Dito e feito

Juiz reafirma liminar contra faixa colocada por vizinho de Marta

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26 de outubro de 2004, 20h52

A briga entre os vizinhos Marta Suplicy e Geraldo de Figueiredo Forbes está definitivamente encerrada, pelo menos judicialmente. O juiz da 1ª Zona Eleitoral, José Joaquim dos Santos, confirmou, nesta terça-feira (26/10), a liminar para que fosse retirada a faixa “Contra a Prepotência e a Corrupção do PT, pela República e Democracia Voto em José Serra”, afixada por Forbes em frente à sua casa, a um muro de distância da residência da candidata a prefeita, na rua Dinamarca, em São Paulo.

A decisão de Santos seguiu à apresentação da defesa de Forbes, no domingo (24/10). Segundo o juiz, a liberdade de expressão alegada por ele foi exorbitada no ponto em que acusa o PT pela prática de “corrupção”. Fixou, assim, o agravo moral, “seja quanto ao partido, seja quanto à candidata, na alegada prática de corrupção, acusação que se reveste de extrema gravidade”.

Santos também rejeitou o argumento de Forbes de que não pretendia ofender Marta, mas apenas ressaltar sua opinião quanto aos conhecidos casos de corrupção atribuídos ao PT. “É que, em tema eleitoral, a melhor interpretação é aquela no sentido de que a ofensa atinge o partido, mas reflete com grande intensidade no candidato e vice-versa”.

O entendimento do juiz foi baseado no artigo 9º da Resolução 21.610, do Tribunal Superior Eleitoral, segundo qual não será tolerada propaganda que “caluniar, difamar ou injuriar qualquer pessoa, bem como atingir órgãos públicos ou entidades que exerçam autoridade pública”. Santos também se apoiou no artigo 10º da mesma Resolução, que defere à Justiça Eleitoral a adoção de “de medidas para impedir ou fazer cessar imediatamente a propaganda realizada com infração do disposto nesta instrução”.

Leia a íntegra da decisão

Processo nº 378/2004 – Representação

Vistos.

Cuida-se de representação deduzida por COLIGAÇÃO UNIÃO POR SÃO PAULO e MARTA TERESA SUPLICY em face de GERALDO DE FIGUEIREDO FORBES, alegando que o representado, vizinho da prefeita e candidata à reeleição, instalou no dia 23 de outubro p.p.uma faixa de grandes dimensões em seu imóvel (dele representado) com os seguintes dizeres:

“CONTRA A PREPOTÊNCIA E A CORRUPÇÃO DO PT, PELA REPÚBLICA E DEMOCRACIA, VOTO EM JOSÉ SERRA”

Sustentam que essa manifestação excede a liberdade de expressão e de pensamento, constitucionalmente tutelada, maculando o patrimônio moral da candidata, mui especialmente quando emprega as expressões “PREPOTÊNCIA” e “CORRUPÇÃO”, que têm como destinatários a prefeita e o seu partido político.

Por último, dizem que a conduta do representado configura crime eleitoral, uma vez patente o agravo à honra e à moral alheia, conforme previsão dos artigos 324 usque 326 do Código Eleitoral. Também é certo que a providência solicitada, qual seja a ordem liminar de retirada da propaganda dita ofensiva, encontra suporte legal no poder de polícia eleitoral deferido a este Juízo (artigo 249 do Código Eleitoral), bem assim no ato normativo que emana da Resolução 21.610, artigos 9, inciso IX e 10, do TSE.

Pedem a ordem liminar de retirada, bem assim a fixação de multa diária para o caso de descumprimento e reincidência, sem prejuízo de ação penal pelo crime de desobediência previsto no artigo 347 do Código Eleitoral, para ao final ser julgada procedente a representação, com extração e remessa de cópias ao Ministério Público Eleitoral para as providências cabíveis.

A liminar foi concedida (fls. 02) e cumprida, conforme certidão dos oficiais de justiça acostada a fls. 15, com apreensão da referida faixa.

Apesar de não haver sido notificado pessoalmente, conforme se verifica da certidão supramencionada, o representado trouxe defesa (fls. 19/21), em causa própria, estranhando a “raríssima rapidez” com que este Juízo apreciou e deferiu a liminar requerida. Indaga, ainda, qual o crime que cometeu, de modo a merecer tão expressa e assombrosa decisão.

Alega, também, que se trata de uma manifestação de cunho pessoal, que lhe é garantida pela Constituição Federal, colocada em muro de sua propriedade, não pretendendo com tal conduta fazer apologia ao candidato de sua preferência. Explica que usou a frase “VOTO EM SERRA” e não “VOTE ou VOTEM EM SERRA”, ou seja, não fez nenhuma propaganda.

No mais, rebate ponto a ponto todas as considerações feitas na petição inicial, ressalvando que o faz mais para exercer o seu direito de defesa, porquanto a controvérsia “é mais matéria para psiquiatria especializado em delírio persecutório do que para cultores da Lei e Direito”.

Pede, não sem antes considerar que houve exorbitância na atividade jurisdicional, que, com “COM IGUAL PRESTEZA”, seja revogada a liminar, devolvida a faixa apreendida, resgatada a sua cidadania e assegurada a sua liberdade de expressão.

