Justiça ambiental

Deputado propõe criação do Superior Tribunal Ambiental

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23 de julho de 2005, 8h59

Em meio a tantas CPIs, denúncias de mensalão e dinheiro de campanhas políticas “não contabilizado”, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou no início do mês a admissibilidade de uma proposta de emenda constitucional que cria a chamada Justiça Ambiental.

De autoria do ex-deputado Wagner Rubinelli, do PT paulista, a PEC 99, de 2003, prevê uma estrutura semelhante a da Justiça comum para julgar casos relacionados ao meio ambiente. Além de um Tribunal Superior Ambiental, composto por 17 ministros togados e vitalícios, cria os Tribunais Regionais Ambientais, os juízes ambientais e o Ministério Público Ambiental.

Advogado e professor de direito, Rubinelli perdeu o cargo na Câmara com a volta para o Congresso do ex-ministro do Trabalho Ricardo Berzoini. “Suplente do PT paulista, Rubinelli foi uma das vítimas indiretas da reforma ministerial do governo Lula”, afirma texto publicado no site oficial do ex-parlamentar.

“A pauta hoje no Brasil é sempre econômica. A discussão ambiental está sempre em segundo plano. O meio ambiente precisa de uma Justiça específica e especializada”, defende Rubinelli. O ex-deputado não sabe dizer ao certo quantas ações por danos ambientais tramitam na Justiça brasileira. “São centenas e muitas vezes interesses econômicos se sobrepõem à questão ambiental”, argumenta.

“O custo da criação de uma Justiça ambiental diante da corrupção praticada no país é ínfimo”, diz sem saber avaliar o valor que deverá ser desembolsado para bancar a mega-estrutura que propõe. Além disso, atesta, com a criação dessa nova modalidade ainda seria possível desafogar a Justiça comum.

O argumento, contudo, cai por terra quando confrontado com os números. Segundo levantamento Superior Tribunal de Justiça, nos últimos três anos chegaram à Corte 1.110 recursos de ações civis públicas por dano ambiental ou recursos que versam sobre crimes contra o meio ambiente. Em 2005, até o dia 21 de julho, o STJ recebeu 149 processos desse gênero.

Após a aprovação na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, a proposta de Rubinelli segue para uma comissão especial onde o mérito será analisado e o parecer do relator, a ser designado, colocado em discussão para aprovação ou não. Só depois disso, ela iria a plenário para votação em dois turnos com maioria de três quintos da Casa. A mesma tramitação acontece no Senado.

De acordo com o texto aprovado pela CCJ, o chamado Tribunal Superior Ambiental seria composto por 17 ministros escolhidos dentre brasileiros com mais de 35 anos e menos de 65 anos, nomeados pelo presidente da República, após aprovação pelo Senado. Dos ministros, 11 escolhidos dentre juízes dos Tribunais Regionais Ambientais, integrantes da carreira da magistratura ambiental, 3 dentre advogados e 3 dentre membros do Ministério Público Ambiental. Uma lei disporia sobre a competência do Tribunal. Entretanto, a proposta define que compete à Justiça Ambiental processar e julgar as ações relativas ao Meio Ambiente.

“Em tese a idéia é boa, mas da maneira como foi redigida essa emenda vai gerar mais confusão do que clareza. A todo momento vai surgir um conflito de competência”, critica o procurador-regional da República da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo), Paulo de Bessa Antunes, que durante seis anos atuou na área ambiental. Segundo ele, não há uma quantidade suficiente de casos que justifique a criação de uma Justiça especializada. “Se fosse assim, melhor seria criarmos, por exemplo, uma Justiça da família”, afirma.

Antunes diz que em poucos países foi criada uma Justiça especializada em Meio Ambiente. As experiências que existem em países como Austrália e Nova Zelândia são mais tímidas do que propõe o deputado petista. Nesses países, a estrutura é composta por apenas um tribunal para todo o país e algumas poucas varas em regiões específicas. “Eu quero mais é trabalhar nessa justiça, porque lá, certamente, eu não vou fazer nada”, ironiza o procurador.

