Diploma suspeito

MPF questiona cursos de pós-graduação da Unisul

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8 de julho de 2005, 9h59

A Unisul — Universidade do Sul de Santa Catarina e a União são alvos de uma Ação Civil Pública do Ministério Público Federal, que questiona a oferta de cursos de pós-graduação sem validade nacional.

Na ação, o procurador da República em Tubarão, Celso Antônio Três, pede a suspensão de aberturas de novas turmas e cursos sem o reconhecimento do MEC — Ministério da Educação. Outro pedido requer a reparação aos estudantes lesados, seja com o reconhecimento e validade nacional dos diplomas até então expedidos, seja com a restituição das anuidades cumuladas com perdas e danos. Os valores ainda serão apurados.

Já a União deverá exercer efetivo poder de polícia sobre a Unisul, fiscalizando o cumprimento dos pedidos, para evitar que a universidade inaugure novas turmas e cursos de mestrado e doutorado não reconhecidos pelo MEC.

Na inicial, o MPF argumenta que o ensino superior não é atividade econômica comum, liberada à livre iniciativa. Apesar dos cursos estarem autorizados pelo Conselho Estadual de Educação, o aluno não garante a titularidade de “doutor”, pois a competência para autorizar cursos superiores não é estadual, mas sim federal.

Leia a íntegra da Ação Civil Pública

EXCELENTÍSSIMO(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE TUBARÃO – SC

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, na tutela da educação, respeito dos serviços públicos aos direitos constitucionais e no direito dos estudantes consumidores de serviço remunerado, forte na instrução do Inquérito Civil Público MPF/TB nº 123/03, vem, à presença de V. Exa., propor

AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com pedido de tutela LIMINAR

contra

UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA — UNISUL, CNPJ n.º 86.445.293/0001-36, situada na Avenida José Acácio Moreira, n.º 787, Bairro Dehon, Município de Tubarão/SC, podendo ser citada na pessoa de seu Magnífico Reitor, Gerson Luiz Joner da Silveira, ou quem estatutariamente o substitua, e

UNIÃO, devendo ser citada na pessoa do Procurador-Chefe, Dr. Marco André Dorna Magalhães, ou quem o substitua(art. 35, IV, da LC 73/93), na Praça Pereira Oliveira, nº 35, Ed. INAMPS, 7º, 8º e 9º andares, fone (48) 224.19.45, Florianópolis(SC);

I – DO OBJETO

A presente “class action’ objetiva, “ab initio”, LIMINARMENTE, suspensão de novos cursos de pós-graduação stricto sensu(mestrado e doutorado), bem assim de novas turmas dos cursos já existentes, oferecidos pela UNISUL sem reconhecimento do MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO – MEC, inválidos nacionalmente.

No mérito, indenização do corpo discente lesado, restituição de parcela das anuidades, obrigação da UNIÃO em fiscalizar, condenando-a à indenização ao Fundo Nacional de Reparação dos Direitos Difusos.

II – DA LEGITIMIDADE ATIVA

A Carta Política, tal qual o fez com a saúde(art. 196), erigiu a educação em direito de todos e dever do Estado Brasileiro(art. 205), franqueando o ensino à livre iniciativa, vinculando-o, todavia, ao cumprimento das normas gerais da educação nacional, autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público(art. 209).

Para “zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública assegurados nesta constituição …’, “in casu”, pela educação, a “Lex Fundamentalis” legitimou o MINISTERIUM PUBLICUM, através da ação civil pública(art. 129, II e III, da CRFB).

Lei Orgânica do PARQUET, LC nº 75/93, “verbis”

Art. 5° São funções institucionais do Ministério da União:

(…)

II – zelar pela observância dos princípios constitucionais relativos:

(…)

d) à seguridade social, à educação, à cultura e ao desporto, à ciência e à tecnologia, à comunicação social e ao meio ambiente; (grifou-se)

(…)

V – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da União e dos serviços de relevância pública quanto:

a) aos direitos assegurados na Constituição Federal relativos às ações e aos serviços de saúde e à educação;(grifei).

