Linha cruzada

Juíza proíbe Telefônica de cobrar assinatura básica de telefone

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10 de fevereiro de 2005, 18h20

A batalha pela cobrança da taxa de assinatura básica do telefone fixo entre consumidores e Telefônica esquentou nesta quinta-feira (10/2). O Diário Oficial publicou 31 liminares de efeito coletivo — cada uma delas isentando todos os assinantes do estado de São Paulo do pagamento da assinatura básica. A Telefônica, por sua vez, informou que derrubou as decisões contrárias à cobrança.

Todas as liminares foram concedidas pela juíza Maria Lúcia Ribeiro de Castro Pizzotti Mendes, da 32ª Vara Cível Central da Capital, que chamou par si o julgamento das ações coletivas referentes à cobrança da assinatura básica pela Telefônica.

Pelas liminares, a Telefônica tem prazo de 48 horas para o cumprimento, inclusive deixando de inserir nas contas de fevereiro a tarifa de assinatura. Para voltar a cobrar a taxa, a empresa terá de derrubar as 31 liminares mediante recursos ao Tribunal de Justiça paulista. A Telefônica informa que já derrubou a Ação Civil Pública e algumas liminares e entende que não está obrigada a suspender a cobrança.

As medidas foram concedidas em Ação Civil Pública proposta pelo Centro de Defesa do Consumidor e Cidadania e em 30 outras ações individuais diversas em favor de consumidores, pessoas físicas e jurídicas.

Todas as decisões têm a mesma redação. A juíza considerou abusiva a cobrança da tarifa. Para ela, o grupo de empresas que detém a concessão de serviços públicos “não pode prevalecer a ponto de ensejar duplicidade de cobrança sobre o mesmo serviço sob pena de enriquecimento ilícito”.

A Telefônica alegou que a concessão das liminares reduziria os lucros, podendo até inviabilizar a empresa. Argumentou, ainda, que a assinatura básica corresponde a cerca de um terço da receita do setor e que sua suspensão definitiva pode por em xeque o próprio modelo de concessão do sistema de telefonia fixa do país. A empresa contabiliza mais de 6 mil ações contestando a cobrança no estado de São Paulo. A Telefônica afirma que tem vitória em 99% das ações.

As divergências não recaem apenas sobre o mérito da cobrança, mas também sobre quem tem competência para decidir. O Superior Tribunal de Justiça decidiu, na semana passada, que cabe à 2ª Vara Federal de Brasília deliberar, em caráter provisório, medidas urgentes sobre a validade ou não da assinatura básica cobrada pelas operadoras de telefonia fixa, em todo o território nacional.

Argumento

Uma das ações individuais foi ajuizada pelo segurança Roni Márcio Orgaide, representado pelo advogado Robson Rogério Orgaide. O advogado alegou que a empresa não oferece contraprestação de serviço. Segundo ele, a Telefônica “cobra por uma taxa que nada tem a ver com a relação de serviço prestado por ela”.

A juíza rebateu o argumento da empresa de que, caso o valor decorrente da assinatura não seja cobrado, aquele que a detém e apenas recebe ligações, se beneficiará de um serviço, sem por ele pagar. “Ora, olvida-se a ré de observar que o serviço por ele prestado é de natureza bilateral, ou seja, para que se pragmatize, é necessária a existência e o contato mútuo de dois consumidores, pois somente recebe ligações, se algum outro consumidor as fizer e, por óbvio, aquele que as está fazendo, já paga pelos pulsos dele decorrentes; por isso, não há serviço sem cobrança, como entende a ré, para aquele que ‘apenas’ recebe a ligação, pois se a recebe, aquele que para ele telefonou, ou seja, o outro consumidor da relação bilateral estabelecida, já paga pela ligação realizada. Desta forma, também sob este prisma, há ‘bis in idem’ na cobrança, quando a ré impõe o pagamento pela taxa de assinatura, somado às tarifas das ligações em si, denominadas pulsos”, ressaltou a juíza.

Outro lado

A Telefônica afirma que não está obrigada a suspender a cobrança de assinatura. Ela alega que entrou com Agravos de Instrumento no Tribunal de Alçada Civil e conseguiu efeito suspensivo para individualizar algumas ações. Ou seja, segundo a empresa, a suspensão de cobrança vale somente para o assinante que entrou com a ação.

Afirma, ainda, que conseguiu cassar as liminares que beneficiavam a Centro de Defesa do Consumidor e Cidadania, no dia 31 de dezembro, e da Associação Nacional de Defesa da Cidadania e do Consumidor, nesta quinta-feira, mesmo dia em que foi publicada. Para a Telefônica, todas as ações são “conexas”.

