Guerra do telefone

Liminar cancela assembléia geral da Brasil Telecom

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28 de julho de 2005, 13h17

O juiz Hildo Nicolau Peron, da 2ª Vara Federal de Florianópolis, cancelou a realização de assembléia geral extraordinária da Brasil Telecom Participações S/A, prevista para esta quarta-feira (27/7), em Brasília. O juiz atendeu ao pedido de liminar do advogado Fernando José Caldeira Bastos, em Ação Popular ajuizada segunda-feira, (25/7). Cabe recurso.

A assembléia foi convocada para discutir a destituição de membros do Conselho de Administração e a eleição do presidente e do vice-presidente do Conselho de Administração. A primeira instância também suspendeu os efeitos do contrato “put”, firmado entre o Citigroup e os fundos de pensão Previ — Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil, Petros — Fundação Petrobras de Seguridade Social e Funcef — Fundação dos Economiários Federais, até o término do prazo para contestação.

Os presidentes, diretorias executivas e conselhos de administração dos fundos não podem, por força da liminar, dar continuidade a quaisquer atos pendentes ou em andamento, previstos no contrato, sem a prévia manifestação do juízo. A Anatel — Agência Nacional de Telecomunicações e a CVM — Comissão de Valores Mobiliários não poderão homologar ou registrar qualquer alteração na composição societária ou do controle societário da Brasil Telecom, que tenha origem no contrato “put”.

O contrato “put” prevê o compromisso entre as partes de negociarem em conjunto seus ativos na Brasil Telecom, impondo aos fundos o dever de comprar a participação do Citigroup em até dois anos, por R$ 1,045 bilhão.

O juiz aceitou as alegações do advogado, de suposta nulidade no contrato, que poderia causar prejuízos à União, empresas estatais e fundos de pensão. A Ação Popular foi proposta contra a Previ, a Petros, a Funcef, o Banco do Brasil, a Petrobras, a Caixa Econômica Federal, o CVC Opportunity Equity Partners LP, o International Equity Investimens IAE e o Investidores Instituicionais Fundo de Investimentos em Ações, além da União.

Processo 2005.72.00.007938-1

Leia a íntegra da decisão

Autos do Processo n° 2005.72.00.007938-1

Classe: Ação Popular

Autor: Fernando José Caldeira Bastos

Réus: Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil – PREVI

Banco do Brasil S.A.

Fundação Petrobrás de Seguridade Social – PETROS

Petróleo Brasileiro S.A. – PETROBRÁS

Fundação dos Economiários Federais – FUNCEF

Caixa Econômica Federal

CVC Opportunity Equity Partners LP

International Equity Investiments IAE

Invertidores Institucionais Fundo de Investimentos em Ações

União

Cuida-se de ação objetivando medida liminar para:

a) suspender os efeitos da opção de compra futura, conhecida no mercado como “put”, formalizado entre a PREVI, a PETROS e a FUNCEF, sob a liderança da primeira e o Citigroup, no qual as partes se comprometeram a negociar seus ativos na Brasil Telecom de modo conjunto, mas impondo aos Fundos de Pensão o dever de comprar a participação do Citigroup em até dois anos pelo preço de R$ 1.045 bilhões, preço que representaria um ágio de 240% sobre o valor no mercado acionário;

b) cancelar a Assembléia Geral Extraordinária convocada para o dia 27 de julho de 2005, às 9 horas;

c) determinar aos administradores envolvidos a abstenção de atos consubstanciados na “put”, bem como o cancelamento/suspensão dos atos praticados pelos Fundos de Pensão e pelo Citigroup a partir da data de celebração do acordo.

O autor pede, outrossim, a expedição de ofícios a Comissão de Valores Mobiliários e à ANATEL, determinando-lhes que se abstenham de homologar ou registrar eventuais alterações na composição societária ou do controle societário da Brasil Telecom, originários do “put”.

O autor alega que o negócio foi formalizado de forma obscura, tendo vindo a público apenas pelo fato de imprensa ter tomado conhecimento; além disso, impõe obrigação de alto risco para os fundos de pensão, que administram serviço de garantia previdenciária para seus filiados, sem qualquer contrapartida a cargo do Citigroup, que apenas teria vantagens com o negócio. Sustenta, assim, que o ônus assumido pelos Fundos de Pensão representa gestão temerária de seus recursos, constituídos, também, de dinheiro pertencente às entidades patrocinadoras, no caso do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal e da Petrobrás, que, em último caso assumirão o prejuízo.

