Meio termo

Diretoria da CVM decide aplicar multa ao Banco Opportunity

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23 de setembro de 2004, 19h38

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) aplicou multa ao banco Opportunity e seus executivos no julgamento sobre a existência de investidores residentes no Brasil com aplicações no Opportunity Fund, fundo sediado nas Ilhas Cayman. O procedimento fere a regulamentação do Banco Central.

Os diretores da CVM decidiram aplicar multa de R$ 100 mil ao Banco Opportunity S/A e de R$ 120 mil ao presidente da instituição, Dorio Ferman. A direção da autarquia multou também o Opportunity Asset Management Ltda. e sua diretora Verônica Dantas em R$ 120 mil cada um. O Opportunity Asset Management Inc. também deverá pagar R$ 20 mil.

A decisão foi pelo meio termo. O colegiado decidiu que, apesar de não ter ficado provada a existência de aplicações de residentes no Brasil no fundo registrado nas Ilhas Cayman, o Opprotunity foi negligente porque abriu essa possibilidade.

Carmine Gesu Rago, diretor do Banco ABN AMRO Real, custodiante do fundo, também recebeu multa de R$ 20 mil. Cabe recurso ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional.

Leia a decisão

Decisão proferida, por unanimidade, pelo Colegiado da CVM no julgamento, em 23/09/2004, do Processo Administrativo Sancionador CVM nº 08/01.

Indiciados:

Banco Opportunity S/A

Dorio Ferman

Opportunity Asset Management Inc.

Opportunity Asset Management Ltda.

Veronica Valente Dantas

Banco ABN AMRO Real S/A.

(ex- Banco ABN AMRO S/A)

Carmine Gesu Rago

Relator:

Diretor Eli Loria

Vistos, relatados e discutidos os autos, o Colegiado da CVM, por unanimidade de votos decidiu:

1) Aplicar aos indiciados as seguintes penalidades, de acordo com o disposto no artigo 11 da Lei nº 6.385/76:

a. Banco ABN AMRO Real S.A., ex-Banco ABN AMRO S.A, e seu diretor Carmine Gesu Rago – pena individual de multa pecuniária no valor de R$ 20.000,00 por negligenciarem na supervisão do cumprimento do regulamento do Opportunity Fund, bem como do compromisso assumido pelo Opportunity Fund, ratificado posteriormente pelo Opportunity Asset Management Ltda. e Opportunity Asset Management Inc. de inserir, nos prospectos, regras restritivas relativas à subscrição de quotas do sub-fundo Opportunity Fund, por investidores residentes e domiciliados no país.

b. Opportunity Asset Management Ltda., Opportunity Asset Management Inc. e seus diretores, Dorio Ferman e Verônica Valente Dantas – pena individual de multa pecuniária no valor de R$ 20.000,00 pelo cumprimento a destempo do compromisso de inserir, nos prospectos, regras restritivas relativas à subscrição de quotas do sub-fundo Opportunity Fund, por investidores residentes e domiciliados no país.

c. Opportunity Asset Management Ltda., gestor do Opportunity Fund e sua diretora Verônica Valente Dantas, Banco Opportunity S.A. e seu Presidente, Dorio Ferman – pena individual de multa pecuniária no valor de R$ 100.000,00 pelo esforço na colocação pública no Brasil de cotas de sub-fundos de Anexo IV do Opportunity Fund vedados a residentes e domiciliados no país.

2) Comunicar ao Ministério Público a presente decisão. Os indiciados punidos terão um prazo de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento de comunicação da CVM, para interpor recurso, com efeito suspensivo, ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, nos termos do parágrafo único do artigo 14 da Resolução nº 454, de 16.11.77, do Conselho Monetário Nacional, prazo esse, ao qual, de acordo com orientação fixada pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, poderá ser aplicado o disposto no art. 191 do Código de Processo Civil, que concede prazo em dobro para recorrer quando litisconsórcios tiverem diferentes procuradores.

Proferiram defesa oral os Drs. Francisco Antunes Maciel Müssnich, advogado dos indiciados Banco Opportunity S/A, Dorio Ferman, Opportunity Asset Management Inc., Opportunity Asset Management Ltda. e Veronica Valente Dantas; e Fernando Crespo Queiroz Neves, advogado dos indiciados Banco ABN AMRO Real S/A. (ex- Banco ABN AMRO S/A) e Carmine Gesu Rago.

Presente à sessão de julgamento o Dr. Adail Blanco, representante da Procuradoria Federal Especializada na CVM.

Participaram do julgamento os seguintes membros do Colegiado: Diretores Eli Lori, Relator, e Wladimir Castelo Branco Castro, e o Presidente Marcelo Fernandez Trindade. Não participaram do julgamento, em razão de impedimento já manifestado, os Diretores Norma Jonssen Parente e Luiz Antonio de Sampaio Campos.

RELATÓRIO

Senhores Membros do Colegiado:

Trata-se do julgamento do Inquérito Administrativo CVM 08/01, instaurado originalmente com a finalidade de apurar a eventual oferta a investidores residentes e domiciliados no Brasil de cotas do Opportunity Fund, investidor estrangeiro registrado na CVM na forma do Anexo IV à Resolução CMN n.° 1.289/87, e Instrução CVM n.° 169/92.


O pedido de abertura de Inquérito Administrativo constante do MEMO/CVM/SIN/GIE/N.° 002/01 (fls. 02 a 09) foi aprovado nas reuniões do Colegiado de 8 e 22 de maio de 2001 (fls. 027 a 046). A Comissão de Inquérito responsável pela investigação foi instaurada pela Portaria/CVM/PTE/N° 112/01, de 6 de agosto de 2001, posteriormente modificada pela Portaria/CVM/PTE/N° 230/01, de 9 de novembro de 2001 (fls. 01 e 469).

A Secretaria da Receita Federal foi comunicada das investigações em curso nesta CVM pelo Ofício/CVM/SFI/N° 029/01, de 2 de julho de 2001 (fls. 237 e 238). Informações ao Ministério Público Federal também foram prestadas, por meio do Ofício/CVM/PTE/Nº 143/01, de 03 de maio de 2001, complementado pelo Ofício/CVM/SFI/N° 028/01, de 29 de junho de 2001 (fls. 235 e 236).

Adicionalmente, em 23 de agosto de 2001, por ordem do MM. Juiz da 3ª Vara Federal Criminal do Estado do Rio de Janeiro, foram fornecidas informações à Polícia Federal sobre o regulamento do Opportunity Fund, como investidor de Anexo IV, bem como cópia integral dos autos (fls. 907, 908 e 974). Em 06 de dezembro de 2001 e 22 de maio de 2002, o Ministério Público Federal requereu cópia integral dos autos, tendo sido atendido em 11 de dezembro de 2001 e 27 de maio de 2002, respectivamente (fls. 571, 875, 922 e 933).

Tendo em vista o requerimento apresentado pelo então Deputado Federal Ricardo Berzoini, datado de 2 de julho de 2002, também foram prestadas informações acerca do Opportunity Fund, em 14 e 22 de agosto de 2002 (fls. 1.037 a 1.044 e 1.067 a 1.070).

De acordo com a Comissão de Inquérito, restou caracterizada a ocorrência de oferta pública a pessoas residentes e domiciliadas no país, de cotas do Opportunity Fund, em infração ao Regulamento Anexo IV à Resolução CMN n.º 1.289/87, combinado com o inciso VI do art. 1º da Instrução CVM n.º 169/92.

Nas reuniões de 23 e 24 de junho de 2004, este Colegiado rejeitou a proposta de termo de compromisso apresentada por Opportunity Asset Management Ltda. (doravante, “OAM Ltda.”), Opportunity Asset Management Inc. (“OAM Inc.”), Banco Opportunity S.A., Verônica Valente Dantas e Dório Ferman (fls. 2904 e segs.).

Em 03 de setembro de 2004, foi recebido nesta Autarquia o OFÍCIO/MPF/PRDF/LF Nº 474, datado de 30 de agosto de 2004, em que o Exmo. Sr. Procurador da República no Distrito Federal, Luiz Francisco Fernandes de Souza, relata ocorrência de certas movimentações financeiras envolvendo pessoas físicas e jurídicas, intermediadas por um banco norte-americano (MTB Bank), e que teriam por finalidade o envio de recursos de origem alegadamente ilícita ao Opportunity Fund, localizado nas Ilhas Cayman.

Tais informações, segundo o mencionado Procurador, teriam sido objeto de matéria publicada no jornal Folha de São Paulo sobre o “Caso Banestado”, sendo que a documentação completa que supostamente comprovaria as referidas transações financeiras teria sido enviada por autoridades norte-americanas ao Brasil e estaria de posse da Comissão Parlamentar de Inquérito instaurada para investigar o “Caso Banestado”, presidida pelo Exmo. Senhor Senador da República, Antero Paes de Barros. Por fim, ressaltando a importância de tais informações, que uma vez comprovadas poderiam, eventualmente, trazer elementos que influenciassem as conclusões da Autarquia quanto aos assuntos deste inquérito, recomenda o mencionado Ofício, sejam os documentos a elas relativos obtidos antes do julgamento.

Em 06 de setembro de 2004 foi expedido o OFÍCIO/CVM/PTE/Nº 207/2004 dirigido ao Excelentíssimo Senador Antero Paes de Barros e Presidente da CPMI – “BANESTADO” encaminhando-lhe cópia do ofício recebido da Procuradoria da República, solicitando-lhe confirmação da disponibilidade e existência das informações ali referidas, e, por fim, em caso afirmativo a ambas as questões, requeria-se a remessa dos competentes documentos a esta Comissão, encaminhando-se cópia do ofício enviado ao Senador Antero Paes de Barros ao Procurador da República Luiz Francisco de Souza, em 06 de setembro de 2004, através do OFÍCIO/CVM/PTE/Nº 206/2004.

Em 13 de setembro de 2004 a CVM recebeu o OFÍCIO/MPF/PRDF/LF Nº 487, datado de 3 de setembro de 2004, em que o mesmo Procurador da República do Distrito Federal encaminha cópia de ação judicial proposta perante o MM. Juízo da 14ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, e recomendando a esta Comissão que “o Inquérito n. 08 seja sobrestado até que os trabalhos da CPI do BANESTADO terminem”, bem como “suspenda o julgamento e converta em diligência, requerendo ao presidente da CPI do BANESTADO que remeta a esta autarquia os dados referentes ao OPPORTUNITY FUND”. Por fim, o ofício manifesta o entendimento daquela Procuradoria no sentido de que “o importante é que o inquérito seja instruído corretamente e para isso é ABSOLUTAMENTE NECESSÁRIO que seja obtida a lista completa dos quotistas do OPPORTUNITY FUND”.


