Prerrogativas em jogo

Ao combater o crime, MP atropela direitos de advogados

Autor

25 de abril de 2005, 17h11

A queda-de-braço entre advogados, estribados em suas prerrogativas, e o trio formado por Ministério Público, Polícia e Judiciário ganhou novos capítulos nas últimas semanas, graças a dois episódios: a Operação Tango e o julgamento do pedido de investigação do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, pelo Supremo Tribunal Federal.

Dois grandes escritórios de advocacia se viram envolvidos nos casos. O Levy & Salomão Advogados, na Operação Tango, e o Demarest e Almeida — uma das maiores bancas da América Latina — no inquérito contra Meirelles. Há notícias, ainda, de outros escritórios com policiais às suas portas, por representarem clientes que são alvo de grandes investigações.

No inquérito contra o presidente do Banco Central, cinco advogados do Demarest e Almeida são citados nominalmente no inquérito encaminhado ao STF pelo procurador-geral da República, Claudio Fonteles. O Ministério Público Federal pede que o presidente do Banco Central seja investigado por crimes eleitorais, contra o sistema financeiro e de lavagem de dinheiro (leia abaixo a íntegra do inquérito).

O relatório, feito pelo procurador Lauro Pinto Cardoso Neto, afirma que o presidente do BC usou artifícios para esconder que é proprietário de empresas offshore, “contando com os advogados do escritório de advocacia paulista Demarest & Almeida”.

De acordo com o relatório, Meirelles fez uma “engenharia organizacional”, com diversas alterações contratuais de empresas “para que permanecesse no controle, mas de forma oculta nas operações por elas realizadas”. Cardoso Neto afirma que “isso favorece a lavagem de dinheiro e dificulta o cruzamento de dados pela Receita Federal, na fiscalização de rotina, bem como facilita a utilização de recursos não declarados em campanha eleitoral”.

O pedido de investigação relata que diversas operações foram feitas com a Empresa Silvania Empreendimentos, controlada pelas offshores americanas Silvania One e Silvania Two. As offshores, por sua vez, teriam como única sócia a estrangeira The Henrique Campos Meirelles Revocable Trust. Nenhuma delas, segundo o procurador, declaradas ao Fisco ou à Justiça Eleitoral.

Segundo o MP, na 14ª alteração contratual da Silvania Empreendimentos, feita em 2001, — segundo o procurador, para esconder o verdadeiro dono da empresa — os advogados do Demarest passam a fazer parte da empresa. “Essa foi a fórmula com a qual os cinco conhecidos advogados de São Paulo passaram à qualidade de ‘quotistas’ da Silvania Empreendimentos”, registra Cardoso Neto.

Para o advogado Roberto Pasqualin, sócio do Demarest, a inclusão do nome dos advogados no relatório da Procuradoria é “claramente” uma tentativa de intimidar os profissionais. “Eles são advogados dos clientes, procuradores. Não são sócios de seus clientes. Não há nada de ilegal na atuação do escritório em representar as empresas citadas”, diz Pasqualin.

Ele aponta a Lei de Sociedades Anônimas para mostrar a legalidade dos atos do escritório, artigo 126, parágrafo 1º, que determina que o acionista pode ser representado por outro acionista, por administrador de sociedade ou por advogado. “A profissão dos advogados é representar de defender os interesses de seus clientes”, afirma.

Os advogados também são citados como representantes das empresas offshores Silvania One e Silvania Two, “como se isso fosse algo suspeito”. Pasqualin afirma que não há nada de ilegal ou estranho nisso. “A própria Lei das S.A., em seu artigo 19, obriga os acionistas residentes no exterior a terem um procurador no Brasil. O escritório representa inúmeras empresas no exterior com investimentos no Brasil. Faz parte da prestação de serviços jurídicos”, diz.

Roberto Pasqualin atribui a atenção dada aos advogados de Meirelles, no relatório, a uma irresponsabilidade generalizada — o “denuncismo irresponsável”, como define. “É inadimissível que advogados sejam acusados de criar ‘engenharia societária’ para seu cliente, como se isso fosse algo suspeito ou criminoso, quando os procuradores que acusam deveriam saber que estruturas societárias como a de Meirelles são prática comum e generalizada, nada havendo de irregular nisso e na atuação dos advogados”, insiste Pasqualin. “Os advogados são suspeitos porque advogam para o acusado, como se advogar no interesse dos clientes fosse criminoso”, completa.

Para o advogado, o “denuncismo irresponsável” faz com que os papéis se invertam: o acusado tem de provar inocência e não o acusador a culpa do acusado. “A presunção de inocência é letra morta. Depois de acusado irresponsavelmente, você é que tem que se virar para provar que não é doleiro ou bandido”, desabafa.

Ele ainda afirma que a advocacia está acima do denuncismo e do vazamento irresponsável para a imprensa de suspeitas nem de perto comprovadas. “A insinuação de cumplicidade com o cliente não intimida o advogado. Apenas mostra prepotência e a falta de melhores argumentos de quem acusa. O advogado defende o cliente, sim, e assim cumpre seu dever profissional maior”, insiste Pasqualin.


O procurador Lauro Pinto Cardoso Neto foi procurado pela revista Consultor Jurídico, mas não quis comentar o assunto. Na Procuradoria-Geral da República, a assessoria de imprensa informou que ninguém fala sobre o inquérito contra o presidente do Banco Central.

Busca e apreensão

Na Operação Tango, que investiga uma quadrilha suspeita de vender falsos créditos tributários para empresas devedoras do Fisco, a Polícia Federal cumpriu um mandado de busca e apreensão no escritório Levy & Salomão, em São Paulo. Levou consigo documentos de um dos clientes da banca.

Por mais de uma vez, a seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil classificou essas buscas de absurdas. Para o presidente da Comissão de Prerrogativas da OAB-SP, Mário de Oliveira Filho, a situação está incontrolável. “É uma anomalia, um absurdo, não se poderia nem cogitar a idéia de apreender documentos de clientes”, afirma.

Segundo ele, a apreensão de documentos de clientes fere uma das mais importantes prerrogativas da profissão: a do sigilo profissional. Oliveira Filho afirma que “se o advogado não está envolvido no crime, não há que se falar em busca e apreensão em escritórios”. A OAB-SP prepara uma reação contra o que chama de banalização das prerrogativas e promete fazer barulho em breve.

“Quando o cliente entrega seus documentos ao advogado tem de haver sigilo profissional, em nome da liberdade de defesa. A partir do momento em que isso não é mais respeitado, acabamos com o Estado de Direito”, opina o advogado. Ele relata, ainda, que muitas ordens da Justiça carecem de fundamentação: “não é incomum mandados que determinam a apreensão de ‘documentos referentes ao inquérito tal… Ora, o mandado de segurança tem de ter objeto certo e determinado”, afirma.

Oliveira Filho diz que a única hipótese de busca e apreensão em escritórios é quando a ordem é contra um advogado, jamais contra seus clientes. E, ainda assim, segundo o Estatuto da Ordem, a diligência deveria ser acompanhada por um representante da OAB. “O problema é que há 10 anos o Supremo adia o julgamento de uma liminar que derrubou a exigência de a busca ser acompanha por um advogado. Em qualquer país civilizado isso seria inadimissível”, contesta.

O presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D´Urso, classifica a busca e apreensão de documentos de clientes como uma “violência inaceitável”. Segundo ele, está sendo banalizada uma ordem judicial que deveria ser medida excepcional “para buscar um objeto definido dentro de um espaço onde o poder público não tem acesso”.

D´Urso explica que a lei protege arquivos de escritórios de advocacia e que as buscas precisam de justa causa: “só existe justa causa quando a ordem judicial é contra um advogado, nunca contra seu cliente”, diz. Para tentar cessar as “reiteradas violações”, a seccional paulista elaborou o projeto de lei que torna crime violar direitos dos advogados. “A idéia é aprovar uma lei que dê um basta em tais desrespeitos, que vão desde impedir o advogado de ter acesso aos autos de um processo, até a violação de seus arquivos de maneira ilegal”.

Leia a íntegra do Inquérito contra Meirelles

PGR. Nº 1.00.000. 008102/2004-50

INTERESSADO: PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO DISTRITO FEDERAL

ASSUNTO: OF/N° 364/04-PR/DF- REPRESENTAÇÃO

INQ 2.206-3

EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL:

1. Tenho por relevantes as considerações estabelecidas a fls. 137/166 da lavra do Procurador da República, Dr. Lauro Pinto Cardoso Neto, pelo que encaminho a Vossa Excelência os autos do P.A. n° 8102/2004-50 a que sejam autuados como Inquérito originário a receber Relatoria.

