Expurgos inflacionários

Contas de FGTS devem receber três novas correções, decide STJ.

Autor

21 de setembro de 2004, 10h42

As contas referentes ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) devem receber três novas correções referentes a planos econômicos. O entendimento é da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça. Para a Turma, as correções serão feitas nas contas em vigor durante o Plano Verão e os Planos Collor I e II. A decisão abre precedente para cerca de 58 milhões de correntistas à época.

As perdas dos trabalhadores nesses três casos seriam de 10,14% em fevereiro de 1989, 12,92% em julho de 1990 e de 11,79% em março de 1991, índices que deveriam ter sido aplicados pela Caixa Econômica Federal. Segundo o STJ, o entendimento foi dado em recurso interposto pela advogada Iracema Canabrava Rodrigues Botelho e seguiu o voto da relatora, ministra Eliana Calmon.

A advogada recorreu ao STJ contra decisão monocrática da mesma ministra. Anteriormente, ela negara seguimento a Recurso Especial por considerar que ia contra a jurisprudência do tribunal. A recorrente argumentou que nem decisão do Supremo Tribunal Federal nem jurisprudência do STJ (Súmula 252/STJ) têm motivação suficiente para rejeição do pedido.

Ela afirmou que o STF não se pronunciou sobre os índices de 84,32% (março/90), 13,69% (janeiro/91) e 13,90% (março/91). Disse, ainda, que a jurisprudência do STJ é uníssona quanto à procedência do pedido dos índices de 10,14% (fevereiro/89), 9,55% (junho/90) e 12,92% (julho/90).

A ministra Eliana Calmon considerou que nem o STF nem mesmo o STJ examinaram as teses em torno dos seis expurgos inflacionários requeridos, como explica a advogada. “Para solucionar a controvérsia, verifico, inicialmente, que a jurisprudência do STJ firmou-se pela inclusão dos expurgos inflacionários, mediante aplicação do IPC, no período de março de 1990 a janeiro de 1991, e do INPC de fevereiro de 1991 a dezembro do mesmo ano”, esclareceu a relatora.

A ministra lembrou que a Primeira e a Segunda Turma, que compõem a Primeira Seção, estão de acordo quanto à aplicação do índice de 10,14% para fevereiro de 1989. A relatora fez um estudo comparativo entre os fatores de correção constantes da tabela de índices de juros e atualização monetária (JAM) aplicados às contas vinculadas ao FGTS e os Índices de Preços ao Consumidor (IPC) e Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

Eliana Calmon enfatizou que o índice de correção monetária de um mês era aplicado no mês subseqüente. Ao final, concluiu que, em março de 1990, foi aplicado o índice correto. Quanto ao de junho do mesmo ano e janeiro de 1991, o percentual aplicado foi superior ao índice da inflação. “Conclui-se, pois, que, além dos expurgos inflacionários contidos na Súmula 252/STJ, ainda são devidos: 10,14% (fevereiro de 1989), 12,92% (julho de 1990) e 11,79% (março de 1991)”, finalizou a ministra.

Balanço

Conforme a Seção de Sistemas Processantes, tramitam no STJ 12.990 processos da CEF com o assunto “tributário — contribuição social — FGTS — correção monetária dos depósitos — índice aplicável”. A Caixa figura como parte autora em 11.470 deles e como ré em 1.450. Nos demais processos, aparece como outros tipos de parte. Com caso igual ou parecido ao de Iracema Botelho, segundo a jurisprudência do STJ, foram dadas 162 decisões monocráticas.

Também segundo a jurisprudência, foram proferidos pelo Tribunal 80.820 acórdãos e decisões monocráticas com o assunto “planos Verão ou Collor — correção monetária — expurgo inflacionário — FGTS”. Não há dados sobre os resultados destes julgados ou decisões, que se referem a situações específicas correntes desde o funcionamento do STJ.

Leia a íntegra da decisão:

AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 581.855 – DF (2003/0155096-6)

RELATORA : MINISTRA ELIANA CALMON

AGRAVANTE : IRACEMA CANABRAVA RODRIGUES BOTELHO

ADVOGADO : JUAREZ ROCHA BOTELHO

AGRAVADO : CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF

ADVOGADO : FLÁVIO SILVA ROCHA E OUTROS

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: – Trata-se de agravo regimental interposto de decisão que negou seguimento ao recurso especial, por estar em confronto com a jurisprudência dominante desta Corte.

Inconformada, assevera a agravante que nem a decisão do STF no RE 226.855-7, nem o entendimento consolidado na Súmula 252/STJ contêm motivação suficiente para a rejeição do pedido.

Afirma, em relação aos índices de 84,32% (março/90), 13,69% (janeiro/91) e 13,90% (março/91), não deferidos pelo Tribunal a quo, que o STF não se pronunciou acerca dos referidos índices, visto que não foram objeto do pedido, não emitindo assim qualquer juízo de valor a respeito.

