Caso Olivetto

Seqüestrador de Washington Olivetto vai permanecer preso

Autor

27 de janeiro de 2005, 14h55

O chileno Maurício Hernandes Norambuena, acusado de comandar o seqüestro do publicitário Washington Olivetto, entre o final de 2001 e o início de 2002, vai permanecer preso por mais um ano no Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), que impõe normas mais rígidas de segurança.

A prorrogação foi determinada pelo juiz-corregedor da Vara das Execuções Criminais e Corregedoria dos Presídios de São Paulo, Miguel Marques e Silva. A decisão é retroativa a 1º de dezembro. Norambuena está preso na penitenciária de Presidente Bernardes.

O chileno requereu sua remoção do RDD alegando que o prazo de sua permanência havia terminado em 25 de novembro do ano passado e que não tinha praticado qualquer indisciplina durante sua permanência no Centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes.

No final de novembro, o juiz prorrogou a internação de Norambuena por mais 60 dias e requereu a manifestação do Ministério Público. A promotora de Justiça Mariza Schiavo Tucunduva opinou pela permanência no RDD, sustentando que ele não é preso de fácil contenção porque teria fugido do presídio de segurança máxima de Santiago do Chile.

Em sua decisão, o juiz Miguel Marques e Silva sustentou que existem mais do que fundadas razões que apontam que Norambueno é um risco à comunidade e que a medida disciplinar mais rígida se impõe, inclusive, para assegurar a aplicação da lei penal chilena, assim como eventual extradição a ser concedida pelo governo brasileiro.

“Indivíduo assim, com alto grau de periculosidade, com duas condenações em conseqüência de prática de delitos hediondos no seu país, que, após espetacular fuga de um presídio de segurança máxima, ainda volta a delinqüir, e, mais que isso, em outro país, só pode receber do Estado resposta à altura da sua audácia”, justificou o magistrado.

Washington Olivetto foi seqüestrado em 11 de dezembro de 2001, depois de sair de sua agência de publicidade, a W/Brasil. O publicitário permaneceu em um cativeiro no Brooklin (zona sul de São Paulo) até 2 de fevereiro de 2002.

Ele foi solto após uma vizinha ouvir os seus gritos. No dia anterior, seis membros da quadrilha haviam sido presos em Serra Negra. Norambuena cumpre pena por seqüestro, tortura e formação de quadrilha. Ele deverá cumprir 30 anos de reclusão no Brasil e, depois, ser extraditado.

Leia a íntegra da decisão

Pro. C-342/03

Mauricio Hernandez Norambuena, qualificado nos autos, requer sua remoção do Regime Disciplinar Diferenciado, alegando que a internação determinada por este juízo, por 360 dias, teve seu término no dia 25 de novembro de 2004, tendo em vista não ter praticado qualquer falta disciplinar durante sua permanência no Centro de Readaptação Penitenciaria de Presidente Bernardes (fls. 157/158). A fls. 160/161 o sr. Secretário da Administração Penitenciaria solicita decisão deste juízo a respeito da permanência do referido sentenciado naquele regime, lembrando que ele trata-se de preso diferenciado dos demais, remetendo cópias de documentos (fls. 162/183).

Por despacho de 29.11.2004 este juízo prorrogou a internação do sentenciado por 60 dias, cautelarmente, determinando em seguida vista ao Ministério Público (fls. 160). Este, a fls. 188/189, por intermédio da sua representante, Dra. Mariza Schiavo Tucunduva, opinou no sentido de que o sentenciado permaneça no regime disciplinar diferenciado, um vez que os motivos ensejadores da sua internação ainda persistem, sustentando, ainda, que ele não é preso de fácil contenção, visto que fugiu de um presídio de segurança máxima de Santiago do Chile.

