Diploma cassado

TSE cassa mandato do deputado estadual Vitor Sapienza

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25 de maio de 2005, 16h34

O ministro Marco Aurélio, do Tribunal Superior Eleitoral, cassou o mandato do deputado estadual Vitor Sapienza (PPS), de São Paulo. Ele foi acusado de captação ilícita de votos pela Procuradoria Regional Eleitoral do estado.

Segundo a denúncia, o deputado ofereceu curso de informática à população carente durante a campanha de 2002 à Assembléia Legislativa. A acusação aponta que no material didático e no certificado de conclusão do curso consta propaganda eleitoral: o nome do deputado e seu símbolo de campanha.

Na decisão, o ministro Marco Aurélio afirmou que “o material distribuído o foi com propaganda eleitoral explícita, lançando-se não só o cargo buscado como também o número de inscrição no certame”.

Segundo o ministro, testemunhas ouvidas no processo confirmaram o objetivo de obter votos em troca do curso oferecido: “a testemunha Glaudy Joaquina Lopes de Moraes deixou consignado em depoimento que ‘no início do curso uma professora de nome Regina fez uma colocação aos alunos que quisessem votar no representado poderiam fazê-lo, pois era ele quem patrocinava o curso’.”

A mesma testemunha afirmou que na entrega dos certificados, “um assessor foi explícito em pedir votos aos formandos para o representado” e que “no momento da conclusão do curso, foi entregue a camiseta contendo propaganda eleitoral”.

Procurado pela revista Consultor Jurídico, o assessor do deputado, Luiz Carlos Ladeia, não deu explicações sobre o caso. Disse apenas que “a promotoria do estado recorreu de decisão do Tribunal Regional Eleitoral e o advogado do caso perdeu o prazo no TSE”.

Leia a íntegra da decisão

RECURSO ORDINÁRIO No 882 – SÃO PAULO (SÃO PAULO).

RELATOR: Ministro MARCO AURÉLIO.

RECORRENTE: PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL DE SÃO PAULO.

RECORRIDO: VITOR SAPIENZA.

ADVOGADO: ANTÔNIO CARLOS MINGRONE.

R E L A T Ó R I O

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Senhor Presidente, eis como deixou o Tribunal Regional Eleitoral delimitados os parâmetros da decisão proferida:

EMENTA: MATÉRIA PROCESSUAL. PROVA ILÍCITA. GRAVAÇÕES CLANDESTINAS. INEXISTÊNCIA. REGISTRO EM ÁUDIO DE CERIMÔNIA REALIZADA DURANTE REUNIÃO ABERTA AO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE OPOSIÇÃO À GRAVAÇÃO. CONCESSÃO DE ENTREVISTA POR PARTE DE PREPOSTO DO REPRESENTADO. ATO QUE TRADUZ ANUÊNCIA INCOMPATÍVEL COM IDÉIA DE INTRUSÃO MORALMENTE ILÍCITA NA INTIMIDADE ALHEIA. ARGÜIÇÃO AFASTADA.

MATÉRIA ELEITORAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO (ART. 41-A DA LEI No 9.504/97). OFERTA E ENTREGA DE BENS E VANTAGENS PESSOAIS A ELEITOR. CURSO GRATUITO DE INFORMÁTICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO. ATIVIDADE FILANTRÓPICA EXERCIDA HÁ ANOS EM PARCERIA COM INSTITUIÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL. VANTAGEM COLETIVA INDISTINTAMENTE PROPORCIONADA À POPULAÇÃO. PEDIDO GENÉRICO DE VOTOS QUE NÃO SE CONFUNDE COM PEDIDO INDIVIDUAL, ESPECÍFICO E VINCULADO À VANTAGEM PESSOAL OFERECIDA AO ELEITOR EM TROCA DO VOTO. REPRESENTAÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.

A LEI NÃO PROÍBE A FILANTROPIA, A AÇÃO SOCIAL, ASSIM COMO NÃO VEDA AOS CANDIDATOS FAZER PROPAGANDA ELEITORAL NO TRIMESTRE QUE ANTECEDE A DATA DO PLEITO. O QUE A NORMA LEGAL PROÍBE É O OPORTUNISMO ELEITOREIRO, A MERCANCIA, A COMPRA E VENDA, A TROCA DA VANTAGEM PESSOAL PELO VOTO DO ELEITOR, A EXPLORAÇÃO DA MISÉRIA MATERIAL E POLÍTICA, A CORRUPÇÃO ELEITORAL, O DESVIRTUAMENTO DA VONTADE POPULAR. PARA QUE O FATO SE CARACTERIZE COMO CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO É IMPRESCINDÍVEL QUE SEJA PRATICADO COM O FIM DE OBTER O VOTO DO ELEITOR. AUSENTE O ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO NÃO HÁ SE FALAR DA OCORRÊNCIA DE INFRAÇÃO AO ART. 41-A DA LEI No 9.504/97.

