Castigo suspenso

Empregado infrator não pode ser punido com suspensão, diz TRT-SP

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19 de outubro de 2004, 14h53

Não há lei que autorize a suspensão de empregado como punição por infração trabalhista. Em determinadas situações, o contrato de trabalho pode ser suspenso por até 30 dias exclusivamente para a apuração de falta grave.

O entendimento unânime é dos juízes da 9ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. Eles julgaram procedente o recurso de um trabalhador afastado do emprego por ter organizado uma passeata no local de trabalho.

O ex-empregado da Sobremetal Recuperação de Metais Ltda ingressou com reclamação trabalhista na 4ª Vara do Trabalho de Cubatão, em São Paulo, contra uma suspensão de 30 dias imposta pela empresa.

A primeira instância considerou que a empresa praticou “excesso de punição” e condenou a empresa a devolver ao empregado o salário de 25 dos 30 dias de suspensão.

A Sobremetal e o ex-empregado recorreram ao TRT paulista. A empresa não concordava com o não reconhecimento do justo motivo para aplicação da pena ao empregado em razão de “passeata por ele indevidamente organizada”. O empregado também recorreu por entender que não tinha de sofrer pena nenhuma, pois teria direito à estabilidade prevista para os dirigentes sindicais.

O relator no TRT, juiz Luiz Edgar Ferraz de Oliveira, deu provimento ao recurso do reclamante e tornou sem efeito a suspensão imposta pela empresa.

Segundo Oliveira, “a lei brasileira não autoriza aplicação de penas constritivas do trabalho, exceto em determinadas situações, em que o empregador pode suspender o contrato até 30 dias para apuração de falta grave, conforme se extrai da leitura dos artigos 474 e 853 da CLT. Este último artigo permite a suspensão do contrato — o que equivale à suspensão do próprio empregado — por até 30 dias, para a instauração do inquérito para apuração de falta grave. E o artigo 474 dispõe que a suspensão por mais de 30 dias importa em rescisão indireta do contrato de trabalho”.

“É equivocada, data venia, a idéia de que, com base no artigo 474 da CLT, o patrão pode suspender o empregado por 1, ou 2, ou 10, ou 20, ou 30 dias, de acordo com o seu critério subjetivo. As infrações trabalhistas, desde a mais leve até a mais aguda, que conduz à rescisão do contrato, devem estar reguladas exclusivamente na lei. E a lei trabalhista não dá autorização ao empregador de suspender empregado com a finalidade de puni-lo”, destacou o relator.

Para a Turma, a Justiça do Trabalho também não pode dosar suspensão imposta a trabalhador, pois se não há norma jurídica prevendo punição, o fato não é punível e qualquer punição será injusta.

De acordo com o juiz Ferraz de Oliveira, se a juíza que proferiu a sentença de primeira instância entendeu que o ato do reclamante não autorizava a suspensão de 30 dias, deveria cancelar a punição, e não reduzi-la para 5 dias. “O juiz não tem poder para aumentar, diminuir ou dosar penalidades, sem que o fato esteja previsto na legislação”, afirmou o juiz.

RO 00477.2002.254.02.00-2

Leia o voto do relator

9ª TURMA

PROCESSO N° 00477.2002.254.02.00-2

RECORRENTES: 1. SOBREMETAL RECUPERAÇÃO DE METAIS LTDA.

2. JOSÉ CAMPOS PEREIRA

RECORRIDOS: OS MESMOS

ORIGEM: 4ª Vara de Cubatão

Suspensão de empregado. Ausência de tipificação legal. Interpretação subjetiva dos fatos e redução da pena pelo juiz. Impossibilidade. O juiz não tem poder para aumentar, diminuir ou dosar penalidades, sem que o fato esteja previsto na legislação. Ele deve analisar o fato e adequá-lo à norma jurídica. Se não houver norma jurídica prevendo punição, o fato não é punível e qualquer punição será injusta. Mas se o fato for punível com pena maior, e o empregado recebeu pena menor, o juiz deverá manter a punição; e se o fato era punível com pena menor, e o empregado recebeu pena maior, só assim poderá reduzir a pena ao limite previsto na legislação. Em nenhuma hipótese poderá o juiz aumentar ou reduzir pena, se não constatar a ocorrência de infração que possa ser enquadrada em algum dispositivo da legislação trabalhista.