Ataca-se a omissão do Estado Brasileiro, a UNIÃO, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, Poder Público que deveria fiscalizar a UNISUL, fazendo respeitar os direitos educacionais.

Tratando-se de Mestrado e Doutorado, qualificação à docência, afora a educação, matéria também é atinente a própria regulamentação, habilitação das profissões(art. 5º, XIII, “in fine”, e 22, XVI, da CRFB c/c art. 66 da Lei nº 9.394/96), exsurgindo interesse de toda coletividade na sua tutela(arts. 1º e 21 da Lei nº 7.347/85 c/c art. 81, §único, I, do CDC)

Sendo cursos remunerados, igualmente presente relação de consumo(arts. 2º e 3º do CDC), constitucionalmente protegida(art. 5º, XXXII, e 170, V, da CRFB), investido o MINISTERIUM PUBLICUM à sua defesa(art. 82 do CDC).


SUPREMA CORTE, a propósito da legitimidade do PARQUET na educação, chegando, muito além da presente ação, a legitimá-lo a questionar o “quantum” das mensalidades, “verbis’:

“EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E HOMOGÊNEOS. MENSALIDADES ESCOLARES: CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO.

1.A Constituição Federal confere relevo ao Ministério Público como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127).

2.Por isso mesmo detém o Ministério Público capacidade postulatória, não só para a abertura do inquérito civil, da ação penal pública e da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, mas também de outros interesses difusos e coletivos (CF, art. 129, I e III).

3.Interesses difusos são aqueles que abrangem número indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas circunstâncias de fato e coletivos aqueles pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis, ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base.

3.1.A indeterminidade é a característica fundamental dos interesses difusos e a determinidade a daqueles interesses que envolvem os coletivos.

4.Direitos ou interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81, III, da Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990), constituindo-se em subespécie de direitos coletivos.

4.1.Quer se afirme interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalística destina-se à proteção desses grupos, categorias ou classe de pessoas.

5.As chamadas mensalidades escolares, quando abusivas ou ilegais, podem ser impugnadas por via de ação civil pública, a requerimento do Órgão do Ministério Público, pois ainda que sejam interesses homogêneos de origem comum, são subespécies de interesses coletivos, tutelados pelo Estado por esse meio processual como dispõe o artigo 129, inciso III, da Constituição Federal.

5.1.Cuidando-se de tema ligado à educação, amparada constitucionalmente como dever do Estado e obrigação de todos (CF, art. 205), está o Ministério Público investido da capacidade postulatória, patente a legitimidade ad causam, quando o bem que se busca resguardar se insere na órbita dos interesses coletivos, em segmento de extrema delicadeza e de conteúdo social tal que, acima de tudo, recomenda-se o abrigo estatal.

Recurso extraordinário conhecido e provido para, afastada a alegada ilegitimidade do Ministério Público, com vistas à defesa dos interesses de uma coletividade, determinar a remessa dos autos ao Tribunal de origem, para prosseguir no julgamento da ação.”(Min. Gilmar Mendes, RE 332545/SP, 06.05.05, Informativo do STF nº 389)

III – DA LEGITIMIDADE PASSIVA

Desde sempre, a UNIÃO, através do MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, exerce o dever/poder de polícia quanto ao ensino superior.

Tanto assim, que a competência ao mandado de segurança contra as IES(Instituições de Ensino Superior), incluídas as privadas, sempre esteve afeto à JUSTIÇA FEDERAL (Sum. nº 15 do Tribunal Federal de Recursos).

Constituição de 1934, art. 150, “verbis”:

“Compete à União:

(…)

b) determinar as condições de reconhecimento oficial dos estabelecimentos de ensino secundário e complementar deste e dos institutos de ensino superior, exercendo sobre eles a necessária fiscalização;”

Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 4.024 de 1961, “verbis”:

“Art. 14. É da competência da União reconhecer e inspecionar os estabelecimentos particulares de ensino superior”.

No ordenamento vigente, igualmente.

LDB(Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional — Lei nº 9.394/96 — fls. 132/161 do ICP), cuja competência legislativa é privativa da UNIÃO(art. 22, XXIV, da CRFB), “verbis”:

“Art. 9º União incumbir-se-á de:

(…)

VII – baixar normas gerais sobre cursos de graduação e pós-graduação;

(…)

IX – autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino.


