Garantia de pagamento

Diretor pode ter bens penhorados por dívida da empresa

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27 de junho de 2005, 15h18

O diretor pode ter seus bens penhorados para pagar dívida da empresa. A decisão é da Seção Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo). Para os juízes, se uma empresa de sociedade anônima não possui bens para satisfazer a execução em processo trabalhista, é legítima a penhora de bens do diretor para garantir o pagamento da dívida.

O entendimento foi aplicado no julgamento de Mandado de Segurança do diretor comercial da Sirma S/A Indústria e Comércio de Máquinas. Ele recorreu contra decisão da 3ª Vara do Trabalho de Guarulhos, que determinou o bloqueio de suas contas bancárias.

A primeira instância penhorou os valores depositados nas contas bancárias para pagar débito trabalhista apurado em processo movido por um ex-empregado da metalúrgica. A informação é do TRT de São Paulo.

No recurso, o diretor alegou que não praticou qualquer ato na sociedade que o coloque na posição de devedor solidário. Ressaltou, ainda, que a empresa executada é uma sociedade anônima e, como diretor comercial, é apenas seu acionista. Nessa condição, a lei não autorizaria a execução de seus bens particulares.

A relatora do recurso no tribunal paulista, juíza Vânia Paranhos, esclareceu que “a reclamação trabalhista se arrasta desde o ano de 1997 sem que a empresa reclamada efetue o pagamento do valor exeqüendo e sem lograr êxito na localização de bens livres e desimpedidos capazes de satisfazer a execução”.

“O total descaso da sociedade para com o seu passivo trabalhista demonstra a sua má gestão, senão dolosa, o que autoriza a responsabilização de seus diretores, por caracterizada a culpa ao longo do contrato de trabalho”, observou a juíza.

Para a ela, o artigo 592, inciso II, do Código de Processo Civil, “permite o entendimento de que os sócios atuais e os ex-sócios à época da vigência do contrato de trabalho têm responsabilidade na execução da sociedade, quando os bens dessa mostram-se insuficientes para o pagamento de débitos trabalhistas, pois o não pagamento de tais haveres constitui violação à lei e os empregados nunca assumem o risco do empreendimento”.

A decisão foi unânime. Os juízes mantiveram a penhora dos valores depositados nas contas bancárias do diretor comercial da metalúrgica.

MS 12577.2004.000.02.00-5

Leia a íntegra do voto

PROCESSO TRT/SP SDI 12577200400002005 (2577/2004-5)

MANDADO DE SEGURANÇA

IMPETRANTE: ATTILIO MARRA FILHO

IMPETRADO : ATO DO EXMº. JUIZ DA MM. 3ª. VARA DO TRABALHO DE GUARULHOS

LITISCONSORTE: EMÍLIO SALVADOR LOURENÇO

EMENTA: RESPONSABILIDADE DO DIRETOR NA EXECUÇÃO DA SOCIEDADE ANÔNIMA. Não possuindo a executada sociedade anônima bens livres e desembaraçados para satisfazer a execução, legítima é a penhora de bens do diretor, tendo em vista que o descaso da sociedade para com o seu passivo trabalhista, demonstra a sua má gestão, senão dolosa, o que autoriza a responsabilização de seus diretores, por caracterizada a culpa ao longo do contrato de trabalho. Segurança que se denega.

ATTILIO MARRA FILHO impetra o presente mandamus, com pedido de liminar, pelas razões de fls. 2/7, contra ato do Exmº. Juiz da MM. 3ª. Vara do Trabalho de Guarulhos, nos autos da reclamação trabalhista nº. 2642/1996, em que contendem EMÍLIO SALVADOR LOURENÇO E SIRMA S/A INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE MÁQUINAS.

Alega o impetrante que nos autos da reclamação trabalhista supramencionada, ora em fase de execução, determinou o MM. Juízo impetrado o bloqueio de suas contas bancárias, impedindo-o de movimentá-las ao arrepio da lei, visto que não houve qualquer condenação solidária de sua pessoa. Aduz que não praticou qualquer ato na sociedade que o coloca na posição de devedor solidário, devendo ser ressaltado tratar-se a empresa executada de Sociedade Anônima, pelo que não existe a responsabilidade do sócio sem os motivos legais previstos na Lei Federal nº. 6.404/76. Acrescenta ser juridicamente impossível a pretensão de desconstituição da personalidade jurídica da reclamada, pois trata-se de uma sociedade anônima, logo, não existem sócios na forma das empresas por cotas, pelo que não poderia o MM. Juízo impetrado determinar o bloqueio de sua conta bancária, na condição de acionista da executada. Ressalta que as dívidas das Sociedades Anônimas não podem recair sobre o patrimônio particular do acionista, posto que apenas detém ações da Sociedade Anônima.