RELATÓRIO

RECURSO ORDINÁRIO das partes contra a sentença de fls.181/185, que julgou o pedido parcialmente procedente. A reclamada a fls. 187/199, inconformada com o não reconhecimento do justo motivo para aplicação de punição ao reclamante em razão de passeata por ele indevidamente organizada; insurge-se contra a redução da pena e o reconhecimento do direito à segunda parcela do abono indenizatório; pretende, também, declaração de incompetência desta justiça especializada para apreciação da indenização por danos morais. O reclamante a fls. 205/212, alega ter direito à estabilidade prevista para os dirigentes sindicais; pretende a anulação e suspensão da penalidade disciplinar com o pagamento de trintas dias de salário; o pagamento da PLR, da indenização por danos morais, do FGTS mais 40% sobre férias indenizadas e outras a serem deferidas, aplicação do art. 467 da CLT, embora membro do conselho consultivo; Contra-razões do reclamante a fls. 214/219 e da reclamada a fls. 220/234. O Ministério Público deixou de emitir parecer circunstanciado, por faltar interesse público a justificá-lo (fl. 239).

VOTO

1. Não conheço dos documentos juntados com as contra-razões da reclamada (fls.235/238) e pelo reclamante a fls. 242/249, porque extemporâneos. Os documentos comprobatórios das alegações devem acompanhar a petição inicial e a defesa, conforme arts. 787 e 845 da CLT, salvo se supervenientes ou para contra-prova, nos termos dos arts. 396 e 397 do CPC, o que não é o caso. Aplico a súmula nº 8 do TST.

RECURSO DA RECLAMADA (fls. 187/199).

2. Pressupostos gerais em ordem (fls. 105, 106, 186, 187, 200, 201), conheço.

2.1. A questão a respeito da competência da Justiça do Trabalho para solucionar controvérsias relativas a dano moral está superada pela OJ 327 do C. TST. Rejeito o recurso neste particular.

2.2. No que se refere à suspensão disciplinar do reclamante por 30 dias, que o juiz reduziu a 5 dias, por se tratar de matéria também tratada no recurso do reclamante, serão os recursos julgados em conjunto mais adiante.

2.3. Quanto ao abono indenizatório, o recurso é genérico, porque não ataca os fundamentos jurídicos da sentença, limitando-se a pedir a reforma. No item 6 da sentença (fls. 184) consta a afirmação de que a recorrente não pagou a parcela do abono que seria quitado em setembro, pois dispensou o recorrente antes, em julho. A recorrente não impugna essa afirmação, limitando-se a dizer que pagou a parcela. O recurso, segundo dispõe o art. 514 do CPC, deve apresentar os mesmos requisitos da petição inicial, ou seja, deve trazer a qualificação das partes, os fundamentos de fato e de direito pelos quais pretende a reforma da decisão e o pedido de nova decisão. Esses requisitos não foram observados no recurso, como pode ser visto às fls. 199, itens 65/66. Mantenho a decisão.

RECURSO DO RECLAMANTE (fls. 205/212)