Em 14 de setembro de 2004, a CVM enviou resposta àquela Procuradoria através do OFÍCIO/CVM/PTE/Nº 215/2004, informando-lhe ainda não haver resposta às solicitações remetidas à CPI do Banestado, bem como também de que a recomendação de sobrestamento, suspensão e conversão em diligência do inquérito administrativo CVM nº 08/01, seria encaminhada para exame do Colegiado da Autarquia quando da sessão de seu julgamento, ressalvando-se, desde então, que eventual decisão denegatória de sobrestamento se daria sem prejuízo da análise de quaisquer outros fatos que venham a ser posteriormente comprovados e que eventualmente se traduzam em irregularidades.

Em 21 de setembro de 2004 foi recebida pela Autarquia, correspondência do Senador Antero Paes de Barros, Presidente da CPMI – “BANESTADO”, datada de 14 de setembro de 2004, OFÍCIO Nº 1250/2004, informando que “obedecidas a normas legais, as informações relativas ao MTB Bank foram encaminhadas ao Ministério Público Federal, a quem cabe institucionalmente, entre outras as funções de investigação e de instauração de inquéritos.” e que “para atender a solicitação dessa Autarquia seria necessário submetê-la à deliberação do plenário da CPMI, sendo praticamente impossível precisar prazo para tal decisão.”

DA ACUSAÇÃO

Da leitura do Relatório da Comissão de Inquérito (fls. 2088 a 2119), depreende-se que esta fundamentou suas conclusões em depoimentos tomados e nas informações prestadas pelas pessoas envolvidas. Foi-lhe impossível obter a identificação dos cotistas do Opportunity Fund, não obstante os inúmeros esforços despendidos neste sentido (fls. 2110).

De início, a Comissão de Inquérito verificou que a expansão das atividades do grupo Opportunity em São Paulo foi concomitante ao deferimento, pela CVM, do pedido de inclusão do Opportunity Fund na conta coletiva do ABN Amro Bank N.V., em junho de 1996. Ressalva a Comissão que o deferimento deste pedido de inclusão estava condicionado ao enquadramento do investidor na alínea “b” do inciso VI do art. 1º da Instrução CVM no 169/92.

Em 1° de agosto de 1997, alternativamente à exigência do parecer de auditor independente atestando a adequação do investidor estrangeiro à regulamentação em vigor, o Colegiado da CVM aceitou a proposta de inserção de regras nos prospectos e regulamentos do fundo, vedando a participação de investidores domiciliados ou residentes no país (fls. 2112 e 2113).

Não obstante, somente em 25 de junho de 1998, diante do iminente cancelamento do registro e, por conseguinte, da suspensão dos negócios da carteira de investidor estrangeiro (Anexo IV), foi que o Banco ABN apresentou à CVM o Private Placement Memorandum do Opportunity Fund, contendo as vedações aprovadas pelo Colegiado da CVM em agosto do ano anterior.

Dada a excessiva demora no atendimento à exigência desta autarquia, não estaria demonstrado qualquer “zelo” por parte da OAM Ltda. e do Banco ABN no cumprimento da regulamentação em vigor (fls. 2113).

Tal negligência teria possibilitado que em julho de 1997, “Rosângela Browne, funcionária do Banco Opportunity, atuando em nome e por conta do Opportunity Fund, mantivesse contatos com Luis Demarco, então funcionário da GP Investimentos, que resultaram na sua subscrição de US$ 250 mil em cotas do sub-fundo Brazilian Hedge, em 05.08.97, conta 182109-716”. Continuou a Comissão: “(…) tal ato, em si, denota ter havido esforço do Banco Opportunity para a colocação de cotas para o investidor Luis Demarco” (fls. 2113). Na época, Luis Demarco não seria sócio ou administrador de qualquer empresa do grupo Opportunity – o que viria a ocorrer apenas em novembro de 1997. ( fls. 2113).

Neste mesmo sentido, também teria ocorrido uma operação em 31 de outubro de 1997, no valor de US$ 500 mil, em cujo boletim de subscrição (fls. 93) a Sra. Rosângela Browne confirma ter sido a pessoa responsável por seu preenchimento (fls. 517). Acerca desta mesma operação, o Sr. Luis Demarco assegurou ser seu titular, assim como ter alocado esses recursos em dois sub-fundos do Opportunity Fund. Tais aplicações teriam sido confirmadas em nome do Sr. Luis Demarco pelo Midland Bank Trust Corporation Limited, então registrar and transfer agent do Opportunity Fund (fls. 77 e 78).

Neste ponto, a Comissão de Inquérito afirma que “não se pode caracterizar que essa subscrição devesse estar sob a égide das regras do Regulamento Anexo IV à CMN no 1.289/87, aprovado pela Resolução CMN no 1.832/91, porquanto não se perfila com as regras próprias do sub-fundo Brazilian Equities” (fls. 2114). Continua a Comissão: “Por outro lado, ainda que não comprovada a ocorrência de subscrição de cotas do sub-fundo Brazilian Equities (…), a priori, não se pode descartar a possibilidade de isto ter ocorrido com a interveniência do Banco Opportunity, face à disponibilidade de material de divulgação dos sub-fundos do Opportunity Fund para interessados pelo escritório do banco, na cidade de São Paulo” (fls. 2114).


Acerca da alegação de Verônica e de Daniel Dantas de que tal subscrição de 31.10.97 seria de titularidade da OAM Inc., entendeu a Comissão que tais argumentos “não lhes aproveitam (…), haja vista que nesse boletim [de subscrição], apenas a parte superior, destinada à identificação do subscritor, está preenchida com o nome de Luis Roberto Demarco Almeida, estando os demais campos destinados ao endereço e a instruções para resgates e pagamento de dividendos em branco” (fls. 2114).

Afirmou ainda a Comissão de Inquérito que “não foi possível a esta Comissão comprovar se os recursos alocados no sub-fundo Brazilian Agressive Equities foram aplicados ou não em segmentos do mercado de valores mobiliários, de modo a sujeitá-lo às regras de Anexo IV” (fls. 2114).

Como ponto fulcral dos fundamentos de sua conclusão, esclarece a Comissão que “as informações prestadas pelos funcionários lotados no escritório de São Paulo do Banco Opportunity, (…) de que prestavam ao público interessado esclarecimentos acerca das características e da performance dos fundos off-shore e que, (…) dispunham de prospectos e material para divulgação dos mesmos, assim como o próprio formulário do boletim de subscrição que era repassado para os investidores interessados, em conjunto, reforçam o entendimento de que eram envidados esforços para a colocação de cotas do Opportunity Fund naquela praça, por conta e ordem do Banco Opportunity, face à atuação direta de seus funcionários” (fls. 2114 e 2115).

Relativamente ao Banco ABN e a seu Diretor Carmine Rago, destaca a Comissão de Inquérito que “a entrega do original do Private Placement Memorandum do fundo à CVM somente ocorreu em 25.06.98, em decorrência de o Banco ABN tê-lo recebido com atraso” (fls. 2115). A tradução deste documento só foi entregue à CVM em fins de setembro de 1998, tendo em vista a necessidade de tradução juramentada, legalização notarial e legalização consular (fls. 2115).

Tal demora caracterizaria uma “total falta de empenho do Banco ABN em zelar pelo fiel cumprimento das normas (…) e do compromisso assumido junto a esta Autarquia, de inserir a restrição nos prospectos e demais documentos do Opportunity Fund de imediato” (fls. 2115). Essa demora e ausência de supervisão no “cumprimento do regulamento do Opportunity Fund, em particular do sub-fundo Brazilian Equities, de Anexo IV, do qual era o administrador e o custodiante local” possibilitou que o Banco Opportunity “oferecesse publicamente cotas desse sub-fundo do Opportunity Fund para investidores com características contrárias ao que dispõe o item VI do art. 1º da Instrução CVM no 169/92” (fls. 2115).

No entender da Comissão de Inquéito, OAM Ltda. e OAM Inc. “nada fizeram no sentido de impedir que investidor não habilitado viesse a realizar subscrições de cotas desse fundo” (fls. 2116), enquanto que a Instrução CVM nº 169/92, art. 1º, VI, “(…) é claríssima quanto à vedação estabelecida pela Autarquia, para aplicações nos mercados financeiros e de capitais, que restringiu a participação nos fundos de investimentos sob a égide do Regulamento Anexo IV à Resolução CMN nº 1.289/87, aprovado pela Resolução CMN no 1.832/91 somente para pessoas físicas e jurídicas residentes e domiciliadas no exterior” (fls. 2116). Assim, no seu entender, “(…) o Banco ABN, instituição responsável pela administração da carteira e o custodiante local do Opportunity Fund, negligenciou o cumprimento de suas obrigações perante a CVM, deixando de exigir de seu cliente a confecção e a apresentação da documentação logo após a aprovação do recurso pelo Colegiado (…)” (fls. 2116).

Convém, ainda, repetir a importância para a acusação do depoimento da Sra. Rosângela Browne, funcionária do grupo Opportunity, que “(…) confirmou (…) que preencheu dois Subscription Agreements para Luis Demarco, destinados à aplicação nos sub-fundos do Opportunity Fund, Money Market e Brazilian Hedge”, e do próprio Sr. Luís Demarco, que confirmou ser o favorecido das subscrições. A estes depoimentos, somar-se-iam as confirmações dos RTAs e as planilhas, possibilitando assim que a Comissão de Inquérito pudesse constatar “[a] colocação de cotas desses sub-fundos junto a investidor residente e domiciliado no País” (fls. 2117).

Corrobariam esta conclusão “a existência e disponibilidade de material de divulgação dos sub-fundos no escritório de São Paulo” e uma “autorização tácita” da administração do grupo Opportunity “para que os funcionários do escritório prestassem informações acerca do valor das cotas e da performance dos fundos aos interessados, sem restrição ou mesmo a sua identificação” (fls. 2117).

DAS IMPUTAÇÕES

Face às evidências obtidas e acostadas aos autos, concluiu a Comissão de Inquérito pela responsabilização das seguintes pessoas (fls. 2117 e 2118):


— Banco ABN AMRO Real S.A., ex-Banco ABN AMRO S.A, e Carmine Gesu Rago, diretor responsável pela administração de carteiras do Banco ABN AMRO S.A. junto à CVM, entre 18.07.96 e 07.01.99, “por negligenciarem na supervisão do cumprimento do regulamento do Opportunity Fund, bem como do compromisso assumido pelo Opportunity Fund, ratificado posteriormente pelo Opportunity Asset Management Ltda. e Opportunity Asset Management Inc” e “pela conseqüente oferta pública, por parte do Banco Opportunity, a pessoas residentes e domiciliadas no Brasil, de cotas de sub-fundo do Opportunity Fund”;

— Opportunity Asset Management Ltda., gestora do Opportunity Fund e Verônica Valente Dantas, diretora responsável pela administração de carteiras junto à CVM, “pela centralização, na praça do Rio de Janeiro, dos negócios off-shore iniciados pelo Banco Opportunity S.A., em São Paulo”, “pelo seu direcionamento para o Banco ABN-AMRO, Cayman”, e “pela orientação passada ao quadro funcional de atender às solicitações de posição de quotas, trocas e resgates, dentre os quais os sub-fundos de Anexo IV (Brazilian Equities) do Opportunity Fund”;

— Banco Opportunity S.A. e seu Presidente, Dorio Ferman, “por atuarem como se fossem representantes do Opportunity Fund credenciado junto a esta CVM” e “disporem da estrutura administrativa e funcional do Banco na cidade de São Paulo em esforço na colocação pública de cotas de sub-fundos do Opportunity Fund”;

— Opportunity Asset Management Ltda., Opportunity Asset Management Inc. e seus diretores, Dorio Ferman e Verônica Valente Dantas, “por subscreverem compromisso de inserir, nos prospectos, regras restritivas relativas à subscrição de quotas do sub-fundo Opportunity Fund, por investidores residentes e domiciliados no país, sem que tal obrigação haja sido cumprida, possibilitando a ocorrência de subscrições contrárias ao disposto no Inciso VI, do art. 1º, da Instrução CVM no 169/92”.

