Sala homogênea

Professores de Pernambuco garantem aumento na Justiça

Autor

25 de julho de 2005, 20h49

O Tribunal de Justiça de Pernambuco negou recurso ao estado para reformar decisão que fixou em 3,5% do salário mínimo o valor da hora/aula do salário dos professores do ensino básico, o equivalente a cerca de R$ 10. O aumento da remuneração beneficia 1.894 professores estaduais.

Na ação, o governo de Pernambuco alegou que a elevação do salário infringiu preceitos processuais e constitucionais. Segundo o estado, a decisão seria nula pois o Código de Processo Civil, em seu artigo 266 prevê a suspensão do processo pela morte de qualquer das partes — ao longo do processo, 17 dos professores que figuram na ação morreram. Também foi alegada pelo governo ameaça de grave prejuízo ao erário pela majoração.

Todos os argumentos foram afastados pelo relator, desembargador Jones Figueirêdo Alves, que se apoiou no princípio da isonomia, já que os ex-celetistas garantiram o direito ao aumento enquanto os professores estatutários continuaram a receber 2,08% do salário mínimo por hora aula. Ele também desconsiderou a alegação de grave ameaça ao erário. Segundo Figueirêdo Alves, “nenhum julgador produz seu pronunciamento decisório com máquina de calcular à mão. O direito é a sua única ferramenta”.

Para o desembargador, o pedido do estado careceu de plausibilidade jurídica, já que o princípio constitucional da isonomia “tem encontrado guarida na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça”.

Leia a íntegra da decisão

Seção Cível

AÇÃO RESCISÓRIA Nº 126401-9

Autor: ESTADO DE PERNAMBUCO

Réus: ALDA IZA CHAVES FREIRE e OUTROS

Relator: Des. Jones Figueirêdo Alves

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA:

Vistos etc.

1. Do pedido rescisório: Cuida-se de Ação Rescisória, sob a égide do art. 485, inciso V, do CPC, e fulcrada em alegada violação literal à disposição em lei, ajuizada pelo ESTADO DE PERNAMBUCO, representado por seus procuradores legais, em face de ALDA IZA CHAVES FREIRE e outros mil oitocentos e noventa e três (1893) professores estaduais, qualificados às fls. 125/280, tendo por objeto o V. Acórdão (fls. 514/515) exarado pelo 1º Grupo de Câmaras Cíveis deste Tribunal de Justiça, nos Embargos Infringentes nº 38021-0/01, interposto pela parte ora suplicada, no qual resultou reformado o decisum que negou provimento à Apelação Cível, garantindo-se, assim, aos servidores públicos embargantes o direito à percepção de suas respectivas remunerações, considerando o valor da hora-aula, nos termos percebidos pelos servidores paradigmas.

Sustenta, em linhas gerais, o Estado autor que o acórdão rescindendo nos Embargos Infringentes nº 38021-0/01, alterando a decisão por maioria exarada no Apelo, infringiu preceitos processuais e constitucionais.

Na sua ótica, houve afronta aos dispositivos legais consubstanciados nos arts. 1º, 2º, 5º, II, 7º, inc. IV, 18, 25, 37, caput, incs. X e XIII, 39, § 1º (na redação vigente quando da propositura da ação em que prolatada a decisão rescindenda), 61, § 1º, II, alínea “a”, 69, parágrafo único, da Constituição Federal; 13, I, III, e V e 25, § 1º, alínea “a”, 57, 60, II, 87, XVII, “b”, 96 e 200 da Constituição Federal de 1967; 265, I, 266 e 472 do CPC, artigo 19, § 1º, II da Constituição Estadual; art. 1º, § 2º, item XIV, da Lei Complementar Estadual nº 03/90 e da Lei Complementar Federal nº 101/00.

Sustenta, ademais, o Estado de Pernambuco que o julgado rescindendo é nulo, porquanto não observado o regramento insculpido no art. 265, inc. I c/c e art. 266 do Código de Processo Civil, onde se estabelece a indispensabilidade da suspensão do processo pela morte de qualquer das partes, até habilitação dos herdeiros ou do espólio. Nesse segmento, assevera que, tendo havido o falecimento de 17 (dezessete) servidores públicos (docs. fls. 716/735), contemplados com a decisão rescindenda, não poderia o feito prosseguir, sem a devida substituição processual, ou mesmo pedido de exclusão daqueles demandantes da lide, operando-se o efeito ex tunc, a partir do primeiro evento morte ocorrido (fl. 717).

No mais, a presente demanda desdobra-se nos seguintes fundamentos:

Da violação da decisão rescindenda às normas de leis federais e da Constituição da República (art. 5º, inc. II, 7º, inc. IV, 37, caput, 39, parágrafo 1º, na sua redação originária);

Da inexistência de suporte jurídico e de legislação estadual ou federal, determinando o pagamento de remuneração por hora-aula, com base no percentual de 3,5% (três virgula cinco por cento) do salário mínimo;

Da inequívoca afronta ao art. 472 do Estatuto de Ritos – por impossibilidade de extensão dos efeitos da coisa julgada na Reclamação Trabalhista nº 820/1979, em beneficio dos réus da presente rescisória;

Da lesão ao art. 1º, parágrafo 2º, item XIV da Lei Complementar Estadual 03/90 (Regime Jurídico Único);


Arremata o Estado autor, a justificar a tese empreendida, ser o aresto rescindendo contrário à posição firmada na Jurisprudência dos Tribunais Superiores e deste TJPE.

Nesse alcance, requer, in limine, a antecipação da tutela jurisdicional, com fulcro no art. 15 da Medida Provisória nº 2.180/2001 c/c o art. 273 ou 798 do CPC, visando sustar a exeqüibilidade do julgado, ante a coexistência do “fumus boni iuris” e do “periculum in mora”.

