Papo na redação

Sandro Vaia diz que são os fatos que não poupam Lula

Autor

4 de agosto de 2005, 22h09

Para o jornalista Sandro Vaia, diretor de redação do jornal O Estado de S. Paulo existem pecados no jornalismo que são imperdoáveis, como a imprecisão, a informação distorcida, a soberba e a arrogância. Entrevistado no Papo na Redação, uma entrevista coletiva online do site Comunique-se, nesta quinta-feira (4/8), Vaia disse também que a relação fonte x jornalista precisa ser acima de tudo honesta: “Um grande furo de reportagem jamais poderá ser obtido se o respeito à ética não for mantido”.

A questão do mensalão marcou presença na entrevista e o jornalista afirmou que a imprensa, de um modo geral, está cumprindo a contento a sua missão. “Está fazendo o que deve fazer. Aí não se trata de poupar ou não o presidente Lula.Se os fatos não o poupam,a culpa é dos fatos,e não da mídia”, afirmou.

A discussão sobre a cobertura da imprensa e sua relação com os acontecimentos passou também pelo caso da Escola Base:

“A imprensa foi leviana e irresponsável na apuração do caso e agora está pagando por isso. Em multas, determinadas por sentenças judiciais,e em credibilidade”.

Leia trechos do bate papo

Fernanda Cristina Pacini (Redator — SBN — Projetos em Comunicação — SP): Existe algum erro que você considera imperdoável no jornalismo?

Sandro Vaia: Boa tarde, Fernanda. Existem várias coisas que considero imperdoáveis no jornalismo. Algumas delas: a imprecisão,a informação distorcida,a soberba, a arrogância.

Marcilênio Arruda (Freelancer — Freelancers): Boa tarde Sandro. Como o Estadão impresso se relaciona com o on-line? É a mesma redação?

Sandro Vaia: Boa tarde, Marcilênio. Não é a mesma redação. Embora a redação online funcione no mesmo espaço físico e sob a mesma orientação editorial, o grupo de profissionais é outro. Mas isso está sendo repensado.

Thá Carolina Yadnak (Estudante): Sandro, como experiente jornalista, qual a maior dificuldade para os récem-formados ao serem contratos na redação do Estadão?

Sandro Vaia: As dificuldades são as de sempre: a oportunidade do aparecimento de vagas, o processo de seleção que eu não considero suficientemente adequado, e às vezes, infelizmente, a falta de talento.

Thá Carolina Yadnak (Estudante): Sandro, como você vê a relação fonte x jornalista? Até onde pode ir a falta de ética para uma boa matéria ou um grande furo de reportagem?

Sandro Vaia: A relação fonte x jornalista precisa ser acima de tudo honesta,como em tudo nas relações humanas. Um grande furo de reportagem jamais poderá ser obtido se o respeito à ética não for mantido. Portanto, a segunda parte da tua pergunta está prejudicada.

Lindoberto Pereira da Silva (Assessor de Imprensa — Lanterna Mágica Multimídia — GO): Como o senhor vê a cobertura que os jornais, e a mídia em geral, está fazendo em relação ao escândalo do Mensalão? Pelo que temos visto, apenas a Revista Carta Capital tem poupado o presidente Lula.

Sandro Vaia: Embora exista um certo tumulto na ordenação dos dados,muito compreensível diante do acúmulo de informações que o caso vem produzindo no dia-a-dia, de um modo geral a imprensa está cumprindo a contento a sua missão.Está fazendo o que deve fazer. Aí não se trata de poupar ou não o presidente Lula. Se os fatos não o poupam,a culpa é dos fatos,e não da mídia.

Márcio Flizikowski (Professor — UFPR): O senhor afirmou que a imprensa está cumprindo a contento seu papel na investigação do caso do mensalão. Como o senhor vê os casos de informações desencontradas como o caso da lista dos freqüentadores do prédio do Banco Rural, que depois se mostrou bastante equivocada e plantada por um integrante da oposição, e principalmente o sensacionalismo das capas das revistas semanais?

Sandro Vaia: Acho que é inevitável que num ambiente conturbado como esse existam informações desencontradas. Ainda mais quando há uma diversidade de fontes tão grande (todos os integrantes da CPI, ministério público, polícia federal etc). O que a mídia tem a obrigação de fazer é a de processar as informações que recebe com extremo cuidado, um extremo rigor, uma extrema preocupação com a credibilidade, a integridade e a boa fé das fontes. As revistas semanais, no meu entendimento, não fogem á regra geral da mídia.

Marcelle Altoé Duarte (Estudante): Ei Sandro, tudo bem? Bom, a neutralidade e a objetividade são dois ideais que o jornalista sempre está em busca. Você acredita que é possível ser completamente objetivo e neutro em uma matéria jornalística?

Sandro Vaia: Tudo bem, Marcelle, e você ? Como neutralidade e objetividade são, intrinsecamente, atributos que contém em si um certo grau de subjetividade, não sei se será possível conseguir sempre objetividade e neutralidade em matérias jornalísticas. Mas é preciso perseguir isso como o centroavante persegue o gol. Sem esse objetivo, é impossível ser jornalista.