(…)

Art. 16. O sistema federal de ensino compreende:

(…)

II – as instituições de educação superior criadas e mantidas pela iniciativa privada;”

Por seu turno, as atribuições do poder público federal na UNIÃO compete ao MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO(art. 1º da Lei nº 9.131/95, cuja vigência está explicitamente ressalvada pelo art. 92 da LDB).

Ao custeio desse indeclinável dever/poder de polícia, afora os verbas orçamentárias, o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO dispõe de tributação específica, “Taxa de Avaliação ‘in loco’ das Instituições de Educação Superior …”(Lei nº 10.870/04 – fls. 193/194).

Entretanto, a UNIÃO, através do MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, é absolutamente inerte, abstendo-se de qualquer autuação, a exemplo da intervenção, suspensão e descredenciamento (art. 46 da LDB c/c Lei nº 9.784/99), enfim, auditando a UNISUL (art. 7º-B, IV, da Lei nº 9.131), consagrando com total impunidade a indiscriminada oferta de cursos de mestrado e doutorado sem reconhecimento.

IV – DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL

De per si, a presença do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, Órgão da UNIÃO, com poder de presentar, encarnar, seus interesses, determina a competência da JUSTIÇA FEDERAL (STJ, CC 25448/RN, 1ª Seção, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ 18.06.2001, p. 18 — TRF/1ª, Rel. Juiz Olindo Menezes, 3ª Turma. Ag. 1999.01.00.003941-4/MA, DJ 31.02.2000, p. 1390).

Em suma, “a fortiori”, ao PARQUET idêntica regra aplicável à Advocacia-Geral da União(art. 5º da Lei nº 9.469/97), sabido que a indisponibilidade da exação do Poder Público é incompatível com a discricionariedade do EXECUTIVO, a quem é subordinada a AGU, defecção que, não fosse suprida pelo MINISTERIUM PUBLICUM, deixaria os direitos coletivos órfãos da tutela da JUSTIÇA FEDERAL.

Além disso, figura no pólo passivo a UNIÃO.

V – DOS FATOS E RESPECTIVA SUBSUNÇÃO À ORDEM JURÍDICA

“Da mihi factum, dabo tibi jus”.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL instaurou o Inquérito Civil Público em acólito, instado por representação do Diretório Central dos Estudantes da UNISUL, noticiando que a instituição “tem criado e ministrado, já há algum tempo, cursos de pós-graduação e mestrado sem a necessária autorização e reconhecimento do Ministério da Educação e Cultura – MEC” (fls. 02/06 do ICP).

Notificada à respectiva defesa, a UNISUL, aduzindo parecer do Prof. Dr. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, reconhecido constitucionalista, em síntese, sustentou a autonomia da universidade na criação de cursos, dizendo-se autorizada ao mestrado e doutorado pelo Conselho Estadual de Educação(fls. 02/108 do ICP).

Notificado a manifestar-se, o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, pela Secretaria de Educação superior, ratificou que a “… Universidade do Sul de Santa Catarina não possui cursos de mestrado ou doutorado reconhecidos pelo Ministério da Educação”, aduzindo normativos que impõe a obrigação descumprida(fls. 173/192 do ICP).

A UNISUL fulcra a legalidade dos cursos no princípio da autonomia universitária (art. 207 da CRFB).

A liberdade das instituições de ensino não é novidade.

Constituição de 1934, §único, “verbis”:

“c) liberdade de ensino em todos os graus e ramos, observadas as prescrições da legislação federal e da estadual;”

Liberdade, autonomia, não confundem-se com acefalia, ausência da autoridade educacional.

A atual Carta Política é enfática, “verbis”:

“Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada atendidas as seguintes condições:

I – cumprimento de normas gerais da educação nacional.

II – autorização e avaliação da qualidade pelo Poder Público.” (grifou-se)

O ensino superior não é atividade econômica comum, liberada à livre iniciativa (art. 170 da CRFB).

Na tutela do corpo discente e da sociedade, a atividade cinge-se à outorga da UNIÃO (art. 7º, II, da LDB — Lei nº 9.394/96).

