Portas fechadas

Câmara quer proibir recursos contra decisões sumuladas

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8 de julho de 2005, 10h44

Em vez de adotar medidas para punir com rigor os recursos protelatórios e a litigância de má-fé, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (6/7), uma solução mais drástica em nome do desentulhamento da Justiça: a proibição de qualquer apelação contra decisões que estejam sumuladas no Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal.

A regra, que institui a chamada súmula impeditiva de recursos, está no Projeto de Lei 4.724/04 (veja íntegra abaixo), aprovado por unanimidade pelos deputados presentes na sessão. A decisão da Comissão é terminativa, ou seja, não precisa ser aprovada pelo Plenário da Câmara. Mas, se houver recurso apoiado por um décimo dos integrantes da Casa, 52 deputados, ela será obrigatoriamente levada para votação em Plenário.

Sob o argumento da economia processual, o texto estabelece que “o juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal”. Segundo um ministro do Supremo, no entanto, as regras processuais vigentes já cumprem com o objetivo alegado punindo o recurso protelatório, bastando que sejam aplicadas.

O projeto, originado no Ministério da Justiça, teria o objetivo de levar ao esquecimento o instituto da súmula vinculante. Já inscrita na Constituição pela Emenda Constitucional 45/04 — a reforma do Judiciário — ela, no entanto, ainda depende de regulamentação para entrar em vigor. A regulamentação deve estabelecer regras para revisar ou cancelar o efeito vinculante das decisões que por maioria de dois terços de seus integrantes o Supremo venha a adotar.

“O projeto da Câmara é muito mais drástico que a súmula vinculante”, afirma o advogado Jair Jaloreto Júnior, especialista em Direito Processual Penal, que condena a adoção das duas espécies de súmulas por tolherem, de qualquer forma, o acesso dos cidadãos à Justiça. A súmula vinculante, no seu entender, não impedirá o conhecimento do recurso. Já a súmula impeditiva de recursos, aprovada na Câmara, acabará com o processo no primeiro grau.

Pior ainda, segundo Jaloreto Júnior, a súmula impeditiva de recursos, no modelo aprovado pela Câmara, poderá se eternizar, uma vez que não são estabelecidas regras para a sua revisão. Além disso, as partes terão que se calar diante da eventualidade de decisões, nos juízos de primeiro grau, que impeçam o andamento do processo com base em súmulas apenas assemelhadas.

Ou seja, cairia por terra o princípio constitucional introduzido pela própria reforma do Judiciário e citado pelo deputado Inaldo Leitão (PP/PB), relator da matéria na Comissão: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”

Leia o voto do relator e veja a íntegra do projeto

Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania

Projeto de Lei nº 4.724, de 2004

Altera os arts. 504, 506, 515 e 518 da Lei nº 5.869, de 11 de Janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, relativamente à forma de interposição de recursos, ao saneamento de nulidades processuais, ao recebimento de recurso de apelação e a outras questões.

Autor: Poder Executivo

Relator: Deputado Inaldo Leitão

I – Relatório

O projeto de lei em comento constitui uma das inúmeras proposições enviadas pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional no fim de 2004 e destinadas a alterar o Código de Processo Civil.

Da mensagem enviada pelo ilustre Ministro da Justiça consta o esclarecimento de que a reforma do sistema processual brasileiro tem o escopo de conferir racionalidade e celeridade à prestação jurisdicional, respeitados, porém, o contraditório e a ampla defesa.

Assim é que a presente proposição regula, dentre outros pontos que analisaremos a seguir, a problemática que afeta as nulidades detectadas no julgamento do recurso de apelação, bem como a possibilidade do juiz negar seguimento à apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal.

Não tendo sido apresentadas emendas e já decorrido o prazo regimental, compete agora a esta Comissão apreciar o projeto, de forma conclusiva, quanto aos seus aspectos de constitucionalidade, juridicidade, técnica legislativa e mérito.

II – Voto do relator

A proposição apresenta-se isenta de vícios de inconstitucionalidade, já que é competência privativa da União legislar sobre direito processual civil, legítima a iniciativa e adequada a elaboração de lei ordinária (arts. 22, I, 48, caput e 61, da Constituição Federal de 1988).