2. Ao Relator do feito, desde já o Procurador-Geral da República requer sejam cumpridas as seguintes diligências, decorrentes do quadro apresentado a fls. 137/166, verbis:

a) requisição à Receita Federal dos dossiês integrados (pesquisa completa) da CPF 274.272,838-91 e CNPJs 51.943.926/0001-51, 05.596.454/0001-90 e 05.596.461/0001-92 e cópia de todas as declarações de impostos de renda desde o ano exercício de 1996;

b) requisição à Receita Federal do relatério circunstanciado da auditoria fiscal até então promovida contra o representado e empresas por ele controladas, e cópia de todos os documentos solicitados pelos auditores fiscais ou apresentados pelo Sr. Henrique Meirelles;

c) requisição ao Banco Central do Brasil de cópia do Processo 9900943883, que cuida do exame de remessas efetuadas pela empresa Saston Comercial Participações Ltda. por meio do Bank Boston, no valor aproximado de R$ 1,37 bilhão de origem não identificada;

d) requisição ao Banco Central da Brasil de cópia do processo nº 0101074058 tendo como envolvidas as empresas off shore Silvânia One e Silvâna Two, bem como a empresa Silvânia Empreendimentos e participações;


e) requisição ao Banco Central do Brasil de informações detalhadas sobre todos os contrratos de câmbio, desde 1996, envolvendo o Sr. HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES, as empresas SILVÂNIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA., SILVÂNIA HOLDINGS LTDA., GOIÂNIA LTD., SILK CQTTON INVESTIMENTES LTD, YAMETTO CORPORATION LTD., SILVANIA ONE LLC e SILVÂNIA TWO LLC BOSTON ADMINISTRAÇÃO COMERCIAL E FMPREEDÍMENTQS LTDA. E BOSTON COMERCIAL E PARTICIPAÇÕES LTDA.;

f) requisição à OAB/SP do registro e relação dos advogados do escritório Demarest e Almeida (Almeida, Rotenberg e Boscoli – Advocacia).

g) ao Primeiro Conselho de Contribuinte, cópia integral do Processo n° 16327.002231/2002-85, referente à empresa Boston Comercial e Participações Ltda., autuada pela Delegacia da Receita Federal no Paraná pelo não recolhimento de imposto de renda;

h) à Delegacia da Receita Federal em São Paulo, cópia integral de todos os processos administrativos referentes às declarações de Compensação – DECOMP – da empresa Boston Comercial e Participações Ltda., nos últimos cinco (5) anos.

3. Indica-se prazo de 60 (sessenta) dias à realização destas diligências.

Brasília, 04 de abril 2005.

CLAUDIO FONTELES

PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

Ref.: PA nº 1.00.000008102/2004-50

Vieram os autos em 29/11/2004, para manifestação acerca dos documentos de fls. 65/125, apresentados pelo Sr. Henrique de Campos Meirelles em face da representação criminal anteriormente formulada às fls. 01/56.

A representação criminal visa à abertura de inquérito para apuração da cometimento, em tese, dos crimes tipificados nos arts. 350 da código Eleitoral e no art. 22 da Lei n° 7.492/86, além de outros crimes que surgirem no curso da apuração dos fatos, como o crime de lavagem de dinheiro previsto no art. 1°, VI e VII, e §§, da Lei n° 9.613/98.

Quanto ao crime previsto no art. 350 da Código Eleitoral, argumenta o representado o seguinte:

a) o tipo penal do art. 350 exige o dolo específico previsto no art. 299 na esfera eleitoral;

b) a declaração de bens ao TRE não produziu efeitos jurídicos e eventual dano ocorreria em detrimento do declarante;

c) a falsidade não atinge documento sujeito à verificação;

d) não houve dolo genérico ou específico;

e) atipicidade da conduta por não constituir a declaração de bens um documento de prova;

Relativamente ao crime tipificado no art. 22 da Lei n° 7.492/86, afirma que:

a) nenhum fato mencionado enquadra-se na tipificação de remessa ou manutenção ilegal de moeda no exterior;

b) que o depósito realizado em conta de doleiro nos Estados Unidos fugiu ao seu controle, pois depositou em conta indicada por seu credor;

c) não houve declaração da existência da conta de onde foi feito o depósito ao doleiro porque ela foi encerrada ao final do exercício fiscal de 2002;

d) não incide imposto de renda sobre a conversão da moeda estrangeira em nacional quando se trata de mera transferência patrimonial dos Estados Unidos para o Brasil,

e) a Medida Provisória nº 2.158 desobriga o recolhimento de imposto de renda pelo residente no Brasil que os tenha adquirido quando residente fora do país, antes de seu retorno ao Brasil.

I. DO CRIME TIPIFICADO NO ART. 350 DO CÓDIGO ELEITORAL

I.1. O especial fim de agir do art. 350 do Código Eleitoral é diferente do dolo específico do art. 299 do Código Penal. Considerações sobre o elemento subjetivo do tipo penal (o dolo).

O art. 350 do Código Eleitoral encontra-se assim redigido:

Art. 350. Omitir, em documento públíco ou particular, declaração que dele devia constar ou nele inserir ou fazer inserir- declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais.”

Já o art. 299 do Código Penal possui a seguinte redação:

“Art. 299. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.

O termo “para fins eleitorais” não se confunde com “com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”.

Para a ocorrência do crime, conforme disposição do art, 14, inciso I, do Código Penal, basta a ocorrência de todos os elementos de sua definição legal. Assim, não se pode acrescer ao tipo penal elemento inexistente.

Se a vontade legislativa fosse considerar a parte final do art. 299 do Código Penal, para a proteção da fé pública eleitoral, a redação do art. 350 deveria repetir todo o enunciado do art. 299 da Código penal, acrescentando a termo “para fins eleitorais”.


Definitivamente, a expressão “com a fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante” não integra o tipo penal do art. 350 do Código Eleitoral.

Os tipos penais são apenas semelhantes, pois cuidam da falsidade ideológica, mas não se confundem para a produção do resultado.

Muito embora seja desnecessário tecer considerações sobre a dogmática do Direito Penal ao ilustre Procurador-Geral da República, professor universitário da cadeira e examinador de diversos concursos para o cargo de Procurador da República, permita-me discorrer sobre o objeto da representação.

O tipo penal possui a face objetiva e a face subjetiva, denominados de tipo objetivo e tipo subjetivo.

O tipo objetivo é composto do núcleo (verbo – ação ou omissão) e de elementos secundários e complementares (sujeitos ativo e passivo, objeto da ação, bem jurídico, nexo causal, resultado, circunstâncias de tempo, lugar, meio, modo de execução etc.) É a própria exteriorização da vontade. Alguns autores subdividem os tipo objetivo em elementos descritivos e elementos normativos, estes necessitando de juízo de valor.

O tipo subjetivo, consistente em “circunstâncias que pertencem ao campo psíquico-espiritual e ao mundo de representação do autor”(1) é formado pelo dolo, consistente na consciência atual da realização dos elementos objetivos do tipo e na vontade da realização desses elementos objetivos.

O dolo dever ser entendido como dolo de tipo ou dolo natural, despojado da consciência da ilucitude (pois é elemento da culpabilidade). Basta a vontade de ação orientada à realização do tipo de um delito (2). Adotou o Código Penal predominantemente a teoria fìnalistíca, constituindo crime o fato tipica e ilícito.

O tipo objetivo consiste justamente no fato do Sr. Henrique Meirelles omitir a declaração de bens que possuia perante a Justiça Eleitoral, quando do seu registro eleitoral. Os elementos exteriores do crime estão mais do que comprovados e confessados pelo representado. A existência do dolo, despojado da consciência da ilicitude (elemento da culpabilidade) também já restou cabalmente provado, já que o próprio representada reconhece não ter declarado todos os seus bens, fato relevante em uma “declaração de bens junto à Justiça Eleitoral”.

A expressão “para fins eleitorais” assemelha-se, sob o ponto de vista da dogmática penal e tão-somente para estudo, à expressão “para fins libidinosos” prevista no art. 219 do Código Penal, que corresponde ao especial fim de agir ou “dolo específico” (escola tradicional), sem qualquer pretensão expressa de “prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”.

O especial fim de agir ou dolo específico do art. 3.50 do Código Eleitoral não é o mesmo do art. 299 do Código Penal.

I.2. Desnecessidade de comprovação de dano material

O fato da declaração falsa de bens apresentada ao Tribunal Regional Eleitoral não ter produzído efeitos jurídicos, como argumenta o representado, não exclui a tipicidade ou ilicitude do crime do art. 350 do Código Eleitoral, que é formal e independe de resultado material. Configura-se crime, ainda que não resulte efetivo prejuízo ou lucro (TJSP, RT 543/321).

Neste sentido, o seguinte precedente do Supremo Tribunal Federal, verbis:

“Falsidade ideológica. Para que se configure esse crime não e mister a ocorrência de dano efetivo; basta que se verifique a potencialidade de um evento danoso.