Para o advogado Álvaro Palma de Jorge, responsável pela área ambiental do escritório Barbosa, Müssnich e Aragão Advogados, a proposta do ex-deputado vai custar muito dinheiro mas pode trazer mais agilidade e especialidade de conhecimento na análise de ações relacionadas ao tema. “Essa seria uma boa fórmula para evitar que o meio ambiente seja uma dessas questões que leva dez anos para ser julgada”, afirma Palma de Jorge.

Leia a íntegra da proposta de criação da Justiça Ambiental

PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 99

(Do Sr. Wagner Rubinelli)

Acrescenta dispositivos aos artigos 92 e 128, e a Seção IX – Dos Tribunais e Juízes Ambientais, ao Capítulo III do Título IV da Constituição Federal.

As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte emenda ao texto constitucional:


Art. 1º Acrescente-se o seguinte inciso VIII ao artigo 92 da Constituição Federal:

“Art. 92 (…)

VIII – Os Tribunais e Juízes Ambientais”

Art. 2º Acrescente-se a seguinte Seção IX ao Capítulo III do Título IV da Constituição Federal:

“TÍTULO IV

(…)

Capítulo III

(…)

Seção IX

Dos Tribunais e Juízes Ambientais

Art. 126 – A. São órgãos da Justiça Ambiental:

I – O Tribunal Superior Ambiental;

II – Os Tribunais Regionais Ambientais;

III – Juízes Ambientais.

Art. 126 – B. O Tribunal Superior Ambiental compor-se-á de dezessete Ministros, togados e vitalícios, escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e cinco anos e menos de sessenta e cinco anos, nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pelo Senado Federal, dos quais onze escolhidos dentre juízes dos Tribunais Regionais Ambientais, integrantes da carreira da magistratura ambiental, três dentre advogados e três dentre membros do Ministério Público Ambiental.

§ 1º O Tribunal encaminhará ao Presidente da República listas tríplices, observando-se, quanto às vagas destinadas aos advogados e aos membros do Ministério Público, o disposto no art. 94; as listas tríplices para o provimento de cargos destinados aos juízes da magistratura ambiental de carreira deverão ser elaboradas pelos Ministros togados e vitalícios.

§ 2º A lei disporá sobre a competência do Tribunal Superior Ambiental.

Art. 126 – C. Haverá pelo menos um Tribunal Regional Ambiental em cada Estado e no Distrito Federal, e a lei instituirá as Varas Ambientais, podendo, nas comarcas onde não forem instituídas, atribuir sua jurisdição aos juízes de direito.

Art. 126 – D. A lei disporá sobre a constituição, investidura, jurisdição, competência, garantias e condições de exercício dos órgãos da Justiça Ambiental.

Art. 126 – E. Compete à Justiça Ambiental processar e julgar as ações relativas ao Meio Ambiente.

Art. 126 – F. Os Tribunais Regionais Ambientais serão compostos de juízes nomeados pelo Presidente da República, observada a proporcionalidade estabelecida no § 1º do art. 126 – B.

Parágrafo único. Os magistrados dos Tribunais Regionais Ambientais serão:

I – juízes ambientais, escolhidos por promoção, alternadamente, por antigüidade e merecimento;

II – advogados e membros do Ministério Público Ambiental, obedecido o disposto no art. 94.

Art. 126 – G . Nas Varas Ambientais, a jurisdição será exercida por um juiz singular”.

Art. 3º Acrescente-se a seguinte alínea “e” ao inciso I do artigo 128 da Constituição Federal:

“Art. 128

(…)

e) O Ministério Público Ambiental.”

Justificação

O Meio Ambiente encontra-se esgotado por uma intensa prática econômica predatória, e o Direito, como principal articulador das relações sociais, deve normatizar regras preventivas e mitigadoras ao dano ambiental.

A nossa civilização está violentamente ameaçada, e o Direito Ambiental se esforça na prestação jurisdicional de proteção à vida. Hoje, dois dos maiores problemas globais são: a distribuição de riquezas e o aniquilamento da natureza.

Tal a gravidade da presente discussão que economistas globais já falam da profecia do colapso, o esgotamento total dos recursos naturais essenciais à existência da vida sobre o planeta Terra.

Dada a importância que o Direito Ambiental representa hoje para a sociedade moderna, investigam-se quais as formas de tornar mais efetiva a prática jurídica de proteção aos bens ambientais.