Transcreve o disposto no artigo 158 da Lei nº. 6.404/76. Afirma que a r. sentença executada em nenhum momento prescreveu a responsabilidade de qualquer acionista, não podendo a execução prosseguir sobre conta bancária de sua titularidade. Menciona que somente pode ocorrer a execução dos bens particulares dos acionistas, nos casos previstos nos artigos 117, 158 e 165 da Lei das Sociedades Anônimas, o que não ocorreu no caso dos autos. Esclarece que é o Diretor Comercial da empresa executada, não podendo responder pela dívida e muito menos ter sua contas bloqueadas. Sustenta que restou violado direito líquido e certo seu, pelo que pretende através do presente mandado de segurança a concessão de liminar inaudita altera pars para que o ato que determinou o bloqueio e penhora on-line das contas bancárias de sua titularidade seja suspenso incontinentemente, liberando-se com efeito, os valores depositados nas referidas contas e, a final, seja confirmada a liminar para determinar a liberação da constrição ocorrida. Requer a concessão dos benefícios da justiça gratuita.

Procuração a fls. 8 e documentos a fls. 9/ 15.

Não concedida a liminar, nos termos do despacho de fls. 20.

O impetrante informa o endereço do litisconsorte passivo necessário a fls. 21.

Informações da D. Autoridade impetrada a fls. 24.

Manifestação do litisconsorte passivo necessário a fls. 25/26 e juntada de procuração a fls. 27.

Parecer do D. Ministério Público do Trabalho a fls. 30/33, opina pela extinção do processo, sem apreciação do mérito, na forma do art. 267, inciso VI, do Código de Processo Civil, e se analisado o mérito, pela denegação da segurança.

É o relatório.

V O T O

I – DA PRELIMINAR DE DESCABIMENTO DO MANDAMUS ARGÜIDA PELA D. REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO

Opina a D. Representante do Ministério Público do Trabalho em seu parecer de fls. 30/33 pelo descabimento do Mandado de Segurança, na forma do art. 5º., inciso II da Lei nº. 1533/51 e Súmula nº. 267 do Excelso Supremo Tribunal Federal. Aduz que a pretensão do impetrante, de ver-se reconhecido terceiro estranho à lide, ao fundamento de que, na qualidade de acionista de sociedade anônima, não pode o seu patrimônio responder pelas dívidas da sociedade é passível de análise através de medida judicial própria (aliás, já proposta, segundo consta das informações da autoridade impetrada – fls. 24), onde é possível a dilação probatória, bem como a obtenção de liminar de restituição dos bens, se for o caso (arts. 1046 e seguintes, do CPC).

Esta preliminar, tal como argüida, confunde-se com o mérito e com ele será analisada.

II – DO MÉRITO

Insurge-se o impetrante contra ato do Exmº. Juiz da MM. 3ª. Vara do Trabalho de Guarulhos que determinou o bloqueio de suas contas bancárias, na qualidade de acionista da empresa executada. Alega que tratando-se a empresa reclamada de sociedade anônima, impossível a desconstituição de sua personalidade jurídica, pelo que ilegal e arbitrária a penhora de patrimônio particular de acionista que não praticou qualquer ato na sociedade que o coloca na posição de devedor solidário. Sustenta que restou violado direito líquido e certo seu, pelo que pugna pela concessão de liminar inaudita altera pars para que o ato que determinou o bloqueio e penhora on-line das contas bancárias de sua titularidade seja suspenso incontinentemente, liberando-se com efeito, os valores depositados nas referidas contas e, a final, seja concedida a segurança definitiva, confirmando-se a liminar pleiteada. Requer a concessão dos benefícios da justiça gratuita.

Por qualquer ângulo que se analise a questão, razão não lhe assiste.

Segundo Manoel Antonio Teixeira Filho, a ação mandamental “é o meio constitucionalmente previsto, de que se pode valer a pessoa, física ou jurídica, para obter um mandado destinado à proteção de direito próprio ou de terceiro, individual ou coletivo, líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, lesado ou ameaçado de lesão por ato de autoridade pública ou de agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público” (in “Mandado de Segurança na Justiça do Trabalho – Individual e Coletivo – 2ª. Edição – LTr, pag. 91).

