Imunidade diplomática

É ilegal bloquear contas de representação estrangeira

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4 de julho de 2005, 17h31

A penhora de conta corrente de Estado estrangeiro é ilegal, a não ser quando for comprovado seu uso para fins estritamente mercantis, e a expropriação de bens só é possível quando eles não forem afetos à representação diplomática ou consular. Assim, a imunidade de execução dos Estados é restrita. Com esse entendimento, o Tribunal Superior do Trabalho determinou o desbloqueio das contas bancárias da embaixada da Malásia mas autorizou a execução dos bens que não forem ligados à missão diplomática do país.

A autorização de bloqueio de duas contas em nome do Escritório Comercial da Embaixada da Malásia foi dada pela 5ª Vara do Trabalho do Distrito Federal, para a quitação de débitos trabalhistas. A decisão foi confirmada pelo Tribunal Regional do Trabalho do Distrito Federal, que negou o desbloqueio pedido pela Malásia por meio de mandado de segurança por considerar o instrumento incabível para a finalidade pretendida (suspender a execução).

O entendimento da Vara e da segunda instância foi o de que, de acordo com a Convenção de Viena, de 1961, que trata das relações diplomáticas, seriam impenhoráveis “apenas e tão-somente os locais da missão diplomática, seu mobiliário e demais bens ali situados, assim como seus meios de transporte”. Como as contas-corrente tinham como titular o escritório comercial da embaixada, concluiu-se que não se tratava de bem impenhorável.

O governo da Malásia, então, entrou com recurso ordinário junto ao TST visando à imediata suspensão dos bloqueios. Em sua defesa, afirmou que a manutenção do bloqueio “implicará em precedente extremamente perigoso, que infringirá o princípio da reciprocidade, possibilitando que créditos brasileiros sejam passíveis de penhora em outros Estados, especialmente o malaio, que poderá utilizar de tal precedente”.

Segundo a representação estrangeira, “a decisão criará um caos na diplomacia internacional sem precedentes, com oficiais de justiça dos diversos países penhorando créditos, saldos e dinheiro uns dos outros” e “trará prejuízo inclusive à imagem do Brasil perante a comunidade internacional”.

A Malásia interpretou a Convenção de Viena (artigo 22, parágrafo 3º) como um princípio de imunidade de execução absoluto, pois não haveria “como distinguir o que esteja e o que não esteja vinculado às necessidades de manutenção do corpo diplomático do país”. Informou, também, que o dinheiro existente nas contas bloqueadas destina-se ao pagamento de salários e despesas de seu corpo diplomático

O processo foi julgado pela SDI-2 — Subseção especializa em Dissídios Individuais e teve como relator o ministro Renato de Lacerda Paiva. Para ele, a Convenção de Viena prevê textualmente que “os locais da Missão [diplomática], seu mobiliário e demais bens neles situados, assim como os meios de transporte da Missão, não poderão ser objeto de busca, requisição, embargos ou medida de execução”.

No caso do bloqueio das contas da Federação da Malásia — Trade Office (Escritório Comercial), o ministro Paiva concluiu que o juiz que o determinou “se equivocou ao associar a promoção de intercâmbio comercial com a caracterização de interesse econômico”. Ou seja, o escritório comercial não se destina a fazer transações comerciais (estando, inclusive, expressamente proibido de fazê-lo), e sim de promover a aproximação comercial entre Brasil e Malásia e favorecer a realização de negócios.

A questão da penhora de bens para execução de dívidas trabalhistas tem preocupado as embaixadas, que já se reuniram este ano com o presidente do TST, ministro Vantuil Abdala. Atualmente, tramitam 194 processos envolvendo Estados estrangeiros no Tribunal Regional do Trabalho do Distrito Federal e no TST.

Para o advogado Arthur Cahen, do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados Associados, a decisão do TST é “irretocável”. Segundo ele, o acórdão respeita tanto a Convenção de Viena quanto o ordenamento trabalhista “sobre a inviolabilidade dos locais da Missão”.

282/2003-000-10-00.1

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