Cipoal legislativo

Busato critica excesso de medidas provisórias do governo Lula

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10 de fevereiro de 2005, 12h27

Um dos motivos da existência do instituto da media provisória é, sem dúvida, a lentidão do Congresso em votar projetos de lei. A afirmação foi feita, em entrevista, pelo presidente nacional da OAB, Roberto Busato. “O processo legislativo brasileiro é altamente complicado, pois temos uma tradição de muita barganha, de envolvimento político na tramitação das leis dentro do Congresso, o que realmente dificulta esse processo”, afirmou Busato. “Essa realidade acabou sendo uma das propulsoras da medida provisória existir no país por meio da Constituição”.

Para Busato, Lula não seguiu com fidelidade o compromisso que assumiu na sede da OAB quando ainda era candidato à presidência, de evitar o uso de medidas provisórias. O presidente nacional da OAB lembrou que Lula já editou mais medidas provisórias que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Roberto Busato criticou a MP 232, que aumentou o Imposto de Renda sobre prestadores de serviço e profissionais autônomos, agora sob estudo da entidade.

Busato acrescentou que, além do povo, o mais prejudicado com a edição exagerada de MPs é o próprio Executivo. Segundo ele, o governo lança um projeto de lei a respeito de um assunto de seu interesse, que passa a tramitar no Congresso Nacional. No entanto, esse mesmo governo entra com uma medida provisória em assunto não-relevante e seu projeto de lei, que estava tramitando, acaba ficando retido devido à edição de MPs que o próprio governo apresentou.

“Isso mostra claramente o cipoal que o governo monta contra si próprio. Nem mesmo um projeto de lei de sua autoria consegue tramitar de forma eficiente dentro do Congresso, pelo excesso de medidas provisórias”, concluiu Busato.

Leia a íntegra da entrevista

Qual a sua avaliação sobre o uso exagerado das medidas provisórias?

O instituto da medida provisória vem sendo deturpado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a sua utilização excessiva e imprudente vem fazendo muito mal a este país. O governo está prostituindo o instituto da medida provisória e, com isso, nem mesmo projetos de lei enviados pelo próprio Executivo ao Congresso Nacional têm conseguido tramitar de forma eficiente. A apresentação de MPs em série acaba trancando a pauta no Congresso Nacional e atrasando o exame de matérias importantíssimas para o País, como aconteceu com a reforma do Judiciário.

Elas obedecem ao princípio da urgência e da relevância ou do interesse eventual do governo?

De acordo com o artigo 62 da Constituição Federal, uma MP só pode ser editada em casos de relevância e urgência. Infelizmente, nenhum governo, nem este nem os anteriores, tiveram o cuidado de obedecer a esse preceito constitucional. O presidente Lula não seguiu com fidelidade o compromisso que assumiu na sede da OAB de evitar o uso das medidas provisórias. Seu governo já editou, em termos proporcionais, mais medidas provisórias que o de Fernando Henrique Cardoso. E, a exemplo do governo anterior, não vem respeitando os pressupostos de urgência e relevância.

Não há nada que se possa fazer para evitá-las?

Há sim, se houver vontade do governo em evitá-las. Se persistirmos nesse mau uso das MPs, acontecerá o caos legislativo neste país. O governo segue editando medida provisória atrás de medida provisória, mesmo depois de o próprio presidente da República ter admitido publicamente que está editando muitas medidas provisórias. E agora veio mais uma, propondo o aumento no Imposto de Renda sobre empresas prestadoras de serviço e profissionais autônomos (MP nº 232), tirando de nós a ilusão de que o governo realmente procura trazer uma harmonia social.

Para alguns, o Congresso poderia simplesmente devolver as MPs, pelo menos nos casos não urgentes nem relevantes. É tão simples assim?

Eu não entendo porque não o faz porque o Congresso e o próprio Executivo saem prejudicados com a enxurrada de medidas provisórias. Por exemplo, o governo lança um projeto de lei a respeito de um assunto de seu interesse, que passa a tramitar no Congresso Nacional. No entanto, esse mesmo governo entra com uma medida provisória em assunto não-relevante, não urgente, e seu projeto de lei, que estava tramitando, acaba ficando retido por causa de medidas provisórias que o próprio governo apresentou. Isso mostra claramente o cipoal que o governo monta contra si próprio. Nem mesmo um projeto de lei de sua autoria consegue tramitar de forma eficiente dentro do Congresso, pelo excesso de medidas provisórias.

O candidato Lula em visita à OAB prometeu não editar MPs? Quando?

Sim. Em julho de 1998, quando ainda era candidato à Presidência. Lula esteve no Conselho Federal da OAB, em Brasília, e entregou ao então presidente da entidade, Reginaldo Oscar de Castro, um documento contendo nove itens que se comprometia a pôr em prática quando chegasse à Presidência da República. Um deles se referia ao uso das medidas provisórias. Ele afirmou: “assumo o compromisso de acabar com o uso indiscriminado de medidas provisórias. O atual governo – referindo-se ao de Fernando Henrique – adotou mais MPs do que os decretos-leis editados pelos governos militares. Limitar-me-ei ao que prescreve a Constituição Federal para cuja elaboração contribuí – de só editar medidas provisórias em situações de excepcionalidade e emergência”. Infelizmente, Lula não vem cumprindo esse compromisso.

A MP surgiu por causa da lentidão do Congresso?

Uma das vertentes da existência do instituto da medida provisória, sem dúvida nenhuma, é a notória lentidão do Congresso em votar os projetos de lei. O processo legislativo brasileiro é altamente complicado, pois temos uma tradição de muita barganha, de envolvimento político na tramitação das leis dentro do Congresso, o que realmente dificulta esse processo. Essa realidade acabou sendo uma das propulsoras da medida provisória existir no país por meio da Constituição Federal.

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