Sustenta, ainda, que a Súmula 252/STJ não consolidou entendimento contrário a essa pretensão e que esta Corte tem se pronunciado, reiteradamente, admitindo a necessidade da aplicação dos referidos índices nas contas fundiárias.

Quanto aos índices de 10,14% (fevereiro/89), 9,55% (junho/90) e 12,92% (julho/90), alega que a jurisprudência do STJ é uníssona no sentido da procedência do pedido, traz à colação vários julgados que corroboram a sua tese.

Havendo posições divergentes nas Turmas de Direito Público, nos termos do art. 34, XII do RISTJ, proponho seja afetado o presente recurso à Seção, a fim de uniformizar-se a jurisprudência.

É o relatório.

AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 581.855 – DF (2003/0155096-6)

RELATORA : MINISTRA ELIANA CALMON

AGRAVANTE : IRACEMA CANABRAVA RODRIGUES BOTELHO

ADVOGADO : JUAREZ ROCHA BOTELHO

AGRAVADO : CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF

ADVOGADO : FLÁVIO SILVA ROCHA E OUTROS

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (RELATORA): – Tem razão a agravante, pois o STF, no RE 226.855-7, e o STJ, pela Súmula 252, não examinaram as teses em torno dos seguintes expurgos inflacionários: 10,14% (fevereiro/89), 84,32% (março/90), 9,55% (junho/90), 12,92% (julho/90), 13,69% (janeiro/91) e 13,90% (março/91).

Para solucionar a controvérsia, verifico, inicialmente, que a jurisprudência do STJ firmou-se pela inclusão dos expurgos inflacionários, mediante aplicação do IPC, no período de março/90 a janeiro/91 e do INPC de fevereiro/91 a dezembro/1991.

As Turmas que compõem a Primeira Seção são acordes quanto à aplicação do índice de 10,14% (fevereiro/89), como demonstram os seguintes arestos:

PROCESSUAL CIVIL. FGTS. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DECIDIDOS POR MAIORIA. APLICAÇÃO DE MULTA (ART. 538, § 1º DO CPC). EMBARGOS INFRINGENTES. DESCABIMENTO.

1. Se a resposta a embargos declaratórios não complementa o acórdão da apelação, não cabem embargos infringentes, mesmo quando tomada por maioria.

2. Não se expõe a embargos infringentes acórdão que, no julgamento de embargos declaratórios impõe a multa cominada pelo art. 538, § 1ºdo CPC.

3. A propósito dos índices de atualização, adota-se o IPC, salvo em relação aos Planos Bresser (junho/87); Collor I (maio/90) e Collor II (fevereiro/91) (RE 226.855-7 e Súmula 252/STJ). A redução do IPC de janeiro de 1989 (42,72%), implica em automática ampliação do IPC de fevereiro do mesmo ano para 10,14%, conforme decisão da Corte Especial no REsp 43.055/SÁLVIO.

(REsp 532.585/MG, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 1ª Turma, unânime, DJ 01/09/2003, pág. 240)

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. FGTS. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. IPC DE FEVEREIRO/89: 10,14%. REFLEXO DA REDUÇÃO DO ÍNDICE APLICADO EM JANEIRO/89. PRECEDENTE DA CORTE ESPECIAL (REsp N.43.055-0/SP)

1. Com a redução do IPC de janeiro/89, de 70,28% para 42,72% (REsp . 43.055-0/SP), há reflexo na aplicação do IPC de fevereiro/89, devendo ser considerado o índice de 10,14% – Precedentes desta Corte.

2. Embargos de declaração acolhidos, sem alteração quanto à conclusão do decisum.

(EDRESP 159.558/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, unânime, DJ 08/03/2000, pág. 97)

Fora a peculiaridade relativa aos expurgos de janeiro e fevereiro/89, em razão do precedente da Corte Especial (REsp 43.055-0/SP), nos demais períodos questionados, os percentuais devidos são:

