relação ao acusador a situação é inversa.

Como visto, o acusador é colocado destacadamente na disposição física atual do Plenário, sobrepondo-se ao defensor e ao acusado.

Eis aí a razão pela qual o defensor ingressa, também, como requerente neste petitório.

01. POSIÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA.

Após o delineamento das simplórias razões sobreditas, oportuno trazermos à tona o entendimento jurisprudencial sobre o tema, antes mesmo do doutrinário. Note-se.

O egrégio SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, em acórdão da lavra do eminente Ministro MARCO AURÉLIO (2.ª T. – RMS n.º 21.884-DF – j. 17.05.94, v.u.), já em 1994, enfrentará semelhante questão, pelo que colacionamos parte da ementa do citado julgado, bem como os trechos pertinente ao caso: “DEVIDO PROCESSO LEGAL – PARTES – MINISTÉRIO PÚBLICO E DEFESA – PARIDADE DE ARMAS. Acusação e defesa devem estar em igualdade de condições, não sendo agasalhável, constitucionalmente, interpretação de normas reveladoras da ordem jurídica que desague em tratamento preferencial. A ‘par condicio’ e inerente ao devido processo legal (ADA PELLEGRINI GRINOVER)”.


Desenvolvendo brilhante raciocínio no aludido acórdão, continua o Ministro, agora citando parecer de eminente processualista:

“…Por isso mesmo, a proficiente Professora de Direito Processual Penal da Universidade de São Paulo – Dra. Ada Pellegrini Grinover – sublinhou no parecer de folhas 208 a 232 que as partes devem contar com a paridade de armas (‘par condicio’), a fim de que a igualdade de condições prevaleça, mantendo-se o equilíbrio indispensável à atuação parcial, é certo, que exercem no processo. Eis um trecho elucidativo:

‘Vê-se daí que a Lei Processual Penal Militar revela o maior cuidado para com a situação de paridade das partes e com a eqüidistância que ambas devem manter em relação ao órgão judicante. Este, em bancada única, há de permanecer fisicamente reunido, até porque, inexistindo incomunicabilidade entre os Juízes, os leigos podem valer-se do Juiz-Auditor para o esclarecimento de questões de ordem jurídica, assim como o Juiz Togado pode valer-se dos demais membros do Conselho de Julgamento para dirimir eventuais dúvidas ligadas à vida militar – item 14 de folha 222’.

…No particular, bem lembrou a consagrada processualista que o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, no inciso XIII do artigo 89, preceitua que o advogado deve tomar assento à direita dos juizes de primeira instância e isto jamais ocorreu em termos peremptórios, advertindo que as leis complementares próprias às instituições indispensáveis à feitura da justiça — e está para vir à balha a da Defensoria Pública — devem dispor para além de vaidades corporativas, refletindo a magnitude dos ofícios que devem desenvolver. Membros do Ministério Público e advogados estão em igualdade de situação, não havendo como cogitar de tratamento preferencial que acabe por colocar em jogo a idéia de independência que deve ser nutrida em relação aos Órgãos julgadores. Especialmente nos Órgãos Colegiados que funcionem mediante bancada única e em que há a participação de leigos, como é o caso dos Conselhos da Justiça Militar, a alínea “a” do inciso I do artigo 18 tem o sentido de revelar que ao Ministério Público será reservado assento especial, tal como à defesa”.

Já o egrégio SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA deixou assente (HC n.º 18.166/SP, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, Rel. p/ Acórdão Ministro HAMILTON CARVALHIDO, 6.ª TURMA, j. 19.02.2002, DJ 24.02.2003, p. 308) que nas ação penais públicas o Ministério Público é sempre parte. Vejamos a ementa:

“HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CONTRADITÓRIO, AMPLA DEFESA E DEVIDO PROCESSO LEGAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. INVERSÃO NA ORDEM DAS FALAS EM PLENÁRIO. PREJUÍZO CARACTERIZADO. ORDEM CONCEDIDA. 1. As atribuições de ‘custos legis’ tem-nas sempre o Ministério Público, qualquer que seja a natureza da função que esteja a exercer – enquanto lhe decorre da própria natureza da instituição, cumulando-as com aqueloutras de ‘parte’ no processo penal da ação pública, incindivelmente por razões evidentes. 2. O Ministério Público, nos processos de ação penal pública, que lhe incumbe promover, privativamente, como função institucional (Constituição da República, artigo 129, inciso I), é sempre parte, mesmo no grau recursal, em que ocorre o fenômeno da sucessão de órgãos na posição do autor na relação processual.3. Viola os princípios constitucionais do contraditório e do devido processo legal, com iniludíveis reflexos na defesa do paciente, a inversão das falas das partes em sessão de julgamento de recursos (Precedentes). 4. Ordem concedida para anular o julgamento de recurso em sentido estrito, determinando-se que outro se proceda”.

Mas, até aqui, quem enfrentou mesmo a matéria tratada neste item foi egrégio TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO, notadamente na sua 7.ª Câmara Criminal, em acórdão da lavra do ilustre Desembargador EDUARDO MAYR (Mandado de Segurança 35/2004 – Reg. em 28/04/2005 Arraial do Cabo. j. 03/11/2004), que está assim ementado:

“JURI. ASSENTO DO M.P. ALTERACÃO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. PREVALÊNCIA DA MAIORIA. Mandado de segurança. Assento do M.P. como parte autora. Denegação do ‘writ’. A alteração da disposição da sala de audiências em Tribunal do Júri com remoção do assento do Ministério Público para posicioná-lo no mesmo patamar do assento da Defesa, não importa em violação da prerrogativa funcional traduzida pelo posicionamento à direita do seu Presidente à vista da disposição do art. 41, XI da Lei Federal 8625/93 (L.O.M.P.) e, ‘ipso facto’, do art. 82, X da Lei Complementar Estadual 106/03, mas, ao contrario, atende à norma constitucional que assegura às partes, em processo judicial penal, tratamento isonômico. A plenitude e a efetividade do ‘equilíbrio de armas’ no contraditório justificam a necessidade de o Juiz envidar todos os meios necessários para evitar que a disparidade de posições cênicas possa influir no êxito de uma demanda penal, condicionando-o a uma distribuição desigual de forcas, pois a quem acusa e a quem se defende em Juízo, notadamente no Tribunal do Júri, devem ser asseguradas às mesmas possibilidades de sucesso na obtenção da tutela de suas razões. Inexistência de direito liquido e certo a ser amparado pela via mandamental. Precedentes citados: STJ – HC 18166/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, julgado em 19/02/2002. STF – RMS 21884/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 17/05/1994”.


Ainda no que concerne ao julgado sobredito do Pretório estadual carioca, oportuno, de igual forma, transcrever alguns pontos substanciais que nela constam:

“Além do seu papel clássico, de ser o fiscal da boa e plena aplicação da lei, velando pelo mais rigoroso da Constituição Federal e da norma infraconstitucionais, sua imagem, na esfera penal, ainda permanece fortemente atrelada a associada posição de acusador público, o Promotor Público, com felicidade transmudado em Promotor de Justiça”…

“A par destas relevantíssimas funções institucionais, remanesce o Ministério Público, contudo, jungido, à função primeva de acusador em sede penal. Talvez, em futuro, se desvinculem estas duas funções que hoje são híbridas:

‘ — Ministério Público, parte autora, acusadora.

— Ministério Público, fiscal da lei, defensor.’ ”

“Se um de um lado, como instituição e como fiscal da boa aplicação lei, merece o Ministério Público a prerrogativa de um lugar adequado, ao lado do julgador. Mas no momento em que ele passa a atuar como parte no processo, haverá que se equiparar à parte adversa. Este princípio de igualdade é sinônimo de justiça, e transcende igualdade formal, mero reconhecimento de que haverá que existir equilíbrio entre as partes, mas o reconhecimento das desigualdades e sua ‘igualização’, eis que o princípio da isonomia tem dimensão dupla, estática e dinâmica: estática, quando a lei anota a igualdade de todos perante a lei de modo formal; e dinâmica, quando o estado assume o compromisso de constatar as desigualdades, criando mecanismo para supri-las, transformando a igualdade em real”.

