Invasão de escritórios

Invasão de escritórios é abuso de juíz, não da polícia

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3 de maio de 2005, 18h34

O jornal O Estado de S.Paulo publicou, em 2 de maio de 2005, editorial intitulado “Os Abusos da PF”. Como não poderia deixar de ser, criticou enfaticamente a atuação da Polícia Federal que, nos últimos doze meses, promoveu a busca e a apreensão de documentos pertencentes a clientes em doze escritórios de advocacia de São Paulo e outros cinco do Rio de Janeiro.

A realização de diligências dessa natureza em escritórios de advocacia constitui evidente desrespeito ao sigilo profissional dos advogados, além de afrontar diretamente o direito de defesa de seus clientes. Trata-se de atitude abominável que deve ser combatida não apenas pela classe, mas por toda a sociedade.

O enfoque apresentado, que é o mesmo de manifestação precedente da Ordem dos Advogados do Brasil, que encaminhou ofício ao ministro da Justiça acusando a Polícia Federal de agir ilegalmente, não nos parece o mais correto.

A ilegalidade das ações noticiadas não reside apenas em eventuais abusos cometidos por policiais federais no cumprimento de mandados de busca e apreensão em locais protegidos pelo sigilo profissional, mas na própria expedição dessas ordens ilegítimas por juízes de direito.

É oportuno lembrar que o Estatuto da Advocacia (Lei 8.906, de 4 de julho de 1994) prevê em seu artigo 7º, inciso II, que é direito do advogado “ter respeitada, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas comunicações, inclusive telefônicas ou afins, salvo caso de busca e apreensão determinada por magistrado e acompanhada de representante da OAB”(1).

A Polícia Federal, portanto, amparada por mandado judicial, não age, a princípio, de forma ilegal e nem promove a “invasão de escritórios” ao realizar referidas diligências.

A responsabilidade pela violência, pela arbitrariedade, pelo abuso, pelo desrespeito, inerentes a este tipo de medida, é do juiz de direito que a determinou, ainda que a polícia se aproveite, despudoradamente, dessas oportunidades para “aparecer sob os holofotes da mídia”.

Não nos parece suficiente informar ao ministro da Justiça que não têm sido suficientemente detalhados os pedidos de busca e apreensão formulados por delegados de Polícia. É o juiz de direito quem deve rejeitá-los quando não especifiquem, convenientemente, o objetivo da diligência e não demonstrem sua legalidade e absoluta imprescindibilidade.

Da mesma forma, é o juiz de direito quem deve ser responsabilizado, inclusive pela prática de abuso de autoridade, quando a medida se mostrar excessiva.

É imperioso, portanto, que a Ordem dos Advogados do Brasil exija dos órgãos judiciais competentes, a apuração da conduta do magistrado que, em absoluto desrespeito ao princípio da inviolabilidade do relacionamento entre cliente e advogado, autorize medida que, por sua própria natureza, afronta as prerrogativas profissionais, atenta contra o bom senso que deve pautar as relações entre o Poder Judiciário e os advogados em um Estado Democrático de Direito e, sem dúvida alguma, deixa seqüelas irreparáveis.

Notas de Rodapé

(1) A eficácia do trecho final, “e acompanhada de representante da OAB”, foi suspensa pelo STF, em medida liminar, nos autos da ADI nº 1.127-8.

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  • Brave

    é advogado especialista em Direito Penal. Foi diretor do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim) e presidente do Movimento de Defesa da Advocacia.

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