Índice de Preços ao Consumidor – IPC / IBGE

1986 1987 1988 1989 1990 1991

Janeiro 16,82 % 16,51 % 70,28 % 56,11 % 19,91 %

Fevereiro 13,94 % 17,96 % 3,60 % 72,78 % 21,87 %

Março (-) 0,11 % 14,40 % 16,01 % 6,09 % 84,32 %

Abril 0,78 % 20,96 % 19,28 % 7,31 % 44,80 %

Maio 1,40 % 23,21 % 17,78 % 9,94 % 7,87 %

Junho 1,27 % 26,06 % 19,53 % 24,83 % 9,55 %

Julho 1,19 % 3,05 % 24,04 % 28,76 % 12,92 %

Agosto 1,68 % 6,36 % 20,66 % 29,34 % 12,03 %

Setembro 1,72 % 5,68 % 24,01 % 35,95 % 12,76 %

Outubro 1,90 % 9,18 % 27,25 % 37,62 % 14,20 %

Novembro 3,29 % 12,84 % 26,92 % 41,42 % 15,58 %

Dezembro 7,27 % 14,14 % 28,79 % 53,55 % 18,30 %

Índice Nacional de Preços ao Consumidor – INPC

1991 1992 1993 1994 1995 1996

Janeiro 20,95 % 25,92 % 28,77 % 41,32 % 1,44 % 1,46 %

Fevereiro 20,20 % 24,48 % 24,79 % 40,57 % 1,01 % 0,71 %

Março 11,79 % 21,62 % 27,58 % 43,08 % 1,62 % 0,29 %

Abril 5,01 % 20,84 % 28,37 % 42,86 % 2,49 % 0,93 %

Maio 6,68 % 24,50 % 26,78 % 42,73 % 2,10 % 1,28 %

Junho 10,83 % 20,85 % 30,37 % 48,24 % 2,18 % 1,33 %

Julho 12,14 % 22,08 % 31,01 % 7,75 % 2,46 % 1,20 %

Agosto 15,62 % 22,38 % 33,34 % 1,85 % 1,02 % 0,50 %

Setembro 15,62 % 23,98 % 35,63 % 1,40 % 1,17 % 0,02 %

Outubro 21,08 % 26,07 % 34,12 % 2,82 % 1,40 % 0,38 %

Novembro 26,48 % 22,89 % 36,00 % 2,96 % 1,51 % 0,34 %

Dezembro 24,15 % 25,58 % 37,73 % 1,70 % 1,65 % 0,33 %

Trago, agora, os fatores de correção constantes da Tabela JAM (juros e atualização monetária), aplicados às contas vinculadas do FGTS:

Tabela de Índices de JAM Creditados nas Contas Vinculadas

de FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

DATA TAXA 3% TAXA 4% TAXA 5% TAXA 6%

01/04/1990 0,847745 0,849234 0,850709 0,852171

(…)

01/07/1990 0,098803 0,099688 0,100565 0,101435

01/08/1990 0,110632 0,111526 0,112413 0,113292

(…)

01/02/1991 0,205065 0,206035 0,206997 0,207951

(…)

01/04/1991 0,087675 0,088551 0,089420 0,090281

A partir dos dados oficiais trazidos acima, passo a um estudo comparativo entre os percentuais, lembrando que o índice de correção monetária de um mês era aplicado no mês subseqüente:

MÊS DE REFERÊNCIA IPC/INPC MÊS DE ATUALIZAÇÃO ÍNDICE APLICADO PELA CEF(COM JUROS DE 3% aa) ÍNDICES DEVIDOS (COM JUROS DE 3% aa)

MAR/90 84,32% ABR/90 0,847745 = 84,77% 0,847745 = 84,77%

JUN/90 9,55% JUL/90 0,098803 = 9,88% 0,098201 = 9,82%

JUL/90 12,92% AGO/90 0,110632 = 11,06% 0,157046 = 13,19%

JAN/91 19,91% FEV/91 0,205065 = 20,50% 0,202056 = 20,20%

MAR/91 11,79% ABR/91 0,087675 = 8,76% 0,120656 = 12,06%

CÁLCULOS PERTINENTES:

MARÇO/90 — 1,8432 x 0,002466 = 0,0045453312 + 1,8432 = 1,847745 = 84,77%

JUNHO/90 — 1,0955 x 0,002466 = 0,002701503 + 1,0955 = 1,098201 = 9,82%

JULHO/90 — 1,1292 x 0,002466 = 0,0027846072 + 1,1292 = 1,131984 = 13,19%

JANEIRO/91 — 1,1991 x 0,002466 = 0,0029569806 + 1,1991 = 1,202056 = 20,20%

MARÇO/91 — 1,1179 x 0,002466 = 0,0027567414 + 1,1179 = 1,120656 = 12,06%

OBSERVAÇÃO: O FATOR 0,002466 CONSTANTE NOS CÁLCULOS ACIMA CORRESPONDE AOS JUROS MENSAIS PROPORCIONAIS QUE, CUMULATIVAMENTE, PERFAZEM O TOTAL DE 3% AO ANO; A CEF, AO LANÇAR NA TABELA JAM O FATOR DE CORREÇÃO, EXCLUI O INTEIRO (EX.: 0,847745 E NÃO 1,847745) POR NÃO INCLUIR O PRINCIPAL, DESTACANDO O MONTANTE RELATIVO À CORREÇÃO MONETÁRIA.

C O N C L U S Ã O

A partir da análise comparativa procedida, observa-se que, relativamente ao mês de março/90, foi aplicado o índice correto; quanto a junho/90 e janeiro/91, o percentual aplicado foi superior ao índice da inflação.

Conclui-se, pois, que além dos expurgos inflacionários contidos na Súmula 252/STJ, ainda são devidos: 10,14% (fevereiro/89), 12,92% (julho/90) e 11,79% (março/91), o que justifica a proposta de alteração do verbete.

Com essas considerações, dou parcial provimento ao agravo regimental.

Resp 581.855

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!