DAS DEFESAS

Devidamente intimados e após sucessivas prorrogações de prazo, os acusados apresentaram defesas tempestivas resumidas abaixo em apertada síntese.

DA DEFESA APRESENTADA POR OPPORTUNITY ASSET MANAGEMENT LTDA., OPPORTUNITY ASSET MANAGEMENT INC., BANCO OPPORTUNITY S.A., VERÔNICA VALENTE DANTAS E DÓRIO FERMAN

DAS PRELIMINARES

Alegam os defendentes a nulidade do processo e seu conseqüente arquivamento, pois seria ilegal a acusação baseada em capitulação legal que não descreva as supostas condutas ilegais imputadas pela Comissão de Inquérito, uma vez que a norma apontada nas intimações descrevem unicamente os requisitos para se caracterizar um investidor institucional de acordo com o antigo Regulamento Anexo IV, e não prevê ou veda as condutas descritas nas intimações (fls. 2169 a 2177).

Alegam ainda que seria ilegal o prosseguimento de um processo administrativo do qual não conste manifestação por parte da autoridade acusadora da norma disciplinar caracterizadora de conduta que tenha sido supostamente infringida.

Pelo princípio da ampla defesa, consideram que seria obrigatório que já na acusação, esteja devidamente apontada a norma de direito material tida pela Administração como tendo sido infringida que consigne a conduta supostamente irregular. Ainda pelo princípio da legalidade e pelo princípio da tipicidade que não seria permitido que os Defendentes sejam acusados de ilícito sem definição prévia da conduta punível e determinação da sanção aplicável em lei e, ainda, sem a exata adequação do ato específico à conduta descrita como irregular na correspondente norma.

Adicionalmente, segundo os defendentes, os procedimentos adotados pela Comissão de Inquérito teriam resultado em cerceamento de defesa, uma vez que (fls. 2177 a 2184):

— houve uma demora injustificada na juntada e disponibilização de documentos relevantes;

— os procedimentos na tomada de depoimentos impediram a exata compreensão do contexto em que as declarações foram prestadas;

— nos primeiros Termos de Declarações as perguntas feitas pela Comissão de Inquérito não foram lavradas e depois passaram a ser;

— houve uma inércia injustificável diante de pedido de produção de prova e de investigações relevantes solicitadas pelos Defendentes.

DO MÉRITO

Inicialmente sustenta a defesa que a “a Comissão de Inquérito (…) reconhece a total impossibilidade de atribuir responsabilidades, afirmando categoricamente que não encontrou evidência que implicasse a conclusão referente às supostas ilicitudes dos acusados” (fls. 2184). A defesa ainda destaca que “[o] Relatório de Conclusão, equivocadamente, apesar de não conseguir provar a ocorrência de qualquer ilicitude, visivelmente frustrado, chega ao ponto de afirmar que não foi comprovada a ocorrência de ilícito, mas o mesmo poderia ter ocorrido” (fls. 2189).

Os defendentes ainda sustentam que a acusação de descumprimento da decisão do Colegiado de 01/08/97, que determinou que em todos os documentos relacionados à oferta de cotas do fundo constasse vedação à participação de investidores residentes e domiciliados no Brasil como cotistas do fundo “…é inteiramente equivocada vez que a obrigação assumida junto ao Colegiado da CVM foi efetivamente cumprida” e que “[c]hega a ser irônica a situação a que os Defendentes foram chamados a se defender” (fls. 2192).

Continua a defesa argumentando que providenciou o imediato cumprimento da obrigação assumida, conforme se verifica no Boletim de Subscrição de 31.10.97 (fls. 2029), nos quais já constava a restrição exigida pela CVM. Sustenta que na mesma época estava sendo negociada a substituição do RTA do Midland Bank para ABN AMRO Cayman, sendo necessário aguardar a conclusão da negociação, a revisão pelos advogados nacionais e estrangeiros dos novos documentos, para envio à impressão gráfica e posteriormente para distribuidores (fls. 2195 e 2196).

A defesa ainda tenta descaracterizar a relação de trabalho entre o Banco Opportunity e Daniela Góes, Terezinha Esteves, Rosângela Browne, Bernardo Patury e Ricardo Kauffman, juntando Relações Anuais de Informações Sociais – RAIS, referentes aos anos-base de 1997, 1998 e 1999, nos quais não constam os seus nomes como empregados do mesmo, bem como certidão negativa emitida pela Junta Comercial do Estado de São Paulo e certidão simplificada pela Junta Comercial do Estado do Rio de Janeiro (fls. 2197 a 2198, e anexos).

A defesa sustenta, ainda, que a Comissão de Inquérito declarou que seu juízo não foi formulado em meios probatórios eficientes, mas somente em depoimentos contraditórios (fls. 2199). Especificamente no caso da depoente Rosângela Browne, alega a defesa que esta foi procurada pelo Sr. Demarco (e não o procurou), e que não sabia se a aplicação fora liquidada financeiramente. Alega ainda a defesa que não houve efetiva transferência de cotas, no caso da aplicação que teria sido realizada pelo Sr. Demarco, pois o respectivo RTA nunca foi enviado (fls. 2205 a 2209).

Adicionalmente, alega ainda a defesa que o fato dos superiores de Rosângela Browne, Boris Muroch e Maria Emmanouillides desconhecerem tais operações e quem as tenham autorizado demonstraria o caráter não oficial da ajuda fornecida pela Sra. Browne (fls. 2206 a 2207).

Sustenta ainda a defesa que as confirmações do RTA de fls. 77 e 78 não comprovam a subscrição de US$ 500.000,00 pelo Sr. Demarco em 31 de outubro de 1997, no sub-fundo Money Market, nem o redirecionamento para os sub-fundos Agressive Equities (no valor de US$ 150.000,00) e Brazilian Fixed Income Derivatives (no valor de US$ 350.000,00). Tais documentos apenas confirmariam a aplicação de US$ 150.000,00 no sub-fundo Agressive Equities e US$ 350.000,00 no sub-fundo Brazilian Fixed Income Derivatives, sem qualquer referência a que tais investimentos comprovariam um switching das cotas do sub-fundo Money Market para os outros dois sub-fundos, sequer apresentando a proporção da troca de cotas.

Alegam ainda os defendentes que não consta dos autos a confirmação do RTA de que teria sido realizado o investimento de Demarco no valor de US$ 500.000,00 no sub-fundo Money Market e portanto este investimento nunca se realizou (fls. 2209 a 2214).

Argumentam ainda os defendentes que caso tivesse efetivamente sido realizado mencionado investimento, teria o Sr. Demarco cometido crime de falso testemunho e falsidade ideológica, pois no referido Boletim já constava declaração expressa do subscritor de que não seria residente no Brasil e que declarara à Comissão de Inquérito que nunca fora informado que havia impedimento para pessoas residentes no Brasil efetuarem esse tipo de aplicação (fls. 2211).

Alegam ainda os defendentes que o investimento que efetivamente ocorreu em 31 de outubro de 1997 não foi o investimento no sub-fundo Money Market, que estaria representado pelo Boletim de Subscrição às fls. 93, mas sim o investimento nos sub-fundos Agressive Equities e Brazilian Fixed Income Derivatives, representado pelo Boletim de Subscrição às fls. 70, realizado por OAM Inc, com sede nas Ilhas Cayman e portanto, não residente no Brasil (fls. 2209 a 2211). O nome do Sr. Luis Demarco no Boletim de Subscrição seria mera “referência interna”, pois este valor só seria devido a título de bônus de performance. Argumentam os defendentes que o Sr. Demarco nunca possuiu poderes para movimentar tais investimentos (fls. 2213 a 2214), e que o switching request somente realizou-se mediante formulário assinado pela OAM Inc. (fls. 163) e confirmado no relatório de negócios realizados pelo Opportunity Fund (fls. 583).

Adicionalmente, alega a defesa que o “redemption request”no valor de US$ 30.000,00 foi assinado pela OAM Inc., sendo que o resgate só foi enviado a Demarco após instruções da OAM Inc., posteriormente confirmada através de carta anexa enviada ao ABN Amro Trust Company (Cayman) Ltd.

Um dos defendentes, o Sr. Dório Ferman, em aditamento de termo de declarações às fls. 866/874 apresenta diversas incongruências nas planilhas que segundo o Sr. Demarco seriam utilizadas pelo grupo Opportunity como extratos oficiais, enviadas periodicamente sobre investimentos do próprio Sr. Demarco e e da Sra. Maria Fernanda de Azevedo Marques no Opportunity Fund. Segundo o Sr. Ferman, estas não se constituiriam extratos oficiais do Banco Opportunity, do RTA ou do Opportunity Fund, visto que (fls. 2215 e segs.):

— à época o Banco Opportunity não utilizava o meio eletrônico (e-mail) na comunicação com seus clientes, sendo que tal prerrogativa somente veio a ser permitida pelo Banco Central do Brasil em 2001;

— o Banco Opportunity só enviava informações oficiais periódicas relativas a fundos por ele administrados, que são só os locais;

— as informações periódicas sobre o Opportunity Fund são enviadas diretamente pelo seu RTA, sediado em Cayman, sendo que Demarco não recebia tais planilhas, conforme seu próprio depoimento;

— as planilhas de fls. 100, 144 e 596 somam valores em moedas distintas (dólares americanos e reais);

— erros primários demonstram que as informações foram inseridas manualmente, não sendo geradas por qualquer sistema do Opportunity;

— não há qualquer tipo de padrão de apresentação e formatação, nem qualquer critério de ordenação das aplicações por data ou valor, sendo que valores em dólares foram escritos e somados como se fossem valores em reais e, sinais de rentabilidade dos fundos de ações foram invertidos;

— o papel timbrado utilizado para confecção dos e-mails são da CVC/Opportunity Equity Partners, que não possui qualquer relação com o Banco Opportunity S/A ou o Opportunity Fund;

— o CVC/Opportunity Equity Partners é a empresa em que Demarco trabalhou e as planilhas nunca foram enviadas por empregados desta empresa;

— mesmo que Banco Opportunity S/A, OAM Ltda ou CVC/Opportunity Equity Partners quisessem enviar tais planilhas, não teriam como fazê-lo, pois nenhum dos três possuía a identificação dos investidores que são detidas pelo RTA;

— a planilha de fls. 587 foi repetida outras vezes com texto em português, demonstrando ser uma montagem;

— várias planilhas foram juntadas repetidas vezes para fazer parecer um número bastante volumoso de provas contra o Opportunity Fund;

— às fls. 100 consta uma planilha datada de 12.03.99 enviada anexa a e-mail de 16.03.98;

— às fls. 98 consta uma planilha datada de 16.03.98, na qual consta uma aplicação de 19 de março de 1998 e o valor das cotas ali indicadas dos sub-fundos do Opportunity Fund e dos fundos nacionais não correspondem ao valor das mesmas na data-base da planilha;

— a Sra. Daniela de Góes nunca trabalhou no CVC/Opportunity Equity Partners;

— a Opportunity Asset Management Ltda possuía endereço em São Paulo, na Av. Brigadeiro Faria Lima, nº 2179, 1° andar enquanto que CVC/Opportunity Equity Partners possuía endereço em São Paulo, na av. Brigadeiro Faria Lima, nº 2179, 7° andar.

