Vitória da Telefônica

Assinantes do Speedy têm de contratar provedor de Internet

Autor

25 de setembro de 2004, 9h32

A Telefônica, que representa o serviço de banda larga Speedy, não é obrigada a prestar serviços de acesso a Internet sem a contratação de provedores. A decisão inovadora é do juiz Vicente de Abreu Amadei, da 36ª Vara Cível de São Paulo. A Justiça paulista já entendeu em sentido contrário em alguns casos. Cabe recurso.

A ação, promovida pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), pede que a empresa permita aos seus associados o acesso a Web sem que seja necessária a contratação de provedor adicional. Segundo o instituto, a banda larga conta com o serviço tipo ADSL, que fornece condições para fazer conexão direta a Internet.

Requer também que a Telefônica não suspenda o serviço de banda larga em caso da não contratação do provedor. Solicita, ainda, que o grupo de telefonia indenize os associados do Idec por danos morais e patrimoniais sofridos em decorrência de suposta prática abusiva.

Segundo o juiz, tecnicamente não há impedimento para que o acesso seja feito pelos usuários do Speedy sem necessidade de vínculo com os provedores. Juridicamente, no entanto, de acordo com ele, é inviável que a Telefônica forneça o acesso a Internet. Para Amadei, o serviço de telecomunicações tem leitura restrita e consiste apenas em “transportar as informações entre pontos fixos”.

O suporte de acesso, diz, “não se confunde com este [de transporte de informações], uma vez que importa em novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações”.

Leia a íntegra da decisão

36 º Vara Cível da Capital.

Despacho Proferido

Processo nº 000.02.126782-0 RITO ORDINÁRIO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA

Autor: IDEC – INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Ré: TELECOMUNICAÇÕES DE SÃO PAULO S.A. (TELEFÔNICA) (Assistente) ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PROVEDORES DE ACESSO, SERVIÇOS E INFORMAÇÕES DE REDE INTERNET – IBRANET.SP

TERMO DE AUDIÊNCIA Aos dezesseis dias do mês de setembro do ano de dezesseis mil e quatro, às 15:00 horas, nesta Cidade e Comarca de São Paulo, Capital, na sala de audiências do Juízo da Trigésima Sexta Vara Cível do Foro Central, sob a presidência do MM. Juiz Direito – Dr. VICENTE DE ABREU AMADEI – comigo, escrevente a seu cargo, ao final assinado, foi aberta a audiência de instrução, debates e julgamento, nos autos e entre as partes acima mencionadas.

Apregoadas as partes compareceram os advogado do autor, Dra. Dulce Soares Pontes Lima, OAB/SP 113.345 e o Dr. Paulo Ferreira Pacini, OAB/SP 198.282 e a ré, por seu preposto, Sr. Lincoln Egydio Lopes, RG 19.213.466-8 e seu advogado, Dr. Daniel Grandesso dos Santos, OAB/SP 195.303.

Presente, nesta audiência, ainda, a assistente da ré, Abranet, por seu representante legal, Sr. Eduardo Fumes Parajo, RG 11.120.301-6 e sua advogada, Dra. Daniela de Oliveira Tourinho, OAB/SP 93.257. Iniciados os trabalhos, a proposta de conciliação resultou infrutífera.

As partes desistem, reciprocamente, do depoimento pessoal, o que foi deferido pelo MM. Juiz. Em seguida, foram ouvidas duas testemunhas da ré, em termos apartados. As partes informam que não têm outras provas a serem produzidas e pedem o julgamento. O MM. juiz então declarou encerrada a instrução. Em debates, o autor, sobre todas as provas aqui colhidas e temas envolvidos no processo, afirma que reitera o teor da inicial e demais manifestações, pugnando pela procedência da demanda.

Com a palavra o advogado da ré disse: “MM. Juiz, quanto às repostas do perito, observa que ele mantém o equívoco nas conclusões de seu laudo, nada obstante as informações técnicas estejam adequadas, equivoco este que decorre da confusão inadmissível entre todas as empresas do Grupo Telefônica com a ré.