Recurso extraordinário conhecido e provido.

(STF, RE nº 93.292/RJ, Rel. Ministro Moreira Alves, Segunda Tur.ma, DJ de 05/06/81, página 15,397)”.

Por outro lado, o argumento de que eventual prejuízo pela falsidade ideológica seria suportado pelo representado não diz respeito a configuração do crime, pois o bem jurídico protegido pela norma é a fé pública eleitoral e não o direito do representado.

I.3. Verificação da declaração de bens e sua natureza, probatória.

O representado defende que não teria ocorrido o crime de falsidade ideológica eleitoral porque sua declaração de bens estaria sujeita à verificação.

Esse argumento somente seria válido se a apresentação da declaração falsa tiver o objetivo de produzir efeito jurídico de força probante, o que não é o caso na hipótese presente.

Não quer a art. 94, § 1º, inciso VI, da Lei nº 4.737/65 e art. 11, §1º, inciso IV, da Lei nº 9.504/97 que o candidato faça prova da propriedade de seus bens, mas apenas que forme a instrução de seu registro com sua própria declaração, que traduz uma presunção juris tantum de ser verdadeira. Daí porque a existência do art. 350 da Lei nº 4.737/65 (Código Eleitoral), no sentido de garantir, como norma de prevenção geral, a fé pública eleitoral.


O representado alega que estando a declaração sujeita à verificação, não haverá o crime tipificado no art. 350 do Código Eleitoral. Todavia, essa verificação deverá estar prevista em lei, como ocorre com a verificação do domicílio eleitoral prevista no art. 42, parágrafo único, do Código Eleitoral c/c art. 65, §§ 3° e 40 da Resolução n°21.538/2003 do Tribunal Superior Eleitoral. Diferentemente, quanto à declaração de bens, não há dispositivo legal eleitoral que determine a verificação destes bens declarados pelo candidato por ocasião de seu registra eleitoral. Daí porque insubsistente a defesa do representado.

I.4. BENS NÃO DECLARADOS AO TRE

Apesar de haver alguns erros materiais apontados pelo representado, eles são insignificante perante a totalidade de bens não declarados ao Tribunal Regional Eleitoral e constante em tabela às fls. 10/13.

I.5. PRECEDENTE JURISPRUDENCIAL

No mesmo sentido da representação ora formulada já decidiu o Tribunal Regional Eleitoral do Estado de São Paulo, verbis:

“CRIME ELEITORAL – ARTIGO 350 – HIPÓTESE EM QUE A DECLARAÇÃO DE RENDA APRESENTADA A JUSTIÇA ELEITORAL CONTEM BENS CUJA TITULARIDADE NÃO RESTOU DEMONSTRADA DE MODO ADEQUADO. PRESENÇA DE IDICIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE QUE JUSTIFICAM O RECEBIMENTO DA DENUNCIA”

(TRE/SP, Acórdão 143.697 Itapeva/SP, DOE 29/08/2002)

II CRIME TIPIFICADO NO ART. 22 DA LEI N° 7.492/86 E NO ART. 10, VI E VII, E. §§, DA LEI N° 9.613/98.

II.1. TIPICIDADE

Os argumentos do representado não se sustentam com a simples leitura da representação.

A tipicidade do art. 22 da Lei n° 7.492/86, na que toca a manutenção de recursos depositados no exterior e não declarados à repartição federal competente, neste momento processual de instauração de inquérito, deve ser analisada com o objetivo tão-somente de examinar a existência de indícios suficientes para o inicio da investigação criminal. Não se quer neste exame sumário a antetipação da condenação do representado. Existem fatos que ainda não foram suficientemente esclarecidos, como veremos adiante.

II.2. OPERAÇÕES SUSPEITAS COM OFFSHORE BISCAY TRAINDIG LIMITED.

É incontroverso o fato de que o Sr. Meirelles realizou operações bancárías com a offshore Biscay Trainding, constituída de um grupo de doleiros de São Paulo investigados por lavagem de dinheiro.

Sobre este aspecto, o Sr. Henrique Meirelles afirmou, à fl. 76, a seguinte:

“Igualmente, neste caso não há nada inconfessável, obscuro e ilegal. No ano de 2002, a representado realizou vários gastos nos EUA, em decorrência da sua atividade na época, inclusive a reforma do apartamento que possuía em Nova York, Fez portanto grande quantidade da pagamentos nos EUA. A quantia apontada pelos Procuradores como depositada em conta de daleiros nos EUA terá sido um dentre os muitos pagamentos que o representado realízou em 2002, nos EUA.

Quanto ao deposito ter sido feito em conta suspeita, alegadamente de doleiro, nada pode esclarecer o representado. Feito a pagamento ao seu credor na conta por este indicada, o trânsito posterior do depósito foge por completo ao seu controle. Aliás, como pessoa fisica operando conta bancária nos EUA, o representado sequer teria como estabelecera qualidade do titular da conta bancário das EUA, se doleiro ou não. O depósito foi realizado em conta que aparentava inteira regularidade, na época, e em banco em atividade normal nos EUA. Não cabia ao representado, nem poderia fazê-lo, auditar o banco ou a conta bacaria a ele indicada, nem cabia ou poderia perquirir de sua eventual vinculação com doleiros brasileiros ou com quem quer que fosse.”

O pagamento foi feito por depósito em conta indicada pelo credor ao representado, em operação bancaria normal e corriqueira na vida de todo mundo, nos EUA ou mesmo aqui.”

O fato é que o Sr, Henrique Meirelles operou com doleiros por meio da offshore Biscay Trading Limited e disse que “nada pode esclarecer”. Poderia trazer aos autos o nome do credor ou cópia do recibo da quitação da obrigação, mas não o fez.

O representado não trouxe aos autos o nome desse credor que indicou tal conta ou qualquer outro recibo pelas despesas efetuadas no valor de U$ 50.677,12 indicados na representação. Não é corriqueiro um cidadão efetuar depósitos bancários em contas por ele desconhecidas. Trata-se de operação suspeita que merece aprofundamento da investígação.

O setor de Pesquisa, Análise e Informações – SPAI – desta Procuradoria da República elaborou o Relatório de Informação n° 010/05 (documento anexo), juntando documentos, no qual aponta no Caso Banestado 3 (três) operações financeiras internacionais realizadas em nome do representado, dentre as quais a operação com uma offshore.


Consta do relatório de informação, verbis:

“Realizamos um rastreamento nas bases de dados do conhecido Caso Banestado e encontramos 03 (três) operações financeiras internacionais, realizadas em nome do Sr. Henrique de Campos Meirelles, sendo uma envolvendo a empresa offshore Biscay Trading Limited do MTB BANK N.Y., pertencente a doleiros investigados na CPMI do Banestado, e a outras duas registradas em contas CC5.

A operação interceptada nos registros bancários do MTB Bank N.Y, é uma ordem bancária internacional, realizada em 18/10/2002, na valor de US$50.677,12, sendo de um lado, como remetente, o Sr, Henrique de Campos Meirelles, a débito de sua conta corrente n° 4029218701, mantida em Nova Iorque/EUA, e de outro, como beneficiária, a conta n° 030102375, titulada pela offshore Biscay Trading Limited, no Mtb ,Bank N,Y, representada no Brasil pelos doleiros VICTOR MANUEL DA SILVA E SOUSA, LUIZ FILIPE MALHÃO E SOUSA, e JOSÉ MENDES POVOAÇÃO, cf. doc. anexo, intitulado “Transferências Internacionais em U$$ – Dólares”.

O mais grave é que a Biscay Trading Limited movimentou recursos no exterior na ordem de US$ 100,0 milhões de dólares, no período de 30/mar/2001 a 27/ago/2003, o que pode implicar, em tese, em crimes contra ordem tributária, evasão de divisas, formação de quadrilhas e outros.” (grifo do MPF)

O próprio Sr. Henrique de Campos Meirelles possuía ou possui um conta CCS, no Brasil, sob nº 00602546041, mantida no BankBoston.

Por essa conta, identificamos apenas que o Sr. Henrique Meirelles realizou, em 24/08/2000, uma remessa de recursos ao exterior, no valor de R$ 364.000,00, por meio do BankBoston, a título de disponibilidade no exterior (cód. 63009). E, em 18/09/2000, recebeu do exterior a quantia de R$ 329.479,48, a título de Mov. No País em Contas de Domiciliados no Exterior (Cód. 62102)”.

