Início da vida

OAB-SP critica ação contra pesquisa com embriões

Autor

31 de maio de 2005, 21h53

Márcia Regina Machado Melaré, vice-presidente da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, contestou a posição do procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, sobre a utilização de células-tronco de embriões em pesquisas.

Fonteles impetrou Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal contra o artigo da Lei de Biossegurança que autoriza o uso de células-tronco de embriões humanos congelados para pesquisas científicas ou tratamentos de doenças degenerativas.

“A vida no ser humano existe somente se as funções cardíacas e cerebrais estão em funcionamento simultâneo e regular. Sob esta ótica, não basta a pessoa estar com o coração batendo para dizer que está viva. Ao contrário, a Lei de Transplante de órgãos declara morta a pessoa que, mesmo com atividade cardíaca, tem constatada a sua morte encefálica”, afirmou a vice-presidente da OAB-SP.

Segundo Márcia, “esse critério para a definição do momento da morte, para fins de doação de órgãos, absolutamente pragmático, deve servir de orientação para a definição do início da vida, em termos legais. Nesse sentido, o embrião humano, ainda sem atividade encefálica, pode ser utilizado para pesquisas científicas em prol de outras vidas humanas”.

Para a vice-presidente da OAB-SP deve haver um amplo debate sobre o momento do início da vida, pois o desenvolvimento científico está a desafiar antigos dogmas a respeito do tema. “Os biólogos são quase unânimes ao afirmar não existir definição científica formal para quando começa a vida. Existem mais de 16 critérios viáveis para definir o início da vida. Alguns cientistas sustentam não existir vida fora do útero, portanto, os embriões congelados, fertilizados in vitro, não estariam caracterizados como seres vivos. Outros aplicam o critério instituído para definir o momento da morte para definir o início da vida: ou seja, pautam-se pela constatação da existência de atividade cerebral no feto para o início da vida. Ainda, para alguns, o momento do início da vida ocorre na fecundação, enquanto para outros, somente quando o feto pode ter vida independente da mãe”, afirma Márcia Melaré.

Ainda na opinião da vice-presidente da OAB-SP, os critérios religiosos sobre o tema vêm sendo alterados conforme os rumos filosóficos da ocasião. “Nos primeiros séculos da Era Cristã, o abortamento até era aceito antes do momento da ‘hominização’, ou seja, da aquisição da alma. Nessa concepção, a infusão da alma não ocorria em fetos, mas somente quando a matéria estivesse suficientemente organizada para dar suporte à alma. Os escritos de Santo Agostinho demonstram que a Igreja condenava a conjunção carnal sem procriação, mas não entendiam o aborto como homicídio até 40 dias após a fecundação”.

Márcia também rebate o argumento de Fonteles de que a pesquisa com células-tronco embrionárias “inobserva a inviolabilidade do direito à vida, porque o embrião humano é vida humana, e faz ruir fundamento maior do Estado democrático de direito, que radica na preservação da dignidade da pessoa humana”.

O presidente da Comissão Bioética, Biotecnologia e Biodireito da AOB-SP, Erickson Gavazza Marques, concorda com Márcia e considera a Ação do procurador-geral descabida. “A Constituição Federal não diz o que é vida e não há consenso de que o embrião é pessoa com vida e que, portanto, pode fazer uso das prerrogativas conferidas pela lei. Se a Medicina não chegou a um consenso sobre quando começa a vida, que dirá o Direito”, defende Marques.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!