LDB, “verbis”:

“Art. 9º. A União incumbir-se-á de:

(…)

VII – baixar normas gerais sobre cursos de graduação e pós-graduação;

IX – autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino” .

(…)

Art. 44. A educação superior abrangerá os seguintes cursos e programas:

(…)

III – de pós-graduação, compreendendo programas de mestrado e doutorado

“(…)

Art. 48. Os diplomas de cursos superiores reconhecidos, quando registrados, terão validade nacional como prova da formação recebida por seu titular.

(…)

Art. 53. No exercício de sua autonomia, são asseguradas às universidades, sem prejuízo de outras, as seguintes atribuições:


I – criar, organizar e extinguir, em sua sede, cursos e programas de educação superior previstos nesta Lei, obedecendo às normas gerais da União e, quando for o caso, do respectivo sistema de ensino;” (grifou-se)

Esse poder normativo da UNIÃO, âmbito do MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, é exercido pelo CNE (Conselho Nacional de Educação), mais precisamente pela CES (Câmara de Educação Superior), a quem cabe deliberar sobre cursos de mestrado e doutorado (arts. 7º e 9º, §2º, ‘g’, da Lei nº 4.024/61, com a redação da Lei nº 9.131/95, cuja vigência está explicitamente ressalvada pelo art. 92 da LDB – fls. 205/209 do ICP).

Por seu turno, a avaliação técnica do mestrado e doutorado compete à CAPES(Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior), consoante Decreto nº 3.860/01, “verbis”:

“Art. 8º. As universidades caracterizam-se pela oferta regular de atividades de ensino, de pesquisa e de extensão, atendendo ao que dispõem os arts. 52, 53 e 54 da Lei nº 9.394 de 1996.

§1º As atividades de ensino previstas no ‘caput’ deverão contemplar, nos termos do art. 44 da Lei nº 9.394, de 1996, programas de mestrado e doutorado em funcionamento regular e avaliados positivamente pela Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior – CAPES.”

A Resolução do CNE/CES nº 1, 03.04.01(fls. 181/184 do ICP), ao tratar sobre os cursos de pós-graduação “stricto sensu”, estabelece, “verbis”:

“Art. 1º. Os cursos de pós-graduação ‘stricto sensu’, compreendendo programas de mestrado e doutorado, são sujeitos às exigências de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento previstas na legislação. (grifei)

§ 1º. A autorização, o reconhecimento e a renovação de reconhecimento de cursos de pós-graduação ‘stricto sensu’ são concedidos por prazo determinado, dependendo de parecer favorável da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, fundamentado nos resultados da avaliação realizada pela Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior — CAPES e homologado pelo Ministro de Estado da Educação.

§ 2º. A autorização de curso de pós-graduação ‘stricto sensu’ aplica-se tão-somente ao projeto aprovado pelo CNE, fundamentado em relatório da CAPES.

§ 3º. O reconhecimento e a renovação do reconhecimento de cursos de pós-graduação ‘stricto sensu’ dependem da aprovação do CNE, fundamentada no relatório de avaliação da CAPES.

A Resolução CNE/CES nº 24, de 18 de dezembro de 2002 (fl. 185 do ICP), em seu artigo 1º, § 4º, preceitua, “verbis”:

“As instituições de ensino superior que, nos termos da legislação em vigor, gozem de autonomia para a criação de cursos de pós-graduação, devem formalizar os pedidos de reconhecimento dos novos cursos por elas criados até, no máximo, 60 (sessenta) dias após ato formal de criação por seus conselhos superiores”.

Claro está que os diplomas emitidos só terão validade se forem relativos a curso superior reconhecido, o que, por sua vez, pressupõe a devida autorização.

A UNISUL argúi o Conselho Estadual de Educação como autoridade competente ao mestrado e doutorado.

A LDB prevê a possibilidade da UNIÃO delegar aos Estados a autoridade sobre seu sistema de ensino superior (art. 9º, §3º, da Lei nº 9.394/96).

Na competência atribuída aos Estados, a LDB reitera as atribuições(art. 10, IV, da Lei nº 9.394/96).

