Barulho por nada

Caso Waldomiro Diniz completa um ano sem resultados na Justiça

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12 de fevereiro de 2005, 13h47

O caso Waldomiro Diniz comemora seu primeiro aniversário sem bolo nem vela, e praticamente sem resultados concretos na Justiça. As investigações do escândalo protagonizado pelo ex-assessor da Casa Civil da Presidência, filmado pedindo ao empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, dinheiro para campanhas do PT e propina para si próprio em troca de facilidades nos negócios das loterias oficiais, estão longe de terminar.

À época da gravação, feita por Cachoeira, Waldomiro presidia a Loterj — Loteria do Estado do Rio de Janeiro. O ex-assessor prometeu a Cachoeira mexer em um edital de licitação para garantir que os negócios do empresário com jogos eletrônicos de apostas não fossem prejudicados.

O que parecia nitroglicerina pura, até agora resultou num traque de festa de São João. O caso publicado pela revista Época em 13 de fevereiro de 2004 produziu um certo esvaziamento político do então todo poderoso ministro José Dirceu, mas a temida CPI para apurar as transações suspeitas foi abortada por pressão do governo.

Produziu também a Medida Provisória 168, que proibiu os jogos de bingos país afora, embora não tratasse de bingo, e sim de loterias a negociação suspeita.

Sem a força política que uma CPI traz em seu bojo, as investigações parecem ter perdido consistência. Nas primeiras apurações do caso, o Ministério Público Federal meteu os pés pelas mãos e acabou invertendo os papéis: passou de acusador para acusado.

Uma nova fita divulgada no final de março mostrou o subprocurador José Roberto Santoro e o procurador Marcelo Serra Azul tomando depoimento extra-oficial de Cachoeira durante a madrugada. Eles tentavam obter a fita que mostrava Waldomiro pedindo propina e foram acusados de tentar desestabilizar o governo.

O procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, pediu abertura de procedimento administrativo contra os procuradores, mas — como tudo nesta novela mal contada — seu resultado é um mistério ou um segredo muito bem guardado por quem procedeu a sindicância.

Investigações

O saldo concreto de doze meses de investigações nas esferas federal e estadual é, até agora, uma ação por improbidade administrativa impetrada pela Advocacia-Geral da União e um conjunto de ações civis públicas ajuizadas pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, por irregularidades na autorização de funcionamento dos bingos no estado.

Segundo o promotor de Justiça Cláudio Henrique da Cruz Viana, um dos responsáveis pelas ações na Justiça fluminense, elas “não têm relação direta com o caso divulgado a um ano. São 20 ações baseadas num relatório do Tribunal de Contas, que apontou irregularidades na concessão de autorização e falta de fiscalização nos bingos”. Como Waldomiro foi presidente da Loterj entre 1999 e 2002, ele é réu em algumas dessas ações.

Waldomiro também foi alvo de uma CPI da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, que investigou suas atividades como presidente da Loterj. Em meio aos trabalhos, surgiu uma fita, divulgada por Veja em outubro, que mostrou o deputado federal André Luiz pedindo R$ 4 milhões a Carlinhos Cachoeira para que seu nome não constasse do relatório final da comissão.

Nova reviravolta no caso e as conclusões da CPI estão nas mãos do procurador-geral Cláudio Fonteles — em razão do envolvimento de deputados federais no caso — que decidirá o que fazer com a papelada.

Impasse

Na esfera federal, a principal investigação, que apura a atuação de Waldomiro, já como assessor palaciano, num negócio de R$ 650 milhões fechado entre a Caixa Econômica Federal e a GTech, empresa americana que montou o sistema de loterias do governo federal, se transformou num impasse. O relatório da Polícia Federal sobre o caso terá de ser refeito pela segunda vez.

A primeira denúncia apresentada pelo procurador Serra Azul foi rejeitada pela 10ª Vara da Justiça Federal de Brasília em junho. Além de Waldomiro e da diretoria da GTech e da Caixa, a denúncia introduziu na novela outro personagem secundário com ligações de primeira: o petista Rogério Buratti, que foi secretário de governo da prefeitura de Ribeirão Preto quando o ministro Antonio Palocci Filho foi prefeito da cidade pela primeira vez, em 1994.

O juiz Cloves de Siqueira entendeu que havia necessidade de aprofundar a apuração sobre os fatos relacionados à renovação do contrato, pelo qual a GTech se mantinha por mais 25 meses como gerenciadora de todo o sistema de loterias no país.

No novo relatório conduzido pelo delegado César Nunes e apresentado à Justiça em 15 de dezembro passado, o número de denunciados foi reduzido a três: Waldomiro, Buratti e o jornalista Mino Pedrosa.

Waldomiro e Buratti foram indiciados por concussão, ou seja, pela tentativa de extorquir empresários em troca de favorecimento. Mino Pedrosa, que trabalhou com Carlinhos Cachoeira, foi indiciado por falso testemunho. A convicção teria vindo do comportamento do jornalista que, na condição de testemunha, escudou-se no direito de nada dizer que o incriminasse em seus depoimentos.

O relatório desagradou à cúpula da PF e, desta vez, foi o Ministério Público Federal quem pediu que as investigações fossem retomadas. “Não se trata de um impasse, e sim de uma discordância normal, corriqueira”, afirma o procurador José Robalinho Cavalcanti, que preside o inquérito desde junho passado.

Segundo o procurador, “a investigação em si estava satisfatória, mas o tratamento das informações é que precisa ser mais bem explorado. Waldomiro e Buratti foram denunciados por concussão. Eu discordei porque não sei se a GTech é totalmente inocente no caso. Isso precisa ser melhor apurado”.

Advogados que acompanham de perto o caso afirmam que esse vai e volta de relatórios é motivado pela falta de provas contra Waldomiro e os demais denunciados.

“Se tivéssemos todos os elementos necessários, a denúncia já teria sido feita”, diz Cavalcanti. Para ele, se o caso não fosse tão rumoroso, ninguém estranharia os procedimentos que foram feitos até agora. “Os fatos investigados aconteceram há dois anos, não há nada de estranho no tempo que as investigações estão levando”, garante.

Desvio de foco

Waldomiro é um especialista em loterias, mas quem pagou o pato foram os bingos. Logo após o escândalo, o governo proibiu o funcionamento dessas casas de jogos pelo país. Depois, a MP 168 foi rejeitada pelo Congresso e os bingos voltaram a funcionar sob as mais variadas suspeitas.

Fato é que em alguns estados as casas funcionam normalmente e em outros estão terminantemente proibidas. Isso acontece graças a um cipoal legislativo que regula o assunto e a decisões judiciais que liberam os jogos aqui e os proíbem acolá. Dados da Associação Brasileira de Bingos dão conta de que há cerca de 800 casas hoje em funcionamento.

Enquanto se discute o funcionamento dos bingos e muito se investiga sobre tráfico de influência de Waldomiro junto a negócios que envolvem loterias, uma importante questão ficou em segundo plano: o PT recebeu, via Waldomiro, dinheiro sujo para suas campanhas?

Nenhuma apuração séria nesse sentido foi levada a cabo e, até agora, parecem escassas as provas contra o ex-assessor palaciano, o que fica evidenciado com o desencontro das investigações. Waldomiro se transformou num esqueleto no armário do PT. Resta saber se ficará esquecido ou se será devidamente exumado.

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