Alega também que a operação contraria o que dispõe a Resolução n° 2829 do Conselho Monetário Nacional, que prevê a aplicação de ativos até o montante máximo de 50%.

Alega ainda que os administradores que celebraram o negócio afirmaram que permaneceriam com as ações adquiridas por no máximo 18 meses, tempo demasiadamente curto para a valorização e o lucro, já que as ações foram compradas por preço muito superior ao seu valor de mercado.


Para completar, alegou que as partes envolvidas, ou seja, os Fundos de Pensão e o Citigroup, de forma sigilosa e veloz, compraram a totalidade das ações detidas pela Fundação 14 de Previdência Privada no fundo Investidores Institucionais Fundo de Investimento em Ações anteriormente denominado CVC/Opportunity Equity Partners FIA, fundo fechado de investimento; e que a Fundação 14, de outra parte, tem como patrocinadora a Brasil Telecom, a qual não foi informada da negociação, pela qual o Citigroup pagou R$ 212 milhões e comprometeu-se a pagar, ainda, a diferença entre o valor pago e o valor da “put” antes referida.

Assim, o autor questiona a razão para o Citigroup, que vendeu a sua participação acionária na Brasil Telecom, investir na compra da participação da Fundação 14. Questiona, também, os motivos de a transação da Fundação 14 envolver a desistência de inúmeras ações administrativas e judiciais que tinham por objeto a discussão sobre o controle e a gestão da Brasil Telecom.

E aponta para o fato de que esta transação teria sido aprovada em tempo muito exíguo (2 dias úteis) pela Secretaria de Previdência Complementar, por meio de seu Secretário, Sr. Adacir Reis que, por sua vez é ex-sócio do ex-Secretário de Comunicação da Presidência da República, Luiz Gushiken.

O autor argumenta que o negócio em pauta não levaria em conta a natureza pública dos recursos operados pelos Fundos de Pensão, bem como ofenderia aos princípios do republicanismo, da finalidade, da moralidade e da eficiência.

Juntou documentos (fls. 32/95), dentre os quais se inclui o título de eleitor e conjunto de reportagens veiculadas a respeito da transação.

DECIDO.

A pretensão deduzida se funda em alegações de nulidade da opção feita pelo CITIGROUP de venda e compra futura da sua participação acionária (ações ON) na BRASIL TELECOM S/A (“BrT”), com as fundações de previdência complementar privada, PREVI, FUNCEF e PETROS.

As alegações contidas na inicial em torno da referida operação conhecida no mercado como “put” sinalizam lesões públicas e privadas de múltiplas grandezas:

– afetam o modelo de privatização concebido pela União para o setor de telefonia;

– afetam a moralidade pública por supostas ingerências de agentes do governo na gestão dos fundos de pensão;

– afetam a saúde financeira dos fundos de pensão; e

– afetam a garantia de complementação das aposentadorias e pensões dos empregados das estatais (Banco do Brasil S/A, Caixa Econômica Federal e Petróleo Brasileiro S/A) com a operação mercantil que teria sido firmada com valor acima de mercado e sem a indispensável transparência do processo com os gestores destes fundos, que incluem o Conselho Deliberativo ou o Conselho de Curadores.

Porém, antes de examinar os requisitos que autorizam o deferimento da medida liminar postulada, explano a respeito dos pressupostos processuais e condições da ação.

O autor popular comprova a condição de cidadão por seu título de eleitor e comprovantes de votação das eleições de 204 (fls. 34). A competência para processar e julgar a ação popular se define pelo domicílio do autor e este tem domicílio nesta Capital, onde exerce a advocacia (fls. 33). Neste sentido há precedentes do TRF da 2ª Região. Transcrevo uma ementa:

“PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO POPULAR – FORO – COMPETÊNCIA.

I – Exigir o ajuizamento da ação popular no lugar em que esse consumou o ato impugnado, seria inviabilizar a garantia constitucional contida no parágrafo 2º do artigo 109, primeira figura, eis que num país da extensão do Brasil, poucos, poderiam se deslocar de seu domicílio para, no elevado espírito público, obter a declaração de nulidade ou anulação dos atos lesivos ao erário. Tem assim, o cidadão, ao socorrer-se da ação popular, o direito de optar entre o foro do seu domicílio, o do lugar do ato e o do Distrito Federal, tendo o autor optado pelo primeiro.