O Tribunal de Justiça de São Paulo informou à revista Consultor Jurídico que a Telefônica ainda não foi notificada das 31 liminares que foram publicadas no Diário Oficial.

Leia a nota divulgada pela Telefônica

Nota à imprensa

A Telefônica informa que o Tribunal de Justiça cassou hoje (10/02) nova liminar concedida pela juíza da 32ª Vara Cível em ação civil pública impetrada pelo Centro de Defesa do Consumidor e Cidadania, determinando a suspensão da cobrança da tarifa de assinatura básica dos serviços de telefonia fixa a partir de março de 2005.


O entendimento da empresa, expresso em agravo de instrumento e acatado pelo TJ, é que, como esta nova decisão tem idêntico teor à liminar concedida em 30 de dezembro de 2004 pela mesma 32ª Vara Cível (em ação movida pela Associação Nacional de Defesa da Cidadania e do Consumidor) e como esta decisão foi cassada pelo Tribunal de Justiça no dia 31 de dezembro, a nova liminar também teria seus efeitos suspensos, pelo efeito conhecido no meio jurídico como “conexão” entre processos.

A Telefônica esclarece que ainda as demais liminares concedidas na mesma 32ª Vara são individuais, valendo apenas para os autores das ações, conforme reforçado por despacho do Tribunal de Justiça, enviado à própria 32ª Vara Cível em 28 de janeiro último. Estas ações individuais estão sendo objeto de recurso por parte da Telefônica.

A Telefônica informa ainda que já tem mais de 7,6 mil sentenças favoráveis à manutenção da tarifa de assinatura básica — considerando ações individuais e coletivas, nos juizados especiais e na Justiça comum. Os julgamentos têm sido favoráveis à manutenção da assinatura básica na totalidade das ações coletivas e em quase todas as individuais.

A assinatura básica é fundamental para a prestação dos serviços de telefonia fixa e sua cobrança ocorre em praticamente todos os países do mundo (exceto Guatemala e Irã). No Brasil é defendida por pareceres de renomados juristas, entre eles Carlos Ari Sundfeld e Kazuo Watanabe. Na mesma direção há pareceres do economista Luciano Coutinho e da OAB-SP.

Telefônica

Assessoria de Imprensa

10/02/2005

Leia uma das liminares concedidas

CONCLUSÃO

Em 30 de dezembro de 2004, faça este autos conclusos ao MM(a) Juiz(a) de Direito, Dr(a) Maria Lúcia Ribeiro de Castro Pizzotti Mendes.

Eu,

Processo nº 000.04.074329-2

Procedimento Ordinário (em geral) – Controle 1138

Vistos.

Versa a presente Ação proposta contra Telecomunicações de São Paulo S/A, sobre alegação de cobrança indevida de tarifa mensal de assinatura relativa à linha telefônica, sob alegação de abusividade da cobrança, que se efetiva, independentemente da utilização do serviço, no período respectivo à cobrança efetivada.

A questão de fundo envolve a cobrança de taxa fixa, denominada como sendo o valor mensal da assinatura da linha utilizada pelo consumidor, cobrança esta que se entende como indevida, em razão da arrecadação dos valores de cada ligação, pela ré, na forma dos chamados “pulsos”, o que representaria duplicidade de exigência de pagamento. Por seu turno, a ré entende que a cobrança do valor decorrente da assinatura é legal, por advir da prestação de serviços efetivada por ela, na medida em que deixa à disposição do consumidor a chamada “placa de assinante” na central telefônica correspondente, de forma ininterrupta, para o uso por parte do consumidor.

Limitar-me-ei a apreciar a questão relativa à postulação de liminar, requerida em sede de antecipação de tutela, considerando que a este Juízo foi denominada à apreciação das questões urgentes da lide, por ter sido o primeiro a despachar em ações civis públicas de natureza semelhante, o que faço, pelas razões e fundamentos que a seguir delineio:

Inicialmente, é indiscutível a natureza consumerista da relação jurídica firmada entre o consumidor, enquanto beneficiário do serviço prestado pela ré, sendo esta, a empresa que recebe os valores decorrentes do serviço por ela praticado, na exata descrição do artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor. E, assim reconhecendo, apreciarei a questão trazida à colação nesta lide, com aplicação dos ditames do Código de Defesa do Consumidor. E nesta linha de raciocínio, destaco, de inicio, o principio da informação, protegido pela Lei Consumerista, do qual se depreende que, em uma relação de consumo estabelecida entre o beneficiário do serviço e o prestador deste, todas as informações necessárias á efetivação do serviço a ser prestado devem ser dadas pelo prestado de serviços, especialmente, no presente litígio, no que concerne aos valores despendidos pela prestadora de serviços com a manutenção externa e com a operação da rede, os quais justificariam a cobrança do valor da assinatura mensal.