Definindo o sistema de ensino do Estado, a LDB diz que nele são incluídas instituições de educação superior mantidas pelo Poder Público municipal(art. 17, II, Lei nº 9.394/96).

Baseado nisso, o Conselho Estadual de Educação de SC entende ser a autoridade dos pós-graduação ‘stricto sensu’ da UNISUL(fl. 67 do ICP).

Inexiste autoridade do Conselho Estadual!

A LDB prevê a delegação da autoridade da UNIÃO aos Estados. Todavia, ela não é automática, dependendo de ato próprio. Não fosse assim, razão alguma subsistiria ao fato competência do Estado prevista no art. 10, IV, da LDB anteceder a delegação da UNIÃO(art. 10, IV, da Lei nº 9.394/96).

Pelo contrário!

Corolário da autoridade da CAPES na área, mestrado e doutorado estão expressamente excluídos da delegação aos Estados(art. 9º, §2º, ‘g’, c/c §3º, da Lei nº 4.024/61, com a redação da Lei nº 9.131/95, cuja vigência está explicitamente ressalvada pelo art. 92 da LDB – fls. 205/209 do ICP).

Mais!

O sistema de ensino do Estado contempla ‘…instituições de educação superior mantidas pelo Poder Público municipal(art. 17, II, Lei nº 9.394/96).

Como “…mantidas e administradas pelo Poder Público…”, a LDB conceitua a instituição de ensino como pública. As demais, todas são privadas (art. 19 da Lei nº 9.394/96).


Entre as privadas, constam as particulares em sentido estrito, comunitárias, confessionais e filantrópicas(art. 20 da LDB).

A UNISUL é privada, ela própria intitulando-se como comunitária(vide estatutos, fls. 218/294).

A UNISUL, como ela diz-se ser, é privada, não sendo mantida, tampouco administrada pelo Poder Público. Não se submete aos regramentos da administração pública(arts. 37, 41, 70 a 75, da CRFB). Não contrata professores e servidores mediante concurso público. Não submete à licitação contratação de obras e serviços. Não presta contas ao Tribunal de Contas. Como as entidades privadas, cobra pela prestação do ensino, etc.

Portanto, a UNISUL sequer pode integrar o sistema estadual de ensino!

A “ratio essendi” da previsão de delegação da autoridade da UNIÃO aos Estados é deferência ao pacto federativo, prestigiando a autonomia dos entes(arts. 18 e 19, II, da CRFB).

Todavia, desde que eles, os Estados, tenham a educação superior promovida por eles próprios ou os municípios, presentes os rigores próprios da administração pública.

Sendo escola privada, perece a “ratio essendi” da delegação.

Além disso, repita-se, mestrado e doutorado estão expressamente excluídos da delegação aos Estados.

A Constituição da República, art. 242, ressalvou da obrigação da gratuidade instituições educacionais oficiais criadas por lei estadual ou municipal existentes à época na qual promulgada a Carta Política.

Ressalvou, tão somente, da gratuidade, não dos demais controles públicos(v.g., arts. 37 e 70 da CRFB).

A UNISUL, todavia, reitere-se, visando desvencilhar-se dos ônus(controles públicos), quer apenas os bônus(autonomia, sujeição ao Conselho Estadual de Educação e não ao MEC, etc.)

Aberrante pensar em titulação, qualquer que seja (ensino fundamental, médio, superior, mestrado, doutorado, etc.), que tenha validade apenas no âmbito do Estado!

Chega-se ao extremo do Conselho Estadual de Educação de SC contrariar o próprio MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, sustentando que, não obstante aquela autoridade educacional federal, à avaliação dos docentes das instituições de ensino superior, considerasse títulos de mestres e doutores apenas os obtidos em cursos credenciados pelo CNE/CAPES, ele, órgão estadual, dispensa o requisito, arrogando-se titular da competência(fls. 162/172 do ICP).

De quebra, explicitando a confusão de interesses entre fiscal e fiscalizado, deixando ao abandono alunos e sociedade, subscreve o Presidente do Conselho Estadual de Educação de SC, Silvestre Heerdt, por largo período Reitor da UNISUL(fl. 163 do ICP).