Destaca, sob o pálio do perigo da demora, a ameaça de grave prejuízo ao erário, diante da implementação do pagamento das respectivas verbas remuneratórias, obtidas pelos 1894 (hum mil novecentos e noventa e quatro) professores estaduais, e cuja devolução aos cofres públicos se afiguraria inviável, dada a natureza da vantagem pecuniária.

Postula, com efeito, a rescisão do julgado, e o proferimento de novo julgamento da causa (judicium rescisorium) com arrimo no art. 485, inciso V, no sentido de julgar improcedentes os pleitos formulados na inicial da ação originária.

Apresenta certidão de trânsito em julgado do reportado acórdão às fls. 962, verificando-se que a ação rescisória está proposta dentro do prazo legal.

É esta a suma do pedido rescindente.

Examino:

2. Dos fundamentos jurídicos apresentados pelo Estado Autor: A presente rescisória busca desconstituir o acórdão de fls. 514/515, pelo qual o 1º Grupo de Câmaras Cíveis deu provimento aos Embargos Infringentes (sob nº 38021-0/01), em reconhecendo a prevalência da isonomia reclamada pelos servidores do magistério público, ora réus, e permitindo-lhes a igualdade remuneratória de vencimentos correspondente aos daqueles 160 (cento e sessenta) servidores celetistas, então favorecidos com a decisão prolatada pela Justiça Laboral, alicerçada no Decreto Federal nº 67322/70 (in Reclamação Trabalhista nº 820/1979 e confirmada pelo TRT, no julgamento do RO nº 186/80, fls. 827/839).

Sustenta-se, primacialmente, a fundamentação jurídica da presente ação rescisória em considerações acerca do Decreto Federal nº 67322/70, que serviu de supedâneo jurídico ao direito primitivamente postulado por um conjunto de professores estaduais.

O aludido Decreto nº 67322/70 – dispondo sobre a fixação de limite mínimo para a retribuição de professores do ensino médio oficial, a ser observado pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, como condição para a utilização da parcela destinada à Educação, nas quotas dos respectivos Fundos de Participação – foi editado sob à égide da Constituição Federal de 1967, instituída em período revolucionário.

Como cediço, a Carta de 1967 possuía uma postura negativa, no sentido de coibir a delegabilidade de regramento de matéria de sua competência. Tal circunstância se prendia ao fato de o art. 6º, parágrafo único, da CF/67, com a Emenda nº 01/69, vedar a qualquer dos poderes delegar atribuições, isto é, era interditado ao Poder Legislativo delegar ao Executivo atribuição sua, deixando para ser regrado por decreto o que era para sê-lo por lei.

Eis o teor do reportado dispositivo constitucional:

“Art. 6º, Parágrafo Único: Salvo as exceções previstas nesta Constituição, é vedado a qualquer dos poderes delegar atribuições; cidadão investido na função de um deles não poderá exercer a de outro”.

Em outras palavras, a função normativa do Poder Executivo estaria limitada ao denominado principio da indelegabilidade de atribuições, segundo o qual não caberia inovar na ordem jurídica, criando direitos, obrigações ou proibições, mediante decreto. Cingia ao Executivo apenas a prerrogativa de estabelecer normas sobre a forma como a legislação haveria de ser cumprida pela Administração.

Assim, de acordo com o art. 8º, inc. XVII, letras “b” e “q” da CF/67, haveria competência privativa da União, para legislar sobre matéria de direito do trabalho, bem como sobre as diretrizes e bases da educação nacional. Da mesma forma em que, o seu art. 25 preconiza estarem os Fundos de Participação atrelados a regulamentação por lei federal e subordinados ao cumprimento de diversas condições dispostas no parágrafo 1º e alíneas.

Doutra banda, aponta o Estado que o princípio da isonomia de vencimentos invocado no acórdão rescidendo é aquele insculpido no antigo art. 39, parágrafo 1º, da Constituição Federal de 1988. Tal preceito constitucional consagrara aos servidores públicos, de atribuições idênticas ou assemelhadas, dos quadros do mesmo Poder Público ou de outro, o direito de perceber as vantagens remuneratórias nos mesmos moldes.

Com efeito, pondera que a isonomia sob o manto da res judicata, sem, todavia, a precedência de lei estabelecendo parametralmente o direito ao piso salarial, a ser estendido aos servidores demandados, não poderá permanecer incólume.


E, desse modo, ainda que exaltada a supremacia de tal principio, não se poderia olvidar da sua vulnerabilidade, tendo em vista não haver direito subjetivo efetivamente declarado no Decreto Federal nº 67322/70, como já dito anteriormente.

Isto porque, da leitura do Decreto nº 67.322/70, verifica-se a priori não haver conteúdo gerador de direito novo, ou mais especificamente, de fixação de piso salarial para a categoria de magistério estadual. E, neste sentido, sublinha o Estado Autor, o Acórdão em Recurso Extraordinário de n° 94.595, segundo o qual “é inconstitucional, por ofensa aos arts. 87, 89, XVII, “b” da Constituição Federal, o entendimento de que o Decreto federal n° 67.332/70, estabeleceu norma obrigatória para a fixação, pelos Estados membros, de salários mínimos para os professores destes.” (STF – 2ª Turma, Rel. Min. Moreira Alves, D.J.U., de 03.11.1981).

E, em havendo colisão de princípios, ao magistrado caberá aplicar o principio da proporcionalidade, como um meta-princípio ou “princípio dos princípios”, buscando preservar evidentemente aqueles em conflito.