“O princípio da isonomia não admite que o magistrado mantenha posição complacente, com uma visão puramente formal do princípio, pois se constatar a existência de desigualdade entre as partes, deve atuar de forma concreta e efetiva, promovendo a referida ‘igualização’”.

“Em sede criminal, em julgamento pelo Tribunal do Júri, em que é assegurado constitucionalmente ao Conselho de Sentença decidir com soberania, deverão as partes – acusação e defesa – posicionarem-se em igualdade de condições, ou na expressão consolidada, em ‘paridade de armas’. E é aí de todo recomendável que o membro do ‘parquet’ reconheça que, neste contexto, não poderá sobrepor mediante compreensível ‘temor referencial’ dos destinatários, a sua condição pessoal transcendendo a da Defesa, pois a real igualdade das partes, no processo penal, é um valor a ser observado sempre”.

Vale ressaltar, que seguem cópias anexas e integrais dos julgados citados, salvo o do Superior Tribunal de Justiça, que segue somente a ementa, daí ser desnecessário continuar com a transcrição.

Percebe-se, assim, que os princípios da isonomia e o da paridade de armas, não podem ser desprezados – nem mesmo por norma infraconstitucional, e menos ainda por ato ordinário administrativo –, dando lugar a eventuais vaidades pessoais do acusador, que, há muito, no sentido aqui exposto, tirar proveito da situação, além de não mover uma palha para torna igual o desigual.

02. ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO.

Passemos, agora, a desfilar as lições e ensinamentos de doutrinadores de renome, as quais reforçam ainda mais as teses argüidas pelos peticionários.

O princípio da igualdade constitui o signo fundamental da democracia. Ele não admite os privilégios e distinções que um regime simplesmente liberal consagra. “Por isso é que a burguesia, cônscia de seu privilégio de classe, jamais postulou um regime de igualdade tanto quanto reivindicara o de liberdade. É que o regime de igualdade contraria seus interesses e dá à liberdade sentido material que não se harmoniza com o domínio de classe em que assenta a democracia liberal burguesa”. Lição do eminente constitucionalista JOSÉ AFONSO DA SILVA.(1)

MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, outro constitucionalista consagrado, assevera que “o princípio de isonomia que a Constituição faz o primeiro desdobramento nos direito fundamentais é de alta significância política, particularmente numa democracia. Os gregos, aliás, consideravam a igualdade perante a lei um dos essenciais e caracterizadores do governo democrático”. (2)

Não custa lembra, ainda, o ensinamento do saudoso professor ANACLETO DE OLIVEIRA FARIA, o qual pregava que “o princípio de igualdade aplica-se de modo geral e indistinto quer ao Poder Público, quer aos particulares. Não constitui, pois, uma regra apenas voltada contra o Estado, mas, também, estatuída em relação aos homens considerados em suas relações privadas”. (3)

E, da mesma forma, é o magistério do insigne GERALDO ATALIBA: (4) “Princípio constitucional fundamental, imediatamente decorrente do republicano, é o dá isonomia ou igualdade diante da lei, diante dos atos infralegais, diante de todas as manifestações do poder, quer traduzidas em normas, quer expressas em atos concretos. Firmou-se a isonomia, no direito constitucional moderno como direito público subjetivo a tratamento igual de todos os cidadãos pelo Estado”.