Thá Carolina Yadnak (Estudante): Fala-se muito na dívida que os jornais possuíram após o fim da paridade Real X Dólar. Isso significa “enxugar” redações e demitir ou pouco contratar jornalistas atualmente?

Sandro Vaia: Não foi só o fim da paridade dólar x real que provocou o aumento das dívidas. Mas não é o caso de discutir a origem das dívidas, mas sim de discutir como chegar ao equilíbrio econômico que viabilize as empresas, que permita a saúde financeira indispensável á manutenção de sua independência. Enfim: adequar o tamanho das empresas àquilo que o mercado comporta.

André Victor Sartorelli (Estudante): Boa Tarde Sandro. Há alguns meses “O Estado de S. Paulo” passou por mudanças. O jornal ficou com “cara nova”. Como essas mudanças têm repercutido junto ao público? A aceitação e satisfação ficaram maiores?

Sandro Vaia: Boa tarde, André. A repercussão das mudanças foi ótima. Até mesmo em setores mais conservadores, que acreditávamos mais resistentes às mudanças, concordam que o jornal ganhou legibilidade sem perder densidade, seriedade e credibilidade.

Ivan Ruela (Estudante): Sandro, o Estadão, em edital, declarou apoio a Serra na campanha presidencial. Já tem alguma posição em relação a um impeachment de Lula?

Sandro Vaia: Você deve querer dizer editorial, certo? O jornal já manifestou a sua posição contra o impeachment por não considerar que seja o caso. Pelo menos até agora.

Márcio Flizikowski (Professor — UFPR): Caro Sandro, podemos dizer que hoje o jornalismo impresso diário está passando por uma crise: queda das vendas e assinaturas, diminuição das verbas publicitárias e também menor interesse do público. Qual o caminho para que os jornais diários consigam sobreviver a este momento e, melhor, transformá-lo em um horizonte de novas oportunidades?

Sandro Vaia: Não há dúvida, caro professor Márcio, de que o jornalismo impresso está numa fase de transição. A natureza da indústria da informação está sofrendo profundas transformações, por causa das inovações tecnológicas, por causa das mudanças comportamentais da sociedade etc. Mas o fato que persiste é o seguinte: as empresas que processam e vendem informação continuarão à frente desse processo. Porque essa é a sua expertise. O que pode mudar é a forma de distribuir essa informação. A informação Estadão terá sempre a marca Estadão, independentemente da forma de distribuição. O jornal impresso sofrerá mudanças, será mais reflexivo, mais analítico, menos dedicado às hard news. Mas sobreviverá ainda por muito tempo, encontrando formas de convivência com sua versão eletrônica online.

Márcio Chaer (Diretor — Redação — Consultor Jurídico — SP): Sandro, Salve! Voltando ao assunto dos escândalos. Vereadores, prefeitos e até governadores, quando se descobre que suas campanhas tiveram “reforço” de dinheiro não declarado, têm suas diplomações causadas. É claro que não interessa a ninguém um solavanco desse tamanho, mas você crê que seja possível ficar tapando o sol com a peneira por muito tempo (ou seja, ignorando o que já dá pra perceber o que ocorreu)?

Sandro Vaia: Olá, Márcio, tudo bem ? Olha, o problema do financiamento de campanhas eleitorais é um problema mundial. Lembra do Bettino Craxi, na Itália? Do Helmuth Kohl, na Alemanha? Do Giscard, na França? Alguma solução tem que ser encontrada para isso. Fingir que o dinheiro vem do céu é impossível. Um desafio para os legisladores.

Danielle Arouche (Assessor de Imprensa — Câmara dos Deputados — DF): Você acredita que a mídia tem feito seu papel nessa crise política ou a onda de denuncismo tomou conta dos veículos? Ainda não há provas, portanto nada fatídico…

Sandro Vaia: Em algums casos, há provas. Em outros, há indícios. Em outros, há pistas. A onda de denuncismo não nasceu da imprensa.

Márcio Flizikowski (Professor — UFPR): Sandro, em uma resposta anterior você afirma que a onda de denuncismo não nasceu na imprensa. Pareceu que isso isenta a mídia da responsabilidade. Mas você não acha que, mesmo que não tenha nascido na imprensa, a grande mídia é responsável por embalar o berço da onda de denuncismo? Como agir em casos como da Escola Base, em que a imprensa faz uma denúncia, destrói pessoas e fica por isso?

Sandro Vaia: Se o establishment político produz escândalos,o que deve fazer a imprensa? Escondê-los? Noticiar é embalar o berço da onda de denuncismo? Não confunda com o caso da Escola Base. Esse é outro caso. A imprensa foi leviana e irresponsável na apuração do caso e agora está pagando por isso. Em multas, determinadas por sentenças judiciais, e em credibilidade.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!