Meio ambiente

Câmara votará projeto de lei sobre gestão de florestas

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30 de maio de 2005, 19h44

A pauta da Câmara dos Deputados prevê para a sessão desta terça-feira (31/5) a votação do projeto de lei que pretende regulamentar a gestão de florestas públicas. Uma das bandeiras da ministra do Meio Ambiente Marina da Silva, a proposta de emenda constitucional 4.766/05 prevê, entre outros aspectos, a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal e do Serviço Florestal Brasileiro.

Em seu lado polêmico, o projeto prevê a concessão de manejo para empresas privadas mediante licitação e pagamento, a dispensa do EIA-Rima — Estudo de Impacto Ambiental e da licença ambiental para as concessões florestais. Para o presidente da ANPR — Associação Nacional dos Procuradores da República Nicolao Dino, o projeto é “inconstitucional e um grave retrocesso no campo da proteção ambiental”. De acordo com nota enviada à imprensa, a entidade fará representação ao Ministério do Meio Ambiente.

Leia a íntegra da nota da ANPR

Por proposta e insistência do Ministério do Meio Ambiente — do Doutor Tasso Azevedo, Diretor de Florestas, e que afirma falar, especificamente quanto a esse ponto, em nome do Secretário Capobianco e da própria Ministra Marina Silva — o texto do Relator (Deputado Beto Albuquerque) dispensa, de forma expressa e “no atacado”, o EIA-RIMA nas concessões florestais, qualquer que seja a área (a média, comenta-se, ficará em torno de 200 mil hectares), o ecossistema, o número de espécies ameaçadas de extinção ou a proximidade com reservas indígenas ou Unidades de Conservação.

Como se pode ver abaixo, na Seção V, do Projeto de Lei , os atentados à Constituição Federal são vários, numa linha de frontal incompatibilidade com as políticas tradicionais do Ministério do Meio Ambiente, dos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente e com a própria história das lideranças da Instituição.

Primeiro, o PL dispensa a licença ambiental para as concessões florestais em si mesmas, falando apenas em “anuência prévia”. A licença, se exigível, o será apenas para “rodovias, instalações industriais, empreendimentos turísticos, de urbanização”.

Ou seja, licença ambiental para equipamentos, anuência prévia do órgão ambiental para a concessão per se. Uma inversão absoluta de valores e de sistema jurídico, pois exige-se a licença para o acessório (os equipamentos) e libera-se de sua exigibilidade o principal, a concessão.

Segundo, mais grave ainda, em surpreendente violação ao texto da Constituição Federal, dispensa-se o EIA-RIMA, em qualquer hipótese, para as concessões, pois dele se cuida “para os empreendimentos referidos no § 6º”.

Vale dizer, novamente, determina-se o EIA para rodovias, instalações industriais, e outros “empreendimentos”, mas não para o “empreendimento principal”, a nave-mãe, por assim dizer.

Enquanto que para os acessórios, o EIA será de rigor, no caso do “principal”, bastará um tal de “estudo de viabilidade socioambiental”, documento este desconhecido do Direito Ambiental brasileiro, e que, por ser heterodoxo, só criará disputas judiciais de interpretação, levando àquilo que a Ministra Marina e o Secretário Langone denominam a “judicialização do meio ambiente”. Não seria melhor chamá-lo de Relatório Ambiental Preliminar, termo já comum na legislação?

Há, aqui, inegável ofensa ao texto constitucional, pondo-se no lixo o art. 225, par. 1o, inciso IV, da Constituição Federal, que determina a elaboração de EIA, em qualquer atividade econômica, pública ou privada, desde que haja risco de “significativo impacto ambiental”.

Dois argumentos principais estão sendo utilizados pelo Ministério do Meio Ambiente : a) que o EIA inviabilizaria as concessões (como se a CF exigisse o EIA para qualquer tipo de concessão, o que não é o caso); b) que os impactos serão analisados e tratados no Plano de Manejo.

Dois redondos equívocos. Primeiro, porque o argumento a) também é utilizado pelo setor produtivo privado, e nem por isso deixamos de exigir o EIA-RIMA; segundo, porque a CF não reconhece o Plano de Manejo como substituto do EIA-RIMA.

Estaremos abrindo o caminho para que outros setores — como mineração, transporte e energia – exijam tratamento semelhante. Ficará difícil negar. Mais ainda quando, para o setor agropecuário, empreendimentos acima de 1.000 hectares exigem EIA-RIMA. Dizer que as concessões florestais são melhores que o desmatamento da área é argumento válido; dizer que as concessões florestais, como regra, não exigirão EIA-RIMA, também é argumento válido; agora, dispensar o EIA-RIMA para toda e qualquer concessão florestais, é uma abandonar o papel do Ministério do Meio ambiente na defesa não só do meio ambiente, mas também da legalidade e constitucionalidade ambientais.

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