3. Dos fundamentos jurídicos do Acórdão rescindendo: Realçados que se acham, uma vez mais, os fundamentos jurídicos nucleares da presente demanda; cumpre, agora, em contraponto, a análise do acórdão rescindendo. A sua ementa, no que interessa, elucida o posicionamento judicante, ora objeto do juízo rescisório:

“EMBARGOS INFRINGENTES. (…)

No mérito: Cargos de atribuições iguais ou assemelhados de um mesmo Poder. Aplicação do princípio da isonomia de vencimentos. Magistério do 1º e 2º graus do Estado de Pernambuco. Inadmissibilidade de remunerações diferenciadas, exceto no que se refere às vantagens de natureza individual expressas no texto da Carta Magna. Inteligência do disposto no art. 39 § 1° da Constituição Federal em vigor.”

(fls. 514 destes autos).

Em julgamento proferido em data de 17.05.2000, por maioria de votos, deu-se, portanto, como espelha o Acórdão citado, provimento aos Embargos Infringentes, com o conseqüente amparo à pretensão dos professores embargantes de lhes ser assegurado tratamento isonômico vencimental. Figurou como relator o Des. Freitas Medeiros, acompanhando o seu voto condutor, os desembargadores Ivonaldo Pereira de Miranda, Antonio Amorim e José Maria Florentino; vencidos o Revisor, des. José Fernandes e o Des. Márcio Xavier. Presidiu a sessão do 1º Grupo de Câmaras Cíveis, o Des. Etério Galvão. (fls. 514/546).

Retenha-se, por relevante, o voto condutor no julgamento dos Embargos Infringentes, quando o eminente Des. Relator, pronunciou o seguinte, verbis:

“É evidente que diante da clareza da norma constitucional e de sua repetição na legislação menor, no âmbito estadual, ociosa e descabida se torna a invocação de leis e decretos que disciplinaram a matéria anteriormente à vigência da Lei Maior promulgada em outubro de 1988, não cabendo, outrossim, a inócua discussão em torno do motivo que originou a desigualdade remuneratória entre professores, na mesma situação funcional, e contra a qual se insurgiram os ora embargantes, por verem nisto um desrespeito ao princípio da isonomia”. (fls. 520/521)

E adiante:

“No caso ora submetido a julgamento, ao contrário do que sustenta o Estado de Pernambuco, não pretendem os embargantes que lhes sejam estendidas quaisquer vantagens obtidas pelos ex-celetistas através de decisão da Justiça do Trabalho. O que aqueles servidores, hoje também estatutários, obtiveram na Justiça do Trabalho não pode ser classificado como uma vantagem individual no sentido jurídico da palavra, semelhante, por exemplo, a de uma gratificação por tempo de serviço ou por desempenho de funções especiais, ou ainda pelas condições anormais em que realizam os serviços, nem muito menos em razão de condições pessoais do servidor.

“Eles, os ex-celetistas, obtiveram a diferenciação remuneratória em decorrência da alteração do cálculo básico dos próprios vencimentos quando a hora/aula dos demais professores estatutários continuou correspondendo 2.08% do mesmo salário mínimo. Vencimento não é vantagem pessoal, como esclarece Hely Lopes Meirelles. Como a hora/aula é a base para o cálculo dos vencimentos, estabeleceu-se uma situação de desigualdade entre professores e professores, impossível de admitir-se em face do mandamento constitucional inserido no art. 39 § 1º da Carta Magna”. (grifos nossos).

(fl. 523)

E continuando, o Relator:

“O que fica bem claro, portanto, para dirimir quaisquer dúvidas, é que a Justiça do Trabalho não criou e nem poderia legalmente criar uma nova vantagem individual para os ex-celetistas, como pretende o Estado embargar, mas tão-somente alterou o percentual da hora/aula incidente sobre o salário mínimo, acarretando uma diferença dos próprios vencimentos, não das vantagens individuais que tem natureza jurídica bem diversa.


(…) É contra essa discriminação remuneratória, inadmissível diante do texto da Constituição em vigor, que se insurgem os embargantes, na condição de professores do 1º e 2º graus, responsáveis que são pela formação escolar básica da juventude pernambucana. (grifos nossos).

(fls. 523/524)

E, com a devida percuciência, coloca o Relator, a estilete, o seguinte:

“(…) De somenos importância é o fato da diversidade de vencimentos entre os embargantes e os seus colegas ex-celetistas decorrer de uma decisão judicial favorável a estes últimos, ocorrida anteriormente à vigência da Constituição de 1988. Promulgada esta, com a adoção do Regime Jurídico Único, impossível se afigura, em face do art. 39 § 1°, a manutenção da remuneração diferenciada para CARGOS DE ATIRIBUIÇÕES IGUAIS OU ASSEMELHADOS.” (grifos nossos).

(fl. 524).

Segue-se que, nessa mesma linha, e com idêntica precisão, o Supremo Tribunal Federal diante do Recurso Extraordinário nº 402.517-5-PE e em face do aludido Acórdão, ora rescindendo, assim colocou:

“(…) Essa, no entanto, não é a hipótese dos autos, nos quais foi dirimida a controvérsia pertinente ao tratamento isonômico conferido aos professores do magistério estadual, porque a matéria foi decidida à luz das disposições da Lei Complementar n° 03/90, que instituiu o Regime Jurídico Único dos servidores do Estado de Pernambuco. É o que se infere do voto de fls. 63…”(grifos nossos).

(fl. 570).

E, com tal entender, “certo que a solução da lide se deu com base em interpretação de norma local, no caso a LC n 03/90 (Súmula 280)”, negou o Ministro Relator seguimento ao Recurso Extraordinário (20.09.2004).