Ora, no caso dos autos, inexiste direito líquido e certo a ser tutelado pela via do Mandado de Segurança, conclusão que se depreende da simples análise das informações prestadas pela D. Autoridade impetrada a fls. 24.

Com efeito, conforme relatado nas citadas informações, a reclamação trabalhista se arrasta desde o ano de 1997 sem que a empresa reclamada efetue o pagamento do valor exeqüendo e sem lograr êxito na localização de bens livres e desimpedidos capazes de satisfazer a execução. Assim, incensurável no caso dos autos a aplicação da teoria da disregard of legal entity, pois não oferecendo a empresa condições de solvabilidade de seus compromissos, deve sua personalidade jurídica ser desconstituída a fim de que os sócios sejam responsabilizados pela satisfação dos débitos, ao contrário do que pretende fazer crer o impetrante.

Por outro lado, conforme se verifica da Ata da Assembléia Geral, datada de 30 de abril de 1993, acostada a fls. 13, o impetrante atua na gerência e administração da empresa executada no cargo de Diretor Comercial, exercendo tal cargo durante todo o tempo de vigência do contrato de trabalho do reclamante, ora litisconsorte passivo necessário, ou seja, de 2 de janeiro de 1995 a 22 de julho de 1996 (fls. 9). Certo é que, o total descaso da sociedade para com o seu passivo trabalhista, demonstra a sua má gestão, senão dolosa, o que autoriza a responsabilização de seus Diretores, por caracterizada a culpa ao longo do contrato de trabalho.

De ser ressaltado que, o fato de não constar do título executivo como devedor ou mesmo de não fazer parte do pólo passivo da reclamação trabalhista na fase cognitiva não significa ausência de responsabilidade para efeito de execução, pois o artigo 596 do Código de Processo Civil prevê responsabilização do sócio a título subsidiário, independentemente de constar do título executivo. De resto, o artigo 592, inciso II, do estatuto processual civil, de aplicação subsidiária ao processo do trabalho, permite o entendimento de que os sócios atuais e os ex-sócios à época da vigência do contrato de trabalho têm responsabilidade na execução da sociedade, quando os bens dessa mostram-se insuficientes para o pagamento de débitos trabalhistas, pois o não pagamento de tais haveres constitui violação à lei e os empregados nunca assumem o risco do empreendimento.

Improspera, ainda, a alegação do impetrante de impossibilidade de constrição de seus bens particulares na qualidade de acionista de sociedade anônima, pois de acordo com as lições de Arion Sayão Romita apud Francisco Antonio de Oliveira, no artigo “Responsabilidade dos Sócios na Execução Trabalhista. Bloqueio de Contas Bancárias” in Rev. Genesis nº. 91, p. 46/52:

“A limitação da responsabilidade dos sócios é incompatível com a proteção que o Direito do Trabalho dispensa aos empregados; deve ser abolida, nas relações da sociedade com seus empregados, de tal forma que os créditos dos trabalhadores encontrem integral satisfação, mediante a execução subsidiária os bens particulares dos sócios (…) quanto às sociedades anônimas, a questão é mais delicada e exige reflexão. Impraticável será invocar-se a responsabilidade dos acionistas, é evidente. A responsabilidade há de ser dos gestores (diretores, administradores, pouco importa a denominação). Urge, também, proclamar que, se insuficiente o patrimônio da sociedade anônima, os diretores responderão solidariamente, com seus bens particulares pela satisfação dos direitos trabalhistas dos empregados da sociedade. (…)”

Nessa conformidade, nada obsta o prosseguimento da execução em pauta sobre as contas bancárias do impetrante, mormente considerando-se ser a penhora em dinheiro a primeira daquelas previstas na gradação contida no artigo 655 do Código de Processo Civil e tratar-se o crédito trabalhista de natureza alimentar.

Ademais, conforme relata a D. Autoridade impetrada em suas informações a fls. 24, o impetrante interpôs Embargos de Terceiro, os quais foram rejeitados pelo MM. Juízo impetrado, de cuja decisão foi oposto agravo de petição que se encontra em fase de processamento, razão pela qual, por mais esse motivo, a denegação da segurança é medida que se impõe.

Pelo exposto, denego a segurança, nos termos da fundamentação supra.

Custas pelo impetrante, calculadas sobre o valor atribuído à causa de R$ 1.000,00 (um mil reais), no importe de R$ 20,00 (vinte reais), restando indeferido o pedido de concessão dos benefícios da justiça gratuita, por falta de amparo legal.

VANIA PARANHOS

Juíza Relatora

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