Protocolo de Kyoto

Regras para o mercado de carbono são superficiais, diz advogado.

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8 de abril de 2005, 15h57

O Projeto de Lei nº 3.552/04, que estabelece regras para o mercado de carbono, é superficial. A opinião é do advogado Paulo Bardella Caparelli, do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados Associados. Para ele, o projeto representa um grande avanço do Brasil na comercialização de créditos de carbono, mas sua abrangência é muito restrita.

“Tratando-se de um tema tão emergente e promissor como o Protocolo de Kyoto, há ainda muitas questões carentes de soluções, como por exemplo as regras de tributação dos RCEs, sobre as quais especula-se a concessão de isenção tributária, o que poderia ter sido tratado por este mesmo projeto de lei”, afirma.

O projeto, de autoria do deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ), foi discutido este mês pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. A proposta prevê a emissão de títulos — Redução Certificada de Emissão (RCE), regulados pelo Protocolo de Kyoto — em projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Esses RCEs são os chamados créditos de carbono, originados a partir de projetos que evitam ou contribuem para a diminuição da emissão de gases de efeito estufa para a atmosfera.

Bardella explica que, ao atribuir a RCE a natureza de valor mobiliário, sinaliza-se a solução de três questões em aberto: a tributação incidente sobre os RCE, a regulação do fluxo de recursos entre o Brasil e o país adquirente do RCE e a contabilização do RCE no balanço das empresas. “Além disso, esses títulos passarão a ser regulados pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários), o que transmite incontestável segurança ao investidor estrangeiro”, acrescenta.

O advogado critica também a idéia de submeter as transações dos RCEs a BM&F (Bolsa de Mercadorias & Futuros), apesar de acreditar que esse procedimento proporcionará ainda mais credibilidade e segurança às transações. “Além de tais negociações dispensarem a atuação da Bolsa, a obrigatoriedade dessa submissão onera a venda, reduzindo a margem de lucro do empresário brasileiro”, explica Bardella.

Leia a íntegra do projeto

PROJETO DE LEI Nº 3.552, DE 2004

(Do Sr. Eduardo Paes)

Dispõe sobre a organização e regulação do mercado de Carbono na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro através da geração de Redução Certificada de Emissão — RCE em projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo — MDL.

O Congresso Nacional decreta:

Art. 1º – O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo — MDL tem como objetivo a estabilização das concentrações de Gases de Efeito Estufa — GEE na atmosfera num nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático, através da Redução Certificada de Emissão — RCE pelas empresas menos emitentes de GEE, para negociação no mercado global.

Art. 2º A RCE é um título correspondente a uma unidade emitida em coformidade com o artigo 12 do Protocolo de Kyoto, igual a uma tonelada métrica equivalente de dióxido de carbono (CO2e), calculada com o uso dos potenciais de aquecimento global, definidos na decisão 2/CP.3 ou conforme revisados subseqüentemente de acordo com o artigo 5 do Protocolo de Kyoto.

Art. 3º – A apreciação e aprovação das atividades de projeto do MDL é atribuição da Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima, que é a Autoridade Nacional Designada para efeitos do MDL, regulamentada pelo Poder Executivo, em conformidade com o artigo 3º, inciso IV, do decreto de 7 de julho de 1999.

Art. 4º – Enquanto título, as RCEs, possuem natureza jurídica de valor mobiliário para efeito de regulação, fiscalização e sanção por parte da Comissão de Valores Mobiliários — CVM, sujeitando-se portanto ao regime da Lei 6.385 de 07 de dezembro de 1976.

Parágrafo Único – Após aprovação pela Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima, a CVM fica responsável pelo registro e validação das entidades operacionais designadas.

Art. 5º – Na regulação do mercado de negociação de RCE, a CVM se norteará por três objetivos centrais a saber:

I — a proteção dos investidores contra fraudes e abusos similares;

II — a manutenção da competição no mercado, assegurando que seja justo, eficiente e transparente;

III — a redução de riscos sistêmicos, de molde a preservar a integridade do sistema financeiro.