Mestre e doutor provinciano, apenas em SC?!

Todos eles, doutorado e mestrado, necessariamente, para serem ofertados pelo ensino regular, devem ser “erga omnes”!

Sendo pagos pelos alunos os cursos de mestrado e doutorado ministrados pela UNISUL, presente relação de consumo (arts. 2º e 3º do CDC — Lei nº 8.078/90), constitucionalmente protegida(art. 5º, XXXII, e 170, V, da CRFB), investido o MINISTERIUM PUBLICUM à sua defesa(art. 82 do CDC).

A UNISUL sequer informa devidamente os alunos, advertindo, como deveria fazê-lo, que o pós-graduação “stricto sensu” não tem registro, tampouco reconhecimento do MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (vide anúncios na internet, fls. 41/54 do ICP), incorrendo em informação e publicidade enganosas(arts. 6º, III e IV, 36 e 37 do CDC).

A UNISUL colocou no mercado serviço em desacordo com norma expedida pelo órgão competente, “in casu”, o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (art. 39, VIII, do CDC), fornecendo serviço defeituoso, comprometendo sua fruição(art. 14 do CDC), valendo notar a abusividade de cláusula que exima a UNISUL de ministrar mestrado e doutorado reconhecidos pelo CNE/CAPES(art. 51, I, do CDC), ensejando direito de reparação do corpo discente(art. 6º, VI, do CDC).

Código de Defesa do Consumidor, “verbis”:

“Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I – a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível;

II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III – o abatimento proporcional do preço.

§ 1° A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros devidamente capacitados, por conta e risco do fornecedor.

§ 2° São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade” (grifou-se)


A UNISUL tem duas alternativas:

a) a título de “reexecução dos serviços”, obter perante o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO(CNE/CAPES) reconhecimento e validade nacional dos diplomas até então expedidos, consoante previsto pelo art. 53 do Regimento Geral da própria UNISUL(fl. 269 do ICP);

b) restituição de parcela das anuidades cumulas com perdas e danos, a serem apurados em sede de liquidação de sentença(art. 95 do CDC).

De outra parte, a UNIÃO, foi omissa no seu irrenunciável dever/poder em fiscalizar a UNISUL.

Sobre as atribuições da UNIÃO, vide tópico “III – DA LEGITIMIDADE PASSIVA.”

As atribuições do poder público federal na UNIÃO compete ao MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (art. 1º da Lei nº 9.131/95, cuja vigência está explicitamente ressalvada pelo art. 92 da LDB).

Ao custeio desse indeclinável dever/poder de polícia, afora os verbas orçamentárias, o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO dispõe de tributação específica, “Taxa de Avaliação ‘in loco’ das Instituições de Educação Superior …” (Lei nº 10.870/04 – fls. 193/194).

Entretanto, a UNIÃO, através do MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, é absolutamente inerte, abstendo-se de qualquer autuação, a exemplo da intervenção, suspensão e descredenciamento (art. 46 da LDB c/c Lei nº 9.784/99), enfim, auditando a UNISUL (art. 7º-B, IV, da Lei nº 9.131), consagrando com total impunidade a indiscriminada oferta de cursos de mestrado e doutorado sem reconhecimento.

A UNIÃO, MINSITÉRIO DA EDUCAÇÃO, no indeclinável poder de polícia, abandonando ao desabrigo alunos e sociedade, perpetrou grave dano contra a coletividade, devendo ser condenada a recolher “quantum”, arbitrado pelo DOUTO JUÍZO, a fundo nacional de reparação dos direitos difusos(art. 13 da Lei nº 7.347 c/c Lei nº 9.008/95).

VI – DA TUTELA LIMINAR

A Ação Civil Pública sempre estabelece a possibilidade de concessão de provimento liminar, nos casos de possibilidade de dano irreparável ao direito em conflito, decorrente da natural morosidade na solução da lide(art. 12 da Lei 7347/85).

O dispositivo tem natureza tanto cautelar, protetivo da eficácia da jurisdição, quanto da fruição do próprio direito, bem da vida postulado “in juditio”.

