Dinheiro de volta

Projeto prevê anistia para retorno de dinheiro do exterior

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16 de maio de 2005, 18h03

O deputado José Mentor (PT-SP) protocolou um projeto de lei que prevê a anistia fiscal a todas as pessoas jurídicas no Brasil que, no prazo de seis meses, promoverem a legalização ou o repatriamento de recursos não declarados ou mantidos no exterior. A proposta foi entregue à Câmara Federal.

De acordo com a proposta, todos os que regularizarem a situação dentro do período previsto terão a punibilidade extinta de delitos relacionados aos valores. Ela não se aplica, entretanto, às pessoas físicas que tenham sido condenadas por tráfico de pessoas, órgãos e entorpecentes, por contrabando de armas, crimes contra a administração pública, seqüestro, crimes contra a economia popular, contra o sistema financeiro nacional e relações de consumo.

Segundo Mentor, a CPI do Banestado apurou que até R$ 150 bilhões foram remetidos ilegalmente ao exterior. “Esses recursos hoje beneficiam o seu proprietário que recebe os juros, bem como os países que estão girando o capital. Esses valores no Brasil dariam novo impulso à economia, gerando milhões de empregos”, afirma.

No início de maio, a Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 2.809/03, que determina o bloqueio, confisco e a repatriação, em favor da União, de recursos ilegalmente depositados em instituições financeiras no exterior. O autor é o deputado João Paulo Gomes da Silva (PL-MG).

A proposta, que tramita em caráter conclusivo, ainda será analisada pelas Comissões de Finanças e Tributação, e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Leia a íntegra do PL

Projeto de lei 5228

O Congresso Nacional decreta:

Artigo 1 – As pessoas físicas e jurídicas domiciliadas no Brasil que, no prazo de seis meses contados da publicação desta Lei promoverem a legalização ou o repatriamento de recursos não declarados e mantidos no exterior gozarão de anistia fiscal e terão extinta a punibilidade dos crimes relacionados aos respectivos valores;

Parágrafo 1 – O disposto nesta Lei não se aplica às pessoas físicas que tenham sido condenadas pela prática de:

I – tráfico de pessoas,

II – tráfico de órgãos,

III – tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins,

IV – contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção,

V – pornografia infantil, via Internet,

VI – terrorismo, inclusive seu financiamento,

VII – crimes contra a administração pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos,

VIII – extorsão mediante seqüestro,

IX – crime contra a economia popular,

X- crime contra o sistema financeiro nacional,

XI – crime contra as normas de defesa da concorrência,

XII – crime contra as relações de consumo,

XIII – crimes previstos na Lei número 8.666, de 21 de junho de 1993, XIV- Crime de responsabilidade e XV- improbidade administrativa.

Parágrafo 2 – Caso se constate que os recursos repatriados são provenientes das condutas previstas no parágrafo l, ainda que tenha sido recolhido o imposto de renda, não terá efeito o disposto nesta Lei e será cobrado integralmente o crédito tributário originalmente devido, com a imposição da multa de ofício prevista no inciso II do artigo 44 da Lei número 9.430 de 27 de dezembro de 1996, e juros de mora, e a sanção penal cabível será aplicada em dobro.

Parágrafo 3 – A anistia fiscal alcança os tributos e contribuições federais devidos, a multa, de mora ou de ofício e os juros de mora.

Parágrafo 4 – O repatriamento dos valores será realizado mediante seu depósito ou custódia em estabelecimento bancário situado no Brasil.

Parágrafo 5 – A legalização dos valores dar-se-á mediante informação de seu valor, espécie e localidade em que se encontra, na forma do regulamento previsto no artigo 10.

Artigo 2 – Na hipótese de existência do inquérito policial, processo administrativo ou judicial instaurados para a apuração de crimes que tenham relação com os recursos não declarados e mantidos no exterior, inclusive os previstos no parágrafo 1 do artigo 1, o contribuinte ou responsável poderá promover a legalização ou o repatriamento dos recursos no prazo de 90 dias a contar do encerramento do inquérito ou do processo administrativo ou judicial desde que a causa de seu encerramento tenha sido:

I – Inexistência do fato,

II – falta de prova da existência do fato,

III – constatação de não constituir o fato infração penal,

IV – falta de prova de ter o acusado ou réu concorrido para a infração penal.

Parágrafo único – O Ministério Público poderá solicitar ao juiz ou tribunal competente, mediante requerimento motivado, a suspensão do direito aos benefícios previstos nesta lei às pessoas que estejam sob investigação.

Artigo 3 – É devido imposto de renda na legalização ou no repatriamento dos recursos à alíquota de:

I – três por cento, sobre os valores transferidos para agência bancária situada no Brasil, ou:

II – seis por cento, sobre os valores mantidos no exterior.

Parágrafo 1 – O recolhimento do imposto de renda será realizado em agência bancária autorizada a receber receitas federais, mediante documento específico de arrecadação, a ser fornecido pela Secretaria da Receita Federal em meio eletrônico, em que constarão apenas:

I – o valor repatriado,

II – O valor do imposto recolhido,

III – código de controle individual que permita a autenticação posterior do documento e:

IV – o banco e a agência em que os recursos ficarão depositados ou custodiados.

Parágrafo 2 – Após o recolhimento, o contribuinte ou responsável encaminhará, por via postal, à Secretaria da Receita Federal declaração de que os recursos não são provenientes da prática de conduta previstas no parágrafo 1 do artigo 1.

Parágrafo 3 – Não será realizada nenhuma espécie de identificação do sujeito passivo para a emissão do documento de arrecadação previsto no parágrafo 1.

Parágrafo 4 – O imposto de renda recolhido na forma deste artigo será definitivo.

