As regras

Reforma sindical exige mudanças de fundo, afirma Walter Barelli.

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1 de abril de 2005, 13h39

Sempre foi consenso nos meios sindicais que a reforma trabalhista, mais importante e urgente que a reforma sindical, deveria ser precedida por esta. Sindicatos mais fortes e representativos teriam melhores condições para discutir a modernização da Consolidação das Leis do Trabalho — a CLT que incorporou ao longo de quase sete décadas de existência uma penca de penduricalhos legais.

No entanto, a reforma sindical que começa a ser discutida na Câmara dos Deputados apresenta um vício de origem. O texto enviado pelo governo estabelece que as novas regras só passarão a valer de fato depois de cinco anos de aprovadas. Imaginando que, na melhor das hipóteses, os trabalhos no Congresso cheguem ao seu final em meados do próximo ano, a reforma trabalhista só começará a ser discutida na próxima década.

“Precisamos antecipar esses prazos”, afirmou o deputado federal, Walter Barelli (PSDB-SP), ex-diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos), ex-ministro do Trabalho e Emprego, no governo Itamar Franco, e ex-secretário do Trabalho do Estado de São Paulo, nesta sexta-feira (1/4), à revista Consultor Jurídico.

“A estratégia de que é preciso primeiro se fortalecer está se mostrando errada”, aponta ele. O potencial universo de trabalhadores que o sindicalismo poderia representar, depois de aprovada a reforma sindical, não ultrapassa 40% da força de trabalho, ou seja, a massa de empregados com carteira assinada. A maioria — os 60% restantes — continuaria submetida à crescente informalidade, que é embalada por regras trabalhistas ultrapassadas e pelos encargos sociais.

Barelli admite que algumas iniciativas poderiam ser implementadas imediatamente. Na luta contra a informalidade, defende ele, por exemplo, a mudança da base de geração dos encargos sociais — as contribuições previdenciárias e para o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), o salário educação e o financiamento dos chamados quatro esses que hoje são seis (Sesi, Senai, Sesc, Senac, Sest e Senat). Esses encargos pesam sobre a folha de pagamento. Quanto maior o número de empregados, maior é o valor das contribuições. Na formulação de Barelli, eles passariam a incidir, como valor adicionado, sobre as mercadorias e serviços.

A estratégia da precedência da reforma sindical também contém, segundo Barelli, outros inconvenientes. Ela pode ser ainda mais retardada pela reedição, por exemplo, dos debates sobre o artigo 8º da Carta Magna que acabaram mudando os rumos do processo constituinte em 1987. Esse é o dispositivo alvo do Projeto de Emenda Constitucional, um dos textos da reforma sindical, que já começa a ser discutido agora na Câmara. O segundo texto, de âmbito infraconstitucional, será analisado após a promulgação da emenda.

Nessa mesma linha, os textos mostram ainda que a reforma terá outras pedras no caminho. Uma delas será a discussão sobre o poder político das centrais sindicais, que passariam a ter personalidade jurídica. Trata-se, para Barelli, de dispositivo bizantino, uma vez que, hoje, mesmo não reconhecidos legalmente, os presidentes das centrais, como diz o deputado, são os que sempre se sentam “na primeira fila”.

Outro ponto altamente polêmico é o fim da autonomia sindical. Segundo o texto, a autorização para a existência de entidades dependerá, em última instância, da caneta do ministro do Trabalho. Para contornar essa questão, Barelli está sugerindo que o foro seja um conselho constituído nos moldes das agências reguladoras. Os conselheiros, com notório saber na área, seriam nomeados pelo governo depois de sabatinados e aprovados pelo Congresso Nacional.

Sobre a forma de financiamento da estrutura sindical, Barelli ainda não tem uma posição definida. “Na Alemanha, os sindicatos são financiados pelo estado”, diz. Aqui eles poderiam contar com os recursos a fundo perdido do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) que são formados pelo PIS e pelo Pasep.

Atualmente, os sindicatos se financiam através de três fontes de recursos: o chamado imposto sindical (valor correspondente a um dia de trabalho por ano), a contribuição de dissídio coletivo e a contribuição confederativa. Pela proposta do governo, haveria apenas uma contribuição, definida nas assembléias de negociação coletiva anuais, que poderiam chegar a até 13% da renda líquida auferida pelos trabalhadores no ano anterior.

“A idéia é arriscada porque os participantes da assembléia poderiam fixar um redondo zero de contribuição”, adverte Barelli. Neste ponto, o deputado tem apenas uma certeza. “A proposta é uma denúncia de que hoje tem gente avançando sobre o dinheiro dos trabalhadores”.

De resto, Barelli lamenta o aprisionamento das lideranças sindicais à idéia de uma estrutura que, como a joboticaba, só existe no Brasil. É só aqui, critica ele, que os empresários se organizam em sindicatos dentro de uma estrutura aprovada por lei.

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