A defesa admite ainda a existência de material de divulgação dos sub-fundos no escritório de São Paulo e a autorização tácita dada pela administração do Opportunity para que os empregados do escritório prestassem informações acerca do valor das cotas e da performance dos fundos aos interessados. No entanto, este material não seria utilizado para venda, pelo simples fato de não estar em português, nem haver indicação de qualquer pessoa ou endereço de contato do Opportunity Fund no Brasil. Justificou-se a existência desse material pelo fato de que, como gestora do Opportunity Fund, a OAM Ltda deveria deter informações quanto à rentabilidade e performance dos sub-fundos do Opportunity Fund, assim como manter contato com as instituições estrangeiras responsáveis pela colocação das cotas do Opportunity Fund no exterior (Private Banks), os quais promovem visitas para checagem de procedimentos.

Em relação à utilização de tal material para fins comerciais, alega que nada ficou demonstrado e que os depoimentos são contraditórios e imprecisos (fls. 2221 e segs.).

Alegam ainda os defendentes que a simples prestação de informações quanto à rentabilidade dos sub-fundos do Opportunity Fund não constitui qualquer irregularidade, e tentam eximir-se de sua responsabilidade pelo fato de outra instituição financeira disponibilizar diversas informações sobre a rentabilidade e performance de fundos offshore (fls. 2221 e segs.).

Finalmente, alegam ainda os defendentes que a acusação formulada pela Comissão de Inquérito contra a OAM Ltda. e a Sra. Verônica Dantas é deveras imprecisa, e que o direcionamento de aplicações para o Banco ABN seria perfeitamente legal, pois este assumia à época o papel de RTA do Opportunity Fund (fls. 2224 e segs.).

DA DEFESA APRESENTADA POR BANCO ABN AMRO REAL S.A. E PELO SR. CARMINE GESU RAGO

DAS PRELIMINARES

Alegam os defendentes que a questão tratada no âmbito do inquérito administrativo remonta ao mês de agosto de 1997, por ocasião do acolhimento pelo Colegiado de recurso do então Banco ABN AMRO S.A., em que se determinou a inclusão de vedação à participação de pessoas físicas e jurídicas residentes ou domiciliadas no Brasil como cotistas do Opportunity Fund; assim, à luz dos arts. 1º e 2° da Lei 9.873/99, estaria prescrita a atuação punitiva da CVM (fls. 2343 a 2345).

DO MÉRITO

Argumenta a defesa (fls.2339/2351 e 2926/2929) que não há qualquer elemento que permita caracterizar sua conduta, na qualidade de administrador e custodiante do Opportunity Fund, que tenha constituído infração a dispositivos legais ou regulamentares, existindo tão somente alegações vagas de que “aparentemente” teria havido omissão na supervisão do compromisso assumido com o Colegiado em 1997, ocasião em que sequer se determinou um prazo para cumprimento deste mesmo compromisso.

Alega ainda que era impossível ao Banco ABN AMRO REAL S.A. a identificação dos participantes e respectivas nacionalidades no Opportunity Fund e, adicionalmente, que a confecção da documentação do Opportunity Fund não dependia de sua atividade isolada enquanto administrador local.

A demora no envio do private placement memorandum do Opportunity Fund deveu-se aos problemas decorrentes da substituição do administrador local e do registrar and transfer agent, o que implicou a necessidade de sua revisão detalhada e nova impressão, sendo inteiramente reformulado. Não obstante, a limitação à participação de pessoas residentes ou domiciliadas no Brasil já constaria do subscription agreement desde outubro de 1997.

Ademais, enquanto custodiante local da conta coletiva da qual participava o Opportunity Fund, alega a defesa que o Banco ABN AMRO S.A. somente poderia visualizar os ativos da carteira, sem conseguir identificar os subscritores, nem certificar se estes tinham acesso ao prospecto. Finalmente, em junho de 1998, após receber do OAM Ltda. a nova versão do private placement memorandum, efetuou a entrega deste prospecto à CVM .

É o Relatório.

Rio de Janeiro, 23 de setembro de 2004

Eli Loria

Diretor-Relator

EMENTA: Oferta a investidores residentes e domiciliados no Brasil de cotas emitidas por investidor estrangeiro registrado na CVM na forma do Anexo IV à Resolução CMN n.° 1.289/8 em infração à Instrução CVM n.° 169/92, art. 1º, VI.

Inserção a destempo, em prospecto, de alerta relativo a restrição de participação de cotistas residentes e domiciliados no Brasil.

VOTO

Senhores Membros do Colegiado:

Antes de adentrar na análise das razões de defesa quero me manifestar a propósito da necessidade, ou não, de adiamento do presente julgamento, pois conforme informado no OFÍCIO/CVM/PTE/Nº 215, encaminhado em 14 de setembro de 2004 ao Exmo. Sr. Procurador da República no Distrito Federal, Luiz Francisco Fernandes de Souza, é de ser submetida à decisão do Colegiado a recomendação de sobrestamento, suspensão e conversão em diligência deste inquérito, formulada pela Procuradoria da República do Distrito Federal no OFÍCIO/MPF/PRDF/LF Nº 487, datado de 3 de setembro de 2004 e recebido pela Autarquia em 13 de setembro de 2004.

A meu juízo, considerando que o Excelentíssimo Senador Antero Paes de Barros, Presidente da CPMI – “BANESTADO”, em correspondência datada de 14 de setembro de 2004, OFÍCIO Nº 1250/2004, em resposta à solicitação da CVM, informou ser praticamente impossível precisar prazo para que o plenário delibere sobre o pedido de informações formulado pela Autarquia, feita a ressalva de que a posterior e oportuna comprovação de fatos irregulares poderá ser futuramente investigada, bem como os elementos constantes destes autos, as informações prestadas pelas partes, as provas colhidas pela Comissão de Inquérito, entendo serem suficientes para concluir o julgamento deste inquérito, do ponto de vista das apurações compreendidas nas atribuições legais desta Autarquia.

Ademais, além de não vislumbrar qualquer insuficiência instrutória, uma vez que os dados relativos à apuração da atuação do MTB Bank não são imprescindíveis ao julgamento do caso ora em comento, aliada à incerteza da prestação da informação solicitada à CPMI, possibilitando até mesmo a prescrição administrativa, estou também convencido de que os benefícios mais que evidentes de uma decisão sobre este assunto são amplamente superiores ao tumulto e aos custos que certamente adviriam do adiamento deste julgamento que, a meu ver, apenas teria o efeito de prolongar uma situação de indefinição, sem qualquer contrapartida proporcional, necessária ou legítima às conclusões abaixo expostas.

Superado esse óbice, passarei à análise das questões preliminares suscitadas pelos indiciados.

No que tange à nulidade do processo por inexistência de capitulação legal, é oportuno lembrar que a Lei nº 6.385/76, no caput de seu artigo 11, estabelece que “A Comissão de Valores Mobiliários poderá impor aos infratores das normas desta Lei, da Lei de Sociedade por Ações, das suas resoluções, bem como de outras normas legais cujo cumprimento lhe incumba fiscalizar, as seguintes penalidades: (…)”.

Tal artigo é uma norma em branco que precisa ser complementada por outra norma. No caso em tela, esta norma a que se remete é o inciso VI, do art. 1º da Instrução CVM nº 169/92. Portanto, não identifico qualquer ilegalidade na acusação que importe a sua nulidade e conseqüente arquivamento.

No que toca às referências aos princípios da ampla defesa, da legalidade e da tipicidade, cumpre anotar que o Relatório da Comissão de Inquérito faz expressa menção ao inciso VI, do art. 1º da Instrução CVM nº 169/92 que foi violado. Outrossim, a defesa defende-se dos fatos. Especificamente em relação à tipicidade, o argumento dos defendentes não pode prosperar, pois está caracterizada a tipicidade indireta: o art. 11 caput da Lei nº 6.385/76, tipo principal, necessita do auxílio de uma norma de extensão, o inciso VI do art. 1º da Instrução CVM nº 169/92, tipo secundário. Há no caso, uma tipicidade indireta, e não caso de falta de tipicidade, posto que a norma em branco foi complementada por outra.

Outrossim, lembro aqui a lição de Maria Sylvia Zanello Di Pietro:

“Ao contrário do direito penal, em que a tipicidade é um dos princípios fundamentais, decorrente do postulado segundo o qual não há crime sem lei que o preveja (nullum crimem, nulla poena sine lege), no direito administrativo prevalece a atipicidade; são muito poucas as infrações descritas na lei, como ocorre com o abandono de cargo. A maior parte delas fica sujeita à discricionariedade administrativa diante de cada caso concreto; é a autoridade julgadora que vai enquadrar o ilícito (…). Por isso mesmo, na punição administrativa, a motivação do ato pela autoridade julgadora assume fundamental relevância, pois é por essa forma que ficará demonstrado o correto enquadramento da falta e a dosagem adequada da pena.” (in Direito Administrativo – 12ª ed. – São Paulo: Atlas, 2000.)

No que toca ao alegado cerceamento de defesa, esclareço inicialmente que em decisão deste Colegiado de 12 de novembro de 2001 (fls. 467 e 468), foi dado provimento ao recurso apresentado pelos defendentes e fornecida cópia do inteiro teor do inquérito, tendo sido juntados todos os documentos aos autos e prontamente disponibilizados às partes em diversas oportunidades. Com a devida vênia, se demora houve foi devido justamente aos inúmeros pedidos de cópias submetidos pelos defendentes. Houve amplo e irrestrito acesso a todos os documentos, denúncias e ofícios que culminaram na tomada dos depoimentos, sendo que os depoimentos dos defendentes foram suspensos até o acesso integral aos autos. Houve rigorosa observância das normas aplicáveis à espécie, abrindo-se inúmeras oportunidades para a defesa, ampla produção de provas, possibilidade de impugnação daquelas já produzidas, não havendo de se falar em nulidade nem prejuízo.