O representado afirma que a conta de onde foi feito o depósito à offshore não foi declarada em seu imposto de renda porque não possuía saldo no final do exercício financeiro, em 31 de dezembro de 2002, argumentou o Sr. Henrique Meirelles à fl. 76, verbis:

…”O representado não declarou a existência da conta de onde feito o depósito em sua declaração do imposto de Renda de 2003, ano base 2002, como acusam os Procuradores, simplesmente porque não havia como fazê-lo uma vez que a conta mencionada pela representação estava encerrada no final do exercício fiscal de 2002. Não havia saldo a declarar dessa conta, em 31 de dezembro de 2002. Seu saldo era zero (doc 11)”

Muito embora não seja obrigatório o Iançamento na declaração de bens a conta não declarada no ano anterior e com o saldo zero, resta a suspeita de que justamente a conta utilizada para operar com conta de uma offshore tenha o seu saldo zerado em 31 de dezembro, justamente para não precisar lançar na declaração de renda. As suas explicações são insuficientes.

II.3. CONVERSÃO DE MOEDA ESTRANGEIRAS E BENS ADQUIRIDOS NO EXTERIOR

Os outros dois argumentos do representado são no sentido de que não incide imposto de renda sobre a conversão da moeda estrangeira em nacional e sobre o ganho de capital referente à aquisição de imóveis no exterior, antes de seu retorno ao Brasil. A questão tributária não é foco central dessa representação. As declarações de imposto de renda são utilizadas para demonstrar a existência de indícios da existência de depósitos não declarados à autoridade brasileira, sem prejuízo, ainda, de desdobramento das investigações para a lavagem de dinheiro, como veremos adiante.

No ano de 2002, o Sr. Henrique Meirelles, segundo suas próprias declarações de imposto de renda, já era residente no país desde junho de 2002 e estava em plena campanha eleitoral, na qual participou como pessoa física com R$ 887.050,12 (oitocentos e oitenta e sete mil, cinqüenta reais e doze centavos), conforme documentos anexo extraída de pesquisa na internet.

Na condição de residente do país, segundo declarações do próprio representado, a partir de junho de 2002, ele deveria recolher o imposto de renda sobre o ganho de capital, segundo disposições do art. 24 da Medida Provisória nº 2.158-35, 24/08/2001 e Instruções Normativas SRF nº 118/2000 e 208/2002, anexas.

No entanto, em sua declaração de ajustes, do exercicio de 2003, ano calendário 2002, não há qualquer recolhimento de imposto de renda sobre ganho de capital, apesar de declarar diversos investimentos, aplicações e direitos a receber do exterior. Como frisou-se na representação, há necessidade de se conferir todos as contratos de câmbio do Sr. Henrique Meireiles e de suas empresas, principalmente a SILVÂNIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA.

II.4. SUSPEITA DE DEPÓSITOS NO EXTERIOR E LAVAGEM DE DINHEIRO COM EMPRESAS CONTROLADAS PELO SR. HENRIQUE MEIRELLES


As suspeitas da existência de recursos localizadas na exterior e lavagem de dinheiro são bastante evidentes, inclusive, em consonância com a Resolução n0 01/99 do Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF, cujo anexo prescreve o seguinte:

“Anexo

Relação de operações suspeitas

1. Operações em que o comprador:

1.1. utilize na quitação valor, em espécie, superior a R$ 10.000, 00 (dez mil reais), ou seu equivalerrte em otrtras moedas;

1.2. utilize ou proponha pagamento, do todo ou de parte, com recursos de origens diversas (cheques de vários bancos, de várias praças, de várias emitentes) ou de diversas naturezas (moeda nacional ou estrangeira, títulos e valores mobiliários, metais, ou qualquer ativo possível de ser convertido em dinheiro);

1.3. tenha proposto pagamento através da transferência de recursos entre contas bancárias no exterior;

1.4. não aparente possuir condições financeiras para a operação, configurando a possibilidade de se tratar de “testa de ferro” ou “laranja”; como usualmente são conhecidas as pessoas que emprestam seus nomes para operações escusas;

1.5, não se disponha a cumprir as exigências cadastrais ou tente induzir os responsáveis pelo negócio a não manter em arquivo registros que possam reconstituir a operação pactuada;

1.6. efetue o pagamento com cheques, ou quaisquer outros instrumentos bancários, de agências localizadas em cidades fronteiriças ou no exterior, quando não se justifique a utilização desta forma de pagamento;

1.7. proponha o superfaturamento do imóvel;

1.8. promova sucessivas transações imobiliárias, pessoalmente ou por intermédio de terceiros;

1.9. seja empresa com sede ou filial em paraíso fiscal ou centro off-shore ou utilize recursos provenientes dessas localidades.

2. Outras operações que, por suas características, no que se refere a partes envolvidas, valores, forma de realização, instrumentos utilizados ou pela falta de fundamento econômico ou legal, possam configurar hipótese de crimes previstos na Lei n° 9.613, de 3 de março de 1998, ou com eles relacionarem-se.

(*) Republicado por ter saído com incorreções no original, publicado no DOU do dia 14 de abril de 1999, seção I, página 7. ” (grifo do MPF)

O Sr. Henrique Meirelles, conforme declaração de ajuste e saída definitiva do país, possuía um patrimônio de R$ 1.809.56145 (um milhão, oitocentos e nove mil reais e quinhentos e sessenta e um reas e quarenta e cinco centavos). Sem qualquer motivo aparente, transporta para o valor total do patrimônio para o campo [27] da declaração no valor de R$ 3.106.364,93.

Quanto retorna ao país, declara no ajuste de 2002 (Fl. 27) possuir um patrimônio em 2001 de R$ 104.499,727,92 (cento e quatro milhões quatrocentos e noventa e nove mil e setecentas e vinte e sete reais e noventa e dois centavos), o que corresponde a um aumento patrimonial em cinco anos de R$ 102.690.166,47 (cento e dois milhões, seiscentos e noventa mil, cento e sessenta e seis reais e quarenta e sete centavos). Houve uma média de acréscimo patrimonial de R$ 20.538.033,29 (vinte milhões, quinhentos e trinta e oito mil, trinta e três reais e vinte e nove centavos) por ano, totalmente incompatível com seus rendimentos e aplicações financeiras.

Em suas declarações de imposto de renda, oferece à tributação no ano de 2002 (fl. 39), apenas R$ 4.313.474,86 (quatro milhões, trezentos e treze mil, quatrocentos e setenta e quatro reais e oitenta e seis centavos) pelos 7 (sete) meses de residente. Já no ano de 2003, oferece à tributação (fl, 47) R$ 6.893.170,94 (seis mihões, oitocentas e noventa e três mil e cento e setenta reais e noventa e quatro centavos). Em termos absolutos, em cinco anos, o representado somente teria em torno de R$ 35 milhões, sem descontar os pagamentos por ele efetuados.

Temos portanto, um acréscimo patrimonial a descoberto, em total descompasso com a renda e aplicações financeiras do representado, que necessita ser investigado.

Curioso notar, também que no ano de 2002 (fl. 27), embora tenha recebido do exterior em torno de R$ 4 milhões, declara ter recolhido no exterior o imposto de R$ 830,921,82 (oitocentos e trinta mil, novecentos e vinte e um reais e oitenta e dois centavos). No ano seguinte (fl. 47), declara ter recebido da exterior em torno de R$ 7 mihões, lança como imposto pago no exterior valor menor de R$ 577.376,08 (quinhentos e setenta e sete mil, trezentos e setenta e seis reais e oito centavos). Deve-se considerar também que no ano de 2002 houve retificadora do imposto pago no exterior (fl. 39), aumentando o seu valor na ordem de R$ 20 mil reais. Os impostos pagos no exterior possibilita a sua dedução no Brasil.

A manipulação de valores de impostos pagos no exterior de forma desproporcional aos rendimentos oferecidos à tributação constitui indício de ocultação de bens ou renda no exterior. Deve-se verificar os documentos que comprovam o recolhimento destes tributos no exterior.


O representado reage diante da possibilidade do Ministério Público Federal checar notícias divulgadas em revistas e jornais. Equivoca-se o representado. Por dever de ofício, cabe ao Ministério Público checar a veracidade das declarações da imprensa, principalmente, quando são indicadas fontes e descrição de fatos objetivos que podem caracterizar a ocorrência de lesão ao patrimônio público ou a ocorrência de crimes.

No caso concreto, foi noticiado no site da Tribuna da Imprensa o seguinte:

“No relatório paralelo, Barros pede a saída do Meirelles do cargo por incompatibilidade com os interesses como empresário. Documentos da CPI mostram, segundo Barros, que o presidente do BC é o dono das empresas off shore Silvânia One e Silvânia Two, com sede nos EUA, detentoras do capïtal da empresa brasileira Silvania Empreendimentos e Participações, processada pelo BC há quatro anos. “Como presidente do BC, o Meirelles não pode fiscalizar mesmo como empresário. Ele não pode continuar no cargo”, afirmou Barros.

