Casa de ferreiro

Boa política de segurança pública começa em casa

Autor

  • João Antonio Wiegerinck

    é advogado mestrando pela PUC-SP em Direito Constitucional e coordenador no Complexo Jurídico Damásio de Jesus. É também professor de Direito Constitucional na Universidade Presbiteriana Mackenzie (pós-graduação).

21 de julho de 2005, 16h17

Segurança é um bem essencial à sociedade. Isso porque o ser humano transgride. Faz parte da nossa natureza procurar sair da égide legal. Estamos, mesmo sem consciência plena disso, sempre buscando uma forma de dirigir nossas vidas de acordo com a vontade imperativa das necessidades e desejos que vão se apresentando.

A Anarquia consiste exatamente na ausência completa de Regime Legal, Jurídico ou Econômico. É a consciência do homem em se tornar seu próprio Estado, exercendo plenamente a Autonomia. Mas, não vivemos em Anarquia. Aliás, os historiadores nos dizem que esta figura é filosófica, utópica e impossível.

Assim sendo, a fim de estabilizar e equacionar as relações entre as pessoas, estabelecemos um Ordenamento Jurídico competente para atender a este fim.

Neste Ordenamento, é previsto que o Estado poderá criar forças de fiscalização da Ordem Pública e repressão à ilegalidade, seja qual for o sujeito ativo que lhe deu origem. Obedecendo a determinação, foram criadas as nossas Polícias – Municipal, Militar, Civil e Federal.

Houve um tempo em que as corporações policiais mantinham um quadro de profissionais aptos e com vocação para defender os interesses da comunidade. Havia mais critério na escolha, na avaliação e na admissão destes componentes imprescindíveis na estrutura social.

Nos dias atuais, uma boa parte do quadro profissional das nossas Polícias está contaminado pela intenção do dinheiro fácil — que vem não do salário, mas das oportunidades de “acordos”, “jeitinhos”, “vistas grossas” e tantas outras definições para a crescente e intragável corrupção.

Haverá quem diga acertadamente: o salário das polícias em geral é vergonhoso. Quem iria enfrentar bandidos armados até os dentes com um arsenal de primeiro mundo — na verdade com um arsenal de exército de primeiro mundo —, entrar em certas favelas violentas, trocar tiros com traficantes e depois receber um salário de R$ 600 (em média) mensais para sustentar a família? De fato, muito pouco encorajador.

Claro que, até ser resolvido o problema do ganho salarial ridículo, esse indivíduo deveria pedir seu desligamento do efetivo policial e dedicar-se a outra atividade. Afinal de contas, a população espera contar com seus protetores.

O que foi abordado até aqui não é novidade. Espelha um dilema permanente entre a (in)competência do Estado em prover segurança e as melhores condições de ganho e trabalho para as corporações envolvidas. O que realmente quero abordar é: se toda a polícia fosse honesta e cumpridora de seus deveres, estaríamos satisfeitos?

Vamos imaginar que aquele excesso de velocidade, a conversão ilegal naquele semáforo, a fila dupla, os 15 minutos que pedimos estacionados em vaga proibida, não nos fossem dados e mais — seriam punidos.

Calma, isso é só o começo. Vamos aprofundar um pouco mais: aquele irmão, filho ou parente pego com um entorpecente, a colisão com vítimas fatais, a falta de porte de arma, a sonegação fiscal, aquela agressão física em um momento de destempero, a falsidade ideológica daquela inocente assinatura em um passado remoto, quando se “emprestou” o nome a alguém a te então confiável, enfim, delitos que se cometem às vezes por descuido ou pouco caso, passassem a ser investigados, julgados e punidos como mandam nossos códigos legais. Nada mais de “jeitinho” ou de “acerto”. Sem exceções. Como ficaria?

Ainda que sejamos cidadãos e pessoas exemplares, certamente conhecemos entes amados que nos cercam e que cometem alguns destes deslizes de alguma maneira. É quase certo que quando essas benesses ilegais nos são conferidas, achamos que a Autoridade foi, digamos, “muito equilibrada e sábia na aplicação da norma ao caso concreto”. Achamos, de coração, que merecíamos este tratamento diferenciado.

Então, cabe o questionamento sobre o tipo de atuação que esperamos dos protetores da Ordem Pública. Aqueles que nos têm como espelho de conduta pessoal ou profissional sempre estão atentos.

Vou terminar dizendo que, neste caso, precisamos mudar nossa cultura de exceções. Ninguém quer ser punido. O que fazer? Pensar melhor antes de agir, de falar. Manter uma disciplina interna e externa condizentes com o que esperamos das nossas polícias. Valorizar os trabalhos bem realizados pela Segurança Pública quando for o caso. Repassar aos nossos filhos e seus colegas que vale a pena ser correto, que ser correto não é ser um idiota. Ter a coragem de, errando, acatar as conseqüências e fazer o melhor para corrigir o erro.

Errar é humano. Assumir o erro é o início da reparação. Reverter a situação ao máximo possível é ter a consciência tranqüila novamente.

Autores

  • Brave

    é advogado, mestrando pela PUC-SP em Direito Constitucional e coordenador no Complexo Jurídico Damásio de Jesus. É também professor de Direito Constitucional na Universidade Presbiteriana Mackenzie (pós-graduação).

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!