Não há problemas de juridicidade, restando observados os princípios do nosso ordenamento jurídico. A técnica legislativa encontra-se adequada aos ditames da Lei Complementar nº 95/98, salvo pela ausência de um artigo inaugural que delimite o objeto da lei, o que justifica a apresentação de uma emenda de redação.


No mérito, o projeto é merecedor do nosso apoio.

Todos temos presenciado as várias tentativas de se imprimir celeridade aos processos judiciais, visando a alcançar a tão almejada efetividade das decisões judiciais, alçada expressamente ao status de garantia constitucional pela Emenda nº 45, de Dezembro de 2004, que acrescentou um inciso ao art. 5º, verbis:

“Art. 5º………………………………………………………………………..

LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”

Antes mesmo da denominada Reforma do Judiciário, já se proclamava, com razão, que o direito à inafastabilidade da tutela jurisdicional (art. 5º, XXXV, CF/88) englobava o direito a uma decisão tempestiva, efetiva e justa, predicados sem os quais não é politicamente legítimo o sistema processual de um país. O verdadeiro acesso à ordem jurídica justa desqualifica a justiça tardia, que nega o próprio acesso à justiça.

É com os olhos voltados para a efetividade da tutela jurisdicional que temos que analisar a proposição em tela, sem, contudo, descurarmos dos direitos constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

Percebe-se, primeiramente, que as alterações feitas nos arts. 504 e 506 não demandam grandes indagações. No art. 504 apenas modifica-se, em parte, a nomenclatura de um ato do juiz, substituindo a expressão “despacho de mero expediente” por simplesmente “despacho”, mantendo-se a previsão de que tal ato não desafia recurso. Em verdade, a moderna doutrina já adota tal terminologia, litteris:

“Denomina-se provimento aos atos pelos quais o juiz se manifesta no processo, os seus pronunciamentos. São de três tipos: sentença, decisão interlocutória e despacho. (…)

Por fim, despachos são provimentos judiciais destituídos de qualquer conteúdo decisório, como o ato que determina a remessa dos autos ao contador judicial, ou o que abre vista às partes para que se manifestem sobre o laudo pericial.”

Já no art. 506 do CPC a modificação pretende esclarecer que o prazo para a interposição de recurso terá início com a publicação do “dispositivo” do acórdão no órgão oficial, e não com a publicação da “súmula” do acórdão, como atualmente consta.

Já que é somente o dispositivo com a conclusão pelo provimento ou improvimento do recurso que deve ser publicado, possuindo o termo súmula outra conotação (súmulas da jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça, por exemplo), afigura-se correta a nova redação, que, aliás, melhor remete ao art. 525, §2º, que ressalva as diversas formas de interposição previstas para o agravo de instrumento.

Por outro lado, o novo §4º que se quer incluir ao art. 515 do CPC somente contribui para a economia processual, ao solucionar o problema das nulidades processuais detectadas por ocasião do julgamento da apelação. Tratando-se de nulidade sanável, o tribunal poderá determinar a realização ou renovação do ato processual e, após cumprida a diligência, sempre que possível prosseguirá o julgamento da apelação.

Tal medida objetiva evitar que o tribunal se limite a declarar a nulidade processual e remeta o processo para o juiz de primeiro grau, com receio de que se alegasse supressão de instância. Na sistemática atual, uma vez sanada a nulidade, o processo retornaria ao tribunal para o julgamento do mérito do recurso. A autorização legal afasta tal óbice e segue na mesma linha do §3º do mesmo art. 515 (introduzido pela Lei nº 10.352/2001), que permitiu o imediato julgamento do mérito quando o tribunal reformasse sentença terminativa. A medida é, por isso mesmo, inegavelmente salutar.

Finalmente, o §1º do art. 518 do Código de Processo Civil passará a prescrever que “o juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal.”

É preciso atentar para a recente publicação da já mencionada Emenda Constitucional nº 45/2004 (Reforma do Judiciário), que adotou, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, a chamada súmula vinculante, acrescentando o art. 103-A à Constituição da República. Ademais, na parte que retornou à Câmara (PEC 358, de 2005), tem-se a previsão da súmula impeditiva de recursos para o Superior Tribunal de Justiça e para o Tribunal Superior do Trabalho.