Quanto aos depoimentos, ressalte-se que não há nenhuma formalidade rígida imposta na tomada dos mesmos. Trata-se de uma opção de quem está presidindo a tomada de depoimentos entre a forma direta, pela qual a pergunta é consignada e o depoimento é ditado diretamente pelo depoente, e a forma indireta, pela qual as perguntas não ficam consignadas e o depoimento passa pela percepção do presidente da audiência que então dita para o escrevente, reduzindo-o a termo. Não há qualquer nulidade, nem prejuízo neste procedimento, adotado amplamente na esfera judicial.

Quanto à alegada inércia na produção de provas, creio que tal alegação dos defendentes não corresponde à realidade; todas as diligências necessárias, relevantes e pertinentes foram realizadas pela Comissão de Inquérito, que envidou todos os esforços possíveis para a elucidação dos fatos.

No que tange aos aspectos preliminares levantados por Carmine Gesu Rago e Banco ABN AMRO S.A. (atual Banco ABN AMRO Real S.A.), recorro à Lei nº 9.873/99, que trata dos prazos prescricionais em matéria de ação punitiva da Administração Pública. Atente-se para o art. 2º que cuida das hipóteses de interrupção da prescrição:

“Art. 2º Interrompe-se a prescrição: (…)

II – por qualquer ato inequívoco, que importe apuração do fato; (…)”

No caso específico, é forçoso reconhecer que inúmeros atos inequívocos de apuração dos fatos foram praticados – como sugerem, aliás, as mais de três mil páginas que compõem estes autos. Ainda que os fatos remontem a agosto de 1997, como argumenta a defesa, é certo que o prazo prescricional foi interrompido, prejudicando assim o argumento levantado pelo defendente.

Por exemplo, já em 05.06.98 esta CVM expediu o Ofício/CVM/SIN/GIE/N.° 1.137/98, endereçado aos próprios defendentes, Sr. Rago e Banco ABN AMRO, em que comunicava a possibilidade de cancelamento da inclusão do Opportunity Fund na conta coletiva do ABN AMRO BANK N.V. – que foi respondido pelo próprio Banco ABN em 25 de junho do mesmo ano (fls. 201). Ademais, nas reuniões de 8 de maio e 22 de junho de 2001, este Colegiado decidiu pela instauração de Inquérito Administrativo, atendendo a pedido da Superintendência de Investidores Institucionais desta CVM (fls. 2/9). Assim, afasto inteiramente a ocorrência de prescrição, face às inúmeras hipóteses de interrupção da contagem do prazo.

No mérito, quanto à alegada “impossibilidade de atribuir responsabilidades” e à ausência de evidência que implicasse a conclusão da Comissão de Inquérito (fls. 2184 e segs.), esclareço que em nenhum momento a Comissão de Inquérito assim reconheceu. Tal raciocínio é equivocado, pois a Comissão de Inquérito apenas assumiu que os resultados não foram comprovados. Ocorre que a comprovação de tais resultados é irrelevante para a caracterização das irregularidades imputadas. São resultados da conduta de esforço na colocação pública de cotas de sub-fundos do Opportunity Fund para residentes no Brasil. A subscrição das cotas não precisa ocorrer, nem estar provada para que se configure a infração que é formal, ou seja, ocorre independentemente do resultado. O regramento já pune a conduta anterior com o objetivo de evitar a ocorrência da conduta posterior, posto que o perigo é abstrato.

Assim, entendo que a ilicitude imputada aos acusados, ou seja, a conduta de esforço de colocação pública, restou completamente provada no curso das investigações, face à disponibilidade de material de divulgação dos sub-fundos do Opportunity Fund para interessados pelo escritório do Banco Opportunity, na cidade de São Paulo, e aos depoimentos de Rosângela Browne, Daniela Saccheto de Góes, Terezinha Esteves, Ricardo Kauffman, Boris Muroch, e ainda à confirmação de aplicações em nome de Luis Demarco pelo então RTA do Opportunity Fund, o Midland Bank Trust Corporation Limited (fls. 77/78), como comentarei a seguir.

Ressalto ainda a afirmação da Comissão de Inquérito de que “…ainda que não comprovada a ocorrência de subscrição de cotas do sub-fundo Brazilian Equities por residentes ou domiciliados no país, a priori, não se pode descartar a possibilidade de isto ter ocorrido com a interveniência do Banco Opportunity, face à disponibilidade de material de divulgação dos sub-fundos do Opportunity Fund para interessados pelo escritório do banco, na cidade de São Paulo” (fls. 2114). Ou seja, a Comissão de Inquérito afirma que houve a possibilidade da subscrição de cotas, a qual não precisa ocorrer nem ser provada para a consumação do delito. E isto é irrelevante, não porque estivesse “visivelmente frustrada”, como afirma a defesa, mas porque não é esta a ilicitude imputada, mas sim o esforço de distribuição de cotas de fundos constituídos no exterior a residentes e domiciliados no país, conforme foi exaustivamente comprovado pela Comissão de Inquérito. Há o perigo abstrato e por isso a consumação é antecipada, presumindo-se desde logo que o resultado desejado pelo agente ocorreu.

No que se refere ao descumprimento da decisão do Colegiado de 01.08.97 (fls. 198 a 199), gostaria de destacar que somente em 25.06.98, o Banco ABN AMRO protocolizou nesta CVM cópia do prospecto de colocação de cotas do Opportunity Fund, revisado e consolidado em 11/05/98, em atendimento ao compromisso assumido perante essa autarquia por seu cliente (fls. 202 e segs.). Apesar do Colegiado não ter fixado prazo para cumprimento da obrigação, a demora em mais de dez meses refoge aos limites da razoabilidade, revelando um total descaso à decisão do Colegiado. Ora, se não houve fixação de prazo é porque o cumprimento deveria ter sido imediato. Até mesmo porque a vedação já existia antes da decisão do Colegiado, que apenas explicita um modo de garantir a sua não ocorrência.

Tal demora, ao contrário do alegado, trouxe prejuízos na medida em que abriu a possibilidade de que residentes no país pudessem subscrever cotas do Opportunity Fund. Por exemplo, a Sra. Rosângela Browne afirmou categoricamente que preencheu em 31.10.97 um subscription agreement de US$ 500 mil em favor do Sr. Demarco, e preencheu um outro em 05.08.97, no valor de US$ 250 mil, em favor do mesmo investidor (fls. 517). O Ofício/CVM/SIN/GIE/nº 1.528/97 foi enviado em 29.08.97 ao Banco ABN AMRO, na qualidade de instituição administradora do Opportunity Fund, dando conta de que o Colegiado aceitara, em 01.08.97, o compromisso assumido pelos ora acusados através da administradora, no qual se comprometiam a colocar uma regra nos prospectos, nos boletins de subscrição e demais documentos relacionados a oferta de cotas do fundo alertando da vedação de participação de pessoas físicas e jurídicas residentes e domiciliadas no Brasil como cotistas do fundo (fls. 182/183) e expressamente reiterado em 14.07.97 (fls.53/54).

Muito embora o ofício da CVM informando a decisão do Colegiado ter sido enviado após a data da subscrição do fundo pelo Sr.Demarco, tal argumento não aproveita à defesa, posto que a Sra. Rosângela Browne assumiu que preencheu um subscription agreement em data posterior (31.10.97) à comunicação enviada pela CVM (29.08.97). Note-se que o compromisso assumido pelos acusados foi no sentido de inserir a vedação nos prospectos e boletins de subscrição do Opportunity Fund, sem restringi-la ao sub-fundo Brazilian Equities.

No que tange aos Boletins de Subscrição acostados às fls. 70 e 93, reconheço que tais documentos elidem a má-fé apenas de OAM Inc., mas não a culpa, a negligência na demora para alteração dos documentos relacionados à oferta do Opportunity Fund.

No que toca à etapa de “transição” de serviços prestados do Midland Bank para o ABN AMRO Cayman, não foi comprovada qualquer negociação à época que comprometesse as obrigações legais dos defendentes. Não comprovaram os defendentes quando a negociação foi concluída, nem quando o material foi enviado para a gráfica. Houve portanto, negligência no cumprimento de suas obrigações.

Quanto à discussão sobre uma eventual inexistência de relação de trabalho entre Banco Opportunity e Daniela Góes, Terezinha Esteves, Rosângela Browne, Bernardo Patury e Ricardo Kauffman, entendo que a relação de trabalho é uma relação de fato e independe da comprovação da presença do nome do funcionário no Relatório Anual de Informações Sociais – RAIS. Do mesmo modo, independe de o empregador estar devidamente regularizado perante a Junta Comercial.

O argumento de que não se pode imputar qualquer responsabilidade ao Banco Opportunity pelo simples fato de ausência dos nomes dos empregados no RAIS, bem como ausência de registro na Junta Comercial, não se sustenta. Em sentido contrário, devem prevalecer os depoimentos convergentes no sentido de que eram funcionários do Banco Opportunity. Até mesmo o argumento utilizado pela defesa de que a origem de tal confusão pode ter-se originado das declarações de Daniela Góes, Terezinha Esteves e Rosângela Browne à Justiça das Ilhas Cayman em que afirmaram que trabalhavam para a Opportunity Asset Management Ltda vem reforçar a tese de que na realidade não havia distinção de fato entre as duas, ambas fazendo parte do grupo Opportunity.

Em relação ao fato de que a acusação teria formado sua convicção com base em depoimentos contraditórios, sou obrigado a divergir de tal assertiva. A Comissão de Inquérito apenas disse que devido à impossibilidade de obter o que seria a prova cabal – lista nominal dos investidores residentes e domiciliados no Brasil que efetivamente operaram no Opportunity Fund a partir de meados de 1996 – devido às negativas da Cayman Islands Monetary Authority, fundamentou suas conclusões, em maior grau, nos depoimentos e informações prestadas pelas pessoas envolvidas. Não disse que os depoimentos não eram eficientes, nem que eram contraditórios.

Ocorre que a prova testemunhal não é mais ou menos importante, nem ineficiente. No sistema brasileiro não há hierarquia das provas. Todas têm o mesmo valor. O que importa é que elas sejam fortes, convergentes, suficientes a sustentar uma condenação.

Convém lembrar que a prova testemunhal é um meio de prova, tendo o mesmo valor que qualquer outro, pois todas as provas são relativas. É apta a embasar uma condenação, ainda mais quando em harmonia com os demais depoimentos colhidos nos autos e não elididas por outros elementos de convicção. Tal é o posicionamento da mais autorizada Doutrina, como Julio Fabrini Mirabete, que nos ensina o valor da prova testemunhal no processo penal:

“Lembra porém E. Magalhães Noronha que, máxime no processo penal, é o testemunho a prova por excelência, já que o crime é um fato, é um trecho da vida e, conseqüentemente é, em regra, percebido por outro. O depoimento – lembra Vishinski – é uma das provas mais antigas e generalizadas. Não há sistema probatório que lhe negue um lugar mais ou menos importante entre as demais classes de prova. Não se pode, realmente prescindir da prova testemunhal na maioria das ações penais, devendo o juiz confiar nos depoimentos prestados quando não estão em desacordo evidente com os demais elementos dos autos” (in Processo Penal. São Paulo: Atlas, 1991).

