Doença profissional

Estabilidade no emprego independe de licença do INSS

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11 de dezembro de 2005, 11h03

Trabalhador não precisa de licença do INSS para ter direito a estabilidade provisória no emprego, no caso de doença profissional. Com este entendimento, os juízes da 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo), condenaram a Sociedade Beneficiente Israelita Brasileira — Hospital Albert Einstein a indenizar uma ex-empregada, demitida depois que o INSS deixou de atestar sua doença.

Segundo os autos, a funcionária trabalhava como operadora de telemarketing. Por causa da função, teve “perda auditiva sensorial bilateral de 15,73%, irreversível e de cunho profissional”. Uma médica do próprio hospital, depois de examinar a empregada, sugeriu “a transferência de setor em função do desconforto”.

Como o INSS não afastou a operadora de telemarketing, por “falta de nexo” entre a doença e a atividade profissional, o hospital decidiu demití-la. Justificou a dispensa alegando “impossibilidade de permanência na função por problemas de audiometria e por inexistência de vaga de acordo com seu perfil e expectativas”.

Inconformada, a empregada ingressou com ação judicial na 30ª Vara do Trabalho de São Paulo. A primeira instância negou o pedido de reintegração e a trabalhadora recorreu ao TRT paulista. A juíza Inavi Contini Bramante, relatora, acolheu o pedido.

“É inequívoco que a obreira é portadora de doença profissional de origem ocupacional, inclusive de conhecimento da reclamada que, diante do fato, ao invés de readaptar ou transferir a reclamante para outro setor, preferiu demiti-la”, observou.

A decisão da 6ª Turma foi por maioria. Os juízes condenaram o hospital Albert Einstein ao pagamento de indenização correspondente a um ano de salários da operadora de telemarketing, incluindo 13º salário, férias e FGTS com multa de 40%. Cabe recurso.

RO 00140.2002.030.02.00-9

Leia a íntegra da decisão

PROCESSO TRT/SP N° 00140.2002.030.02.00-9

RECURSO ORDINÁRIO

RECORRENTE : gilvania ferreira de brito

RECORRIDO: sociedade beneficiente israelita brasileira – hospital albert einstein

ORIGEM: 30ª VARA DE TRABALHO da cidade DE sÃO PAULO

EMENTA

ESTABILIDADE ACIDENTÁRIA. ART. 118, DA LEI 8.213/91. DOENÇA DO TRABALHO.

Embora, em princípio, a percepção do auxílio-doença acidentário seja condição essencial à aquisição da estabilidade acidentária, não se pode tolher da reclamante esta garantia pois, ao contrário do “acidente-tipo”, a doença profissional e a doença do trabalho agravam-se progressivamente, em razão das atividades desenvolvidas pelo trabalhador, constituindo-se em causa lenta e progressiva para a incapacidade permanente ou temporária para o trabalho. Ainda mais, no caso, a disacusia neuro sensorial bilateral de 15,73% constitui lesão incapacitante de seqüela irreversível. Nos casos de doença profissional não há como se exigir o prévio afastamento por período superior a quinze dias e a percepção de auxílio-doença acidentário, como pressupostos à aquisição da estabilidade prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/91 pois, uma vez adquirida a doença profissional, ela se agrava lenta e gradualmente, em razão das atividades exercidas com reflexos na continuidade do contrato de trabalho, bem como após o seu término. Sendo assim, comprovada a existência de doença profissional e nexo de causalidade é inequívoco o direito à garantia de emprego prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/91.

RELATÓRIO

Da r. sentença de fls. 120/121, declarada à fl. 129, que julgou improcedente o pedido, a reclamante interpõe recurso ordinário, fls. 132/139, aduzindo que é portadora de doença profissional e por esta razão faz jus a reintegração ao emprego ou indenização do período estabilitário. Pretende, ainda, a reforma do julgado relativamente às horas extras, tendo em vista a não concessão de intervalo intrajornada e a inobservância da hora noturna reduzida. Juntou documentos às fls. 140/154.

Custas processuais, fls. 155.

Contra-razões da reclamada às fls. 159/173.

O Ministério Público do Trabalho, fl. 174, não ofertou parecer circunstanciado.

É o relatório.

V O T O

Conhecimento

Conheço, pois presentes os requisitos de admissibilidade.

Fundamentação

Da estabilidade provisória

Por primeiro, o fato de o Juízo de origem não ter deferido a prorrogação do prazo para juntada do laudo pericial realizado pelo perito na ação acidentária, não impõe cerceamento do direito de prova documental porque, como a própria recorrente reconhece, os documentos anexados com a petição inicial são suficientes para análise do pedido. O laudo pericial juntado com o Recurso Ordinário é prova superveniente, mas reforça o entendimento da questão discutida nos autos.

A recorrente almeja a reforma da decisão de origem, sob o fundamento de que é portadora de doença profissional e em razão disso faz jus à reintegração ao emprego ou, na impossibilidade, à indenização, tendo em vista a estabilidade provisória prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/91.

Razão assiste à reclamante.

É inconteste que a recorrente é portadora de doença profissional (“perda auditiva sensorial bilateral de 15,73%, irreversível e de cunho profissional” – fl. 97), atestada pelo perito médico nomeado pela 6ª Vara de acidentes do Trabalho de São Paulo e pelos documentos juntados com a inicial. Não há dúvida, também, que a reclamada, durante o pacto laboral, tomou conhecimento da doença da reclamante, tanto que em data de 13.10.1998 emitiu a Comunicação de Acidente do Trabalho (fl. 55), ocasião em que a reclamante permaneceu afastada dos serviços de 13.10.1998 a 09.11.1998 (fls. 85/86).