II – Agravo de Instrumento Improvido.

(Ag. 9702140307/RJ, 1ª T., rel. Des. Fed. Julieta Lídia Lunz, publ. Em 15/06/99, p. 146).

Idem, no AG 68161, 1ª Turma, relator Des. Fed. Ney Fonseca, julg. Em 18/06/2001.

Resta ver se a competência para a causa é da Justiça Federal.

No pólo passivo o autor incluiu, dentre outros, a UNIÃO e a FUNCEF e se, de fato, uma ou outra, ou ambas tiverem que figurar no pólo passivo ou tiverem interesse de figurar no pólo ativo (após a citação), a competência é realmente deste Juízo.

Consigno que o fato de haver notícias relacionadas à discussão do mesmo contrato no Rio de Janeiro, não afeta a competência para processar e julgar a ação popular que possui réus diversos e pedidos distintos.

A presença da UNIÃO está bem apontada, pois resta evidenciado que a operação envolve lesão a interesses que lhe dizem respeito, ou seja, o serviço de telefonia, explorado que é por concessão sua. Ademais, os atos lesivos discutidos na ação permitem dizer que a concretização da negociação implica na mudança do controle acionário da BrT, pois as fundações citadas passam a deter a maioria do capital com poder de voto. E, se é certo que o Banco do Brasil S/A (patrocinador atual em regime paritário das contribuições pagas pelos seus empregados à PREVI) detém o controle acionário da TELEMAR, e que também indica 3 dos 6 integrantes da Administração da PREVI, dentre os quais o Presidente, que tem voto de qualidade (art. 11 da LC nº 108/2001); e se é certo que a PREVI juntamente com as demais fundações assumirão também o controle acionário da BrT, transparece que uns poucos anos (07 anos) está servindo para se manipular o modelo de privatização recém desenhado, sem que se tenha notícia de medida de governo, no sentido de barrar as possíveis afrontas à Lei de Telecomunicações, concebida para um sistema de livre concorrência de fortes conglomerados.


No que tange à FUNCEF, graça alguma controvérsia a respeito da competência para julgar as ações contra si aforadas, mas não vejo que a Justiça Federal possa ser competente para processar e julgar ações aforadas por ou contra a Caixa de Assistência dos Advogados, e seja diverso o entendimento quando se está a discutir o risco de dilapidação de parte da poupança constituída por uma empresa pública federal (a Caixa Econômica Federal) que tem foro na Justiça Federal. O precedente (do TRF da 1ª Região) a seguir vem a calhar:

“(…)

1. A Justiça Federal é competente para o feito em que economiário busca a revisão da suplementação de aposentadoria paga pela Fundação dos Economiários Federais – FUNCEF, porquanto se trata de entidade instituída e mantida pela Caixa Econômica Federal – CEF. Precedentes das Turmas da Primeira Seção do Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

2. Agravo de instrumento provido. Competência da Justiça Federal declarada.”

(AG. Nº 9401026181, processo 9401026181/DF, rel. Des. Fed. Tourinho Neto. julg. Em 09/06/2003, DJ de 01/08/2003, p. 12).

E no que tange a essas pessoas indicadas e outros, a Lei nº 4.717/65 – art. 6º, § 3º) prevê que podem se posicionar no pólo ativo após a citação, pelo que seria prematuro afastar a competência da União, da Caixa Econômica Federal e de outros, potencialmente legitimados neste estágio inicial da ação.

Por sua vez, é forçoso destacar que a competência é igualmente federal, pela via atrativa, no que se refere àqueles que devam figurar como litisconsortes passivos necessários, sendo desnecessário tecer maiores considerações.

Mas de plano acentuo que incumbirá ao autor promover a inclusão no pólo passivo daquelas pessoas que entende devam responder pelos prejuízos suportados pela Entidades de Apoio, referidas na petição inicial, pois o pedido de imputação do dever de ressarcimento aos responsáveis, como requerido no item 5 (fls. 31) pressupõe as suas participações no processo como réus-litisconsortes. Neste sentido são as precisas lições de JOSÉ AFONSO DA SILVA:

“… qualquer autoridade que houver participado do ato impugnado – autorizando-o, aprovando-o, retificando-o ou praticando-o deverá ser citada para a demanda popular, que vise anulá-lo. Assim, desde as autoridades mais elevadas até as de menor gabarito estão sujeitas a figurarem como rés no processo de ação popular. Nem mesmo o Presidente da República, ou o Supremo Tribunal Federal, ou do Congresso Nacional, está imune de ser réu, neste processo.”