Referiu-se o preclaro Relator, Ministro Eros Grau, ao voto do eminente Desembargador Ivonaldo Pereira de Miranda, cuja transcrição, vale, mais uma vez, ser feita, em síntese, ilustrando a controvérsia reaviventada:

“(…) Aprecio o mérito. O caso não é de tão difícil julgamento. Sabem todos que se refere a professores do Estado de Pernambuco, de Ensino Básico, que umas tem 3,5% sob o salário mínimo para base de cálculo de sua remuneração, enquanto outras tem 2,8%. E pleiteiam com a ação a isonomia, a igualdade, princípio basilar da Constituição Federal. As Embargantes são professores que antes seriam regidas pela Lei Trabalhista, tiveram prejuízo na sua remuneração, pois o cálculo da sua remuneração recai sobre percentual menor, 2,8% enquanto outras percebem 3,5% sob uma diminuição do valor dessa remuneração.

“Aqui estamos a apreciar apenas a divergência, pela natureza do recurso interposto, e a divergência foi no voto do eminente Des. Alves da Rocha, que reconhecia esta isonomia, de aplicação de 3,5% sobre o valor do salário mínimo regional. Prende-se unicamente à apreciação dessa divergência. É o que diz a nossa Lei de Rito. Tudo foi causado pela edição da Lei Complementar nº 3, em 1990. A Constituição Federal, de 1988, assegura a isonomia, a igualdade, não se entende funcionários com a mesma prestação de serviços, a mesma categoria, mesmo tipo de serviço prestado, no caso, o magistério, de que haja diferença de remuneração.” (grifos nossos).

(…)

Acrescente-se, de logo, que ao pugnar o Estado de Pernambuco, por via de Agravo Regimental no referido Recurso Extraordinário, pela incidência da

Súmula n° 339 daquela Corte, afastada pelo Acórdão ora rescindendo, foi negado provimento ao Agravo interno, à unanimidade (fls. 572/589), com o Acórdão assim ementado:

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO. VENCIMENTOS. LEI COMPLEMENTAR DO ESTADO DE PERNAMBUCO Nº 3/90. DIREITO LOCAL. SÚMULA 280-STF. Para dissentir do aresto recorrido que, ao interpretar disposições das normas infraconstitucionais, deferiu às autoras o direito à percepção do salário-aula à razão de 3,5% (três e meio por cento), impõe-se a análise dos fatos que deram ensejo à causa e a legislação estadual disciplinadora da matéria, o que é vedado nesta instância (Súmula 280). Agravo regimental a que se nega provimento. (grifos nossos).

(D.J.U., de 17.12.2004).

(fl. 582).

Registre-se, outrossim, que o Recurso Especial de n° 329.661-PE, interposto contra o presente Acórdão rescindendo, não foi conhecido (fls. 548/560) ressentido de pressupostos de sua admissibilidade, por atacar acordão fundado em parâmetros constitucionais, ou mais precisamente “como visto, o thema sub

judice envolve discussão sobre tema de direito constitucional”. (fl. 555), tendo sido negado seguimento, no Supremo Tribunal Federal, ao Agravo de Instrumento n°434.120-9, interposto contra o Recurso Especial não conhecido, e afinal negado provimento ao Agravo Regimental (fls. 562/568).

Nessa linha de pensar, a uniformidade remuneratória decorre da própria Lei Complementar n° 03/90 que instituiu o Regime Jurídico Único. Isso significa dizer que, perante tal regime, servidores ex-celetistas e não celetistas, todos são estatutários, não se compreendendo possam uns ganhar menos que outros em face da percepção dos vencimentos para cargos de atribuições iguais ou assemelhados (art. 1º, § 2º, inciso XIV, LC 03/90), ressalvadas as vantagens de caráter individual e as relativas à natureza ou ao local de trabalho (art. 1º, § 2º, inciso XIV, 2ª parte, LC 90/03).


4. Da coisa julgada rescindível: Descortinados os meandros do cenário de interesses antagônicos do composto litigioso, a ensejar o manejo da presente ação, tenha-se, presente, na via de conseqüência lógica, o controle da subsunção pela ação rescisória.

Essa tendência da revisão da coisa julgada encontra-se intimamente atrelada à concepção de “uma coisa julgada suscetível de ser atacada” (Paulo Roberto de Oliveira Lima, in “Teoria da Coisa Julgada”, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 111).

Como refere Teresa Arruda Alvim Wambier em “Controle das Decisões Judiciais por meio de Recursos de Estrito Direito e de Ação Rescisória” (Ed. RT, São Paulo, 1ª ed., 2001), “à circunstância de a ação rescisória poder ser intentada contra sentença de mérito transitada em julgado, quando há ofensa a “literal”disposição de lei, Teori Zavascki chama de relativização da coisa julgada. Observa, com acerto, que a expressão lei, usada no art. 485, V, do CPC significa norma jurídica no sentido lato, abrangendo lei federal, complementar, ordinária, Constituição Federal, leis estaduais, municipais, medida provisória, decreto legislativo, resolução, etc.”

De fato. A ação rescisória instala relação jurídico-processual própria, em processo autônomo, objetivando desconstituir o julgado que ataca, observado o prazo decadencial para a nova demanda.

Desse modo, não há negar pela admissibilidade da ação rescisória intentada pelo Estado de Pernambuco, para o fim de ser conhecida e processada, quando apontada a necessidade de rescisão do julgado. Este juízo de admissibilidade positivo é provisório e de probabilidade, juízo de viabilidade para o exame definitivo das hipóteses trazidas subjacentes à sua propositura.

5. Do pedido de suspensão dos efeitos do Acórdão rescindendo: Admitido o processamento da presente ação, cumpre-me, nesta fase prefacial, apreciar o pedido formulado pelo Estado de Pernambuco, sob a égide dos ditames da antecipação da tutela de mérito.

Segue-se que, diante do novel instituto operado pelo art. 273 do C.P.C., o sistema processual que nega efeito suspensivo à execução do julgado rescindendo por força de ação rescisória (art. 489, caput, CPC) poderá receber a devida atenuação, quando relevantes os fundamentos da demanda (verosssimilhança da alegação, v.g. art. 273, caput, parte final) e quando aquela execução acarrete comprometimento irremediável ou de difícil reparabilidade ao direito que o autor afirma possuir (art. 273, I). São elementos objetivos convergentes e concomitantes do instituto.