Constata-se do documento juntado à fl. 12, a emissão de parecer de profissional, médica do quadro da reclamada, a sugestão de “transferência de setor em função do desconforto que a paciente Sra. Gilvania F. de Brito relata com os fones”. Depreende-se, ainda, do conteúdo que “não foi realizado exame audiométrico na admissão para o setor”, presumindo-se que a reclamante adquiriu ou desencadeou a doença (perda de audição) no exercício da profissão, o que aliás, é muito comum na função de telefonista.

Verifica-se, ainda, do documento de fl. 13, a comunicação do coordenador central de atendimento, dirigido ao departamento de medicina ocupacional, informando o afastamento da reclamante da função de operadora de telemarketing (antiga função de telefonista) e o aguardo de transferência para outro departamento.

No entanto, não obstante o conhecimento do problema e a sugestão da profissional da área, a reclamada não providenciou a transferência da obreira para outro setor. Pelo contrário, mesmo após o retorno do afastamento, continuou prestando serviço na mesma função.

Saliente-se, ainda que a reclamante não tenha sido afastada do serviço pelo INSS durante o período do contrato de trabalho (pedido indeferido por falta de nexo – fls. 58/59), é inequívoco que a obreira é portadora de doença profissional (perda auditiva sensorial bilateral) de origem ocupacional, inclusive de conhecimento da reclamada que, diante do fato, ao invés de readaptar ou transferir a reclamante para outro setor, preferiu demiti-la sob a justificativa de “impossibilidade de permanência na função por problemas de audiometria e por inexistência de vaga de acordo com seu perfil e expectativas” (fl. 14).

Embora, em princípio, a percepção do auxílio-doença acidentário seja condição essencial à aquisição da estabilidade acidentária, não se pode tolher da reclamante esta garantia pois, ao contrário do “acidente-tipo”, a doença profissional e a doença do trabalho agravam-se progressivamente, em razão das atividades desenvolvidas pelo trabalhador, constituindo-se em causa lenta e progressiva para a incapacidade permanente ou temporária para o trabalho. Ainda mais, no caso, a disacusia neuro sensorial bilateral de 15,73% constitui lesão incapacitante de seqüela irreversível.

Nos casos de doença profissional não há como se exigir o prévio afastamento por período superior a quinze dias e a percepção de auxílio-doença acidentário, como pressupostos à aquisição da estabilidade prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/91 pois, uma vez adquirida a doença profissional, ela se agrava lenta e gradualmente, em razão das atividades exercidas com reflexos na continuidade do contrato de trabalho, bem como após o seu término.

Sendo assim, comprovada a existência de doença profissional e o nexo de causalidade é inequívoco o direito à garantia de emprego prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/91. Entretanto, tendo em vista a inviabilidade da reintegração pretendida, em razão do decurso de tempo, dou provimento ao recurso da reclamante, para condenar a reclamada ao pagamento da indenização postulada correspondente aos salários e demais consectários (13ºs salários, férias, FGTS + 40%, tudo na forma do pedido inicial) a contar da ilegal data da dispensa ocorrida em 02.02.2000 até 02.02.2001, cujos valores deverão ser apurados em liquidação de sentença.

Dou provimento

Horas extras

Do intervalo intrajornada

A recorrente afirmou, na inicial, que não gozou do intervalo intrajornada. Na defesa, a recorrida disse que havia gozo de quinze minutos, atraindo para si o ônus probatório, do qual se desincumbiu, conforme se depreende do depoimento da 1ª testemunha da reclamada (fl. 39). Ressalta-se que a reclamante, em depoimento, afirma que “tinha intervalo de apenas dez minutos, e no último ano trabalhado não teve intervalo”, contrariando a alegação feita na inicial. A testemunha da reclamante afirma que “durante o dia a reclamante usufruía intervalo em duas etapas, de dez e de cinco minutos cada…”. A prova oral produzida nos autos revela a inconsistência do pedido da reclamante.

Nego provimento

Da hora noturna

Razão assiste à recorrente. Conforme cartões pontos juntados às fls. 66/101, verifica-se que a reclamante ativou em horário noturno e a reclamada não considerou a hora reduzida, conforme preceitua o parágrafo 1º, do artigo 73, da CLT. Diante disso, reformo a decisão de origem para condenar a reclamada ao pagamento de horas extras e reflexos decorrentes da não redução da hora noturna, devendo ser apuradas pelos cartões pontos juntados aos autos. Com relação ao período de 1996 a 16/02/1997, deverá prevalecer o horário declinado pela reclamante, já que a reclamada não juntou os respectivos cartões pontos.

Dou provimento

Dispositivo

Em face do exposto, conheço do recurso ordinário, e, no mérito, dou provimento parcial, para alterar a decisão de origem, julgando procedente em parte o pedido, a fim de reconhecer a estabilidade provisória, prevista no artigo 118, da Lei 8.213/91, condenando a reclamada ao pagamento da indenização postulada correspondente aos salários e demais vantagens do período estabilitário (13ºs salários, férias + 1/3, FGTS + 40%) a contar da ilegal data da dispensa ocorrida em 02.02.2000 até 02.02.2001, e ainda, a pagar a reclamante o que se apurar em liquidação de sentença a título de horas extras e reflexos pela não observância da hora noturna reduzida, tudo nos termos da fundamentação. Rearbitro o valor da condenação em R$ 10.000,00, fixando as custas em R$ 200,00, pela reclamada, pagas parcialmente pela reclamante à fl. 155, a qual deverá ser ressarcida na forma preconizada na OJ 186 da SDI-I.

Ivani Contini Bramante

Juíza Relatora

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