Parágrafo Único – Impõe-se aos emitentes dos títulos, o dever de fornecer todas as informações relevantes, visando a proteção do investidor e para que este possa, de modo fundado, tomar as decisões de compra ou venda de RCE.

Art. 6º – No intuito de facilitar a liquidez dos títulos, a CVM fará impor certa padronização dos contratos e a concentração das transações em mercado de bolsa através da Bolsa de Mercadorias e Futuros — BM&F, situada na Bolsa de Valores do Estado do Rio de Janeiro — BVRJ.

Art. 7º – No mercado de balcão, por força da flexibilidade característica das operações, com o fim de satisfazer as necessidades específicas das contrapartes, a CVM uniformizará os seus termos.

Art. 8º Revogam-se todas as disposições em contrário.

Art. 9º Esta Lei entrará em vigor no ato de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

Existem vários benefícios para o Brasil com a implantação de um mercado de carbono: desenvolvimento de um mercado de permissões, em lugar de um sistema de impostos; uso de incentivos econômicos e alinhamento com investimentos em outros setores produtivos, tais como florestamento ou reflorestamento e energia renovável; identificação e superação de uma falha de mercado; desenvolvimento de um mercado global, enfatizando especializações regionais e economias de escala; sinergia entre mercados financeiros especialmente os de commodities e câmbio; e estreitamento da cooperação internacional.

A Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima será a Autoridade Nacional Designada para o MDL, e o seu objetivo é aprovar ou não os projetos de MDL no Brasil, deverá verificar se estes projetos estão cumprindo com o seu duplo objetivo: redução das emissões de GEE e/ou remoção de CO2 atmosférico; e a promoção do desenvolvimento sustentável.

A natureza jurídica das Reduções Certificadas de Emissões constitui tema controvertido, ainda em aberto, sendo certo que possui particularidades próprias, inexistentes em outros institutos. Entretanto, independentemente de ser derivativo ou tão-só ativo, face às possibilidades eminentes que surgem com a institucionalização de um mercado para negociá-las, em especial para o País e particularmente no Estado do Rio de Janeiro, que, será o recebedor de divisas e tecnologias, sua importância é clara, pelo que devem submeter-se à regulação da Comissão de Valores Mobiliários, visando, em suma, a proteger os investidores, assegurar a competição no mercado e diminuir os riscos sistêmicos.

A Comissão de Valores Mobiliários, fruto de descentralização administrativa, é uma entidade autárquica em regime especial, agência reguladora vinculada ao Ministério da Fazenda, mas sem subordinação hierárquica, dotada de personalidade jurídica e patrimônio próprios, bem assim de autonomia financeira e orçamentária, de cujas funções, tipicamente estatais, desincumbe-se mediante decisões marcadamente técnicas e despolitizadas, capazes portanto de dar credibilidade ao mercado.

De toda sorte, a importância do novel mercado de RCEs é evidente, sobretudo para os países em desenvolvimento, como o Brasil, devendo submeter-se, à competência administrativa desta CVM, como firmada em sua lei de regência, bastando, para tanto, atribuir-se às RCEs, por Lei, a natureza jurídica de valor mobiliário.

Já o papel da Bolsa de Mercadoria e Futuros — BM&F avulta, não só como agente para a organização do mercado físico dos certificados, como para o desenvolvimento do mercado secundário e de derivativos. A BM&F pode utilizar seu posicionamento financeiro e sistema político para impulsionar o mercado. Ademais a BM&F certamente irá reavivar o mais antigo mercado financeiro do Brasil, voltando a operar na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro — BVRJ.

Num futuro próximo a BVRJ estará sediando um mercado a nível internacional, concentrando e dando liquidez às operações da BM&F voltadas para o mercado de energia, petróleo, gás natural e também de carbono ou RCE.

Desta forma, conto com a colaboração dos Parlamentares para aprovar a presente proposição sobre organização e regulação das RCEs, que visa a exaurir o assunto, incentivando o desenvolvimento sustentável no Brasil, através do crescimento eficaz e seguro do mercado de carbono.

Sala das Sessões, em de, de 2004 .

Deputado Eduardo Paes

PSDB/RJ

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