Nota-se, pois, que o não recebimento da apelação contra sentença em consonância com súmula dos Tribunais Superiores representa, a nosso sentir, uma medida condizente com a adoção da súmula vinculante. Ou seja, se optamos pela súmula vinculante, não há sentido em permitir o processamento de recurso contrário ao entendimento fixado por aquela.


Ainda que assim não o fosse, tal conduta do magistrado apenas anteciparia o provimento que fatalmente viria a ser tomado pelo relator do recurso, o qual, com base no art. 557 do CPC já está autorizado a negar seguimento a recurso em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do STF ou de Tribunal Superior.

De qualquer modo, caso o magistrado incorra em equívoco ao considerar sua decisão adequada ao entendimento refletido pela Súmula, restará à parte a via do agravo de instrumento contra a decisão que não conhecer de sua apelação, nos termos do art. 523, §4º, in fine, do Código de Processo Civil.

Por derradeiro, o §2º que se acresce ao art. 518 do CPC fixa prazo para que o juiz, após o oferecimento das contra-razões da parte recorrida, possa reexaminar os pressupostos de admissibilidade do recurso (atitude já prevista pelo atual parágrafo único do mesmo dispositivo legal). A limitação de prazo não causa qualquer prejuízo e apenas busca imprimir maior celeridade a este ato judicial.

De qualquer modo, além de se tratar de prazo impróprio, os pressupostos recursais constituem, como se sabe, matéria de ordem pública, a qual pode vir a ser apreciada (ou mesmo reapreciada) pelo tribunal na ocasião do julgamento do recurso, estando a salvo de preclusão.

Isso posto, o nosso voto é pela constitucionalidade, juridicidade, boa técnica legislativa, com a emenda em anexo, e, no mérito, pela aprovação do Projeto de Lei nº 4.724, de 2004.

Sala da Comissão, em de de 2005.

Deputado Inaldo Leitão

Relator

Comissão de Constituição e Justiça e de CIDADANIA

Projeto de Lei nº 4.724, de 2004

Altera os arts. 504, 506, 515 e 518 da Lei nº 5.869, de 11 de Janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, relativamente à forma de interposição de recursos, ao saneamento de nulidades processuais, ao recebimento de recurso de apelação e a outras questões.

EMENDA

Acrescente-se ao projeto o seguinte artigo 1º, renumerando-se os demais:

“Art.1º Esta lei altera dispositivos da Lei nº 5.869, de 11 de Janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, relativamente à forma de interposição de recursos, ao saneamento de nulidades processuais, ao recebimento de recurso de apelação e a outras questões.”

Sala da Comissão, em de de 2005.

Deputado Inaldo Leitão

Relator

Projeto de Lei

Altera os arts. 504, 506, 515 e 518 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, relativamente à forma de interposição de recursos, ao saneamento de nulidades processuais, ao recebimento de recurso de apelação e a outras questões.

O Congresso Nacional decreta:

Art. 1o Os arts. 504, 506, 515 e 518 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 504. Dos despachos não cabe recurso.” (NR)

Art. 506

III – da publicação do dispositivo do acórdão no órgão oficial.

Parágrafo único. No prazo para a interposição do recurso, a petição será protocolada em cartório ou segundo a norma de organização judiciária, ressalvado o disposto no § 2o do art. 525.” (NR)

“Art. 515

§ 4o Constatando a ocorrência de nulidade sanável, o tribunal poderá determinar a realização ou renovação do ato processual, intimadas as partes; cumprida a diligência, sempre que possível prosseguirá o julgamento da apelação.” (NR)

“Art. 518

§ 1o O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal.

§ 2o Apresentada a resposta, é facultado ao juiz, em cinco dias, o reexame dos pressupostos de admissibilidade do recurso.” (NR)

Art. 2o Esta Lei entra em vigor noventa dias após a data de sua publicação.

Brasília,

nº 00182 – Ministério da Justiça

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