Manifestação do Ministério Público Eleitoral a fls. 24/26.

É o relatório.

DECIDO.

Abstraindo o forte conteúdo emocional que está a nortear a indelicada e afrontosa defesa trazida pelo representado, esclareço, desde logo, que somente quem não milita na Justiça Eleitoral desconhece a celeridade e eficiência que são emprestadas aos feitos entregues a esta especializada atividade jurisdicional.

A rapidez na apreciação da liminar, que tanta perplexidade causou ao representado, concedida após duas horas, no mais das vezes e em processos desta natureza demanda sempre tempo menor. Por outras palavras, fosse o representado advogado militante nesta Justiça Especializada, não teria acusado tal espanto, nem tampouco o tornaria público. Mas, ao que tudo indica, sobre ser jejuno na advocacia eleitoral, gosta realmente o representado é de dar publicidade até mesmo às suas preferências eleitorais.

No tocante à sua preferência eleitoral, albergada na liberdade de expressão e de pensamento, tutelada pela Carta Magna, nenhum reparo teria merecido a conduta do representado, desde que contida a mensagem exibida na fachada de sua propriedade dentro dos limites da civilidade, sem ataques ou ofensas ao Partido dos Trabalhadores diretamente, que resvalaram para o campo pessoal, atingindo igualmente o patrimônio moral da candidata à reeleição, ainda que indireta e dissimuladamente.

Eis o teor da faixa colocada na residência do representado:

“CONTRA A PREPOTÊNCIA E A CORRUPÇÃO DO PT, PELA REPÚBLICA E DEMOCRACIA, VOTO EM JOSÉ SERRA “

Ora, o apreço do representado pelos valores republicanos e democráticos é louvável e indiscutível. Do mesmo modo, como já dito, a sua preferência por esta ou aquela candidatura não foi sequer objeto de questionamento. Até aí, a sua liberdade de manifestação, embora não seja absoluta, não merece qualquer censura.

De fato, o artigo 5º da Constituição Federal vigente, em seu inciso IV, preceitua o seguinte:

Inciso IV – “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”;

E o artigo 220, “caput” da mesma Carta, no capítulo da comunicação social, traz a seguinte redação: “A manifestação de pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.”

Acontece que o representado, a pretexto de exercer a sua liberdade de expressão, exorbitou desse direito, fazendo-o exatamente no ponto em que acusa o Partido dos Trabalhadores pela prática de “CORRUPÇÃO”. Nem vou ao ponto de examinar a expressão “PREPOTÊNCIA”. Fixo o agravo moral, seja quanto ao partido, seja quanto à candidata, na alegada prática de corrupção, acusação que se reveste de extrema gravidade.

A Constituição Federal, não por acaso, ao deferir a liberdade de expressão, limita-a precisamente quando há ofensas desta ordem.

Nem adianta, como fez o representado em sua defesa, tergiversar a respeito do destinatário da ofensa. Diz o representado que não quis ofender a candidata, mas apenas ressaltar a sua opinião quanto aos conhecidos casos de corrupção atribuídos ao PT, que se traduziram em escândalos nacionais. É que, em tema eleitoral, a melhor interpretação é aquela no sentido de que a ofensa atinge o partido, mas reflete com grande intensidade no candidato e vice-versa.

Tal entendimento levou o legislador eleitoral a atribuir legitimidade “a um e outro, que se considere difamado, injuriado ou caluniado” (Acórdão 12.303 – TSE, Relator o Ministro Marco Aurélio).

E mais: a expressão assacada pelo representado (“CORRUPÇÃO”) denigre a imagem e a dignidade da candidata e de seu partido, uma vez que “no mundo político e no tocante às eleições os interesses confundem-se” (Acórdão citado).

Demais disso, convém sublinhar que ao abraçar a candidatura de José Serra, fazendo-o com tal grau de explicitação e denegrindo a imagem do partido da sua oponente, permitiu extrair a ilação de que esta não ostenta o atributo da probidade, de modo a merecer o seu voto.

Em suma, quer pelo ataque direto ao partido, quer pelo ataque indireto e dissimulado à candidata, a publicidade contida na faixa objeto da liminar concedida contraria o artigo 243, do Código Eleitoral e o artigo 9º, inciso IX, da Resolução 21.610, do TSE, ambos do seguinte teor:

“Artigo 9º –

Não será tolerada propaganda:

IX – que caluniar, difamar ou injuriar qualquer pessoa, bem como atingir órgãos ou entidades que exerçam autoridade pública”.

E o artigo 10 da mesma Resolução defere à Justiça Eleitoral a adoção “de medidas para impedir ou fazer cessar imediatamente a propaganda realizada com infração do disposto nesta instrução” (grifo não original).

E foi por isso que, imediatamente, determinei a retirada da questionada faixa.

Por tais razões, penso que a liminar deve ser mantida e tornada definitiva, com a procedência da representação.

Isto posto, JULGO PROCEDENTE A REPRESENTAÇÃO.

Por conseguinte, TORNO DEFINITIVA A LIMINAR CONCEDIDA.

P.R.I.

São Paulo, 26 de outubro de 2.004.

JOSÉ JOAQUIM DOS SANTOS

Juiz Eleitoral

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