“Por outro lado, ressalta, do ponto de vista técnico que o serviço Speedy não comporta o acesso à Internet, dispensando os provedores, bem como que, sob o ângulo jurídico, com atenção a LGT, não é admissível à ré a operacionalidade do sistema Internet pois isso está no plano de serviço de valor adicional que a ré não pode exercer. Pede, pois a improcedência da ação”.

Com a palavra a advogada da assistente da ré, em debates, manifestou-se: “MM. Juiz, a assistente também reitera os termos de suas manifestações, observando que o perito, embora correto na sua análise técnica, apresentou confusão do ponto de vista das relações societárias e jurídicas que envolvem o sistema, anotando-se que os provedores mantém contrato com a Telefônica Empresa, a qual não se confunde com a ré (Telesp).

“A Telefônica Empresa fez enormes investimentos para a infra-estrutura da rede IP, que foram repassados contratualmente para os provedores, em sub contratos, não havendo sentido em criar um monopólio em favor da Telesp, a qual teria que investir também elevados custos para a rede de infra-estrutura e até repassar para os usuários o valor respectivo. Por fim, salienta que o objetivo desta ação resultaria em monopólio para o acesso à Internet o que não está afinado com o sistema econômico brasileiro. Assim, pela improcedência. “


Então, o MM. Juiz proferiu a seguinte sentença:

“IDEC – INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, qualificado nos autos, promove ação civil pública contra TELECOMUNICAÇÕES DE SÃO PAULO S.A. (TELESP), também qualificada nos autos, alegando, em resumo, que a ré fornece o serviço denominado Speedy para diversos usuários, os quais ainda são obrigados a contratar provedores para o acesso à Internet, situação essa que poderia estar dispensada, pois desnecessária a presença dos provedores de banda larga, na medida em que a ré, pelo serviço tipo ADSL já tem condições de fazer diretamente a conexão na rede Internet.

Sustenta, ainda, que já houve decisão judicial que sustenta essa pretensão, bem como que o IDEC tem legitimidade ativa para tutelar o interesse de seus associados, consumidores, que fazem uso do serviço Speedy.

Juridicamente, ressalta, também, os princípios que direcionam os serviços de telecomunicações a desobediências das regras da ANATEL, bem como a necessidade de ressarcimento dos danos causados, via indenização em dobro do que os consumidores foram obrigados a pagar.

Pede, pois, inclusive em tutela antecipada, a procedência da demanda para que a ré seja condenada na obrigação de fazer de permitir ao associados do IDEC usufruir do serviço Speedy sem a contratação de provedor adicional, bem como que a ré se abstenha de suspender esse serviço em virtude da não contratação ou de provedor adicional, disponibilizando endereço eletrônico próprio para o IDEC viabilizar o cumprimento da prestação jurisdicional.

Pede, ainda, a condenação da ré, de forma genérica a indenizar seus associados pelos danos patrimoniais e morais sofridos em decorrência da prática abusiva da ré já mencionada. Com a petição inicial vieram documentos.

Inicialmente distribuído o feito por direcionamento à 11ª Vara Cível local, operou-se, na seqüência, livre distribuição (fls. 134) e, assim, o feito veio para este Juízo. Deferida a tutela antecipada (fls. 136/137), mas em grau de recurso de agravo essa tutela antecipada foi cassada, inicialmente pelo efeito suspensivo (fls. 143) e, posteriormente, pelo acórdão resultante do julgamento desse agravo (fls. 655/657). A ré, citada, contestou (fls. 402/437).

Em preliminar, sustentou a carência da ação por falta de interesse processual e por impossibilidade jurídica do pedido. No mérito, discorreu técnica e juridicamente sobre o serviço de telecomunicações e, especialmente do serviço Speedy, salientando que juridicamente, segundo as normas da lei 9.742/97 (LGT), bem como segundo as normas da ANATEL, não pode realizar serviço de valor adicional, que não se confunda com o serviço de telecomunicações e, portanto, também não pode promover serviço próprio de Internet que são diversos daqueles considerados de telecomunicação.