Aliás, os depoimentos colhidos são de fundamental importância para este julgamento. Temos aí pelo menos dois aspectos passíveis de esclarecimento: a colocação das cotas do Opportunity Fund e a existência de material de divulgação nos escritórios da OAM Ltda.

Quanto à colocação das cotas, cumpre destacar:

— Boris Muroch e Maria Emmanouilides Pereira (responsáveis pela coordenação comercial da unidade regional da OAM Ltda em SP) declararam que o objetivo principal da equipe que atuava sob sua supervisão, na filial OAM Ltda em São Paulo concentrava-se na colocação de fundo local, não existindo uma rígida estrutura administrativa formal ou hierárquica, já que, por vezes, membros da equipe podiam se reportar diretamente à administração sediada no Rio de Janeiro (fls. 564 a 568);

— Rosângela Browne, Terezinha Aparecida Marques Esteves e Ricardo Kauffman (funcionários do Banco Opportunity S/A) declararam que a função básica da área em que atuavam consistia na venda de fundos de investimentos locais administrados pelo Banco Opportunity (fls. 513, 517, 561 e 562);

— Fernando Barrozo disse que atendia aos colocadores dos fundos locais e offshore do grupo Opportunity (fls. 698 e 699);

— Pérsio Arida disse que a distribuição e vendas da cotas do Opportunity Fund eram feitas pelos Private Banks no exterior, além de negociações que ocorriam via Euroclear. O registro de clientes ficava a cargo do RTA em Cayman. (fls. 716 a 719);

— Bernardo Patury Assumpção (funcionário do Banco Opportunity de maio/98 a maio/00) declarou “que comercializava tanto fundos locais como internacionais; nos locais tinha como clientes pessoas físicas e jurídicas, e nos internacionais bancos e distribuidores de fundos” (fls. 521);

— Rosângela Browne admitiu que foi pessoalmente conversar com Luis Demarco (residente no Brasil)sobre investimentos oferecidos pelo Opportunity Fund, tendo levado consigo uma pasta com todos os regulamentos dos fundos locais e off-shore; assumiu que cuidou da orientação e da entrega de prospectos e modelo de boletim de subscrição do Opportunity Fund a Luis Demarco, relativamente a duas operações por ele realizadas, em 5 de agosto e 31 de outubro de 1997 (fls. 517);

— Daniela Saccheto de Góes (funcionária do banco Opportunity) afirmou categoricamente “que a sua área fazia vendas de fundos custodiados no Brasil e no exterior”, e que, além disso,”tinham alguns investidores além do Demarco que residiam no Brasil e tinham cotas do sub-fundo do Opportunity Fund”; que “esse conhecimento decorria do fato de que, uma vez feita a venda das cotas, era ela (…)quem prestava as informações e operacionalizava a movimentação das contas, tais como resgates e switching”; que “nas movimentações de contas era dado somente o número da conta e não o nome do cliente(…)”; que “enviava um fax para o Banco [ABN AMRO], com cópia para a Sra. Karine Esteves, funcionária do Opportunity no Rio de Janeiro, que tinha a função de confirmar junto ao ABN as movimentações solicitadas” (fls. 511 e 512);

— Boris Muroch disse que relativamente à ocorrência de eventuais consultas telefônicas acerca do valor das cotas ou da performance dos fundos off-shore por determinação da administração do Opportunity, os interessados poderiam ser informados “sem qualquer restrição” ou mesmo a identificação do solicitante; e que a Sra Karine Esteves era responsável pelo “fornecimento do valor das cotas e da performance dos fundos off-shore” (fls. 564 e 565);

— Verônica Dantas disse que todas as negociações com ações eram feitas na praça do Rio de Janeiro; que Karine Sylvie Esteves cuidava do recebimento das informações internas; e que os private banks ou mesmo o Euroclear faziam a venda do Opportunity Fund enviando as informações diretamente para o banco contratado para agir como RTA – Midland Bank Trust Co. Ltd., ABN AMRO Bank – Cayman e, atualmente, o UBS Cayman (fls. 656 e segs.);

— Karine Esteves, rebatendo as declarações de Boris Muroch, disse que a aplicação nos fundos cabia aos Private Banks, os quais mantinham acordo com o Opportunity Fund, e, ao Registrar and Transfer Agent,(RTA); que se algum representante dos Private Banks estivesse fazendo due dilligence junto a OAM Ltda., aí sim, poderia receber modelos/drafts daqueles formulários (fls. 720 a 724);

— Eduardo Penido (responsável pela área de produtos da OAM Ltda. desde março/94 e pela comercial, a partir do segundo semestre/2000) disse que a OAM Ltda só distribuía fundos domésticos utilizando-se dos bancos distribuidores, porquanto não dispunha de estrutura de venda direta para varejo, nunca tendo feito qualquer esforço ou promoção para colocação de cotas de fundos off-shore. Declarou que o Opportunity Fund não exerce nenhuma atividade operacional (receber aplicações, fazer cadastros e executar investimentos) no Brasil e não realiza operações de remessas de recursos para o exterior em nome dos clientes do Fundo, sendo tais operações realizadas pelo RTA em Cayman (fls. 639 e 640);

— Dório Ferman declarou que o Opportunity Fund não recebia, pagava ou fazia câmbio para clientes, sendo que a captação se dava unicamente no exterior através de colocadores (fls. 684 a 686);

— o Sr. P.L., uma vez confrontado com o subscription agreement em que consta seu nome (fls. 63) declarou que “acredita que tenha sido preenchido quando do contato feito com o Opportunity para a aplicação (…)” que, ainda segundo o Sr. P.L., não se efetivou (fls. 523).

Assim, temos que os depoimentos de Boris Muroch, Maria Emmanuilides, Rosângela Browne, Terezinha Esteves, Ricardo Kauffman e Fernando Barrozo apenas enfatizam o “objetivo principal”, “a concentração”, a “função básica”, o “atendimento” relativos a fundos locais. Em nenhum momento negam a colocação de fundos off-shore. Pérsio Arida também não exclui a possibilidade de distribuição e vendas no Brasil, apenas declara que eram feitas no exterior.

Ao mesmo tempo, os depoimentos de Karine Esteves, Eduardo Penido e Dório Ferman devem ser apreciados com alguma reserva, uma vez que ninguém é obrigado a imputar a si mesmo a autoria de um ilícito.

Por outro lado, os depoimentos de Luis Roberto Demarco, Bernardo Patury, Rosângela Browne, Daniela de Góes e Bóris Muroch são categóricos, consistentes e em sintonia com os demais elementos dos autos no sentido de que cotas do Opportunity Fund eram efetivamente oferecidas no Brasil. Assim, devem merecer fé e são robustos, aptos a servir de suporte a uma condenação. Neste mesmo sentido, tem-se ainda o depoimento do Sr. P.L., confirmando a existência da oferta, associado ao subscription agreement em que consta sua identificação.

Já no que se refere ao segundo aspecto, relativo à existência de material no escritório da OAM Ltda, os fatos são os seguintes:

— Boris Muroch afirma claramente que nas instalações do escritório em São Paulo havia “lâminas” explicando a característica de cada sub-fundo off-shore administrado pelo Opportunity Fund, assim como formulário de subscription agreement – que possuía uma etiqueta de identificação numérica não específica, para ser entregue ao solicitante; que no entanto, não teve acesso aos prospectos e regulamentos dos sub-fundos off shore; e que “no período em que esteve como coordenador comercial houve a entrega destes formulários [subscription agreement] para diversas pessoas que procuraram o setor comercial em São Paulo” (fls. 565);

— Maria Emmanouilides disse que teve acesso aos prospectos e regulamentos dos sub-fundos off shore, mas não procedeu a uma leitura acurada dos mesmos (fls. 567 e 568);

— Rosângela Browne teve acesso aos prospectos e os entregou a Demarco (fls. 517);

— Terezinha Esteves negou ter acesso aos prospectos e regulamentos dos sub-fundos off shore (fls. 513);

— Daniela de Góes, Ricardo Kauffman e Bernardo Patury também tiveram acesso aos prospectos (fls. 511, 512, 561, 562 e 521);

— Verônica Dantas admite que havia material sobre o Opportunity Fund no escritório da OAM Ltda, mas nega que seria utilizado para divulgação, mas sim para informação sobre a performance dos sub-fundos, e servia para ser enviado aos bancos que vendiam os fundos. Acrescenta que não havia material em português, não constando telefone, endereço ou nome de pessoa de contato do Opportunity (fls. 656 e segs.);

— o Sr. P.L., declarou ter “consultado” o Banco Opportunity, e de tal consulta, ter-se-ia como resultado o preenchimento de um subscription agreement em seu favor. Razoável assumir, portanto, que o preenchimento deste documento deu-se no país e não no exterior, uma vez que o depoente afirma ter procurado a instituição financeira local.

Quanto ao depoimento da Sra. Browne, nota-se esforço efetivo da defesa em descaracterizá-lo. Esta afirma ter preenchido um subscription agreement em 05.08.97, no valor de US$ 250 mil, para aplicação no sub-fundo Brazilian Hedge e outro em 31.10.97, no valor de US$ 500 mil (fls. 517).

No caso, pouco interessa à caracterização da oferta pública o fato de que a Sra. Browne teria procurado o Sr. Demarco, ou se teria ocorrido o contrário. Não importa quem procurou quem, o que interessa é que houve efetiva oferta de cotas de sub-fundos do Opportunity Fund, consubstanciando-se no fornecimento de explicações sobre o modo de aplicação em referido fundo, inclusive de prospectos dos fundos administrados pelo Opportunity Fund e de modelo de subscription agreement. Ademais, o depoimento da Sra. Browne corresponde fielmente ao depoimento do Sr. Demarco.

Quanto à questão da incerteza da liquidação financeira da subscrição, tal fato não é essencial para a caracterização da colocação. Ocorre que a consumação da colocação independe da venda, sendo esta mero exaurimento daquela; a mesma interpretação se aplica para o eventual não envio do RTA.

Quanto ao fato de os superiores da Sra. Browne, o Sr. Boris Muroch e a Sra. Maria Emmanouillides desconhecerem tais operações, entendo que estes últimos alegam desconhecer apenas a realização de tais operações de venda, o que não significa que desconheciam a oferta. Entendo que o fato da Sra. Browne ser funcionária do Banco Opportunity, e exercer suas atividades em filial da Opportunity Asset Management Ltda, em prédio em que várias empresas do Grupo Opportunity exercem suas atividades, reveste-se de uma aparência que permite considerar que o ato foi praticado em nome do Opportunity Fund.