Por sua vez, o preclaro professor CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELO, com a mestria que lhe é peculiar, conclui: “Com efeito, a igualdade é princípio que visa a duplo objetivo, a saber: de um lado proporcionar garantia individual (não é sem razão que se acha insculpido em artigo subordinado à rubrica constitucional ‘Direito e Garantias Individuais’) contra perseguições e de outro, tolher favoritismo”. (5)

Após essas singelas considerações preliminares, típicas do ordenamento constitucional, podemos afirma que o aludido princípio também possui uma especificidade própria quanto aos demais ramos do Direito, bem como em relação a outras disciplinas das ciências humanas e sociais, dando assim o tom da sua dimensão. Por exemplo: igualdade tributária, igualdade penal, igualdade trabalhista, igualdade processual ou jurisdicional, igualdade política, igualdade social, igualdade racial, igualdade religiosa, etc.

Nesse passo, é a igualdade processual, aliada a absurda “disparidade de armas”, que nos aflige e, sobretudo, nos deixa inconformado, segundo já expusemos.

O princípio da isonomia processual, que se insere no devido processo legal, garantia constitucional (artigo 5.º, inciso LIV, da CF), possui o seu relevo específico no ordenamento processual contemporâneo, sobremaneira com o intitulado Processo Penal e Civil Constitucional nascidos da Carta da República de 5 de outubro de 1988, introduzindo, assim, substancias alterações e reformas no Direito Processual pátrio, como é do conhecimento dos operadores do direito.

Destarte, a aludida igualdade processual não é um tema inédito, mas uma questão que, há muito, é enfrentada com muitos sacrifícios e, principalmente, inteligência. É o que se nota do magistério de excelência da professora ADA PELLEGRINE GRINOVER, (6) onde encontramos a lição de que “o direito de ação e de defesa liga-se teleologicamente ao princípio da isonomia. A igualdade perante a lei é premissa para afirmação de igualdade perante o juiz”.

Em outras palavras, a igualdade jurisdicional é necessária entre as partes. De modo que tal ensinamento pode ser acrescido àqueles transcritos nos acórdãos do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (que seguem anexos), sobre os quais este r. juízo deve refletir também.

No que diz respeito, entretanto, à paridade de armas a renomada processualista, acompanhando as novas tendências do processo, assevera: “entende-se, modernamente, por ‘par condicio’ ou ‘igualdade de armas’, o princípio de equilíbrio de situações, não iguais mais recíprocas, como o são, no processo penal, as dos ofícios da acusação e defesa”. (6-A)

ROGÉRIO LAURIA TUCCI e JOSÉ ROGÉRIO CRUZ E TUCCI, em comento as aspecto processualístico trazido pela Constituição em vigor, asseveram que: ”Por via de conseqüência, a qualquer dessas funções estatais, especialmente a judiciária, não é dado estabelecer privilégios, nem discriminações, sejam quais forem as circunstância, devendo tratar equitativamente todos os cidadãos: ‘este é o conteúdo político-ideológico absolvido pelo princípio da isonomia e juridicizado pelos textos constitucionais em geral, ou de todo modo assimilado pelos sistemas normativos vigentes’”. (7)

A mesma dupla de professores da disciplina Direito Processual, citados anteriormente, e em obra de fôlego (8) a despeito do devido processo legal e penal, no qual se insere a isonomia processual, deixam assente que naquela é preciso se assegurar à paridade de armas para se obter a tão desejada igualdade substancial.

Na realidade, sob o nosso ponto vista, está-se a concluir, e acertadamente, que o tratamento dispensado aos sujeitos parciais do processo – para nós o processo penal – deve ser paritário, por que deflui da garantia constitucional sobredita de onde se extrai o devido processo penal.

Em obra particular de porte, ROGÉRIO LAURAI TUCCI, cotejando os direitos e garantias individuais no processo penal, notadamente a “igualdade de armas”, revela que “a isonomia processual, por sua vez, reclama que aos sujeitos parciais sejam concedidas as mesmas armas, afim de que paritariamente tratadas, tenham idênticas chances de conhecimento, satisfação ou asseguração do direito que constitui objeto material do processo”. (9)

Ainda trilhando pela via doutrinária, buscamos concluir este item citando dois membros do MINISTÉRIO PÚBLICO, FEDERAL e do ESTADO – para não dar ensejo a ilações de que somente professores e advogados pensam da forma aqui expendida – os quais lecionam, sustentam e compartilham, também, da efetiva necessidade das partes possuírem as mesmas armas no duelo processual.