Logo, o rigor do art. 489 do Estatuto de Ritos se flexibiliza ante o disposto no art. 273 do mesmo diploma legal, porque as duas regras podem conviver, harmonicamente, no mesmo sistema processual. Elas não são incompatíveis entre si, cabendo na interpretação de ambas, o resguardo à efetividade da própria jurisdição em ação rescisória.

A doutrina tem assinalado, a propósito, que “em caso de gravidade acentuada e de manifesta relevância da pretensão de rescindir a sentença contaminada por ilegalidade, a Jurisprudência vem admitindo, com acerto, medida cautelar com o fito de suspender, liminarmente, a exequibilidade do julgado rescindendo. A partir, porém, da Lei nº 8952/94, a medida adequada para se obter dita suspensão, quando presentes os requisitos do art. 273 do CPC, é a antecipação de tutela. Tornou-se enfim, pacífico, que a sentença, por se revestir da autoridade da coisa julgada, não gera efeitos imunes a medidas preventivas manejáveis em torno da ação rescisória” (in Curso de Direito Processual Civil, Humberto Theodoro Jr., 31ª edição, vol. I, Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 588). (grifos nossos).

Veja-se, a propósito, o ditame do art. 5º da Lei nº 8.437/92, que já assegurava, antes do instituto da antecipação da tutela, trazido pela Lei nº 8.952/94, a possibilidade de suspensão dos efeitos da sentença rescindenda, nas rescisórias propostas pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, bem como pelas autarquias e fundações instituídas pelo Poder Público, quando caracterizada a plausibilidade jurídica da pretensão.

Não é outra a orientação do Superior Tribunal de Justiça, acerca do tema:

“Revela-se cabível a antecipação dos efeitos da tutela em ação rescisória, objetivando suspender a execução do acórdão rescindendo, desde que presentes os requisitos do art. 273 do CPC, mercê do disposto no art. 489 do mesmo diploma legal.”

(1ª Seção, AgRg na AR 1291/SP, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 27/09/2004). (grifos nossos).

“A despeito da norma inserta no art. 489 do Código de Processo Civil – “a ação rescisória não suspende a execução da sentença rescindenda” – a jurisprudência desta Corte tem admitido, excepcionalmente, a antecipação dos efeitos da tutela, em sede de ação rescisória, para suspender a execução da decisão rescindenda, quando presentes as hipóteses previstas no art. 273 do Código de Processo Civil” (3ª Seção, AgRg na AR 1423/PE, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ 27/09/2003). (grifos nossos).


Pois bem.

Impõe-se, destarte, a análise dos requisitos legais para a antecipação dos efeitos da tutela em ação rescisória, em desiderato de suspender a execução do acórdão rescindendo, acendrando-se, aqui, as questões postas pela inicial e no acórdão hostilizado, para efeito de avaliar, configurada ou não, a relevância da fundamentação do pedido vestibular.

Do antagonismo dos fundamentos jurídicos antes sustentados, extrai-se a síntese apertada da controvérsia posta na lide rescisória. E mais, densamente, impõe-se destacar o seu núcleo conflitante, a partir de saber se a decisão judicial do caso paradigma (“leading case”), tornado coisa julgada imútavel para os servidores dela atendidos, constituiu, ou não, mera vantagem pessoal daqueles servidores, ex-celetistas, tese esgrimada pelo Estado ora autor.

Nesse particular, o Estado autor sustenta que os 161 (cento e sessenta e um) servidores paradigmas detinham (e detém) uma condição pessoal que os descriminava (e descrimina) dos demais professores da rede estadual de ensino, inclusive dos 1.894 (mil oitocentos e noventa e quatro) demandados desta rescisória.

Se assim for condição privilegiada, como vantagem pessoal, sem implicar direito aos demais, a sistemática de quantificação da remuneração em sendo aplicável aos demais professores, constituiria, conforme pondera o Estado autor, negação do próprio princípio de isonomia, aplicado ao reverso.

Entretanto, a esse propósito, o Tribunal de Justiça de Pernambuco, já respondeu, no Acórdão seguinte:

“Apelação Cível. Remessa Necessária. Ação revisional de vencimentos e/ou proventos de servidores públicos estaduais. Professores estaduais. Vencimentos (hora/aula). Regime celetista e estatutário. Inexistência de vantagem individual pecuniária. Atribuições idênticas. Uniformidade remuneratória. (…) Improvimento indiscrepante do Reexame Compulsório e prejudicialidade do recurso de apelação, nos termos dos votos taquigrafados.” (grifos nossos). (TJPE – 3ª Câmara Cível, Rel. Des. Macedo Malta, j. em 24.10.2002, DOPJ de 17.12.2002).

É do percuciente voto condutor do eminente Relator, Des. Macedo Malta, atual e digno presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco, que se extrai, inclusive, o seguinte:

“(…) Aqui é um problema de isonomia, aqui não é problema de equiparação em absoluto. (…) O pedido dos autos não é a aplicação do referido Decreto aos seus vencimentos, nem também que fiquem os seus proventos vinculados ao salário mínimo. O pedido é de equiparação, (ou melhor, isonomia) salarial, ou seja, que os professores que exerçam as mesmas funções tenham os mesmos direitos, a mesma remuneração. Os professores celetistas, nesse caso, serviriam de paradigmas, uma vez que exercem as mesmas funções e tem a mesma capacidade técnica que os Estatutários. Portanto, não há como se justificar que dois funcionários, dentro da mesma função, exercendo o mesmo labor técnico, tenham vencimentos díspares, ao ponto de ser um praticamente o dobro do outro. Como muito bem salientado, na sentença de fls., essa situação fere o princípio constitucional da isonomia, porque dá tratamento desigual àqueles que são iguais. (…)

E o Revisor naquele mesmo julgamento, Des. Freitas Medeiros, reportando-se, inclusive, ao Acórdão ora rescindendo, deixou assente, outra vez:

“Que fique bem claro, portanto, para dirimir quaisquer dúvidas, que a Justiça do Trabalho não criou (nem poderia criar) uma nova VANTAGEM INDIVIDUAL para os ex-celetistas, como pretende o Estado apelante, mas, tão-somente, alterou o percentual da HORA-AULA, incidente sobre o salário mínimo, acarretando uma diferenciação nos próprios VENCIMENTOS, não nas VANTAGENS INDIVIDUAIS, que têm natureza jurídica bem diversa.”