Neste sentido, vale transcrever os artigos 4º inciso IV e 6º inciso III, ambos do Código de Defesa do Consumidor: que coadunam com a fundamentação que ora discorro.

A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus direitos econômicos, a melhoria de sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:


Inciso IV – educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo.

Ainda são direitos básicos do consumidor

Inciso III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.

Prosseguindo, determinei o reexame da postulação da liminar, após a juntada aos autos da contestação ofertada pela ré, para que pudesse analisar os argumentos deduzidos em face do contraditório estabelecido, entretanto, não logrou a requerida apresentar qualquer fundamento, de natureza fática ou jurídica, que tivesse o condão de afastar os alicerces do requerimento de apreciação da tutela pretendida, quais sejam o do perigo de irreversibilidade, em caso de não acolhimento da pretensão, e o da verossimilhança das razões deduzidas. Isto porque, além de vislumbrar a verossimilhança da pretensão, em razão do duplo pagamento efetuado, advindo da cobrança dos valores de assinatura e pulsos, por um único serviço prestado, vislumbro a dificuldade de reversão, em caso de não conceder o provimento jurisdicional pretendido, em vista do grande número de consumidores envolvidos, que arcam com o custo mensal da assinatura, e teriam extrema dificuldade em reaver os valores pagos, para ressarcimento individual a cada um, caso a liminar não venha a ser nesta fase processual concedida.

Outrossim, além de considerar presentes ao requisitos que autorizam a concessão da liminar postulada, destaco que, em primeira análise, há a aparência do direito dos consumidores, na medida em que a prestadora de serviços ré, cobra tanto pela ligação que é efetivamente realizada, como pela manutenção da linha telefônica em si; entretanto, apenas ter a linha, sob minha ótica não representa prestação de serviço, vez que para adquiri-la, em tempos passados, o consumidor pagara pela linha telefônica , enquanto produto, valores inclusive significativos e, “a posteriori”, o valor das taxas de instalação da mesma, quando o valor da linha perdera valoração no mercado; assim, o único fato gerador a ensejar a cobrança é, a meu ver, a realização da ligação por um doa consumidores, que ao fazê-la, impõe a prática do serviço pela ré, justificando, assim, a cobrança por cada ligação realizada e deixando, sem causa, a cobrança pela existência da assinatura em si, a qual, exclusivamente, não enseja a prestação de serviços pela ré. E sem prestação de serviços, não há que existir cobrança.

Um outro aspecto a ressaltar, é o argumento da ré de que, caso o valor decorrente da assinatura não seja cobrado, aquele a detém e apenas recebe ligações, se beneficiará de um serviço, sem por ele pagar. Ora, olvida-se a ré de observar que o serviço por ele prestado, é de natureza bilateral, ou seja, para que se pragmatize, é necessária a existência e o contato mútuo de dois consumidores, pois somente recebe ligações, se algum outro consumidor as fizer e, por óbvio, aquele que as está fazendo, já paga pelos pulsos dele decorrentes; por isso, não há serviço sem cobrança, como entende a ré, para aquele que “apenas” recebe a ligação, pois se a recebe, aquele que para ele telefonou, ou seja, o outro consumidor da relação bilateral estabelecida, já paga pela ligação realizada. Desta forma, também sob este prisma, há “bis in idem” na cobrança, quando a ré impõe o pagamento pela taxa de assinatura, somado às tarifas das ligações em si, denominadas pulsos.

Mais um fundamento que se faz necessário ter destaque, é o de que a tarifa, como valor cobrado do consumidor, não se enquadra no conceito de tributo, vez que, na forma descrita pela Constituição Federal e pelo Código Tributário Nacional, tributos são os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria. Desta forma, a tarifa, quando cobrada, por decorrência de imposição legal, não poderá desrespeitar o principio magno que veda a bitributação com base no mesmo fato gerador. Assim, se a tarifa é conseqüência de norma infra constitucional, não ofenderá os princípios basilares constitucionalmente estabelecidos, o que me faz concluir que, igualmente como no caso dos tributos, não poderá cobrar, duas vezes, pelo mesmo fato, qual seja, a realização de ligação telefônica.