Destaco que em nenhum momento se contestou o fato de que realmente houve o fornecimento de informações, prospectos dos fundos e modelo de boletim de subscrição por parte da Sra. Browne ao Sr. Demarco. Este concorda que realmente houve a ajuda de Rosângela Browne no preenchimento dos boletins de subscrição, o que demonstra plenamente que houve a efetiva colocação de cotas.

No que se refere aos documentos acostados às fls. 77 e 78, não entro no mérito de estar ou não demonstrado um eventual switching das cotas – ainda que não provem o redirecionamento da aplicação em 05.11.97, o que importa é que provam o efetivo investimento em 31.10.97. Não obstante, repito que a confirmação do investimento é mero exaurimento do resultado da oferta, não se precisando efetivar, quanto mais se provar.

Quanto ao eventual cometimento pelo Sr. Demarco de crime de falso testemunho e falsidade ideológica, cumpre ressaltar que a sua responsabilidade não exime a responsabilidade dos indiciados.

Quanto à alegação de que o investimento ocorrido em 31.10.97 teria sido realizado pela OAM Inc, e não pelo Sr. Demarco, destaco que a parte superior deste boletim está preenchida com o nome de Luis Demarco (fls. 70).

Ademais, o Sr. Demarco afirmou que tal operação foi realizada pela Sra. Terezinha Esteves, que embora em depoimento tenha alegado não se recordar em específico deste caso, confirma que realizava esse tipo de operação para Demarco, juntamente com outros funcionários (fls. 513).

No que tange às planilhas apresentadas, ainda que se considere as alegações do Sr. Ferman, não se pode desprezar o depoimento do Sr. Fernando Amaral, citado pelos próprios defendentes, verbis: “Que no momento em que (…) tomou conhecimento desse tipo de informação que era prestada, no caso, pelo Sr. Ricardo Kaufman, o advertiu de que[ tal préstimo] não era prática da empresa e nem atribuição da função dele esse tipo de atividade e, se ele o fazia, fazia em caráter pessoal e por mera liberalidade” (fls.698/699).

Admitindo-se que o Sr. Ricardo Kauffman elaborava tais planilhas enquanto trabalhava na OAM Ltda, resta saber se o seu conteúdo era verdadeiro. Muito embora tais documentos fiquem descaracterizados como documentos oficiais do Banco Opportunity, o que nele está contido foi confirmado como presumidamente verdadeiro em depoimentos de funcionários que os elaboraram. As planilhas eram informais, artesanais e feitas exclusivamente para o cliente, diretor do CVC/Opportunity Equity Partners, tal como um relatório de acompanhamento paralelo e pessoal.

Os dados constantes nas planilhas foram incluídos manualmente por quem os elaborou. O Sr. Ricardo Kauffman declarou que acessava um sistema de controle de contas, compilando os dados em uma planilha para serem enviados ao investidor. Assim, justamente pelo fato das planilhas não serem geradas pelo sistema, mas elaboradas manualmente possibilita e justifica a incidências dos erros apontados no aditamento ao termo de declarações do Sr. Dório Ferman (fls. 866 e segs.).

Ora, CVC/ Opportunity Equity Partners, Banco Opportunity S/A e Opportunity Fund, Opportunity Asset Management Ltda, Opportunity Asset Management Inc. pertencem a um mesmo grupo econômico. O reconhecimento de que o grupo econômico é um fato dá-se na legislação trabalhista (CLT, art. 2º, § 2°), para atribuir responsabilidade solidária a todas as empresas do mesmo grupo econômico pelos créditos trabalhistas e considerar o grupo de empresas como empregador único (Enunciado nº 129 do TST).

Assim, justifica-se o fato das planilhas de controle de investimentos estarem em papel timbrado do CVC/Opportunity Equity Partners. Justifica-se também o fato do Sr. Ricardo Kauffman ter tido acesso a um sistema de controle de contas do Opportunity, de onde retirava os dados que compilava em uma planilha eletrônica. Justifica-se ainda o fato das planilhas serem enviadas ao Sr. Demarco, pois este gozava da condição de diretor de uma das empresas do grupo, conforme disse a própria defesa.

Mesmo que tais planilhas não possam ser consideradas como contendo informações cuja autoria fosse imputável oficialmente ao Grupo Opportunity, as circunstâncias em que foram produzidas, reconhecidas pela própria defesa, autorizam considerá-los como meio de prova idôneo a demonstrar, pelo menos, a existência da relação de investimento entre o Sr. Demarco e o conglomerado Opportunity.

Em relação à existência de material de divulgação nos escritórios de São Paulo, divirjo da defesa quanto à contradição e imprecisão nos depoimentos a este respeito.

No meu entender, os depoimentos das testemunhas foram coerentes na sua ampla maioria a demonstrar a efetiva oferta, o esforço na colocação das cotas através do fornecimento de informações, prospectos e modelos de boletim de subscrição, conforme já amplamente descrito nos parágrafos anteriores.

Quanto ao fato de outra instituição financeira disponibilizar informações sobre fundos offshore em sua página na rede mundial de computadores, esclareço que tal fato refoge do âmbito do presente inquérito e em nada modifica a responsabilidade dos acusados e, ademais, as regras hoje são outras não havendo, no meu entender, óbice a que residentes e domiciliados no país façam investimentos no exterior, desde que declarados à Receita Federal e ao Banco Central do Brasil.

Os defendentes tentam vincular a colocação de cotas a uma venda de cotas, o que não se justifica, pois como já afirmei ao longo deste voto, a venda é mero exaurimento da oferta posto que o resultado é a própria conduta de oferecer.

Quanto à referência feita pelos defendentes da existência de outros interesses por trás do presente inquérito administrativo, gostaria de esclarecer que estes são impertinentes e irrelevantes para o deslinde da questão. Caso versem sobre questões pessoais, as mesmas devem ser resolvidas pelas pessoas envolvidas fora do âmbito desta Autarquia.

Aliás, em certas circunstâncias a profusão de incidentes processuais motivados exclusivamente por interesses pessoais é fator que mais prejudica do que colabora com a apuração levada a cabo pela CVM.

Sobre a sentença proferida nas Ilhas Cayman, lembro que uma decisão de outro país, que adota um sistema jurídico totalmente diverso do nosso, com sistema de provas diverso, garantias de contraditório e ampla defesa diversos, não pode impor-se ao nosso ordenamento jurídico, pois feriria o princípio da soberania nacional.

Necessário que fosse submetida ao juízo de delibação no Supremo Tribunal Federal, competente para verificar sua adequação às leis brasileiras, ao conceito moral, aos costumes e às garantias do devido processo legal. Se assim não foi, não é exeqüível no Brasil, devendo ser acolhida como um elemento da livre convicção do julgador, como outro qualquer, que a ela não fica adstrito.

Quanto à substituição do administrador local e do Registrar and Transfer Agent, entendo que tais fatos não eximem de responsabilidade os defendentes. Lembro aqui, que o prazo decorrido entre o comando de inserção no private placement memorandum de alerta quanto a restrição à participação no fundo de residentes e domiciliados no país, decidido em reunião do Colegiado de 01.08.97 e a apresentação à CVM da respectiva documentação na forma exigida (25.06.98), foi superior a dez meses.

Tanto na regulamentação em vigor à época (o “Anexo IV” à Resolução CMN n.° 1.289) quanto na atual (Resolução CMN n.° 2.689), o papel do administrador local do investidor estrangeiro, atualmente referido como o “representante local”, é o de responder perante as autoridades locais pelos atos praticados em nome deste investidor, dentre outras obrigações. Assim, exigiu-se que o Banco ABN diligenciasse para o total e pronto atendimento ao compromisso assumido perante esta CVM em agosto de 1997.

Neste sentido, a demora em se inserir no prospecto a informação acerca da limitação à participação de residentes ou domiciliados no país é inexplicável. No mínimo, demonstra a omissão do Banco ABN no cumprimento de seu dever de administrador local do Opportunity Fund.

Em atenção ao fato de que no subscription agreement já constava a declaração acerca do local de residência do subscritor das cotas, lembro que não foi este o compromisso assumido junto a esta Autarquia. Era necessária a alteração do private placement memorandum, instrumento de efetivação da oferta pública de cotas, e foi a este documento que o Colegiado desta CVM fez referência ao apreciar o recurso do próprio Banco ABN em 1997.

Assim, admito como atenuantes o fato de que a limitação à participação de pessoas residentes ou domiciliadas no Brasil já constava do subscription agreement desde outubro de 1997 e que, ainda que tardiamente, foi inserida a cláusula no private placement memorandum, é fato que houve descumprimento da determinação da CVM.

Pelas razões expostas, VOTO no sentido de aplicar as seguintes penalidades, de acordo com o disposto no artigo 11 da Lei nº 6.385/76:

Banco ABN AMRO Real S.A., ex-Banco ABN AMRO S.A, e seu diretor Carmine Gesu Rago – pena individual de multa pecuniária no valor de R$20.000,00 por negligenciarem na supervisão do cumprimento do regulamento do Opportunity Fund, bem como do compromisso assumido pelo Opportunity Fund, ratificado posteriormente pelo Opportunity Asset Management Ltda. e Opportunity Asset Management Inc. de inserir, nos prospectos, regras restritivas relativas à subscrição de quotas do sub-fundo Opportunity Fund, por investidores residentes e domiciliados no país.

Opportunity Asset Management Ltda., Opportunity Asset Management Inc. e seus diretores, Dorio Ferman e Verônica Valente Dantas – pena individual de multa pecuniária no valor de R$20.000,00 pelo cumprimento a destempo do compromisso de inserir, nos prospectos, regras restritivas relativas à subscrição de quotas do sub-fundo Opportunity Fund, por investidores residentes e domiciliados no país.

Opportunity Asset Management Ltda., gestor do Opportunity Fund e sua diretora Verônica Valente Dantas, Banco Opportunity S.A. e seu Presidente, Dorio Ferman – pena individual de multa pecuniária no valor de R$100.000,00 pelo esforço na colocação pública no Brasil de cotas de sub-fundos de Anexo IV do Opportunity Fund vedados a residentes e domiciliados no país.

Proponho, ainda, que o Ministério Público seja comunicado desta decisão.

Adicionalmente, gostaria de tecer alguns comentários a respeito de algumas questões que me afligiram ao longo da análise destes autos.

De início quero ressaltar que os julgamentos realizados por esta Autarquia são de natureza colegiada e imparciais.

Os julgadores pautam sempre o seu convencimento por uma análise isenta, com método e serenidade, buscando a verdade dos fatos valendo-se de todas a provas produzidas nos autos.

Também tenho por certo serem infundadas e improcedentes as referências de que este processo tenha sido retardado no âmbito da CVM. Tanto na área técnica como no Colegiado da CVM o procedimento teve o andamento rigorosamente normal, e falo isso com a tranqüilidade de quem examinou os autos como Relator e não atuou no processo nem na área técnica nem no Colegiado até recentemente, quando tomei posse.

Ademais, gostaria de registrar aqui o esforço empreendido não só pela Comissão de Inquérito responsável pelo caso, mas também por outras áreas da CVM (como a Superintendência de Relações Internacionais), no sentido de obter informações junto à Cayman Islands Monetary Authority, que pudessem colaborar na investigação.