A fls. 193/195 Embargos de Declaração oferecidos pelo sentenciado, os quais foram indeferidos pelo despacho de fls. 196, que determinou ainda, manifestação da Defesa acerca do pedido de prorrogação naquele regime. A fls. 197/199 esta se manifestou, alegando que o pedido do Ministério Público não tem amparo legal e que o sentenciado não cometeu falta disciplinar grave, ostentando bom comportamento carcerário. Alega ainda, que o risco de fuga não pode respaldar a internação do sentenciado, pois é dever do Estado custodiar os presos e mantê-los encarcerados. Por isso pede o indeferimento do pedido de prorrogação de internação do sentenciado em RDD.

É o relatório. Decido.

O sentenciado Mauricio Hernandez Norambuena requer sua remoção do Centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes, onde se encontra cumprindo pena no regime disciplinar diferenciado, alegando que não registra qualquer falta disciplinar e o prazo de sua internação naquele presídio já expirou. O Ministro Público, por sua vez, por meio da sua representante legal, Dra. Marisa Schiavo Tucunduva, requer a permanência do sentenciado no referido regime, pois os motivos que deram ensejo à sua internação ainda persistem.

A razão está com o Ministério Publico pois realmente persistem os motivos que acabaram levando o sentenciado a ser internado no aludido regime.

Primeiramente, como já acentuamos na decisão anterior, o requerente sofreu duas condenações em seu país de origem, ambas à pena de prisão perpétua, por assassinato de autoridades, quando chefiava organização criminosa (fls. 05). Era conhecido nessa organização por “Comandante Ramiro” (fls. 126 e 128, do apenso).

Cumpria essas penas em presídio de segurança máxima em Santiago do Chile, quando foi resgatado de maneira espetacular por seus companheiros de crime, por meio de um helicóptero.

Posteriormente, veio ao Brasil com o intuito único de cometer seqüestros, tendo comandado aquele do qual foi vitima o publicitário Washington Luiz Olivetto, o que demonstra toda sua audácia. Preso e processado, acabou sofrendo condenação à pena privativa de liberdade de trinta anos.

Portanto, tem o requerente situação diferente de todos os demais presos do Brasil. Não é um detento qualquer, não podendo merecer o mesmo tratamento durante a expiação da pena, como aquele que é dado aos demais presos. O princípio da individualização da pena, aplicável na fase da execução penal, tem que levar em consideração as peculiaridades do requerente, para que possa receber tratamento condizente com sua situação particular.

Como já enfatizamos, a distribuição da justiça, na fase da execução penal, pressupõe tratar desigualmente os desiguais, impondo-se a devida retribuição ao mal cometido.

A respeito leciona JULIO FABBRINI MIRABETE que,

“É norma constitucional, no Direito Brasileiro, que ‘a lei regulará a individualização da pena’ (art. 5º, XLVI, 1ª parte, da CF). A individualização é uma das chamadas garantias repressivas, constituindo postulado básico de justiça…

Com os estudos referentes à matéria, chegou-se paulatinamente ao ponto de vista de que a execução penal não pode ser igual para todos os presos – justamente porque nem todos são iguais, mas sumamente diferentes – e de que tampouco a execução pode ser homogênea durante a fase executória da pena, se exige um ajustamento desse programa conforme a reação observada no condenado, podendo-se só assim falar em verdadeira individualização no momento executivo.” (“Execução Penal”, 9ª ed., pág. 46).

Assim, levando em consideração que o requerente encontra-se condenado em nosso país a cumpri pena de 30 anos de prisão, em decorrência do crime de extorsão mediante seqüestro, seu resgate espetacular de um presídio de segurança máxima em Santiago, Chile,e, principalmente, suas duas condenações nesse país à pena de prisão perpetua pela pratica de terríveis, delitos, que inclusive deram ensejo à solicitação de sua extradição pelo governo daquele país, a melhor solução, por ora, ainda é mantê-lo no atual regime disciplinar, com apoio nos §§ 1º e 2º, do art. 52 da Lei de Execução Penal, pois não há duvidas de tratar-se aludido sentenciado de preso estrangeiro que representa alto risco para a ordem e a segurança, tanto de estabelecimento penal, como para a sociedade, envolvido com organizações criminosas. Existe, portanto, mais do que fundadas razoes no sentido de apontar o requerente como sendo um risco à comunidade.