Outra suposta incompatibidade de Meirelles com o cargo relatada por Barros foi o arquivamento de casos investigados pelo BC, entre eles, a remessa de U$ 1 bilhão ao exterior pela Boston Comercial e Participações…”

Essa notícia foi confirmada pelos dois relatórios produzidas na CPMI do Banestado.

O Relator Deputado José Mentor, no item 4.11., relativo à Caixa 201, Processo do Banco Central n° 9900943883, de 20/04/99, assim descreve:

“Processo de nove volumes, aparentemente inconcluso, tendo em vista o seguinte: após tentativa de rastrear a origem de R$ 1.372.499.147,79, enviados para o exterior sob o fato “disponibilidade no exterior” a empresa Boston Comercial Participações Ltda negou-se a fornecer informações referentes aos depositantes em sua conta corrente, impossibilitando a identificação da origem dos recursos.

Esse montante, conforme folha 266, representava 2.083 vezes o capital social da empresa no exercício de 1997. Fato curioso, conforme os analistas do BC, é o valor expressivo na conta passiva “Contratos de Assunção de Obrigações”, segundo a mesma folha do processo, “rubrica pouco usual” da contabilidade, cujo montante atingiu a cifra de R$ 1,4 bilhão. Registre-se que, em um contrato de assunção de obrigação, a empresa A, que assume a obrigação, recebe da Empresa B (ou de várias empresas) valores à vista e, juntamente a esses valores, contas (obrigações) a serem pagas no futuro. A empresa A, então, detentora dos valores à vista, realizará a liquidação das obrigações em nome da empresa B em datas futuras.

Ainda sobre as operações realizadas, um trecho da informação e despacho, folha 246, elaborado pelo Coordenador em Exercício Maurício Venâncio Leite, em 07/05/1999, está consignado o seguinte: “Note que as documentos entre as empresas Boston são tão repetitivos que chegam a cometer erros primários, como a Nota Promissória às fls. 116, onde a empresa Boston Administração e Empreendimentos Ltda. figura, ao mesmo tempo, como credora e devedora, conforme contrato de mútuo às fls. 117/119, a mutuária é a Boston Comercial e Participações Ltda.

O pedido de arquivamento desconsiderou o despacho contido na fl. 281, emitido pelo então consultor do Decam, Sr. Fernando Celso Gomes de Souza, datado de 24/05/1999, com o seguinte teor: “Peço verificar o fluxo de remessas e retornos da referida empresa no período de 01.06.98 a 21.05.99 e a origem dos recursos remetidos, para tanto oabtendo o extrato da conta carrente da empresa. Caso se constate que a empres atuou como captadora de recursos no mercado interno (de pessoas naturais e jurídicas) para a aplicação no exterior (como se fosse administradora FIEX, por exemplo), sem estar autorizada, como se supõe, configurar-se¬-ia, claramente, o crime previsto no art. 16 da Lei n° 7.492/86, tornando obrigatória a comunicação ao Ministério Publico Federal e à Receita Federal”.

Processo em exame desde 05/10/2001. Não encerrado até a data de encerramento da CPMI” (grifos do MPF)

Também o Deputado José Mentor, no item 4.1.27, informa sobre o Pt do Banco Central n° 0101074058, de 12/12/2000, Caixa 204, o seguinte:

“Resultado do monitoramento convencional de câmbio. Destaque-se o fato de que surge um caso no qual há remessa de recursos do exterior para o País (Silvania) que apresenta um contrato de prestação de serviços de pagamentos de despesas, com a característica de que esta prestadora é de propriedade de duas offshores cujos representantes no Brasil são da Banca de Advocacia Demarest & Almeida. Foi verificado e constatou-se que as off-shores que controlam a Silvania atualmente, uma vez que as off-shores mudaram, são Silvania One e Silvania Two, ambas americanas (INFOMAÇÃO ADICIONADA), Processo em exame da data de encerramento da Comissão.”


No mesmo sentido, o Senador Antero Paes de Barros, no item 4.3, relativo à evasão de divisas pelo sistema financeiro, esclareceu:

“A presente CPI do Banestada decidiu, então, requisitar ao Banco Central cópias de processos de fiscalizações cambiais, instauradas à época, inclusive os acima referidos Processos do Bank Boston.

As análises concentraram-se sobre o terceiro processo do Bank Boston, o PT 9900943883, tendo em vista não somente tratar-se de um caso que guardava relação com o objeto da investigação da CPI do Banestado, a evasão de divisas, mas especialmente em vista de envolver a emblemática cifra de um bilhão de reais.

… Há indícios que o Bank de Boston patrocinou esquemas voltados para a evasão de divisas e sonegação de impostos, além de resistir em atender às determinações do Banco Central, oferecendo embaraços à fiscalização.

Já no item 4.3.1. do relatório, afirma o Senador Antero Paes de Barros, verbis:

“A fiscalização cambial detectou que, entre 03/09/98 e 16/09/98, uma empresa denominada Boston Comercial e Participações Ltda. havia remetido ao exterior um montante da ordem de U$ 1 bilhão de dólares (R$ 1.181.092,11), utilizando-se da conta de não-residente do Bank Boston em Nassau.

A Boston Comercial e Participações Ltda. tratava-se de empresa não-financeira com sede na Alameda Rio Negro, 1439 – Q 12, Lj 1, Alphaville, Barueri/SP, sendo contolada quase integralmente por Boston Overseas Financial Corporation, sediada em Boston/EUA.

Essas empresas estavam sob controle do Conglomerado Financeiro Bank Boston, cuja presidência mundial do banco e da holding Bank of Boston Corporation vinha sendo ocupada pelo Sr. Henrique de Campos Meirelles desde outubro de 1996, época em que passou a responder como principal executivo do grupo, exercendo a função de COO (Chief Operational Officer), sendo o primeiro estrangeiro a ocupar a presidência de um banco americano. Reportavam-se a ele todas as áreas de negócios nos EUA e exterior, mercado de capitais, mesa de operações, tesouraria, marketing, operações e sistemas.

Assim, o Sr. Henrique Meirelles, na qualidade de acionista e detentor de opções de compra de ações do Grupo Boston, era um grande beneficiário dos lucros proporcionados pelas operações de evasão de divisas, assim como por negócios simulados com a matriz nos EUA, que evitavam os tributos devidos no Brasil.

Em 17/09/98, os técnicos de monitoramento sobre o câmbio atuaram com agilidade, encaminhando correio eletrônico à matriz do BanK Boston em São Paulo, solicitando, no prazo de 3 dias úteis, o envio de extratos das contas correretes da empresa Boston Comercial e da instituição financeira não-residente The First National Bank of Boston – Nassau, a partir de 01/08/98. A solicitação não foi atendida na prazo e foi reiterada em 21/10/98, data em que os técnicos também solicitaram o balanço detalhado da empresa em setembro/98 e a comprovação/documentação de origem dos recursos transferidos e instrumentos financeiros utilizados nas movimentações.

O Bank Boston não atendeu ao solicitado, tendo encaminhado um balanço sem o detalhamento exigido. Ainda assim, o balanço revelava uma empresa com um patrimônio liquido inferior a R$ 7 milhões e um passivo descomunal, de R$ 1,5 bilhão, abrigado sob a rubrica genérica “Outras Obrigações”. Esse passivo financiava R$ 1,2 bilhão em aplicações em renda fixa e o restante em créditos de exportações (R$ 124 milhões), de sociedades ligadas (R$ 36 milhões) e outros não especificados (R$ 49 milhões), além de um ativo permanente de R$ 78 milhões.

Em outras palavras, a principal fonte de recursos da empresa, responsavel por R$ 1,5 bilhões, foi apresentada de forma encoberta, como “Outras Obrigações”, que normalmente é utilizada para reunir valores de menor expressão. A falta de transparência na apresentação de informações fundamentais exigidas pelo Banco Central para cumprir sua atribuição fiscalizadora foi adotada de forma proposital e acintosa.

A empresa, portanto, apresentava-se com o perfil típico daquelas utilizadas em lavagem de dinheiro, pois não tinha atividades operacionais, a não ser aquelas típicas derivadas de intermediação financeira, aplicando em renda fixa recursos cuja origem ocultava no seu balanço.

No Banco Central, o assunto deu origem ao processo PT 9900943883, instaurado para investigar a origem dos recursos de remessa efetuada por uma empresa não-fïnanceira, até então, desconhecida.

Observe-se que mais de um ano antes, em abril de 1997, o Banco Central já havia denunciado o esquema de Foz do Iguaçu ao Ministério Público Federal. Dentre as operações classificadas como irregulares, estavam empresas de fachada, de porte irrisório, cujas contas-correntes acolhiam vultosos depósitos de origem desconhecida, para serem remetidos ao exterior, ocultando a identificação do efetivo proprietário das disponibilidades.