(Ação Popular Constitucional, p. 197).

Vencidas estas questões formais básicas, examino a presença dos requisitos que autorizam a concessão da medida liminar – fumus boni juris e periculum in mora, pois conforme a Lei 4.717/65, § 4º do art. 5º: Na defesa do patrimônio público caberá suspensão liminar do ato lesivo impugnado.

É preciso antes de mais nada deixar certo que, embora incumba ao autor popular o ônus de provar os fatos constitutivos do direito, é perfeitamente admissível e compreensível que não disponha de imediato de todos os elementos necessários, porque não tenham sido fornecidos pelas entidades envolvidas.

Com mais razão quando se tem diversos artigos referindo que a operação correu em sigilo e que nem mesmo os membros de Conselho Deliberativo puderam conhecer previamente do “put” em discussão. Inteligência do art. 7º, I, ‘b’, e § 2º, da Lei 4.717. Vale dizer, basta que os fatos, antes da citação, estejam devidamente expostos, bem como os fundamentos do pedido, para que os réus possam, com base neles, oferecer sua defesa.

Postas estas bases, pode-se dizer que a fumaça do bom direito pressupõe a evidência de que o ato acoimado de ilegal ou nulo seja ao mesmo tempo lesivo. É o que deflui do art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal de 1988 e arts. 1º ao 4º da Lei 4.717/65.

Sustenta-se na ação que o ato negocial envolvendo a venda de ações com poder de voto do CITIGROUP em favor das fundações PREVI, PETROS e FUNCEF teria sido realizada sem prévio conhecimento do Conselho Deliberativo; que o valor das ações compradas pelos fundos são muito superiores aos preços praticados no mercado de ações, com pouca chance de recuperação do valor a ser pago, o que representará prejuízos para as estatais que seriam as garantidoras de eventuais prejuízos em favor dos fundistas/poupadores; e que a negociação afrontaria a Lei de Telecomunicações.

A propósito da alegada nulidade do “put”, as provas constantes dos autos, adiante discriminadas, apresentam-se suficientemente indiciárias de ilegalidades que não ficam a salvo do controle judicial. Vejamos:

– Consultor Jurídico, de 28/05/2005: Fundos de pensão oferecem garantia de R$ 1,3 bi ao Citi;

– Folha de São Paulo, de 27/05/2005: Fundos prometem 1,3 bi ao Citi por BrT em Telemar;


– Correio Brasiliense, de 31/05/2005: Lei é impedimento para acordo da Previ com Citi;

– Correio Brasiliense, de 02/06/2005: Brasil Telecom – Fechado acordo com os fundos;

– Revista Veja, de 08/05/2005, Coluna Holofote, de Felipe Patury: Desacordo

em Casa;

– O Estado de São Paulo, de 12/07/2005: Telecom Itália sem preferência da Previ;

– Telecom On-Line, de 01/07/2005: Conflito Societário – Telecom Itália recorre à Justiça contra acordo put de fundos e Citibank;

– Folha de São Paulo, de 07/07/2005: Citi aumenta participação na BrT;

– Folha de São Paulo, de 13/07/2005: Telecom Itália aponta “ações orquestradas”;

– Folha de São Paulo, de 24/07/2005: Pizzolato questiona acordo entre Previ e Citi;

– O Estado de São Paulo de 24/07/2005: Bancos sob suspeita têm R$ 600 mi de estatais BMG, Rural e Santos seriam compensados com aplicações de fundos de pensão;

– Folha de São Paulo, de 24/07/2005: Conselho Fiscal vai investigar acordo entre Previ e Citi.

Conforme detalharei, essas provas evidenciam que alguns dos requisitos de validade do negócio jurídico (art. 104, I, II e III do Código Civil) podem ter sido desrespeitados, quais sejam:

– o relacionado à competência do agente – porque o “put” envolvendo desembolso futuro de US$ 400.000.000,00 (quatrocentos milhões de dólares americanos), do qual boa parte advém do poder público (não esquecendo que até a recente Emenda Constitucional o regime de contribuição não era paritário) e da “suada” poupança do trabalhador das estatais, não poderia/deveria ser decidida apenas pela Presidência e/ou pela Diretoria Executiva, no modelo de gestão preconizado na Lei Complementar 108/2001 (art. 10 e 13, III, IV) que inclui responsabilidades dessa ordem ao Conselho Deliberativo. Ou se é que poderia em função do pequeno percentual patrimonial a ser aplicado, deveria (como bom gestor) ouvir os conselheiros pela própria utilização de um indexador da dívida que não era o usual na Previ (IGP-DI ao invés do IPC). A reportagem de fls. 92 da Folha de São Paulo deixa evidenciado o sigilo que cercou a operação em relação aos próprios responsáveis pela gestão do fundo:

“Folha: Como é a relação entre Presidência e Conselho da Previ?

