Imbróglio jurídico

Imbróglio jurídico sobre bingos resulta de falta de regulamentação

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16 de outubro de 2004, 14h29

Todas as semanas pelo menos uma liminar é proferida contra ou a favor do funcionamento das casas de bingo pelo país. As empresas abrem e fecham, num curto período de tempo, quase na mesma rapidez que as bolas rolam no globo. A guerra de liminares começou depois da edição da Medida Provisória 168/04, que proibiu a atividade. Entretanto, a MP foi derrubada em maio pelo Senado.

A Medida Provisória foi baixada pelo governo logo depois da publicação do escândalo que envolveu o ex-subchefe de assuntos parlamentares da Casa Civil, Waldomiro Diniz. Em uma gravação, ele apareceu cobrando propina do empresário do jogo do bicho Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.

A questão da legalidade do jogo gera controvérsias, principalmente, por não existir regulamentação da atividade. Se por um lado, não há lei que proíba o funcionamento das casas, por outro, não há lei federal que expresse a permissão para que os estabelecimentos continuem operando. Isso ocorre desde que os dispositivos da Lei 9.615/98 (Lei Pelé), que dispunham sobre o jogo, foram revogados pela Lei 9.981/2000 (Lei Maguito). Formou-se uma espécie de branco jurídico, tecnicamente denominado vacatio legis.

No Supremo Tribunal Federal, tramitam pelo menos 14 Ações Diretas de Inconstitucionalidade contestando leis estaduais que prevêem a legalidade dos jogos de bingo no país. Em agosto, o STF julgou inconstitucional lei do Distrito Federal que permite o funcionamento de loterias sociais. Segundo o relator Carlos Velloso, o entendimento deve servir de orientação jurisprudencial que norteará os próximos julgamentos sobre o assunto. Mas o caso ainda pende de decisão final da Corte.

A discussão vai ainda mais longe porque o assunto envolve, além da questão constitucional, aspectos cíveis e criminais — há os que argumentem que a atividade é contravenção penal e crime contra o sistema financeiro.

Baseado nesses princípios, o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) de São Paulo, enviou um ofício datado de maio deste ano à divisão de investigações gerais da Delegacia Estadual de Investigações Criminais (Deic). Nele, pede que o departamento tome providências e investigue os bingos que não tiverem amparo judicial para funcionar.

O Ministério Público paulista classifica a atividade como jogo de azar e, portanto, ilegal. Para o MP, a atividade está proibida pela lei dos crimes contra a economia popular (que levam as pessoas a gastar sem possibilidade real de ganho) e pela lei da contravenção penal (que veda o jogo de azar). O bingo seria, também, uma porta aberta para a prática da lavagem de dinheiro.

O fato é que, para alguns advogados, como Daniel Bialski, o bingo não é um jogo de azar. Ele aposta que “vários juízes estão repensando os critérios adotados para proibir o funcionamento das casas”.

Segundo ele, o raciocínio se mostra cada vez mais favorável aos donos de casas de bingo, até porque a MP do governo foi revogada. Para Bialski, o que deve permanecer é “o direito adquirido, a volta do statos quo. O direito particular não pode ser prejudicado”.

Projetos de Lei

Dois projetos de lei que visam regulamentar a atividade tramitam na Câmara. Um deles, o PL 2.944, de autoria do deputado Valdemar Costa Neto (PL-SP), propõe a autorização de três modalidades de bingo, que destinariam recursos para um Fundo Social da Fome, Cultura e Desporto (FSFCD). O outro, pretende normatizar as loterias de concurso de prognósticos numéricos e desportivos, vídeos loterias, bingos permanentes e eventuais, e loterias sociais. O PL 3.145, do deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), também destina recursos para projetos de incentivo ao desporto e à cultura e políticas de seguridade social.

A edição efetiva de uma lei que regulamente a atividade é necessária, diz o advogado Fábio Diniz, para pôr fim à “baita de uma bagunça” que se formou no meio jurídico. Mais do que chegar ao consenso sobre a permissão ou não do jogo, é preciso que sejam definidos aspectos como “o que é bingo, quem pode explorar, como será a fiscalização e a cobrança de tributos, o número de casas que pode haver numa cidade, se parte dos lucros devem ser destinadas a clubes de futebol ou se as empresas são independentes”.

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