Nas razões recursais de folha 286 a 300, a Procuradoria Regional Eleitoral sustenta ocorrida a transgressão ao artigo 41-A da Lei no 9.504/97, articulando também com o dissenso jurisprudencial. O recorrido teria fornecido benesse – curso de informática – a eleitores visando a fins eleitorais. O material didático fornecido conteria propaganda eleitoral, ficando consubstanciados a doação de caráter pessoal e o pedido de votos aos alunos. São tecidas considerações sobre a valoração da prova, afastado o exame dos elementos coligidos na fase de instrução do processo. Ter-se-ia, no caso, configurada a quebra do equilíbrio do certame, incidindo a regra do artigo 41-A da Lei no 9.504/97, ou seja, captação ilícita de votos. Alude-se à circunstância de as apostilas distribuídas conterem a fotografia e o número do candidato, o que não acontecera anteriormente. À folha 339, está certificada a ausência de apresentação de contra-razões.

A Procuradoria Geral Eleitoral emitiu o parecer de folha 343 a 350 no sentido do conhecimento e provimento do recurso. Segundo a peça, o acórdão proferido não levou em conta a prova contida no processo. Ressalta o parecer que a adequação do disposto no artigo 41-A da Lei no 9.504/97 decorre dos seguintes elementos:

a) atestado de conclusão de curso básico de informática no qual consta expressamente o nome do recorrido e seu símbolo de campanha (folha 15);

b) material didático do mencionado curso contendo o número de candidatura do recorrido, sua fotografia e o símbolo da campanha (folha 16);

c) folheto, com alusão ao curso, em que se destaca a atuação do recorrido (folha 17);

d) fotografias registrando a distribuição aos alunos de material publicitário do recorrido (camisetas com o número de campanha impresso) (folha 19/23);

e) depoimentos de folha 129/145.

Destaca o Vice Procurador Geral Eleitoral, Doutor Roberto Monteiro Gurgel Santos, ser irrelevante a ausência de participação direta do candidato, já que tinha ciência da prática irregular e a ela anuiu.

É o relatório.

V O T O

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (relator): Senhor Presidente, na interposição deste recurso, foram observados os pressupostos de recorribilidade que lhe são próprios. A intimação pessoal do Ministério Público, considerado o acórdão proferido, ocorreu em 16 de dezembro de 2002 – segunda-feira (folha 283), vindo à balha o inconformismo no dia imediato. Conheço do recurso.

Observe-se o teor do artigo 41-A da Lei nº 9.504/97 no que voltado a coibir abusos e, portanto, o desequilíbrio na disputa eleitoral. Dele se retire a maior eficácia possível:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990.

Realmente, conforme consignado no acórdão proferido pelo Regional Eleitoral, “a lei não proíbe a filantropia, a ação social, assim como não veda aos candidatos fazer propaganda eleitoral no trimestre que antecede a data do pleito”.

Uma coisa é partir-se para o implemento da solidariedade estendendo-se a mão aos menos afortunados. Isso nada tem a ver com a disputa eleitoral. Outra diversa é valer-se o candidato a cargo eletivo de benesse proporcionada a terceiros para, considerados os parâmetros da relação jurídica mantida, vir a se beneficiar.

Conforme ressaltado pela Procuradoria Geral Eleitoral, o representado, em parceria com terceiros, mantém curso de informática que, por sinal, leva o respectivo nome com a qualificação possuída – Curso de Informática Deputado Estadual Vitor Sapienza.

O material distribuído o foi com propaganda eleitoral explícita, lançando-se não só o cargo buscado como também o número de inscrição no certame – folha 16.

O que se nota é o nexo de causalidade, o entrelaçamento, considerado o curso proporcionado gratuitamente e a busca em si de votos. A testemunha Glaudy Joaquina Lopes de Moraes deixou consignado em depoimento que “no início do curso uma professora de nome Regina fez uma colocação aos alunos que quisessem votar no representado poderiam fazê-lo, pois era ele quem patrocinava o curso” (folha 129). Esclarece, ainda, que a citada professora somente ministrou duas aulas, sendo substituída por professor que não veiculou o tema eleitoral. Mais do que isso, a testemunha deixou explicitado que, na solenidade de entrega dos certificados, um assessor foi explícito em pedir votos aos formandos para o representado. Segundo depoimento colhido, no momento da conclusão do curso, foi entregue a camiseta contendo propaganda eleitoral.

Também haveria o uso, durante o curso de aprendizado de informática, de referências ao deputado recorrido, sendo que ocorria a cobrança aos alunos da apresentação do título de eleitor – folha 129 a 132.

O depoimento que se seguiu, de Vanessa de Moraes Bárbara (folha 133 a 136), também fez referência à sugestão aos formandos para que votassem no representado.

Então, é dado concluir que a gratuidade do curso objetivou em si obter votos. Tenho como configurada a prática vedada na Lei no 9.504/97 (artigo 41-A), razão pela qual conheço do recurso e o provejo para julgar procedente o pedido formulado na inicial, cassando a diplomação ocorrida.

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