De tal sentir, não resulta incontroversa a tese afirmada pelo Estado autor em relevância do direito afirmado, para efeito da antecipação.

De mais a mais, é preciso conferir, ainda de imediato, que para reconhecer o tratamento isonômico a imperar entre os servidores, a interpretação que possa ser dada ao acórdão paradigma afigura-se diferente daquela dada pelo Colegiado do 1º Grupo de Câmaras Cíveis no Acórdão ora rescindendo.

É que, se de um lado, o “leading case” arrimou-se no Decreto n° 67.322/70, quando inconstitucional o entendimento de o mesmo haver estabelecido norma obrigatória para a fixação, pelos Estados Membros, de salários mínimos, para os professores destes (v.g. STF – Recursos Extraordinários nºs. 94.334-BA (D.J.U. de 02.10.1981); 94.595-PE (D.J.U. de 03.11.1981); 96.290-PE (D.J.U. de 18.05.82), 97.090-PE (D.J.U. de 13.08.82); 101.131-PE (D.J.U., de 18.08.83), tendo o decreto em comento, apenas consignado diretrizes aos Estados e Municípios para se beneficiarem de cota mínima dos recursos do Fundo de Participações, no âmbito educacional, sugerindo um limite mínimo de 3,5% (três e meio por cento) sobre o salário mínimo mensal de cada região, para a hora-aula; o Acórdão rescindendo, a seu turno, pronunciou-se, tão somente, acerca da “inadmissibilidade de remunerações diferenciadas, exceto no que se refere às vantagens de natureza individual expressas no texto da Carta Magna”, segundo a inteligência do disposto no art. 39 § 1° da Constituição Federal em


vigor, e em compasso da Lei Complementar n° 03/90, quando pontificou o Regime Jurídico Único, e notadamente o seu artigo 1°, § 2º inc. XIV.

Então, a questão fundamental de embate não está em malferir o Decreto n° 67.322/70, admitido a favor dos servidores paradigmas, por ato do julgamento da Recl. Trabalhista n° 820/1979, onde sabidamente, não se produz efeitos “erga omnes” (efeitos em benefício de terceiros estranhos à lide), sob o arrimo, inclusive, do que depõe o art. 472 do Código de Processo Civil.

A “vexata quaestio” está, muito ao revès, e pontualmente, na relevante e significativa circunstância jurígena, com efeitos irradiantes, de os mesmos servidores, terem sido integrados pela Administração Pública ao Regime Jurídico Único, apresentando critério de remuneração diferenciado, a tornar, de tal conseqüência, sem incidência real o artigo 1°, § 2º inc. XIV da LC n° 03/90, quando os demais servidores percebem, atualmente, remuneração aquém daqueles.

O Estado de Pernambuco, ao admitir a opção dos ex-celetistas paradigmas, beneficiados com a decisão judicial, pelo regime jurídico único, terá, igualmente, admitido a repercussão dos seus atuais salários aos demais integrantes do mesmo regime, porquanto é a mesma Lei Complementar n° 03/90, que em seu artigo 2º dispõe, verbis:

Art. 2º – Para os fins de que trata o Art. anterior, as atuais funções permanentes existentes no âmbito da administração direta do Poder Executivo, mantidos os respectivos ocupantes e atuais níveis de remuneração, ficam transformadas em Cargos Públicos.

§ 1º – A transformação é feita para cargo absolutamente igual, em nomenclatura, remuneração básica e atribuições, às funções objeto do contrato de trabalho celebrado com a administração pública.

E, nesse caso, a aplicação do artigo 1°, § 2º inc. XIV da LC n° 03/90, afigurar-se-á inevitável, em sua índole constitucional.

Ora. A admissão daqueles servidores, em patamar financeiro diferenciado, por haverem sido recepcionadas as suas opções ao Regime Jurídico Único, constitui lei, em caso concreto, isto porque a solução normativa de admiti-los (os ex-celetistas, paradigmas) significa norma jurídica stricto sensu, consagradora, aliás, do pagamento na forma de que já titulares, como implicou a regra do art. 2º da L.C. 03/90, antes citado.

Não há negar esse fato. É fato incontroverso: O juiz sentenciante reconheceu que cinqüenta e três (53) professores celetistas foram optantes, e, após a opção, “com os vencimentos diferenciados em relação aos demandantes, fere, os princípios da legalidade e da isonomia” (fl. 428).

Embora adotando, em equação contrária, o entendimento pela improcedência do pedido dos ora demandados, foi o douto magistrado “a quo” que, atento e com precisão instante e ímpar, assinalou o problema em seu núcleo de ilegalidade, ao assinalar a particularização dos vencimentos a uma pequena parcela de professores, quando ingressos no Regime Jurídico Único, criando-se uma situação “esdrúxula e antijurídica”, face aqueles optantes deterem direito à remuneração diversa. Ter-se-ia equivocado, todavia, o nobre magistrado, ao contemplar esse direito como vantagem pessoal, embora ínsita de remuneração vencimental.