3. Pressupostos gerais em ordem (fls. 9, 186, 205), conheço.

3.1. A juíza, na análise da questão relativa à suspensão do recorrente por 30 dias, considerou que a empresa praticou “excesso de punição” e por esse excesso foi condenada a restituir ao recorrente o salário de 25 dos 30 dias de suspensão. A reclamada, conforme já mencionado no item 2.2, não concorda com essa decisão, e o recorrente também, por entender que não tinha de sofrer pena nenhuma. A questão há de ser analisada do ponto de vista estritamente jurídico. A lei brasileira não autoriza aplicação de penas constritivas do trabalho, exceto em determinadas situações, em que o empregador pode suspender o contrato até 30 dias para apuração de falta grave, conforme se extrai da leitura dos arts. 474 e 853 da CLT. Este último artigo permite a suspensão do contrato — o que equivale à suspensão do próprio empregado — por até 30 dias, para a instauração do inquérito para apuração de falta grave. E o art. 474 dispõe que a suspensão por mais de 30 dias importa em rescisão indireta do contrato de trabalho. Esses dispositivos têm de ser vistos em conjunto e não separadamente. É equivocada, data venia, a idéia de que, com base no art. 474 da CLT, o patrão pode suspender o empregado por 1, ou 2, ou 10, ou 20, ou 30 dias, de acordo com o seu critério subjetivo. As infrações trabalhistas, desde a mais leve até a mais aguda, que conduz à rescisão do contrato, devem estar reguladas exclusivamente na lei. E a lei trabalhista não dá autorização ao empregador de suspender empregado com a finalidade de puni-lo. As advertências, os sermões, os avisos, as suspensões, etc., são todas medidas de caráter administrativo, que o empregado pode aceitar ou não. Vindo à Justiça reclamar, compete ao juiz decidir se o ato do empregado foi grave o suficiente para a rescisão do contrato, ou não. Se foi grave, a pena menor deve ser considerada justa, por ser mais favorável ao trabalhador. Se, porém, o ato não representou infringência a nenhum preceito legal, ou contratual, a punição deve ser cancelada, assim como seria confirmada se o ato fosse grave e houvesse a dispensa. Assim, se a juíza entendeu que o ato do reclamante não autorizava suspensão de 30 dias, tinha então de cancelar a punição, e não reduzi-la para 5 dias. O juiz não tem poder para aumentar, diminuir ou dosar penalidades, sem que o fato esteja previsto na legislação. Ele deve analisar o fato e adequá-lo à norma jurídica. Se não houver norma jurídica prevendo punição, o fato não é punível e qualquer punição será injusta. Mas se o fato for punível com pena maior, e o empregado recebeu pena menor, o juiz deverá manter a punição; e se o fato era punível com pena menor, e o empregado recebeu pena maior, só assim poderá reduzir a pena ao limite previsto na legislação. Em nenhuma hipótese poderá o juiz aumentar ou reduzir pena, se não constatar a ocorrência de infração que possa ser enquadrada em algum dispositivo da legislação trabalhista. Assim, considero ilegal a decisão de reduzir a suspensão de 30 para 5 dias, calcada apenas na interpretação subjetiva dos fatos. Pela leitura do depoimento da reclamada e de suas testemunhas (fls. 162/164), não se constata nenhuma infração praticada exclusivamente pelo reclamante que justificasse punição individual. O reclamante e outros empregados, dentre os quais sindicalistas, fizeram uma passeata dentro da empresa. Se o fato representou indisciplina ou insubordinação, o correto era aplicar o art. 482 da CLT, o que não foi feito. Logo, a suspensão por 30 dias decorreu de interpretação subjetiva dos fatos, sem respaldo legal. Dou provimento ao recurso do reclamante a fim de tornar sem efeito a ilegal suspensão.

3.2. A respeito das participação nos lucros e resultados (PLR) só se faz devida nos termos e condições estabelecidos em norma coletiva, conforme Lei 10.101/00. O recorrente não trouxe ao processado, oportunamente, instrumento normativo assegurando o benefício no ano de 2.002. Mantenho a decisão.

3.3. Por fim, o pedido de indenização por dano moral, em razão da penalidade aplicada pela empresa, não tem amparo jurídico. A reclamada agiu dentro daquilo que considerou seu poder de comando. Quando um empregado pratica atos de confronto com o empregador, juntamente com outros empregados e com respaldo de sindicalistas em busca de melhores condições de salário ou de trabalho, não haverá dano moral se o empregador fizer análise incorreta dos fatos e suspender o empregado. É uma consequência natural a que se sujeita o empregado em suas reivindicações. O ato do empregador, em tais condições, pode ser considerado auto-defesa e não uma ofensa desmotivada contra a honra ou moral do empregado. Mantenho a improcedência.

3.4. O valor pago a título de férias na quitação rescisória, por ter caráter indenizatório, não está sujeito à incidência do FGTS, sendo matéria superada pela OJ 195 da SDI-1 do C. TST. Mantenho.

3.5. Por fim, não há parcelas incontroversas para ensejar a aplicação da sanção pecuniária prevista no artigo 467 da Consolidação das Leis do Trabalho. Rejeito.

CONCLUSÃO

4. Não conheço dos documentos juntados pelas partes. Rejeito a preliminar de incompetência da Justiça do Trabalho e nego provimento ao recurso da reclamada. Dou provimento parcial ao recurso ordinário do reclamante, a fim de considerar nula a suspensão, restituindo também os 5 dias de suspensão mantidos na sentença, conforme se apurar. Mantenho o valor da condenação para efeito de custas. Nada mais.

Juiz LUIZ EDGAR FERRAZ DE OLIVEIRA

Relator

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