Na linha de pensamento acima anunciada é o escólio do ilustre professor da Universidade de São Paulo ANTONIO SCARANCE FERNANDES (10) (procurador de justiça aposentado): “Como salientado, em duas direções manifesta-se o princípio da igualdade no direito processual: dirige-se aos que se encontram nas mesmas posições do processo – autor, réu, testemunha –, garantindo-lhes idêntico tratamento; dirige-se, também, aos que estejam nas posições de autor e de réu, assegurando-lhes idênticas oportunidades e impedindo que a um sejam atribuídos maiores direitos, poderes, ou impostos maiores deveres ou ônus do que a outro”.


O sobredito processualista, membro do Ministério Público do Estado de São Paulo, frisa ainda que a acusação, normalmente, está afeta ao órgão oficial, tendo este todo o aparelho estatal, organizado, ao seu inteiro dispor, ao passo que o acusado conta apenas com as suas próprias forças e o auxílio de seu defensor. (11)

Já Paula BAJER FERNANDES MARTINS DA COSTA (procuradora da república em São Paulo), defendo profunda tese de doutorado, justamente sobre a igualdade no direito processual penal, (12) sustentou: “O que desperta a atenção, nesse contexto, é a possibilidade de a relação entre a igualdade e justiça conduzir a concepção de justiça processual. Só há justiça processual – devido processo legal – quando há igualdade no modo como a jurisdição contempla os interesses em conflito. A jurisdição penal só é exercida efetivamente quando há igualdade”.

Quanto à igualdade de armas, também no processo penal, a ilustre doutora foi categórica ao sustentar que seria “melhor admitir, portanto, que paridade de armas está ausente no processo penal”. (13)

Depreende-se, portanto, das teses aqui argüidas que estar-se discriminando ou atentando contra direito fundamental (artigo 5.º, inciso XLI, da CF) que, não custa assinalar, é vedado pela Lei.

Desta forma, entendemos que é dever não só legal, mas, sobretudo, institucional, do magistrado em corrigir as desigualdades existentes no processo como um todo.

Não obstante, seria o caso de até mesmo o próprio Ministério Público ser razoável. Isto é, atender o princípio da razoabilidade, já que como também é fiscal da lei é do seu mister pugnar pela justa e igualdade processual.

Ainda em relação ao sagrado e consagrado princípio da razoabilidade, analisa-o, com profundidade, o constitucionalista LUIZ ROBERTO BARROSO (14), pelo que oportuno à transcrição do seu pensamento: “O Princípio da razoabilidade é um parâmetro de valoração dos atos do Poder Público para aferir se eles estão informados pelo valor superior inerente a todo o ordenamento jurídico: a justiça. Sendo mais fácil de ser sentido do que conceituado, o princípio se dilui em um conjunto de proposições que não o libertam de uma dimensão excessivamente subjetiva. É razoável o que seja conforme a razão, supondo equilíbrio, moderação e harmonia; o que não seja arbitrário e caprichoso; o que corresponda ao senso comum, aos valores vigentes em dado momento ou lugar” (grifo nosso).

É preciso, mais uma vez, ser enfático e lembrar que inexiste hierarquia entre advogado, juiz e promotor de justiça, a teor do artigo 6.º, caput, da Lei 8.906/94; de sorte que vislumbra-se daí, de forma cristalina, a isonomia de tratamento entre tais profissionais o direito, a qual, no caso vertente, vem sendo esquecida ou deixada de lado.

Concluímos como iniciamos no rosto desta peça, com a eterna e saudosa intelectualidade de RUI BARBOSA: “Advogado sou, há cinqüenta anos, e, já agora, morrerei advogado. Na missão do advogado também se desenvolve uma espécie de magistratura. As duas se entrelaçam, diversas nas funções, mas idênticas no objeto e na resultante: a justiça. Com o advogado, justiça militante. Justiça imperante, no magistrado. Legalidade e liberdade são as tábuas da vocação do advogado”. (15)

II – DO PEDIDO.

