Defesa da concorrência

Mudança da lei de concorrência deve ter consulta pública

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16 de maio de 2005, 12h34

O governo federal, por iniciativa das autoridades diretamente envolvidas na defesa da concorrência, pretende apresentar ao Congresso Nacional um projeto que visa a alterar a atual legislação que rege os limites de atuação dos agentes econômicos no mercado brasileiro. Não se trata de uma novidade, tendo em vista que no passado procurou-se unificar as atribuições da SDE — Secretaria de Direito Econômico, Seae — Secretaria de Acompanhamento Econômico e Cade — Conselho Administrativo de Defesa Econômica, sendo que, naquela ocasião propôs-se a criação de uma agência.

Um dos grandes obstáculos à época para a aceitação do projeto era a existência de arestas mal aparadas entre esses órgãos. Hoje, no entanto, talvez o maior trunfo para que o projeto seja aprovado é a inédita convergência de interesses dos representantes da SDE, Seae e Cade.

Por outro lado, as autoridades envolvidas na elaboração desse projeto demonstraram grande preocupação quanto à possibilidade de que o mesmo viesse a ser submetido à consulta pública, pois, segundo elas, a demora em enviar o texto ao Congresso poderia comprometer o trabalho em razão da agenda política do Legislativo. Por certo também haveria o risco de uma grande rejeição por parte daqueles que se dispusessem a responder tal consulta.

Eventos promovidos por instituições que agregam profissionais envolvidos direta ou indiretamente com direito antitruste foram, então, considerados por essas autoridades como suficientes para esclarecer à população sobre as mudanças almejadas.

Surge agora a informação de que a Casa Civil poderá, sim, submeter ao crivo popular o projeto de lei. É necessário que se compreenda, portanto, a dimensão dessa prerrogativa.

O Decreto 4.176, de 28 de março de 2002, estabelece as regras para elaboração, redação, alteração e consolidação de atos normativos a serem encaminhados ao presidente da República por ministros e órgãos do Poder Executivo, ou seja, aplica-se ao referido projeto de lei. De acordo com o Decreto, a própria Casa Civil da Presidência da República é quem decide sobre a conveniência e oportunidade para divulgar, de maneira ampla, o texto de projeto de lei que seja considerado de “especial significado político ou social” (artigo 34, II).

Algumas expressões saltam aos olhos quando da leitura do Decreto, dentre elas a “ampla divulgação” e o “especial significado político ou social”.

Será que a exposição do projeto e até mesmo o debate em algumas instituições privadas, com a presença principalmente de profissionais do Direito, pode ser considerada uma “ampla divulgação”, capaz de suprir a necessidade de uma consulta pública? Certamente os autores do projeto julgam que sim, mas ainda que se refira às principais associações de advogados que militam na defesa da concorrência, não se pode esquecer que se trata de um projeto de alcance nacional.

O que se pretende é uma profunda e completa mudança do sistema legal, o que justifica a necessidade de serem ouvidos brilhantes estudiosos que se encontram espalhados por todo Brasil e que muito podem contribuir. Também as ações das próprias autoridades antitruste, com o apoio do Ministério Público e da força policial civil e federal, têm se intensificado por todo país, o que termina por difundir a cultura de defesa da concorrência em locais cujo interesse pela matéria era, em outros tempos, de pouca relevância.

Não há dúvida que se trata de ato normativo de especial significado social, pelas razões já expostas, mas também de grande relevo político, o que justifica o interesse da Casa Civil em buscar o maior número possível de manifestações sobre o projeto.

Talvez a consulta pública não seja, no atual momento, estrategicamente interessante aos autores do projeto, mas é um meio inquestionável de democratizar a discussão acerca do que poderá vir a ser o novo arcabouço legal de defesa da concorrência.

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