O esquema utilizado pelo Bank Boston tinha as mesmas caracteristicas. O Banco registrou na Junta Comercial uma empresa não-financeira que não tinha atividades operacionais, a qual acolheu depósito em suas contas correntes de origem não identificada e remeteu os recursos ao exterior, camuflando a identidade de seus efetivos proprietários.

Consta do processo um documento emitido pela Grupo de Trabalho, datado de 19/08/99, no qual o GT fez questão de realçar a questão fundamental, que consistia na incompatibilidade entre a valor das remessas e o capital da empresa. Foi também assinalado que os expressivos valores registrados a crédito nos extratos como sendo provenientes de “Contratos de Assunção de Obrigação”, tratava-se de rubrica pouco usual, cujo montante era de R$ 1,4 bilhão em 31/08/98.”


Cabe ressaltar que até a presente data não se sabe a origem dos recursos na ordem de R$ 1,4 bilhão remetidos para o exterior, no período de 05/06/98 a 10/02/99, pela Boston Comercial Participações Ltda.

O Presidente da Comissão Parlamentar, o Senador Antero Paes de Barros, demonstrou que durante a gestão do Sr. Henrique Meirelles à frente do Banco Central, 44 dos 64 processos foram arquivados em esforço concentrado, em três meses, muito embora tenham sido instaurados de forma espaçada, entre 1997 e 2002.

No período de 19/11/2003 a 09/12/2003 foram arquivados 30 processos, Já entre 03/02/2004 a 10/02/2004, 11 processos. Dentre os processos arquivados, encontrava-se o de n° 0101074058, relativos às Silvanias controladas pela representado, o Sr. Henrique Meirelles.

Sobre este aspecto, afirma o Presidente da Comissão, verbis:

“Um outro processo analisado pelo Relator causou surpresa por envolver duas empresas offshores americanas – Silvania One e Silvania Two – controladas de uma outra Sìlvania no Brasil. Essas 3 empresas pertencem a ninguém menos que o Presidente do Banco Central do Brasil, Sr. Henrique Meirelles.

O Relator não tratou do aspecto de relevância nesse caso, que é o fato de o Sr. Henrique Meirelles deter a atribuição de fiscalizar a si próprio e as operações que realizou. Trata-se de processo instaurado há quatro anos, em 12 de dezembro de 2000.

Em vista de haver nítido conflito de interesses, trata-se de uma delicada situação sob o ponto de vista ético. Portanto, é de se ponderar a respeito de qual seria a forma de garantir um tratamento ao processo dotado de isenção, já que os servidores da autarquia poderiam não se sentir confortáveis ao ter que apreciar a conveniência de aplicar sanções ao seu próprio chefe. …”

Por outra via, é incontroverso o fato de que o Sr. Henrique Meirelles não declarou ao Fisco e ao TRE/GO o controle das empresas SILVÂNIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA., SILVÂNIA ONE LLC , SILVÂNIA TWO LLC e a empresa Trust estrangeira THE HENRIQUE CAMPOS MEIRELLES REVOCABLE.

A empresa SILVÂNIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA., como mesmo disse o representado, realizou diversas operações imobiliárias no Brasil em seu favor.

A partir, de uma engenharia organizacional, como veremos adiante, o representado promoveu diversas alterações contratuais dessas empresas, para que permanecesse no controle, mas de forma oculta nas operações por elas realizadas. Isso favorece a lavagem de dinheiro e dificulta o cruzamento de dados pela Receita Federal, na fiscalização de rotina, bem como facilita a utilização de recursos não declarados em campanha eleitoral.

Sobre esse ponto, argumentou o Sr. Henrique Meirelles, às fls. 74/75, verbis:

“Afirma o documento enviado a V. Exa, que o representado omitiu “em sua declaração ao TRE., várias sociedades civis que controla, tendo estas vários bens”. Reafirme-se que o representado não tinha uma única ação ou cota dessas sociedades. Por isso, não as declarou. (grifo no original)

Nesta mesma linha de adjetivar as operações de ilícitas, sem fornecer as razões e os fundamentos da imputação, os representantes afirmam que a empresa “Silvania Participações e Empreendimentos Ltda.” “envolveu-se, no ano passado, em uma operação suspeita”. Como fonte de suas informações citam a revista “Veja”. (grifo no original)

No que diz respeito à “Silvânia Empreerdimentos e Participações Ltda.”, trata-se de empresa antiga, que administra bens do representado no Brasil, cujo Contrato Social à época das declarações está anexado a estes esclarecimentos (doc.9). Como durante vários anos, especificamente de 1996 a 2002, o representado residiu nos Estados Unidos, onde exerceu relevantes funções na empresa privada, a referida empresa “Silvania” geriu seus negócios imobiliários no pais. Nada de errado aqui também. Sem razão a equivocada invocação da empresa pelos Procuradores. Nada errado também em essa empresa ter sócios no exterior (doc. 9) e serem sócios representadas por procuradores no Brasil. Isso é, hoje, exigência legal, e como a “Silvania” há milhares de outras empresas estrangeiras no Brasil representadas por¬ procuradores. Nada de errado nisso, (grifo da MPF)

14º) Os Procuradores fazem ainda referência a empresas off shore do representado em paraísos fiscais, no exterior, procurando emprestar a isso a conotação negativa que se dá a alguns países de baixa ou nenhuma tributação. Reitere¬-se mais outra vez que das empresas referidas pelos Procuradores, a quase rotalidade delas não são do representado, que delas não possui uma cota ou ação sequer. (grifo do MPF)

O representado tem, sim, empresas no exterior, devidamente declaradas ao Fisco brasileiro (Red Horizon e Tranquil Bay) , cujos dados de constituição estão aqui anexados (doc.2). (grifo do MPF)

…”


O Sr. Henrique Meirelles nega, categoricamente, o controle das empresas não declaradas ao Fisco, pelo fato de não possuir uma única cota ou ação dessas sociedades. Afirma, inclusive, que “as empresas referidas pelos Procuradores, a quase totalidade delas não são do representado”.

Ao contrário do que alega o Sr. Henrique Meirelles, ele controla e é dono oculto de todas as empresas offshores, estrangeiras e nacionais mencionadas, por razões não esclarecidas ao Procurador-Geral da República. O representado não tece uma linha sequer sobre o controle dessas empresas. Por que razão?

O representado também não trouxe aos autos o contrato social das empresas SILVÂNIA ONE e SILVÂNIA TWO, que têm como representantes no Brasil o Sr. Marco Túlio Pereira de Campos, o mesmo que foi preso com R$ 32,000,00 (trinta e dois mil reais) no aeroporto de Guarulhos. As razões são obvias, no sentido de que não se esclareça que o Sr. Henrique Meirelles é, verdadeiramente, o único dono e controlador de todas essas empresas.

O representado omitiu em sua resposta que o único sócio das empresas SILVÂNIA ONE e SILVÂNIA TWO, talvez para induzir Vossa Excelência em erro, é empresa trust estrangeira “THE HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES REVOCABLE TRUST – 1998”.

Consta dos anexos do Relatório de Informação n° 09/05 que empresa trust estrangeira “THE HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES REVOCABLE TRUST – 1998 detém 100% do capital das empresas SILVÂNIA ONE e SILVÂNIA TWO, as quais controlam a SILVÂNIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA., que realizou diversas operações financeiras no Brasil para o representado.

Afirmou o Sr. Perito no Relatório n° 09/05, verbis:

“Quanto às empresas Silvanias, constatamos o seguinte.

A Silvania Empreendimentos e Participações Ltda (CNPJ 51.943.926/0001-51), constítuída em 08/12/1979 com endereço na Rua Morgado de Mateus, 96, Vila Mariana, São Paulo/SP, em situação “Ativa Não Regular” perante o Fisco, tem como representante legal e procurador o Sr. MÁRIO ROBERTO VILLANOVA NOGUEIRA (CPF 112.981.928-03).

Fazem parte do quadro societário da empresa Silvania Empreendimentos, desde 18/12/2001, as firmas estrangeiras SILVANIA ONE LLC e SILVANIA TWO LLC, cujo procurador perante a Receita Federal é a Sr. MARCO TULlO PEREIRA DE CAMPOS (CPF 112.981.928-03), citado em várias reportagens como primo e procurador de Henrique de Campos Meirelles, cf. docs. anexos.

Essas firmas Silvania One e Silvania Two tem como único sócio, portanto, com 100% das cotas de capital, uma empresa Trust estrangeira, denominada por THE HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES REVOCABLE, incluída desde 04/04/2003.”