Salienta que deve haver respeito ao princípio de legalidade e aos limites em que foi concedido os serviços de telecomunicações. Por fim, ainda ressalta que além de não estar autorizada a prestar o serviço de acesso à Internet isso ainda lhe causaria enormes prejuízos, não se podendo disponibilizar à autora o que ela pretende, salientando-se, ainda, o ardil dela por não indicar sequer a relação de associados assinantes do Speedy.

Pede, pois, sejam acolhidas as preliminares ou julgada improcedente a demanda. Compareceu aos autos, ainda, na qualidade de assistente da ré, a Associação Brasileira dos Provedores de Acesso, Serviço e Informações da Rede Internet – SP. (ABRANET.SP) – (fls. 439/433), solicitando sua admissão no feito com assistente litisconsorcial da ré. Juntou documentos.

Houve na petição da Abranet.sp, sustentando a admissibilidade da assistência, bem como levantando preliminares de carência da ação e manifestando-se sobre o mérito da pretensão inicial, especialmente quanto a técnica e forma de operacionalidade do serviço Speedy e dos provedores de acesso, com referência a dependência de infra-estrutura específica remunerada, além das razões jurídicas expostas para obstar o pedido do autor (fls. 488/514).

Diante da decisão de fls. 487 que, dando cumprimento ao efeito suspensivo do agravo suspendeu a execução da liminar, veio agravo retido do autor (fls. 548/550). Manifestou-se o autor sobre o pedido de assistência litisconsorcial (fls. 552/556) e apresentou réplica (fls. 558/589), acompanhada de novos documentos. Indeferido o pedido de ingresso da Abranet.sp, como assistente (617/617,vº), em sede de agravo de instrumento essa decisão foi reformada e, então, admitida a assistente (fls. 252/254 dos 2º volume do agravo de instrumento, em apenso ao 4º dos autos deste processo).

Saneado o feito, com rejeição das preliminares levantadas, determinou-se a produção da prova pericial (fls. 659/659,vº). As partes apresentaram quesitos, indicaram assistentes e juntaram novos documentos. Veio o laudo pericial (fls. 780/803), acompanhado de documentos anexos. Vieram os parecer dos assistentes técnicos do autor e da ré (fls. 874/875 e 890/901). Formuladas perguntas ao perito, que as respondeu antes da audiência designada para a prova oral (fls. 923). Na audiência de instrução realizada hoje foram ouvidas duas testemunhas da ré.


Em debates, o autor reitera a inicial e suas manifestações, pela procedência da demanda, ao passo que a ré, bem como a assistente dela, manifestam-se sobre as provas produzidas, reiterando os argumentos fáticos e jurídicos antes deduzidos nas peças que apresentaram, pela improcedência da demanda.

É o relatório.

DECIDO.

Trata-se de ação civil pública destinada a promoção, pelos usuários do serviço Speedy, associados do autor, de acesso direto à Internet sem necessidade de vinculação a provedores ou ao pagamento de provedores. Na ocasião do saneamento do feito já ficou bem esclarecido, inclusive por força da inteligência que se extraia do teor do acórdão relativo ao agravo de instrumento que revogou a tutela antecipada (fls. 655/657), que o tema da controvérsia tinha dois ângulos de enfrentamento: um técnico e outro jurídico (fls. 659,vº).

Do ponto de vista técnico, entendo que é perfeitamente possível que a ré, sem qualquer vinculação a provedor de acesso, possa também prestar o serviço de acesso dos usuários à Internet. Neste sentido, o teor do laudo pericial (fls. 781/803), com explicita conclusão nesse sentido, após longas considerações em torno do serviço Speedy, o que ainda foi ratificado pelos seus esclarecimentos posteriores (fls. 923).

