Contra-ataque

“Ações de setores da advocacia são de ataque ao Judiciário”

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7 de julho de 2005, 22h01

As ações de alguns setores dos advogados contra as invasões de escritórios de advocacia “abrem grave precedente de violação da legalidade democrática, pretendendo converter as necessárias, indispensáveis prerrogativas da advocacia em uma espécie super-regime de auto-tutela”. A afirmação é do vice-presidente da 2ª Região da Ajufe — Associação dos Juizes Federais do Brasil, José Carlos da Silva Garcia durante ato de desagravo ao juiz Vlamir Costa Magalhães, nesta quinta-feira (7/7), no Rio de Janeiro.

Segundo ele, a “situação é de grave ataque ao Judiciário”. De acordo com Silva Garcia, os atos de algumas seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil estão promovendo “absurda e inexplicável confusão institucional”. O objetivo seria, afirma, “intimidar os juízes na apreciação livre dos autos e cercear a utilização das medidas que, a critério do juiz da causa e com base na lei, sejam necessárias para investigar práticas delituosas graves”.

Leia a íntegra do discurso

Palavras de abertura: Sras. e srs., autoridades aqui presentes, que cumprimento na pessoa do Presidente do TRF da 2ª. Região, desembargador federal Frederico Gueiros, este ato se realiza em momento particularmente tenso na vida jurídica nacional.

Nas últimas semanas, os juízes em geral, e muito particularmente os membros da Justiça Federal, têm sido vítimas de ataques ferozes e de intensa campanha em rádio, televisão e mesmo em cartazes de rua, por parte de setores das lideranças das entidades representativas dos advogados do país – parcelas da OAB, notadamente da sua seccional paulista, e de outras entidades de classe dos advogados.

O objeto destes ataques são atos judiciais presumidamente (por estes setores) ilegais e abusivos praticados por juízes federais, mais especificamente o que chamam de “invasões de escritórios de advocacia”, na verdade expedição de mandados de busca e apreensão determinados pelas autoridades judiciais competentes em decisões judiciais em pleno vigor.

Alguns destes setores da classe dos advogados têm mesmo instigado, incitado seus pares a expressamente resistir ao cumprimento de todos os mandados judiciais de busca e apreensão a serem cumpridos em escritórios de advocacia, desde que eles próprios os considerem ilegais, genéricos ou abusivos.

Para tanto, chegam a incitar os advogados ao enfrentamento dos policiais federais responsáveis pelo cumprimento destas ordens judiciais. Ao fazê-lo, estas lideranças dos advogados abrem grave precedente de violação da legalidade democrática, pretendendo converter as necessárias, indispensáveis prerrogativas da advocacia em uma espécie de super-regime de auto-tutela, conferindo aos advogados em cujos escritórios devam ser praticados tais atos o poder “jurisdicional”, muito entre aspas, de avaliar a legalidade das ordens judiciais, jogando sobre todas elas a pecha de inconstitucionalidade e de abusividade e a presunção (relativa ou absoluta?) de ilegalidade.

No cerne destes ataques, encontra-se decisão proferida pelo colega Vlamir Costa Magalhães, juiz federal substituto da Vara Federal de Itaboraí, no bojo da chamada “Operação Cevada”. Contra esta decisão, ainda em vigor, ofereceu a OAB representação contra o juiz no Conselho Nacional de Justiça, já rejeitada pelo seu Corregedor, Ministro Pádua Ribeiro, ao fundamento de não se poder atacar ato jurisdicional por medida disciplinar, e ainda de que a instância disciplinar competente, se existente ato passível de apreciação nesta sede, seria a Corregedoria do TRF da 2ª. Região, à qual remeteu parcialmente a matéria.

Não contente com esta tentativa visível de intimidação, a OAB paulista impetrou discutível mandado de segurança “preventivo e coletivo, cumulado com suscitação de conflito de competência e representação com pedido de correição ao Conselho de Justiça Federal (CJF), em favor de advogados nela inscritos, contra atos dos Tribunais Regionais Federais (TRFs), por seus presidentes e magistrados da Justiça Federal, do diretor-geral da Polícia Federal, do superintendente da Polícia Federal em São Paulo e delegados e policiais federais de todo o País que viessem a pretender executar diligências no Estado de São Paulo” (sic, transcrição da página do STJ na internet).

Nesta mesma página na internet, lê-se a notícia da decisão do Ministro Presidente do STJ, Edson Vidigal, que indeferiu o pedido de liminar e extinguiu o processo, sem julgamento do mérito. A situação é de grave ataque ao Judiciário. Alguns setores dos advogados (não todos, nem mesmo todas as seccionais da OAB), promovendo absurda e inexplicável confusão institucional, pretendem de fato intimidar os juízes na apreciação livre dos autos e cercear a utilização das medidas que, a critério do juiz da causa e com base na lei, sejam necessárias para investigar práticas delituosas graves, muitas vezes praticadas de forma organizada e ramificada para várias outras esferas de poder econômico e político.

Não se trata de avaliar, aqui, o mérito ou o conteúdo da decisão do colega Vlamir: isto não pode estar em discussão, se ainda está em vigor a decisão, se não foi atacada eficazmente pela via cabível, que não é a disciplinar, que não é a expiação pública, mas o recurso legalmente previsto para o Tribunal competente. O ato de desagravo que aqui se realiza não é um julgamento às avessas da decisão do nosso colega juiz federal, e sim, ao contrário, o reconhecimento de que este julgamento só pode ser validamente feito pelas instâncias competentes do Judiciário, através das vias previstas em lei.

Este é o desagravo que nos cabe, sem dúvida dirigido à dignidade do juiz federal substituto Vlamir Costa Magalhães, mas ainda repleto de simbolismo e de evidente caráter institucional. Por isso, ao empenharmos aqui nossa solidariedade, pessoal e institucional ao colega Vlamir,certamente visamos a deixar livre de dúvidas sua honra e sua autonomia para, nos termos da Constituição e das leis, apreciar e julgar os autos que lhe sejam distribuídos; mas visamos também preservar a autonomia e a independência de cada um e todos os juízes aqui reunidos, bem como reconhecer o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo Ministério Público, pela Polícia Federal e pela Receita Federal no combate incansável à impunidade, à corrupção e à criminalidade organizada.

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