Os magistrados estão preparados para decidirem problemas relacionados ao efeito estufa, camada de ozônio, lixo tóxico, chuva ácida, dejetos nucleares? A sociedade tornou-se complexa em seus mecanismos, as possibilidades de agressão do homem é algo espantoso. Nossos juizes estão recebendo a atenção necessária para julgar os novos crimes?

Em matéria ambiental a realidade reclama do juiz uma atitude dinâmica, em consonância com as necessidades atuais.

Para pensar em uma prática mais efetiva do Direito Ambiental é necessário primeiro capacitar os aplicadores das normas, para que conheçam com tecnicidade o emaranhado de leis, decretos, resoluções e portarias que compõem a nossa esparsa legislação ambiental.

A missão do juiz é pacificar os litígios da sociedade, aplicar as normas do Estado, a fim de permitir que as relações sociais se tornem possíveis em sua dinâmica. A temática principal das discussões globais é como conciliar o desenvolvimento econômico com a preservação dos recursos ambientais. Naturalmente que os Juízes precisam estar preparados para as grandes discussões sociais. É necessário que os Tribunais, Escolas Jurídicas, Ministérios ligados à lei oportunizem aos seus magistrados, promotores e estudiosos da área congressos, fórum de discussões, seminários sobre a aplicação da norma ambiental. Como esperar do Judiciário conscientização ambiental se os magistrados estiverem abortados dos novos tempos?


As instituições de formação jurídica devem reformar seus programas disciplinares, incluindo matérias direcionadas à questão jurídico-ambiental, talvez incluí-la nas pautas dos concursos, exigindo assim conhecimento mais amplo da temática ambiental.

O juiz não pode estar distante da realidade social, acima de tudo é necessário que o magistrado seja alguém atento aos acontecimentos e extremamente bem informado das mudanças na sociedade, caso contrário corre o risco de ser mero agente punitivo, distante da missão pacificadora.

Magistrados cansados, sufocados pela lógica diária da prática forense, muitas vezes isolados em pequenas comarcas, distantes das novas discussões, juízes presos na realidade de seus processos, como irão se adequar às novas questões jurídicas próprias do Direito Ambiental?

Somente a capacitação do magistrado mais efetiva tornará a prática do Direito Ambiental e com isso preservará os recursos necessários à vida. Nunca a história precisou tanto da figura do juiz sóbrio e sábio como nos dias atuais.

A civilização humana está em crise e cabe ao juiz tornar efetiva a aplicação das normas ambientais.

Outro mecanismo de tornar mais efetiva a prática do Direito Ambiental é a criação de Varas, Delegacias e Tribunais especializados na área ambiental, atendendo o imenso impacto jurídico que o Direito Ambiental vem projetando no campo do Direito. Vale ressaltar a experiência australiana a inaugurar o primeiro Tribunal Ambiental do mundo, denominado Tribunal de Terras e Meio Ambiente.

A criação de um Tribunal especializado em matéria de Direito Ambiental, com jurisdição integrada e exclusiva, diminuiria os procedimentos múltiplos surgidos do mesmo litígio ambiental e daria um grau maior de certeza nas decisões julgadas, pois disporia de operadores mais especializados e cientes da complexidade ambiental. Obviamente o Direito Ambiental, pela abrangência de seu objeto jurídico, exige que seus agentes armazenem conhecimentos multidisciplinares, pois é necessário que sejam não só estudiosos de normas, mas do próprio conflito global de seu tempo para, com justiça, cumprirem a missão de pacificação social.

Mais do que conhecimento jurídico, o novo magistrado precisa conhecer a história de seu tempo e, em matéria de Direito Ambiental, a sensibilidade suficiente para compreender a gravidade jurídica da aplicação da norma ambiental. Acima de tudo aceitar o desafio jurídico do novo milênio, ou seja, a de humanizar o próprio homem.

Diante desses fatos é que estamos propondo uma emenda ao texto constitucional, instituindo a Justiça Ambiental e o Ministério Público Ambiental.

Desse modo, esperamos contar com o apoio de nossos ilustres Pares, com vistas á aprovação dessa propositura, que se reveste de inegável alcance social.

Sala das Sessões, em … de … de … 2003.

Deputado Wagner Rubinelli

PT/SP

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