Não bastasse todos esses indícios contra o representado, trago à Vossa Excelência Cópia dos contratos sociais, das alterações societárias e de procurações expedidas, relacionadas às empresas SILVANIA EMPREENDIMENTOS PARTICIPAÇÕES LTDA., SIVANIA HOLDINGS LTDA. , GOIANIA LTD., SILK COTTON INVESTMENTS LTD., YAMETTO CORPORATION LTD., SILVANIA ONE LLC e SILVÂNIA TWO LLC, que demonstram, cabalmente, que o Sr. Henrique de Campos Meirelles utilizou-se de artifícios para ocultar a sua participação (como único proprietário) das quotas o capitai social dessas empresas, principalmente a empresa brasileira SILVANIA EMPREENDIMENTOS PARTICIPAÇÕES LTDA., contando com advogados do escritório de advocacia paulista DEMAREST e ALMEIDA (Almeida, Rotenberg e Boscoli – Advocacia, registrada sob o nº 9 na OAB /SP), os senhores ALTAMIRO BOSCOLLI, ROGÉRIO CRUZ THEMUDO LESSA, JORGE FERNANDO KOURY LOPES, MARIA LÚCIA DE ALMEIDA PRADO E SILVA E MÁRIO ROBERTO VILLANOVA NOGUEIRA, o mesmo escritório de advocacia que ora apresenta defesa à Vossa Excelência.

Isso tudo fica muito bem esclarecido pelo Sr. Perito Renato Rodrigues Barbosa, Chefe do Setor de Pesquisa, Análise e Informação desta Procuradoria da República, verbis:

“O Rastreamento Societário dos fatos registrados e arquivados em cartório público, em nome da empresa Silvania Empreendimentos, aponta que:

Em 14/12/1979, Henrique de Campos Meirelles requer o resgistro e arquivamento dos atos constitutívos da empresa SILVANIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇOES LTDA ao 4º Registro de Títulos e Documentos da Comarca de São Paulo, de cuja composição societária participa:

– HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES – com 749.999 cotas; e

– CATENÁRIA ENXPREENDIMENTOS – com 1 cota

Chama atenção o fato de que o único signatário do contrato social da Silvânia Empreendimentos é o próprio Henrique Meirelles, porquanto havia recebido em cartório uma procuração especial para assinar em nome da Catenária Empreendimentos, aliás, uma prática constante na Silvania Empreendimentos. Senão vejamos:

Ainda em 14/12/1979., a empresa CATENÁRIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA, representada pelos únicos sócios MARCO ANTONIO RAMOS DE OLIVEIRA e HEMA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA, ” … nomeia e constitui seu bastante procurador HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES, …, CPF 274.742.838-91 (…). a quem confere amplos e especiais poderes para firmar todo e qualquer documento inerente, útil ou necessário à representação da outorgante na sociedade SILVANIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA, em fase de constituição…”


Daí por que a razão dos lançamentos das duas assinaturas de Meirelles no Contrato Social da Silvania Empreendimentos. conforme demonstra o recorte a seguir:

(…)

Em 28/12/1981 a firma CATENÁRIA é retirada da sociedade com a Silvania Empreendimentos. Em seu lugar, entra a nova sócia DIVA SILVA DE CAMPOS, brasileira, casada, do lar (…), mãe do Sr. Henrique Meirelles, recebendo por transferência 1 cota do capital social.

Note-se que um tempo depois, em 28/06/1982, a Sr. Diva assina diversas procurações nos seguintes termos “… nomeia e constitui seu bastante procurador, o Sr. HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES. …. (doravante designado “OUTORGADO”), com os mais amplos poderes e gerais poderes para, isoladamente, em nome e lugar da OUTORGANTE, representá-la na condição de sócia quotista da SILVANIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPARÇÕES LTDA…”

Ou seja, o Sr. Henrique Meirelles continua com a absoluto controle sobre a Silvania Empreendimentos. Tanto é assim que nas datas de 01/07/1982, 31/12/1982 e 19/12/1983, ele mesmo assina, por ele e pela sua mãe, as duas alterações contratuais seguintes da Silvania Empreendimentos.

(…)

Em 18/01/1984, Henrique Meirelles substabelece os poderes que lhe foram conferidos pela senhora Diva Silva de Campos aos senhores MARCO ANTONIO RAMOS DE ALMEIDA e EDUARDO AMARAL GURGEL KISS.

Posteriormente, esses dois advogados passam a assinar, por procuração, em nome do Sr. Henrique Meirelles e da Sra. Diva Silva de Campos, conforme 4ª alteração contratual da Silvania Empreendimentos, datada de 22/02/1984.

Sucessivas alterações de aumento de capital e mudança de endereço da sede da Silvania Empreendimentos ocorreram até que, em 16/09/1996, a Sr. Diva Silva de Campos outorgou a procuração n° 330.099/96 aos senhores Henrique de Campos Meirelles e ALEX WALDEMAR ZORNIG com “… poderes específicos de transferir- as citadas quotas para terceiros no país ou no exterior, podendo, para tanto, tudo fazer assinar, transigir, dar e receber quitação, inclusive assinar a Alteração de Contrato Social da respectiva sociedade …”.

Constatou-se, posteriormente, que com essa procuração o Sr. Alex Zomig requereu, em 18/09/96, com efeito, o registro e arquivamento da 11ª alteração contratual da Silvania Empreendimentos ao mesmo 4° Registro de Títulos e Documentos.

(…)

Foi nessa 11ª alteração que o Sr. Henrique Meirelles resolveu novamente alterar a composição do quadro societário tentando ocultar definitivamente a sua participação nas quotas do capital da Silvania Empreendimentos, cujos principais trechos destacamos aqui;

HENRIQUE DE CAMPOS IMEIRELLES,…: e

DIVA SILVA DE CAMPOS, …

únicos sócios da sociedade civil … SILVANIA EMPREENDIMENTOS… têm entre si justo e acordado alterar as cláusulas do contrato social, procedendo da seguinte forma:

1) Alterar a composição do quadro societário, como a seguir:

a) pela conferência de 251.686 (…) quotas detidas pelo sócio HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES, a título de subscrição do capital social da empresa SILVANIA HOLDINGS LTD, …

b)pela conferencia de 251,685 (…) quotas detidas pelo sócio HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES a titulo de subscrição do capital social da empresa GOIANIA LTD, …

c) pela venda, pelo valor nominal, de 1 (uma) quota detida pela sócia DIVA SILVA DE CAMPOS a empresa GOIANIA LTD, … (…)”

Ressalte-se que Henrique Meirelles apenas confere, na 11ª alteração da Silvania Empreendimento, as suas quotas pessoais por conta de supostas subscrições da capital de duas empresas offhores SILVANIA HOLDINGS LTD e GOIANIA LTD, sediadas nas ilhas Cayman.

Note-se que quem assina pelas duas empresas offshores é o próprio Sr. Alex Zomig, por conta daquela procuração n° 330.099/96, de 16/09/1996, passada em cartório por Diva Silva de Campos e Henrique Meirelles.

(…)

Conclui-se, pois, que as 503.371 quotas nunça deixaram de pertencer ao seu verdadeiro dono; Henrique de Campos Meirelies, como veremos nos atos subsequentes.

Constatou-se ainda que em nome das empresas offshores SILVANIA HOLDINGS LTD e GOIANIA. LTD foram eleitos os procuradores ALEX WALDEMAR e ELISABETE APARECIDA GIORGIANI, conforme tradução pública de procuração supostamente lavrada nas Ilhas de Cayman.

Agora quotistas absolutas, da empresa Silvania Empreendimentos, as offshore SILVANIA HOLDINGS LTD e da GOIANIA LTD resolvem, em Ata de Reunião de Quotistas realizada em 20109!96, aprovar a “indicação do Sr. Alex Waldemar Zornig, …. como responsável perante a Receita Federal. …”

Em 19/0612000, protocola-se um requerimento assinado pela Sr. Alex Zornig requerendo o registro e arquivamento da 12° alteração contratual da empresa Silvania Empreendimentos, onde as empresas offshores sediadas Bahamas


– SILK COTTON INVESTIMENTS LIMITED; e

– YAMETTO CORPORATION LIMITED,

se apresentam como sucessoras da SILVANIA HOLDINGS LTD, respectivamente, no quadro societário da Silvania Empreendimentos.

Eis que surge nessa 12ª alteração contratual o Sr. Henrique Meirelles assinando de uma só vez pelas quatro empresas estrangeiras. Senão vejamos:

(…)

Realmente, as procurações lavradas nas Ilhas Bahamas confirmam que o Sr. Henrique Meirelles detinha das firmas Yametto Corporation e Silk Cotton especiais poderes para “…representar a ‘Sociedade’ com o objeto especial de assinar toda e qualquer documentação, recibos, quitações, alterações em estatutos e contratos sociais e requerer e/ou aceitar todos e quaisquer registros exigidos segundo as leis brasileiras, com relação à transferência de 251.686 quotas da Silvania Empreendimentos e Participações Ltda.,…”

Na 13ª alteração contratual da SiIvania Empreendimentos,

de 22/06/2001, a Sra. Elisabete Aparecida Giorgiani, após renúncia, delega seus poderes de Gerente Delegado ao Sr. BERTRANDO

MOLINARI FILHO.