Pizzolato – Na cabeça do Sérgio (que é o Presidente da Previ), a gente estava lá de favor. Ele fazia o que bem entendia e a gente tinha de referendar. Se não referendasse, eles (da diretoria) ameaçavam. Quando começamos a discutir a questão das telecomunicações, eles colocaram quatro ou cinco técnicos dentro da sala que fizeram ameaças: “Se a decisão da diretoria não for mantida, os associados vão começar a mandar telegramas e a ligar para vocês, vão cobrar”. Por isso, a gente decidiu que a gente tinha de mudar as práticas. Veja, eles assinaram um acordo de mais de um bilhão com o Citi às escondidas e depois a gente ficava sabendo por um fato relevante do Citibank na imprensa. Quando a gente tentou saber alguma coisa eles se irritavam e negavam informações.”

Por tais declarações chega a ser discutível até mesmo o requisito de validade do negócio jurídico envolvendo o elemento “vontade” dos agentes do Conselho Deliberativo (indispensável para o aperfeiçoamento do contrato), sujeitos a essa gestão, o que permite dizer que o negócio jurídico realizado é passível de suspeição, porque não é próprio do regime democrático e paritário previsto para a gestão de um fundo de previdência complementar fechada que se utilize de qualquer meio intimidatório de “convencimento”.

– a licitude do contrato que conduz a PREVI, enquanto diretamente vinculada ao Banco do Brasil – senão a afrontar a literalidade da lei (art. 29 da LC 108/2001), ou do modelo de competição previsto para a exploração do serviço de telefonia, ao menos se evidencia como afrontosa ao seu escopo, que é o de evitar riscos para o patrimônio constituído para fins de previdência social e não o de facilitar a formação de posição dominante no mercado de telefonia. A respeito, vem a calhar a reportagem também veiculada na Folha de São Paulo (fls. 67/9), na qual o Presidente da TELECOM ITÁLIA aponta toda a problemática (que me valho remissão) para concluir que “Ou a TELEMAR está afrontando a legislação ou a proposta que recebemos já faz parte de plano da empresa, com os fundos de pensão e o Citigroup, para modificar a Lei Geral de Telecomunicações.” Em suma, não se evidencia que o objeto de fundo negociado – que é o controle acionário da BRASIL TELECOM pelos fundos de pensão multi-referidos seja passível de ser transferido nos moldes acordados.

– no que se refere às formalidades para o ato, também se evidencia que a operação não foi precedida da prévia e expressa autorização do governo, conforme declarado por Valmir Camilo, presidente da Associação Nacional dos Funcionários do Branco do Brasil (ANAAB) – reportagem do Correio Brasiliense de 31/05/2005.


Por estes vários aspectos, o juízo sumário que faço é de que há fortes evidências de nulidade do contrato do qual se pretende extrair e projetar efeitos contra a União, os Fundos de Pensão e os destinatários destes.

No que se refere à lesividade do “put” considero adequado separar:

– o dano que se evidencia em desfavor da UNIÃO e de todos os consumidores do serviço de telefonia que privatizada (a preços considerados baixos) na expectativa de criar um modelo competitivo, e se começa a reverter para as mãos de entidades que, se não podem ser consideradas juridicamente paraestatais ou entidades de apoio, vicejam muito próximas das estatais e/ou sofrem ingerências diretas das estatais e/ou do próprio governo, tais como as indicações políticas para cargos de fundações, como as noticiadas nos autos;

– o dano que se evidencia em desfavor indireto das estatais (empresas públicas e sociedades de economia mista incluídas no pólo passivo da ação) que patrocinam um complemento de aposentadoria com o objetivo específico de constituir reserva capaz de complementar idoneamente as aposentadorias dos seus empregados e não terão esta garantia quando os investimentos são feitos com excesso de risco. Certamente não por outra razão, o Presidente do Banco do Brasil, Rossano Maranhão, convocou Sérgio Rosa (da Previ) para se explicar e que “O clima foi de mal-estar.” (conforme relato contido na reportagem da VEJA, de 08/06/2005 – fls. 36, encartada nestes autos às fls. 60);