Há que ser ressaltado, ainda, que tal medida se impõe, inclusive, para assegurar a aplicação da lei penal chilena, assim como eventual extradição a ser concedida pelo governo brasileiro.

A Defesa, conforme se vê nas suas manifestações, tem insistido no argumento de que o sentenciado não praticou qualquer falta disciplinar grave no presídio onde se encontra, todavia isso é muito pouco para autorizar a saída do regime disciplinar diferenciado. Na verdade, encontrando-se o sentenciado nesse regime, é praticamente impossível a prática de falta disciplinar de natureza grave, em face das circunstâncias e da estrutura do Centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes.

No que tange à alegação de que o atual embaixador do Chile no Brasil é favorável à desinternação do sentenciado, como já frisamos na decisão anterior, “é curioso que, pouco tempo depois da primeira manifestação, outro embaixador daquele país venha dizer que era interesse do governo do Chile que o sentenciado não fosse mais mantido no regime disciplinar diferenciado. Há notícias, contudo, que bem podem justificar tal mudança de atitude, que, após aquela primeira manifestação do governo chileno, seguiram-se naquele país vários atentados perpetrados por companheiros do sentenciado, componentes de uma organização criminosa da qual ele faz parte, em represália por haver sido solicitada sua permanência no RDD pelo referido governo”.

Uma última observação ainda se impõe: o requerente reclama que alguns de seus direitos, de acordo com a Constituição brasileira, não estariam sendo observados, todavia, parece olvidar que sal do país exclusivamente para aqui praticar delitos de natureza hedionda, uma vez que, tanto no processo de conhecimento, como no da execução penal, consta como sendo sua residência o endereço certificado a fls. 57 deste feito, ou seja, à Rua Santiago, 218, Centro, Santiago, Chile. Seus familiares, como ele próprio diz, residem todos no Chile (fls. 55).

A despeito da inequívoca incidência dos dispositivos da nossa Constituição em favor do estrangeiro, também não se pode esquecer, por outro lado, que a mesma Carta, em seu artigo 5º, caput estabelece que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros se aos estrangeiros residentes no País…” (g.n.).

Na verdade, os direitos e garantias de condenado estrangeiro que aqui veio única e exclusivamente para praticar crime hediondo e que sequer reside no País, deveriam se restringir ao cumprimento da pena aplicada e, em sendo de altíssima periculosidade, em estabelecimento adequado.

Indivíduos assim, com alto grau de periculosidade, com duas condenações em conseqüência da prática de delitos hediondos no seu país, que, após espetacular fuga de um presídio de segurança máxima, ainda volta a delinqüir, e, mais que isso, em outro país, só pode receber do Estado resposta à altura da sua audácia.

Aliás, apenas o fato de ter contra si aquelas duas condenações, a cumprir pena de prisão perpétua, já é o bastante para autorizar seja o sentenciado mantido no presídio onde se encontra.

Tal se dá porque, se o nosso ordenamento não prevê esse tipo de pena, evidentemente que não pode também o estrangeiro que se encontra condenado a esse tipo de punição receber tratamento igual ao sentenciado residente no país, que é punido, no máximo, com pena privativa de liberdade.

Em suma, principalmente em razão da existência dessas duas condenações à prisão perpétua no Chile, entendo que o sentenciado Maurício Hernandez Norambuena deve continuar, por mais um ano, no regime disciplinar diferenciado do Centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes.

Em face do exposto, determino a prorrogação da internação de Maurício Hernandez Norambuena, pelo período de 360 dias, com efeito retroativo a 1º de dezembro de 2.004, com fulcro nos parágrafos 1º 2º do art. 52, da Lei de Execução Penal, expedindo-se ofício à Secretária da Administração Penitenciária para as providências.

P.R.I.C

São Paulo, 18 de Janeiro de 2.005.

MIGUEL MARQUES E SILVA

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!