Com o art. 273 do CPC, essa tutela viu-se ainda mais consagrada, albergando a concessão do bem da vida “ab initio”, “a fortiori”, a cautelar indispensável a prevenir seu inevitável perecimento(art 273, §7, do CPC).

O “fumus boni juris” é inequívoco, exsurgindo da aberrante dilapidação do patrimônio público, comprovada mediante documentação de fé pública, incontroversos (art. 273, §6º, do CPC).

O “periculum in mora”, de equivalente evidência.

A UNISUL segue inaugurando turmas e cursos de mestrado e doutorado, lesando alunos e sociedade.

Em sede de tutela liminar é requerido o mínimo, ou seja, obstadas novas turmas e cursos de pós-graduação “stricto sensu”, mantidos as turmas atualmente sendo ministradas.

VII – DO PEDIDO

Ante o exposto, o MINISTERIUM PUBLICUM requer:

a) ouvidas as RÉS(art. 2º da Lei nº 8.437/92), LIMINARMENTE (vide tópico “VI – DA TUTELA LIMINAR”), cominando-se gravosa pena à hipótese de descumprimento(v.g., R$ 10.000,00 diários), seja determinada a imediata suspensão de abertura de novas turmas, bem assim inauguração de novos cursos de pós-graduação stricto sensu(mestrado e doutorado) pela UNISUL, sem reconhecimento do MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO;

b) citadas as RÉS, sob pena de revelia (confissão), procedida a instrução segundo o “due process of law”, desde já protestando-se por todos os meios de prova, especialmente testemunhais e documentais, no MÉRITO, seja julgada integralmente procedente a demanda, prolatando-se veredicto condenatório:

b.1) à UNISUL:

b.1.1) obrigação de não fazer, abstendo-se de oferecer cursos de pós-graduação stricto sensu sem obter, junto ao MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, o cabível instrumento de credenciamento e autorização, validade nacional dos títulos;

b.1.2) obrigação de fazer, suspendendo todos os cursos de mestrado e doutorado atualmente ofertados, sem reconhecimento do MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO.

b.1.3) obrigação de dar, consistente na reparação do corpo discente lesado, alternativamente:

b.1.3.1) a título de “reexecução dos serviços”, obter perante o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO(CNE/CAPES) reconhecimento e validade nacional dos diplomas até então expedidos, consoante previsto pelo art. 53 do Regimento Geral da UNISUL(fl. 269 do ICP);

b.1.3.2) restituição de parcela das anuidades cumulas com perdas e danos, a serem apurados em sede de liquidação de sentença(art. 95 do CDC).

b.2) à UNIÃO:

b.2.1) cominando-se pena a eventual descumprimento, obrigação de fazer, exercer efetivo poder de polícia sobre a UNISUL, fiscalizando seus atos, notadamente o pós-graduação “stricto sensu’,

b.2.1) obrigação de dar, uma vez que, abstendo-se de qualquer autuação, a exemplo da intervenção, suspensão e descredenciamento (art. 46 da LDB c/c Lei nº 9.784/99), enfim, auditando a UNISUL (art. 7º – B, IV, da Lei nº 9.131), consagrando com total impunidade a indiscriminada oferta de cursos de mestrado e doutorado sem reconhecimento, foi omissa, prevaricou no seu dever/poder de fiscalização, abandonando ao desabrigo alunos e sociedade, perpetrou grave dano contra a coletividade, devendo ser condenada a recolher “quantum” arbitrado pelo DOUTO JUÍZO ao fundo nacional de reparação dos direitos difusos (art. 13 da Lei nº 7.347 c/c Lei nº 9.008/95).

Seja publicada súmula desta ação (tópico “I – DO OBJETO”) no Diário Oficial da Justiça, visando cientificar eventuais interessados em ingressar no processo como litisconsortes, consoante art. 94 do CDC.

Sem custas, assim como todas as ações afetas ao MINISTERIUM PUBLICUM (art. 18 da Lei nº 7.347/85).

Para fins de alçada, dá-se à causa o valor de R$ 100.000,00.

Nesses termos, pede deferimento.

Tubarão, 06 de julho de 2005.

Celso Antônio Três

Procurador da República

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