– o dano que se evidencia em desfavor direto dos destinatários dos fundos de pensão – os milhares de trabalhadores, aposentados e pensionistas. Todo o documentário que instrui a inicial está a indicar que o preço pago pelas ações dificilmente será recuperado nos prazos previstos. Não fora pela questão do preço, o prejuízo também está evidenciado quando o próprio Pizzolati (fls. 62) declarou para a Folha de São Paulo que “Estranhamos o acordo porque os fundos são obrigados a comprar a parte do Citi, mas o Citi não é obrigado a comprar a dos fundos. E isso não foi precificado (seria especificado). Há informações de que esse acordo valeria US$ 200 milhões.”

Sendo forçoso presumir que o declarante Pizzolati tenha se informado com especialistas para embasar sua declaração, evidencia-se que, na avaliação de especialistas, os fundos de pensão pagarão o DOBRO do valor que seria devido.

Por tais razões, considero suficiente a prova para reconhecer presente o requisito do fumus boni júris para a concessão da liminar.

O requisito do periculum in mora também se faz presente. O Edital de fls. 70 e 91 deixa certo que a BRASIL TELECOM PARTICIPAÇÕES S/A convocou para o dia de amanhã – 27 de julho de 2005 – às 09:00 horas, a Assembléia Geral Extraordinária com a seguinte pauta:

1) Deliberar sobre a destituição de membros do Conselho de Administração e eleição de novos membros; e

2) Deliberar acerca da eleição do Presidente e do Vice-Presidente do Conselho de Administração.

Pelo visto, a referida Assembléia se desenvolveria com base nas novas participações acionárias resultantes do “put” que está sendo impugnado nesta ação. Assim, a BRASIL TELECOM S/A correria o risco de vir a ser controlada pelos Fundos de Pensão (PREVI, FUNCEF e PETROS), o que será obstado pela fumaça de bom direito que milita em favor do autor popular, evitando-se desdobramentos indesejáveis a partir do contrato que está sendo questionado, sem prejuízo de ulterior deliberação, ou seja, após os prazos de contestação.

ANTE O EXPOSTO, defiro a medida liminar. Por conseguinte:

1 – SUSPENDO os efeitos do contrato “put” realizado entre o Citigroup e os fundos de pensão PREVI, FUNCEF e PETROS, até findo o prazo de contestação;

2 – CANCELO a Assembléia Geral Extraordinária convocada pelo Presidente do Conselho de Administração da BRASIL TELECOM Participações S/A, Sr. Luis Otávio Carvalho da Motta Veiga, para realizar-se no dia 27 de julho de 2005 às 09:00 horas, na sua sede social, situada em Brasília/DF, no SIA SUL, ASP, LOTE D, BLOCO B;

3 – DETERMINO aos Presidentes, Diretorias Executivas e Conselhos de Administração dos fundos PREVI, FUNCEF E PETROS que se abstenham de dar prosseguimento a quaisquer atos pendentes ou em andamento, previstos no contrato “put”, salvo prévia apreciação deste juízo;

4- DETERMINO a expedição de ofícios à CVM e à ANATEL para se abster de homologar ou registrar qualquer alteração na composição societária ou do controle societário da Brasil Telecom que tenha origem no contrato “put’ ora questionado.

INTIME-SE por carta precatória a BRASIL TELECOM Participações S/A, na pessoa do Sr. Luis Otávio Carvalho da Motta Veiga, ou na pessoa de quem estiver ocupando o cargo, de Presidente do Conselho de Administração, quanto à presente liminar, com a urgência que o caso requer, no que se refere aos itens 1, 2 e 3.

Intime-se o autor popular para em 10 dias emendar/completar a inicial, sob pena de indeferimento do pedido deduzido no item 5 (fls. 31), ou seja, “… de imputação do dever de ressarcimento aos responsáveis por eventuais desfalques no patrimônio dos Fundos de Pensão …” No mesmo prazo deverá justificar o porquê de não ter incluído o CITIGROUP no pólo passivo.

Florianópolis, 26 de julho de 2005.

Hildo Nicolau Perón

Juiz Federal Substituto

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