Idéias trocadas

Luiz Francisco tenta explicar terceirização de denúncia

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6 de setembro de 2004, 22h02

O procurador da República Luiz Francisco de Souza divulgou nesta segunda-feira (6/9) uma nota para tentar explicar o fato de uma ação de improbidade assinada por ele ter em seu registro eletrônico a autoria do arquivo atribuída ao advogado de uma empresa interessada na causa. Enquanto isso, a Corregedoria-Geral do Ministério Público anunciou que vai apurar o caso.

Luiz Francisco, em sua nota, alega que recebera o arquivo do advogado Marcelo Ellias e, tendo gostado da fonte (tipo de letra) utilizada, resolveu apagar o conteúdo original e redigido a peça por cima. Ellias teria colaborado, afirma o procurador, na condição de advogado da Previ (Caixa de Previdência do Banco do Brasil). O advogado ajudou, segundo Luiz Francisco, informando a estrutura societária do grupo Opportunity, o principal alvo da sua denúncia (leia a nota abaixo).

A explicação dada conflita com a lógica e com a entrevista de Luiz Francisco na semana passada.

A fonte estrangelo edessa como qualquer outra só se configura em um computador se a fonte já estiver instalada nele. Não estando, ela aparecerá como outra fonte disponível no editor de texto. Ele sequer poderia vê-la. Portanto, se Luiz Francisco já a tinha, não precisava copiar. Se não tinha, copiá-la de um arquivo seria inútil.

Em sua nota, ele se reporta ao passado para indicar o momento em que recebeu a colaboração de Ellias. Contudo o arquivo que ele enviou a este site, em suas propriedades, informa que o mesmo foi criado no dia 31 de agosto de 2004. Ou seja, na terça-feira da semana passada. O mesmo registro dá conta de que o texto foi salvo pela última vez às 17h12 do dia 1º e impresso, também pela última vez, às 16h53. a denúncia foi protocolada por volta das 17h30 do mesmo dia. Na entrevista, Luiz Francisco afirmou que esta foi a 10ª revisão do documento.

Também na entrevista a Consultor Jurídico, indagado sobre como conheceu Ellias, o procurador disse, textualmente: “Eu o conheci em decorrência do Demarco”, afirmou, referindo-se ao empresário Luiz Roberto Demarco, inimigo do banqueiro Daniel Dantas do Opportunity. Demarco é dono da Nexxy, empresa onde foi produzido o polêmico arquivo original.

Na semana passada, Luiz Francisco não lembrou que Ellias trabalhou ou trabalha na Previ ao longo de duas entrevistas de 54 minutos. Só no final do dia, horas depois de ter dito que o conhecia na condição de advogado, amigo e sócio de Demarco, surgiu a referência à Previ.

Na mesma entrevista, o procurador admitiu que recebera ajuda externa para entender a estrutura societária do Opportunity. Mas essa ajuda teria sido dada pelo ex-ministro das Comunicações, o deputado Miro Teixeira. “Foi o homem que melhor fez o estudo societário desse grupo”, disse o procurador.

Nesta segunda-feira, depois de remeter sua “nota de esclarecimento”, Luiz Francisco pediu desculpas à revista Consultor Jurídico, prontamente aceitas, por ter-se exaltado na semana que passou. Pediu também para que fosse cortado o último parágrafo da nota onde ele insinua que a reportagem pretendeu beneficiar o empresário Daniel Dantas. O texto foi mantido.

Neste último parágrafo, ele acusa o site de produzir “um texto tendencioso, ao omitir dos seus leitores o teor da ação”. A acusação é duplamente injusta. Primeiro porque a petição fora, sim, publicada. Ele é que não viu. Segundo que, em sua entrevista, o procurador não só desautorizou a publicação da petição como fez diversas ameaças caso o texto fosse divulgado. A íntegra da entrevista com Luiz Francisco será divulgada ainda esta semana.