Um outro argumento sustentado pela ré, quando da apresentação de sua contestação, versa sobre os lucros da empresa, que segundo a requerida, diminuirão sobremaneira, podendo, até, inviabiliza-la, caso seja concedida a liminar postulada, argumento este, de ordem financeira, que entendo não poder se sobrepor à fundamentação legal, ou seja, não pode ser considerada, em detrimento das disposições legais; mesmo porque, é certo que o lucro da empresa que detém a concessão do serviço público, como é o caso da ré, não pode prevalecer, a ponto de ensejar duplicidade de cobrança sobre o mesmo serviço prestado, sob pena de enriquecimento ilícito em favor da ré.


Ainda analisando mais uma das argumentações esposadas pela ré, acerca da imposição das normas pela Anatel, sua reguladora, ressalto que inexiste relação de consumo estabelecida entre o consumidor final, representado pela Associação autora, em a reguladora em questão; ademais, a relação de normatização e fiscalização que envolve a Anatel e a Telefônica é restrita às mesmas, não podendo impor normas ou coibir a pagamentos sobre fato gerador que tem como sujeito o consumidor. Por isso, descabe a sustentação de que, adstrito à Anatel, as cobranças por ela impostas são legitimas, devendo responder por elas o consumidor final. Portanto, tal argumento não tem o condão de fazer manter a cobrança que ora se questiona.

Derradeiramente, consagro, em reiteração ao já supra exposto, que o principio da informação, um dos alicerces da relação de consumo, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, não é respeitado, quando a prestadora de serviços não informa ao consumidor, integralmente, por quais serviços está pagando, quanto efetivamente custam os mesmos e, ainda, as cláusulas contratuais que impõe as cobranças, ou que lhe dão origem, já que não há mais contratos formalmente estabelecidos, nos termos previstos no CDC, firmados entre as partes, para fins de prestação de serviços de telefonia. Assim, o consumidor se limita a solicitar a linha e passa a pagar por ela, sem que tenha conhecimento e alcance, sobre o que paga, e quanto paga.

Ainda acerca do principio da informação, é certo que ainda que a ré alegue estar adstrita às normas elaboradas pela Anatel, as previsões dos artigos 46, 47 e 54 do Código de Defesa do Consumidor hão que prevalecer, no sentido de que se respeite a prévia e adequada informação do consumidor como sendo esta uma exigência legal, para que se possa proceder à inserção das obrigações do mesmo consumidor ao contrato de consumo. Isto quer dizer, que a obrigatoriedade da cobrança da assinatura, bem como seu respectivo valor, hão que se informados previamente ao consumidor, para que se possa dele exigi-la, o que implica em dizer que o consumidor deverá ter conhecimento de todas as cláusulas do contrato, inclusive as que imponham as exigências da reguladora do sistema de telefonia, sendo este um requisito indispensável para o equilíbrio das relações contratuais entre o fornecedor e o consumidor.

Entretanto, jamais houve tal informação, o que implica na inadequação e abusividade da cobrança da taxa de assinatura, o que ora se reconhece.

Desta forma, a requerida vem também desrespeitando o principio basilar do Código Consumerista, o que, mais uma vez, acaba por justificar a concessão da liminar pleiteada na inicial.

Assim, diante de todo o exposto, CONCEDO A LIMINAR postulada, para que a ré, em caráter geral, com relação a todos os consumidores usuários dos serviços telefônicos por ela prestados, se abstenha de proceder à cobrança relativa à assinatura da linha, limitando-se a cobrar pelos telefonemas realizados, computados pela cobrança de “pulsos”, até decisão final desta lide, sendo certo que esta liminar deverá ser cumprida em 48 horas, para fins de emissão das contas, as quais deverão ser elaboradas, para o próximo mês vincendo, qual seja, o mês de fevereiro, sem a inclusão da referida cobrança, o que fica determinado, sob pena de multa diária de R$ 10,00, assim considerada com relação a cada consumidor, até o efetivo cumprimento da liminar ora concedida, em forma de antecipação de tutela.

Cite-se a Requerida, pela via postal, após o recolhimento das custas referentes ao Provimento 833/04 pela Requerente, em 05 dias.

P.e Int.

São Paulo, 30 de dezembro de 2004.

Maria Lúcia Ribeiro de Castro Pizzotti Mendes

Juiz(a) de Direito Titular

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