Outrossim, nada obstante as ponderações do assistente técnico da ré, nos sentido de que o Sisco 6.400 exerce apenas função de agregador de serviços o que não se confunde com o roteador (fls. 890/901), o que poderia importar em alguma dificuldade técnica, situação essa, também referida pela testemunha Rodrigo Kazu Yamamoto, ouvida hoje, o fato é que, tecnicamente, não haveria grandes transtornos para a concretização da conexão direta realizada pelo serviço Speedy, sem o recurso aos provedores de acesso.

Ressalto que tanto a testemunha Nilton César Tobita quanto a Rodrigo Kazu Yamamoto, não afastam a possibilidade técnica da mencionada conexão sem que se reporte aos provedores. Logo, sob o ângulo técnico, penso que não haveria óbice ou impedimento que não se pudesse transpor com facilidade para o acesso da internet, pelos usuários do serviço Speedy sem vínculo com provedores de acesso.

Todavia, sob o enfoque jurídico da questão, o tema é bem mais complexo e, em meu ver, o autor está sem razão, pois considerando toda a normatividade de regência em torno do serviço de telecomunicações, não se pode sustentar a viabilidade jurídica da empresa ré (Telesp) realizar o serviço de acesso à Internet.

De fato, o conjunto das normas da lei 9.472/97 (LGT), especialmente na inteligência de seus artigos 61 e 86, agregando-se a isso o teor da norma 4/95, aprovada pela Portaria MInisterial 148, de 31.05.1995, da Resolução ANATEL 73 e daquela de 25.11.1998, bem como da norma MC 4/95, levam a segura conclusão jurídica de que não é possível, para as operadoras de serviços de telecomunicação realizar serviços diversos daqueles especificamente considerados de telecomunicação e, no caso, o serviço de acesso à Internet não é propriamente daqueles que se pode qualificar como de mero meio de transmissão de informação, mas sim, serviço que se enquadra na bitola do chamado serviço de valor adicional (artigo 62 da Lei 9.472/97), o que é vedado para as empresas de telecomunicações.

Impõe-se melhor explicitar esse ponto e, para isso, ressalto a atenção que se deve ter ao voto do Ministro Domingos Francili que se pode colher no Recurso Especial nº 456.650-Paraná, do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (fls. 739/754).

Não se confundido serviço de valor adicionado (artigo 61 da LGT – fls. 208), com serviço de telecomunicações, a ANATEL ainda examinou a situação de modo exaustivo e chegou à mesma conclusão (fls. 772/778), observando que serviço de telecomunicações têm leitura restrita, pois são apenas aqueles destinados a transportar as informações entre pontos fixos, ao passo que a qualificação do serviço de valor adicionado acrescenta aos serviços de telecomunicações suporte que não se confunde com este, uma vez que importa em novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações.

Assim, como os serviços próprios dos provedores de serviços a conexão à Internet terminaram prestando esse tipo de serviço de valor adicionado e, porque a ré tem óbice jurídico decorrente da legislação e da concessão do serviço público, para isso, não se viabiliza o pedido deduzido pelo autor sob o ângulo do nosso direito positivo. Logo, a demanda é improcedente.

Em face do exposto, declarando extinto o processo nos termos do artigo 269, I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE a demanda. Condeno o autor no pagamento das despesas processuais, bem como no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 15% sobre o valor da causa atualizado desde o ajuizamento da ação.

Observo, no entanto, que as verbas de sucumbência só poderão ser exigidas se ocorrer a hipótese do artigo 11, § 2º, da Lei 1060/50, uma vez que já deferida a gratuidade judiciária conforme o artigo 87 do Código de Processo Civil (fls. 137). Dou a sentença por publicada em audiência e os presentes por intimados. Registre-se.” NADA MAIS. Eu, Carlos Vinci, escrevente, digitei e subscrevi.

VICENTE DE ABREU AMADEI

Juiz de Direito

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!