É irretorquível que se os servidores paradigmas tivessem permanecido no regime jurídico anterior, não aderindo e sendo aceitos, como foram, ao Regime Jurídico Único, estes constituiriam “quadro suplementar em extinção”, e suas remunerações não teriam sido projetadas ao Regime Jurídico Único, vingando a aplicação cediça do art. 472, 1ª parte, do Código de Processo Civil.

Nesse alcance, preceitua o art. 3°, § 2º da Lei Complementar n° 03/90, verbis:

Art. 3º ………………………………………………………. § 2º – Os servidores da administração direta do Poder Executivo, das autarquias e das fundações dentro de 15 (quinze) dias, manifestarem opção pela permanência no regime jurídico anterior, a este continuarão vinculados, integrando Quadro Suplementar em Extinção.

No regime estatutário, todavia, as regras que lhes são inerentes timbram o princípio da isonomia de vencimentos em face dos servidores em cargos iguais e assemelhados.

Ora. Diante de tal desenho, a não manutenção imediata do decisum rescidens implicará em severa afronta ao princípio da isonomia resguardado pelo Acórdão rescindendo. Queda-se inservível, nessa ordem, a invocada relevância da fundamentação, pelo Estado autor, para efeito de obtenção da tutela liminar antecipatória de mérito, porquanto o seu alcance, acaso deferida, significaria, em última “ratio” suspender a eficácia do próprio artigo 1°, § 2º inc. XIV da LC n° 03/90.

Mas não é só isso.

A um, a decisão do Supremo Tribunal Federal que negou seguimento ao Recurso Extraordinário n° 402.517-5-PE diante do Acórdão, ora rescindendo, “certo que a solução da lide se deu com base em interpretação de norma local, no caso a LC n 03/90 (Súmula 280)”, não é isolada.


Em situação parelha, o Supremo Tribunal Federal, mais recentemente, afastou a aplicação do verbete sumular n° 339 daquele Pretório, “quando legislação local específica estabelece a isonomia entre vencimentos de servidores da Administração local” e “a matéria foi solucionada a partir da interpretação de norma de direito local e da análise dos fatos que deram origem à causa” (STF

– 1ª Turma, Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 365.887-PA, Rel. Min. Eros Grau, in DJU de 22.04.2005).

Na análise do caso, o Ministro Relator acolheu, incólume, o Acórdão atacado, no assento seguinte:

“os impetrantes, na verdade, com o presente Mandado de Segurança, não obtiveram a vinculação de seus vencimentos ao salário mínimo vigente, mas, sim, em termos de isonomia salarial ou vencimental, de acordo com a norma do parágrafo primeiro do art. 39 da Constituição Federal, vencimentos iguais aos dos outros médicos veterinários da Secretaria de Estado da Agricultura do Pará. Aliás, o direito que os impetrantes pedem lhes seja reconhecido, está, também, previsto no art. 122 da Lei Estadual n° 5.810, de 1994 (..).

Não precisa dizer que o art. 122 da Lei estadual paraense n° 5.810/94, repete em sua inteligência maior, a regra do inciso XIV do § 2º do art. 3º da Lei Complementar pernambucana n° 03/90.

O Ministro Relator, ao afastar a aplicação da Súmula n° 339 do STF, expressou, com clareza solar, a questão nodal da controvérsia:

“(…) insisto em afirmar que essa decisão limitou-se a equiparar vencimentos de servidores, com base não somente no princípio constitucional da isonomia, mas também com esteio em legislação local específica que prevê a referida equiparação. Esse entendimento encontra perfeita adequação com a jurisprudência da Corte, devendo ser afastada a aplicação do Enunciado n. 339 da Súmula, uma vez, que no caso, há legislação específica apta a fazer incidir a isonomia pleiteada pelos impetrantes.”

A compreensão tópica, dessa linha jurisprudencial, é a de que o Acórdão rescindendo não teria, como alegado pelo Estado autor, estendido os efeitos da coisa julgada, relativa à reclamatória trabalhista dos servidores paradigmas.

A dois, alinhando-se, à consideração supra, tem sido entendido pelo Superior Tribunal de Justiça o incabimento de medida liminar para suspender a execução do julgado rescindendo, quando a questão debatida, frontalmente pela ação rescisória, não se constituiu objeto do decisum rescindendo. Bem de ver que é o próprio Estado autor, que chega a admitir, em sua inicial, que:

“É insofismável, e pode ser conferido pela simples leitura do Acórdão rescindendo, que os doutos julgadores tomaram como irrelevante qualquer discussão pertinente ao fundamento específico da existência de diferenciação remuneratória entre os autores da reclamação trabalhista e aqueles que promoveram a ação ordinária em que prolatada a decisão rescindenda. Simplesmente adotaram como razão do deferimento da pretensão dos ora réus o fato objetivo de haver diferença entre as remunerações.” (grifos nossos).

(fl. 50).

Atente-se que, malgrado a assertiva do Estado autor, não foram interpostos, oportuno tempore, Embargos declaratórios ao Acórdão, ora rescindendo.

Nessa diretriz, recolhe-se o julgado seguinte, com aplicação analógica:

“(…) Ação rescisória. Concessão de medida cautelar para suspender a execução do julgado rescindendo. Impossibilidade. Inexistência de plausibilidade jurídica da pretensão rescindenda. Questão que não se constituiu em objeto do decisum rescindendo.” (STJ – 6ª Turma,REsp.nº 477.481-RN, Rel.p/Acórdão Min.Hamilton Carvalhido, DJU de17.12.2004). (grifos nossos).