Artigo 4 – O contribuinte ou responsável poderá promover a legalização dos recursos não declarados mesmo na hipótese em que os mesmos já tenham, na data da promulgação desta Lei, ingressado no Brasil mediante operação simulada de empréstimo com pessoa física ou jurídica localizada em país com tributação favorecida.

Artigo 5- O contribuinte ou responsável informará na Declaração de Ajuste Anual e na Declaração de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica, se for o caso, relativa ao ano-calendário da legalização ou repatriamento, o montante dos recursos legalizados ou repatriados, o imposto recolhido e o número do código de controle individual constante do documento específico de arrecadação.

Artigo 6 – Fica o sujeito passivo obrigado a manter em boa guarda e ordem, enquanto não prescritas eventuais ações que lhes sejam pertinentes:

I – o documento específico de arrecadação previsto no parágrafo 2 do artigo 3,

II – cópia da declaração de bens e direitos correspondente ao ano-calendário do repatriamento e

III – segunda via da declaração de que os recursos repatriados não são provenientes da prática das condutas previstas no parágrafo 1 do artigo 1. Parágrafo único. Na hipótese de procedimento de fiscalização, o sujeito passivo deverá apresentar à repartição fiscal solicitante os documentos mencionados no caput.

Artigo 7 – É vedada a divulgação ou a utilização das informações relativas a repatriamento de recursos para a constituição de crédito tributário relativo a outros impostos ou contribuições.

Parágrafo único – Na hipótese de violação de sigilo nos casos previstos nesta Lei, além das sanções civis, o responsável será demitido, ficando incompatibilizado para nova investidura em cargo público pelo prazo de cinco anos e a sanção penal cabível será aplicada em dobro.

Artigo 8 – Os valores repatriados deverão permanecer aplicados no Brasil pelo prazo de 2 anos.

Artigo 9 – O Ministério da Fazenda e o Ministério da Justiça regulamentarão, por ato conjunto, o disposto nesta Lei o prazo de 90 dias.

Artigo 10 – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Justificação. Em décadas recentes, o Brasil vivenciou diversas situações que propiciaram a sonegação fiscal e a saída irregular de recursos do país. Dentre esses fatores, podem ser apontados a instabilidade econômica e a elevada carga tributária.

Esse programa vem sendo alterado nos últimos anos, tendo passado o país a possuir instituições políticas e jurídicas mais estáveis, bem assim pelas medidas adotadas com o intuito de redução da carga tributária e incentivo aos investimentos privados.

Apesar disso, uma realidade é incontestável, qual seja, a de que há um grande volume de recursos em instituições financeiras no exterior. Estimativas apuradas na CPI do Banestado dão conta de que algo entre R$ 90 e R$ 150 bilhões foram remetidos ilegalmente ao exterior nos últimos anos. Esses recursos não trazem nenhum benefício para a economia brasileira e, apenas de um modo bastante reduzido, o trazem para seus detentores.

Isso porque tais recursos não podem ser repatriados e nem usufruídos sem que se incorra na prática de lavagem de dinheiro ou outros ilícitos de mesma natureza.

Assim, os únicos beneficiários desses depósitos são os banqueiros internacionais, que os investem, auferindo remunerações superiores do que a dos juros por eles devidos faos titulares dos recursos.

A prática de crimes contra a ordem tributária não é tão severamente punida no Brasil, tanto assim que a Lei 8.137, de 27 de dezembro de 1990, ao instituir tais crimes no país, criou a possibilidade da extinção de sua punibilidade (artigo 14).

Ainda que tenha havido um certo clamor pela revogação do dispositivo, o que se deu já no ano de 1991, a possibilidade de extinção da punibilidade foi novamente introduzida no ordenamento jurídico em 1995 (Lei 9.249 de 26 de dezembro de 1995, artigo 34).

Assim sendo, cabe questionar se há algum modo de fazer com que tais recursos sejam repatriados para o Brasil, trazendo recursos para a economia do país. A resposta a essa indagação é positiva, qual seja, a concessão de anistia fiscal e penal, conforme pretende o projeto de lei ora apresentado.

Ressalte-se que não se trata de experiência nova no que concerne às administrações tributárias de outros países, já tendo a mesma sido adotada, segundo a revista Forbes, no México, Itália, Cazaquistão e, mais recentemente, na Turquia e Alemanha.

Estimativas dão conta de que US$ 63 bilhões retornaram para a Itália, US$ 40 bilhões para o México e US$ 1 bilhão para o Cazaquistão ressaltando-se que as experiências da Turquia e da Alemanha são comparativamente bem mais recentes, não se dispondo de dados sobre seu efeito econômico.

Na Alemanha projeto semelhante concedeu anistia ampla e irrestrita a todos os contribuintes que possuem recursos não declarados dentro ou fora do país. Excluem-se da regra alemã apenas os casos em que já existam investigações administrativa ou criminal em curso. As alíquotas incidentes sobre os recursos beneficiados pela anistia variaram entre 25 e 35%.

No caso italiano a regra foi menos ampla. Não abrangia os casos de divisas no próprio país e concedia a anistia apenas às pessoas físicas e algumas espécies de pessoas jurídicas. No entanto, assim como na Alemanha não fazia distinção entre recursos oriundos de atividades lícitas ou ilícitas. Na Itália foram instituídas alíquotas mais brandas, que iam de 2,5 a 6%.

Diferentemente dos dois casos citados, a legislação mexicana concedeu anistia apenas a pessoas físicas. A alíquota incidentes nessas operações foi de 1%, o que incentivou o repatriamento de grande volume de capital.

Por fim, saliente-se que o presente projeto de lei não traz qualquer impacto nas contas públicas, tendo em vista que a possibilidade de os recursos não declarados depositados no exterior virem a implicar constituição de crédito tributário é bastante remota e de quase impossível mensuração”.

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