Em procuração de 11/06/2001, a offshor-es Yametto Corporation e Silk Cotton outorgam poderes ao mesmo Sr. Alex Waldemar Zomig, para “…representar a ‘Sociedade’, com a finalidade específica de assinar toda e qualquer documentação, recibos, quitações, alterações em estatutos e contratos sociais e requerer e/ou aceitar todos e quaisquer registros exigidos segundo as leis brasileiras, com relação à transrência de 251.686 quotas da Silvania Empreendimentos e Participações Ltd.,…”¬

A 14ª alteração Contratual da Sìivania Empreendimentos, de 27/09/2001, entre outras cláusulas, apresenta como novos procuradores da firmas Silk Cotton e Yametto Corporation os advogados:

ALTAMIRO BOSCOLLI

ROGÉRIO CRUZ THEMUDO LESSA;

JORGE FERNANDO KOURY LOPES,

MARIA LUCIA DE ALMEIDA PRADO E SILVA;

MÁRIO ROBERTO VILLANOVA NOGUEIRA,

para “…representarem os interesses da Sociedade na qualidade de quotistas da Silvania Empreendimentos e Participações Ltda…”

E essa foi a fórmula com a qual os cinco conhecidos advogados de São Paulo passaram à qualidade de “quotistas” da Silvania Empreendimentos.

Por ocasião da 14ª alteração, Alex Zornig renunciou ao cargo de gerente deIegado, posteriormente assumido por Mário R. V. Nogueira e Maria L. Almeida Prado e Silva.

Na 15ª alteração contratual da Silavania Empreendimentos, de 28/09/2001 saem de cena as firmas Yametto Corporation e Silk Cotton para dar lugar a outras duas empresas sediadas nos Estados Unidos:

SILVANIA ONE LLC, e

SILVANIA TWO LLC,

representadas no Brasii pelos mesmos cinco advogados de São Paulo, citados anteriormente.

Na 16ª alteração, de 20/03/2002 a empresa Silvania One e Silvania Two são representadas por MARCO ANTÔNIO RAMOS DE ALMEIDA e MÁRIO ROBERTO VILLANOVA NOGUEIRA.

Na 17ª alteração contratual da empresa Silvania Empreendimentos, de 31/12/2002, figuram como representantes das Silvanias One e Two o Sr. MARCO TÚLIO PEREIRA DE CAMPOS e MARIA HELENA DE ARAÚJO MORAIS.

Saliente-se que o Sr. Marco Túlio Pereira de Campos aparece em diversas matérias jornalísticas como sendo primo e procurador do Sr. Henrique de Campos Meirelles,

Em 08/07/2004, no auge das denúncias veïculadas pela imprensa nacional, portanto, renuncia ao cargo de Gerente da Sìlvania Empreendimentos o Sr. Marco Túlio, representante das Silvanias One e Two, retornando ao cargo o advogado Mário Roberto Villanova Nogueira, procedimento consignado na 19ª alteração no contrato social da Silvania Empreendimentos e nas duas procurações públicas, lavradas nos Estados Unidos.

Segundo os mesmos passos de Marco Túlio, em 08/07/2004, Maria Helena também renuncia ao cargo de Gerente da Silvania Empreendimentos, alegando razões de ordem estritamente pessoal.

Para concluir, identificamos em pesquisas ao sistema CNPJ da Receita Federal, que atualmente a Silvania Empreendimentos pertence as firmas Silvanias One e Two, sendo as duas de propriedade do único sócio estrangeíro THE HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES REVOCABLE TRUST, conforme documentos juntados ao nosso Relatório de intimação nº 009/05-SPAI/PRDF e em pesquisa anexa.

Ademais o contrato social da empresa Silvania Empreendimentos apresenta por objeto Social o seguinte:

“…

(a) a administraçáo de bens próprios ou de terceìros; e

(b) a participação em outras sociedade, como acionista ou sócia.

…”

Por todos esses pontos analisados concluímos, pois, que o Sr. HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES utilizou-se de engenharias societárias, arquitetadas no Brasil e no Exterior, para ocultar como de fato ocultou, a sua participação como o único proprietário das quotas do capital social da empresa Silvania lmpreendimentos e Participações Ltda.


Todas as ligações e os relacionamentos societário do Sr. Henrique Meirelles encontram-se planificados no diagrama anexo, para melhor visualização e compreensão de sua posição oculta e de único proprietário de todas as empresas.

III. CONCLUSÃO

Estas são as considerações sobre a resposta oferecida pelo representado.

Represento, pois, à Vossa Excelência, pela imediata abertura de investigação criminal contra o Sr. Henrique Meirelles para apurar o cometimento de crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro, bem como oferecimento de denúncia pelo crime eleitoral.

Para o início das investigações criminais, sem prejuízo de outras previdências. que Vossa Excelência considerar necessárias, indico as seguintes diligências:

a) requisição à Receita Federal do dossiês integrados (pesquisa completa) do CPF 274.742.838-91 e CNPIs 51.943.926/0001-51 , 05.596.454/0001-90, e 05.596.461/0001-92 e cópia de todas as declarações de imposto de renda desde a ano exercício de 1996;

b) requisição à Receita Federal de relatório circunstanciado da auditoria fiscal até então promovida contra o representado e empresas por ele controladas, e cópia de todos os documentos solicitados pelos auditores fiscais ou apresentados pelo Sr. Henrique Meirelles;

c) requisição ao Banco Central da Brasil de cópia do Processo 9900943883, que cuida do exame de remessas efetuadas pela empresa Boston Comercial Participações Ltda. por meio do Bank Boston, no valor aproximado de R$ 1,37 bilhões de origem não identificada;

d) requisição ao Banco Centrai do Brasil de cópia do processo no 0101074058, tendo como envolvidas as empresas offshore Silvania One e Silvania Two, bem como a empresa Silvania Empreendimento Participações;

e) requisição ao Banco Central da Brasil de ínformações detalhadas sobre todos as contratos de câmbio, desde 1996, envolvendo o Sr, HENRIQUE DE CAMPOS MEIRELLES, as empresas SILVANIA EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. , SILVANIA HOLDINGS LTDA. , GOIANIA LTD, SILK COTTON INVESTMENTS LTD., YAMETTO CORPORATION LTD., SILVANIA ONE LLC e SILVANIA TWO LLC, BOSTON ADMINISTRAÇÃO E EMPRENDIMENTOS LTDA. E BOSTON COMERCIAL E PARTICIPAÇÕES LTDA.;

f) requisição à OAB/SP do registro e relação dos advogados do escritório Demarest e Almeida (Almeida, Rotenberg e Boscoli – Advocacia);

g) requisição ao Primeiro Conselho de Contribuintes de cópia integral do Processo nº 16327.002231/2002-85, referente à empresa BOSTON COMERCIAL E PARTICIPAÇÕES LTDA., autuada pela Delegacia da Receita Federal do Paraná pelo não recolhimento de imposto de renda, conforme documentos anexos;

h) requisição à Delegacia da Receita Federal em São Paulo, cópia integral de todos os processos administrativos referentes às Declarações de Compensação – DECOMP da empresa BOSTON COMERCIAL PARTICIPAÇÕES LTDA., nos últimos cinco anos,

Atenciosamente,

LAURO PINTO CARDOSO NETO

Procurador de República

Relação de 14 (quatorze) documentos anexos:

1) declaração de saída definitiva do país;

2)relatório de Informação nº 009/05;

3) Relatório da Informação nº 010/05;

4) Medida Provisória nº 2.158-35/2001;

5) Instrução Normativa nº 118/05,

6) Instrução Normativa nº 208/2002;

7) Relatório CPMI Banestado — Dep. José Mentor;

8) Relatório CPMI Banestado – Sen. Antero Paes de Barros;

9) Notícias da imprensa;

10) Gastos eleitorais da campanha do representado;

11) Relatório de Informação nº 015/05;

12) Procurações, contratos sociais e suas alterações;

13) Documentos do COAF;

14) Diagrama das relações societárias do representado,

Notas de Rodapé

1 – WESSELS. Johannes. Direito Penal. Trad, Juarer Tavares, Porto Alegre ; Sérgio Fabris, 1976, p. 34.

2 – WELZEL, Hanz, Derecho Penal alémán. Parte General. Trad. Juan Bustos Ramírez e Sérgio Yánez Pérez, 11. Ed. Santiago : Jurídiça de Chile, 1970.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!