A três, sobreleva notar, que os Recursos Extraordinários nºs. 94.595-PE (D.J.U. de 03.11.1981); 96.290-PE (D.J.U. de 18.05.82), 97.090-PE (D.J.U. de 13.08.82); 101.131-PE (D.J.U., de 18.08.83), todos de Pernambuco, o primeiro citado pelo Estado autor, são anteriores à Lei Complementar n° 03/90, não guardando, daí, por isso mesmo, nenhuma pertinência com o Acórdão rescindendo.

Nessa esteira, impende considerar, portanto, em face do pedido prefacial do Estado autor, que a concessão da tutela antecipatória, em sede de rescisória, sujeita-se, inexoravelmente, à plausibilidade jurídica da pretensão. E pelo conduto minudente do exposto, não se encontram, às expressas, aperfeiçoados os elementos definidores do art. 273 do CPC.

Bem de ver a ensinança de Teori Albino Zavascki, lúcido na afirmativa:

“…não há dúvida que a suspensão da execução da sentença rescindenda tem natureza antecipatória. A ordem de sustação, determinada pelo tribunal, é exemplo típico de medida com integral relação de pertinência em face da conseqüência jurídica resultante do direito afirmado pelo autor da ação rescisória.


(apud VASCONCELOS GUERRA, Adriana Diniz de; “A Tutela Antecipada e sua Admissibilidade em sede de Ação Rescisória”, Ed. Forense, 2001, p. 115).

Diante disso, consabido que a princípio, “a ação rescisória não suspende a execução da sentença rescindenda” (art. 489,CPC) e que, somente excepcionalmente, tem sido admitida a tutela antecipada em sede da ação rescisória, quando presentes, de forma inequívoca, as hipóteses previstas no art. 273 do CPC, o pleito que se pretende ver assegurado até o julgamento da ação rescisória, encontra óbice legal, a saber do disposto no inciso XIV do § 2º do art. 3º da Lei Complementar n° 03/90, tudo a demonstrar a falta de relevância na fundamentação.

Mais precisamente: a isonomia preconizada no art. 39 § 1º da Constituição Federal se acha viabilizada mediante lei, ou seja, a própria Lei Complementar nº 03/90, na qual resultou fundado o Acórdão rescindendo.

Em outras palavras, não há de se reconhecer, de pronto, a plausibilidade jurídica do direito vindicado, em suspensão do acórdão rescindendo, porquanto a hipótese nele sufragada, a do princípio constitucional da isonomia, tem encontrado guarida na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

Posicionamento diverso implicaria em violar, além do princípio isonômico, dois institutos preservados também pela Constituição Federal, um instrumental, outro substancial: a coisa julgada e a segurança jurídica.

Neste ponto, em que analisado pressuposto basilar do art. 273 do CPC, o da plausibilidade jurídica do direito invocado, desprovida a verossimilhança do alegado, é útil lembrar que o pressuposto do “periculum in mora” não subsiste isolado, máxime quando o julgamento da ação rescisória não se achará inviabilizado sem a liminar pretendida, ou seja, não existem os riscos de ineficácia a que esteja eventualmente sujeito o decisum do juízo rescisório. Somente “em hipóteses raras, tem-se afastado a incidência da norma expressa no art. 489 do Código de Processo Civil, porém desde que presentes a plausibilidade jurídica concernente à rescisória e o periculum in mora. Ausentes esses pressupostos, mantém-se a eficácia da coisa julgada.” (STJ – 2ª Seção, AgRg. na MC 4170-SP, Rel.Min. Castro Filho, DJU de 25.08.2003).

Por derradeiro, e de passagem, não impressiona, ademais, a arguição de nulidade do processo, por violação aos artigos 265, I e 266 do Código de Processo Civil. Em desprestígio da tese, observa-se que o primeiro evento morte (fl. 717) teve lugar em data de 07.09.1997, ou seja, após a r. sentença, proferida em data de 05.05.1997 (fls. 394/429) e após o recurso apelatório (fls. 430/435),

valendo dizer, singelamente, que, sucedido o falecimento, vê-se dessa assimilação fática, no plano processual, apenas, a rigor, inexistentes recursos subseqüentes interpostos pelos autores falecidos (art.37, e § único, CPC), sem que tal fato contamine o processo, em face dos interesses dos demais. Máxime quando não provados, em tempo próprio, os respectivos óbitos, para efeito de suspensão do processo.

No que basta ao arremate e sem digressões, uma reflexão é cogente: observada a discrepância remuneratória entre os servidores professores, e em efetividade do Acórdão rescindendo, não revela juridicidade o argumento do Estado autor, à fl. 119 dos presentes autos, explicitamente endereçado à pretender legitimar o pedido liminar e/ou justificar a rescindibilidade da coisa julgada, de oneração mensal dos cofres públicos em R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais) e de execução por quantia certa da decisão rescindenda, a ostentar valor de R$ 416.747.972,87 (quatrocentos e dezesseis milhões, setecentos e quarenta e sete mil, novecentos e setenta e dois reais e oitenta e sete centavos), como a viciar, prima facie, o julgado questionado.

Nenhum julgador produz seu pronunciamento decisório com máquina de calcular à mão. O direito é a sua única ferramenta.

Posto isso, não configurados, quanto bastante, os pressupostos do art. 273 do Código de Processo Civil, diante da falta de plausibilidade jurídica do pedido, mormente quando visível o desiderato do Acórdão exeqüendo de assegurar aos ora demandados, o princípio de isonomia vencimental, nos exatos termos do disposto no inciso XIV do § 2º do art. 3º da Lei Complementar estadual n° 03/90, indefiro o pedido de suspensão dos efeitos do Acórdão rescindendo.

Citem-se os suplicados para responderem, querendo, no prazo de trinta (30) dias, ex-vi art. 491, CPC.

Comunique-se a presente decisão ao MM. Juiz de Direito da 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual. Oficie-se.

Cumpra-se.

Publique-se.

Recife, 25 de julho de 2005

Des Jones Figueirêdo Alves

Relator

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