Posta assim a questão, diante das singelas razões expendidas, requer-se a Vossa Excelência, após manifestação do membro do órgão ministerial, que no dia 16 de fevereiro de 2006, às 13h, data do julgamento pelo Júri, seja alterada a disposição física do mobiliário do Plenário do Júri no sentido de igualar as bancadas da acusação e defesa, de preferência que as mesmas fiquem postadas defronte para a mesa da presidência do julgamento, nos moldes americano, podendo, aí sim, a acusação alojar-se à direita e a defesa à esquerda, porém ambos de frente para o juiz presidente.

Cumpre ressaltar, que a forma disposta acima fica a critério do magistrado. Foi somente uma sugestão prática que é possível em razão do espaço existente, cujo qual já é do nosso conhecimento. Entretanto, pode se dar de outra forma, desde que atendido os princípios aqui almejados.

Imaginamos, assim, que com isso se estabeleça a igualdade, inclusive no que tange à advocacia.

Em sendo outro o entendimento deste r. juízo – o que não acreditamos – aguardamos a devida motivação da r. decisão, nos termos da do novo magistério do professor ANTONIO MAGALHÃES GOMES FILHO, (16) requerendo, desde já, que conste a expressa autorização, tão-somente, para extração de cópias, por 30 minutos.

Renovamos o mesmo pedido acima, agora em forma de versos.

No plenário de julgamento,

Após formular um convencimento,

Os jurados dizem que tem razão

Se defesa ou a acusação.

Mas para tanto,

Precisa saber

Que promotor e advogado

Assentam-se no mesmo banco.

O primeiro na bancada da acusação

E segundo na da defesa,

Ambos buscando convencer

O conselho de sentença

Da condenação ou absolvição.

A igualdade prevista constitucionalmente

Impera entre as partes,

De modo que no processo

Não pode ser diferente.

Qualquer privilégio no júri afronta a lei

E envolve a consciência dos jurados,

Os quais não devem ser afrontados,

Fazendo-os crer que uma das partes é rei.

As partes são iguais,

Inclusive em armas,

Nos termos da norma,

Entretanto, na prática são desiguais.

A jurisprudência também já confirmou

E doutrina não destoou,

Todavia, o que se vê é a inaplicação

Da regra que o vento não levou.

Espanta-nos a desigualdade apontada,

Apesar do acusador não fazer nada,

Por que pode sentir-se desigual,

Caso venha eliminá-la.

São tantos os fundamentos

Para se adotar a igualdade no plenário,

Contudo, para quê isso,

Se o órgão acusador

Tira proveito de tal cenário.

Quando isso acontece

A liberdade se mostra ameaçada,

Devendo o juiz presidente intervir,

Antes que a igualdade seja sepultada.

Adotar medida para suprir privilégio

Mesmo contrário à convicção ministerial,

Não é um sacrilégio,

Senão uma atitude de justiça,

Há muito, ensinada pelos jesuítas.

Tal desigualdade,

Viola prerrogativa dos advogados,

Que defendo direitos da nação,

Contra os militares,

Muito foram exilados e executados.

Na Constituição o advogado

É indispensável à administração da justiça,

O que é muito mais do que conquista,

Mesmo ainda enfrentando

Situação nada positivista.

Não almeja o defensor

Se assentar também na mesa do juiz,

Como ocorre com o acusador,

Apenas pleiteia aquilo que a lei diz.

Portanto, se requer a adoção da igualdade,

Com base também na razoabilidade

Posta na Constituição Federal,

Fonte de democracia e liberdade.

Requer deferimento.

Guarulhos, 03 de novembro de 2005.

EDSON PEREIRA BELO DA SILVA

Advogado – OAB/SP nº 182.252

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