Veja a íntegra da nota de Luiz Francisco

NOTA DE ESCLARECIMENTO SOBRE AÇÃO OPPORTUNITY

A respeito da polêmica envolvendo a ação ajuizada contra o Grupo Opportunity e o Citibank, esclareço que trabalho nesta investigação desde 1998, quando ajuizei várias ações contra a privatização. Elementos contidos na ação referida já foram descritos por mim em peças judiciais e em ofícios desde 2001. O caso nasceu com as ações que movi contra as privatizações, especialmente do Sistema Telebrás. O Sr. Demarco foi o principal denunciante e tem como sócio ou amigo um advogado chamado Marcelo Elias. Este, por sua vez, foi contratado pela PREVI (pelo atual presidente, Sérgio Rosa) há mais de um ano. Fiz várias reuniões com a PREVI e com este advogado, Marcelo Elias. Foram enviados textos atachados em arquivos e num deles havia um tipo diferente de letra que gostei, daí, colei a minuta de minha ação por cima e ficou registrado no arquivo (que eu mesmo enviei para o site Consultor Jurídico) o nome do advogado da PREVI.

O caso Opportunity já gerou dúzias de ofícios. Enviei ofícios a autoridades judiciais e monetárias de Cayman, requerendo a lista completa dos cotistas do fundo do Opportunity. Também encaminhei pessoalmente ofícios com dossiês do caso ao advogado-geral da União, Dr. Alvaro Costa, e ao controlador-geral da União, Dr. Waldir Pires . Em meu depoimento de 12 horas na CPI do BANESTADO, no ano passado, mostrei que existiam centenas de empresários, políticos e servidores que remeteram dinheiro, via doleiros, para fundos de investimentos em Cayman, especialmente para o Opportunity Fund. ESTE FOI O ARGUMENTO PRINCIPAL DA AÇÃO

Em 2002, remeti ofício ao Juiz de Foz de Iguaçu mostrando que o Opportunity Fund tinha sido beneficiário e consegui, naquela época, o envio judicial do primeiro banco de dados de Foz, que mais tarde gerou a ida do delegado Dr. José Castilho e do perito da Polícia Federal Renato Barbosa a Nova Iorque no início de 2003. Os documentos obtidos geraram a CPI do Banestado. Remeti documentos descrevendo o esquema para o BACEN e para vários outros órgãos, sempre descrevendo o mesmo esquema que está na ação judicial.

Então, o que aconteceu foi bem simples: eu elaborei uma ação complexa, contando com a ajuda de dados da PREVI e de seu advogado. A ação visa anular partes da privatização e condenar o OPPORTUNITY e o CITIBANK em vários bilhões. O CITIBANK é o maior banco do mundo e o maior credor da dívida externa. O núcleo da ação (a existência de brasileiros no Opportunity Fund) já foi descrito há vários anos, especialmente em ofícios a CVM, no Inquérito n. 8, para que esta autarquia conseguisse os dados em Cayman. Requeri estes dados ao Sr. Daniel Dantas e também à autoridade monetária e judiciária de Cayman. Pedi que a AGU conseguisse os dados e no final ajuizei uma ação ÉTICA, CORRETA E QUE SERVE UNICAMENTE AO BEM COMUM e da qual tenho muitíssimo orgulho. Foi tudo o que aconteceu.

TODA A ESTRATÉGIA DA AÇÃO ESTÁ DESCRITA NUM DOCUMENTO QUE FIZ HÁ VÁRIOS ANOS. A ação visa beneficiar os fundos de pensão estatais e a União em vários bilhões e tenho imenso orgulho de ser autor e signatário (com o colega LAURO) da ação.

Demarco trabalhou com Dantas e passou a denunciar um fato grave: era um dos quotistas do Op Fund e existiam centenas de outros. Demarco pagou os tributos que devia e, se a ação tiver êxito, perderá sua parte nas estatais como quotista de um dos fundos que controla estas estatais. Obtive informações e dados da PREVI, de um fundo de pensão estatal. A PREVI contratou um amigo de Demarco, Marcelo Elias, e o recebi como advogado da PREVI. Usei um pequeno texto sobre a questão societária de Marcelo Elias. Estes textos vieram em meio magnético, em textos atachados e em disquetes. Daí a confusão.

A única coisa que lamento nesse episódio é a forma como reagi, de forma irritada e com profunda indignação, ao ter minha integridade questionada por suposta relação com empresários pelo site Consultor Jurídico. O site fez um texto tendencioso, ao omitir dos seus leitores o teor da ação, sem sequer questionar qualquer ponto desta, que resulta na tentativa de desqualificação do processo, beneficiando, dessa forma, os principais acusados, entre eles, o banqueiro Daniel Dantas.

Luiz Francisco de Souza

Brasília, 6 de setembro de 2004.

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