Pude identificar pelo menos cinco ofícios (sem contar outros aditamentos e ratificações) endereçados àquela autoridade estrangeira, em que se tentou obter dados acerca dos possíveis subscritores de cotas do Opportunity Fund.

Infelizmente, não obstante o esforço da CVM, não foram colhidos bons frutos: as autoridades de Cayman negaram o fornecimento de documentação e informações pois exigiram garantias de que a informação não seria usada em processos criminais o que, evidentemente, por força de lei, a CVM não pôde assegurar.

Tal negativa nos remete à discussão em torno da dificuldade imposta aos reguladores do mercado financeiro e de capitais, pela farta utilização de veículos de investimento constituídos offshore, em especial em “paraísos fiscais”. Observa-se que tais territórios têm legislação comercial e tributária flexível, além de ampla liberdade cambial, mas com sigilo bancário e profissional muito rígidos.

É interessante observar que o Brasil alterou diversas regras internas, de forma a evitar situações em que seja possível escapar à identificação de titulares de qualquer investimento – como é o caso da vedação geral à criação e emissão de títulos ao portador, e todo o arcabouço erguido em torno da legislação de combate à lavagem de dinheiro.

A Secretaria da Receita Federal também tem demonstrado preocupação com a matéria e editou normativos específicos, que destinam tratamento tributário diferenciado a países ou dependências que oponham sigilo relativo à composição societária de pessoas jurídicas (e.g., Instrução Normativa SRF n.° 188, de 6 de agosto de 2002).

Esforços no sentido de viabilizar a troca de informações com fins de investigação não faltam. Temos como exemplo por excelência a Lei Complementar nº 105/01, que prevê diversas hipóteses de intercâmbio de informações. No caso específico da CVM, é oportuno destacar o número crescente de memorandos de entendimento firmados com órgãos reguladores de outros países.

Demonstrando preocupação com a situação dos paraísos fiscais, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva a eles referiu-se em seu discurso proferido em 26.01.03 no Fórum Econômico Mundial realizado em Davos, Suíça, no seguinte sentido: “É necessário que a comunidade internacional dê sua contribuição para impedir a evasão ilegal de recursos, que buscam refúgios em paraísos fiscais. Maior disciplina nessa área é fundamental para o decisivo combate ao terrorismo e à delinqüência internacionais, que se alimentam da lavagem de dinheiro.”.

Encontro referência, ainda, em discurso proferido em Oxford, Inglaterra, em 13.11.02, pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso, comentando já ter ressaltado a importância de se discutir “mecanismo normativo que conferisse maior previsibilidade à movimentação do capital de curto prazo” e proposto, inclusive, o fim dos paraísos fiscais, “fonte não apenas de especulação financeira, mas de evasão tributária, corrupção e lavagem de dinheiro.”.

Lamento que este esforço brasileiro não tenha sido acompanhado pela comunidade internacional, e lastimo que nos autos deste processo administrativo, tenhamos uma demonstração de que a efetiva troca de informações entre autoridades ainda possua sérias limitações. Esta não depende da vontade de apenas uma das partes. Assim, não foi possível obter confirmação acerca da composição do quadro de cotistas do Opportunity Fund, inobstante não ser imprescindível para o deslinde do caso.

Outro aspecto que merece ser desmitificado é a questão de residentes e domiciliados no Brasil realizarem investimentos no exterior.

Tais aplicações são possíveis e objeto de regulamentação específica, como é o caso da Medida Provisória n.° 2.224, de 4 de setembro de 2001, da Resolução CMN n.° 2.911, de 29 de novembro de 2001, e das Circulares BACEN n.° 3.071, de 7 de dezembro de 2001 e n.° 3.095, de 6 de março de 2002.

Gostaria de ressaltar que a remessa, per se, não constitui infração a normas legais ou regulamentares. O problema reside na origem ilícita dos recursos, na utilização de meios ilícitos para a remessa, bem como na sua não declaração ao Banco Central do Brasil e à Secretaria da Receita Federal.

Faço aqui esta observação, pois houve certa confusão no tratamento do tema pela imprensa, vis-à-vis o processo ora em análise, que envolve também eventuais investimentos de brasileiros no exterior.

No meu entender, à época, era o aspecto fiscal a principal motivação para a vedação da participação de residentes e domiciliados no país em fundos constituídos no exterior que utilizavam a modalidade do Anexo IV à Resolução CMN nº 1.289/89, pois tais aplicações usufruíam isenção de imposto de renda sobre o ganho de capital. Assim, não fazia sentido se favorecer um residente no país que fizesse uso do veículo, visto que se realizasse a mesma operação em seu próprio nome, no país, teria tratamento fiscal diferente. Situação hoje já modificada.

Por fim, entendo caber à sociedade brasileira, por intermédio de seus representantes, identificar mecanismos que permitam equilibrar a necessidade do país receber investimentos estrangeiros com a necessidade de se identificar o investidor e a origem dos recursos aqui aportados.

É o VOTO.

Rio de Janeiro, 23 de setembro de 2004.

Eli Loria

Diretor-Relator

Declaração de Voto do Diretor Wladimir Castelo Branco Castro, na sessão de julgamento realizada em 23/09/04

Senhor Presidente,

Acompanho integralmente o voto do Relator, tanto no tocante à desnecessidade de adiamento do presente julgamento, quanto às conclusões e às punições.

Gostaria, no entanto, de tecer algumas considerações.

Ficou evidenciado nos autos a realização de oferta pública para pessoas residentes e domiciliadas no Brasil em fundos direcionados justamente para investidores não-residentes no país e que tinham tratamento fiscal favorecido, bem como não foi cumprida tempestivamente a determinação do Colegiado quanta à inclusão no prospecto de menção à limitação da participação de subscritores residentes no país.

O presente processo foi objeto de rumores por parte dos meios de comunicação, que apenas causaram especulações em torno das investigações e do julgamento.

Eu quero ressaltar o fato de que os membros do Colegiado gozam de autonomia, não se sujeitando a pressões de qualquer natureza, pautando suas condutas segundo os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, finalidade, moralidade e supremacia do interesse público sobre o privado, bem como dos princípios consagrados na lei do processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.

Dito isso, acompanho o bem lançado voto do Diretor Relator, Dr. Eli Loria.

É esse o meu voto, Sr. Presidente

Wladimir Castelo Branco Castro

Diretor

Declaração de Voto do Presidente Marcelo Fernandez Trindade, na sessão de julgamento realizada em 23/09/04

Para quem está do lado de cá deste balcão é muito triste ver esta sala tão cheia num dia como hoje, porque este caso, em si mesmo, não o merece. Esta platéia que inclui o nosso mestre, Dr. Bulhões, que escreveu esta lei, criou esta Autarquia, inclui também dois ex-presidentes desta Autarquia. Tenho certeza de que todos estão tão tristes quanto eu, de ver este auditório tão cheio, quando ele, normalmente, é tão vazio para julgamento de casos tão mais importantes para o mercado de capitais brasileiro.

Há duas semanas nós julgamos aqui, com uma audiência de duas ou três pessoas, uma falta grave de um intermediário, numa colocação pública registrada na CVM, uma coisa muito importante para o mercado de capitais brasileiro, e não tinha ninguém aqui. E hoje esse auditório está cheio assim e, para mim, de maneira ainda mais tocante, de vários jovens, meus ex-alunos, que vejo lá atrás, que, por certo, devem imaginar, erradamente, que este caso é muito importante, e por isso eles estão aqui. Não sei porque eles estão aqui, mas, certamente, não é porque esse caso é muito importante, talvez estejam aqui porque esse caso foi muito divulgado pela imprensa, porque este caso está incluído no seio de uma luta cujas motivações me escapam inteiramente — e aliás me conforta a ignorância dessas motivações.

Vejo aqui agentes de mercado, pessoas muito cultas, muito importantes no mercado, que vieram assistir a este julgamento e isto me surpreende inteiramente porque este julgamento é irrelevante para a realidade atual do mercado brasileiro. Estes fatos, este auditório, comprovam o que a defesa hoje disse aqui: que a pressão em torno deste julgamento, a pressão da opinião publica, da mídia, é fruto de alguma outra coisa, que eu não sei qual é, e pode ser por qualquer razão, mas, certamente, não deriva da relevância deste caso para o mercado de capitais brasileiro.

Este caso é um caso bastante simples, que só o eventual cinismo, ou a eventual cegueira propositada de alguns, poderia tentar complicar.

Este caso é um caso muito simples porque ele enfrenta uma situação de uma pessoa que fez uma aplicação num fundo — provavelmente lendo uma declaração de que não podia fazer essa aplicação, mas, certamente, dada a sua especialização, consciente de que não podia fazer essa aplicação —sendo residente e domiciliado no Brasil, fez uma aplicação num fundo estrangeiro. Não vem ao caso se os recursos eram ou não declarados. Não sei se o ilícito ultrapassava as fronteiras da CVM ou não, isto é, se chegou-se também ao ilícito fiscal. O que aconteceu aqui neste caso foi isto, e este fato, em razão de uma disputa entre o investidor e o administrador dos recursos, veio a ser denunciado à CVM. A CVM fez então, exatamente, o que tinha que fazer, que é apurar esse evento, não importa quem denuncie — não importa se o denunciante é o maior dos beatos ou o maior dos chantagistas — a CVM tem, de quem quer que parta esta denúncia, a mesmíssima obrigação de averiguar a denúncia, de apurá-la. E foi o que a CVM fez neste caso: apurou os fatos.

Eu custo a crer, com toda a intensidade da minha mínima inteligência, que o Opportunity tenha sido o único administrador de recursos brasileiro a receber investimentos de brasileiros num fundo off shore. Mas como foi este fato que chegou ao conhecimento da CVM, e então cumpria à CVM, modestíssima e minimamente, no aspecto absolutamente irrisório desta questão no contexto do grande mercado de capitais brasileiro, julgar este caso. E é isto que ela está fazendo aqui hoje.

Certamente a repercussão deste julgamento será muito maior, continuará a ser muito maior do que este caso realmente é. Certamente, a imprensa publicará manchetes em letras garrafais: CVM condena o Opportunity! Por outro lado, certamente muitas queixas serão publicadas dizendo que as penas foram baixas, que a CVM deveria ter banido para todo o sempre do mercado — e, se possível, da face da terra — todas as pessoas envolvidas neste caso. Ambas as críticas só nos confortarão, porque comprovarão que agimos com isenção e distanciamento, e sem nos deixarmos impressionar pela pressão da mídia e dos profetas do passado.

A CVM está fazendo, neste caso, apenas o que devia fazer, que é muito pouco, dada a real dimensão do caso, e, entretanto, com este pouco está cumprindo um pequeno pedaço de sua grande missão.

Com essas palavras eu acompanho o voto do Relator e declaro encerrada a sessão.

Marcelo Fernandez Trindade

Presidente

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