Crimes comuns

Advogados querem foro privilegiado para serem julgados

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26 de novembro de 2004, 10h36

Um anteprojeto de lei prevê foro privilegiado para advogados. A proposta será apresentada pelo presidente da OAB de Santa Catarina, Adriano Zanotto, ao Colégio de presidentes de seccionais da OAB, reunidos em encontro na sede da OAB do Maranhão, nesta sexta-feira (26/11).

Segundo a OAB nacional, o anteprojeto prevê que, nos crimes comuns, praticados no desempenho da profissão perante juízos federais e primeira instância, o advogado será processado e julgado pelos tribunais regionais federais. Quando o crime comum for praticado no desempenho profissional, perante juízes de primeira instância estadual, o advogado será processado e julgado pelos tribunais de justiça.

A idéia da proposta é estender aos advogados o mesmo tratamento dado a magistrados e membros do Ministério Público. “A Constituição Federal, secundada pelas constituições estaduais e por leis infraconstitucionais, dentre essas as leis e códigos de organização judiciária dos diversos tribunais de Justiça do País, consagra aos magistrados e membros do Ministério Público o foro especial por prerrogativas de função”, afirmou Adriano Zanotto.

O presidente da OAB-SC observa que, por outro lado, “o arcabouço legal pátrio não deu o mesmo tratamento aos advogados, não obstante tenha preceituado o artigo 133 da Constituição da República que “o advogado é indispensável à administração da Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos termos da lei”.

Leia o anteprojeto

A respeito do foro por prerrogativa de função, para magistrados e membros do Ministério Público, a Constituição Federal, em seu artigo 96, estabeleceu:

“Compete privativamente:

(…);

III — aos Tribunais de Justiça julgar os juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos crimes comuns e de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral”.

A Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União, em seu artigo 18, disciplina:

“São prerrogativas dos membros do Ministério Público da União:

(…);

II – processuais:

a) do Procurador-Geral da República, ser processado e julgado, nos crimes comuns, pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Senado Federal, nos crimes de responsabilidade;

b) do membro do Ministério Público da União que oficie perante tribunais, ser processado e julgado, nos crimes comuns e de responsabilidade, pelo Superior Tribunal de Justiça;

c) do membro do Ministério Público da União que oficie perante juízos de primeira instância, ser processado e julgado, nos crimes comuns e de responsabilidade, pelos Tribunais Regionais Federais, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;

(…);

Parágrafo único. Quando, no curso de investigação, houver indício da prática de infração penal por membro do Ministério Público da União, a autoridade policial, civil ou militar, remeterá imediatamente os autos ao Procurador-Geral da República, que designará membro do Ministério Público para prosseguimento da apuração do fato”.

Apenas para exemplificar, a Constituição do Estado de Santa Catarina, em seu artigo 83, XI, “b”, dispõe:

“Art. 83. Compete privativamente ao Tribunal de Justiça:

(…);

XI – Processar e julgar, originariamente:

(…);

b) Nos crimes comuns e de responsabilidade, os Secretários de Estado, salvo a hipótese prevista no art. 75, os juízes, os membros do Ministério Público e os Prefeitos, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;”

Vê-se, pois, que a Constituição Federal, secundada pelas constituições estaduais e por leis infra-constitucionais, dentre essas as leis e códigos de organização judiciária dos diversos tribunais de justiça do país, consagra aos magistrados e membros do Ministério Público o foro especial por prerrogativa de função, sendo que a esses dois órgãos fica garantido o postulado do juiz natural “diferenciado” (CF, art. 5º, LIII), na forma dos diplomas legais mencionados.

Por outro lado, o arcabouço legal pátrio não deu o mesmo tratamento aos advogados, não obstante tenha preceituado o artigo 133 da Constituição da República que “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

Na mesma linha de entendimento, o artigo 2o da Lei n. 8.906/94, estabelece que “O advogado é indispensável à administração da justiça” e em seu Parágrafo 1o, acentua que “no seu ministério privado, o advogado contribui na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos constituem munus público”.

Por munus, segundo GISELA GONDIN RAMOS, lembrando ensinamentos de DE PLÁCIDO E SILVA, temos o “encargo, emprego ou função” (Estatuto da Advocacia : comentários e jurisprudência selecionada. Florianópolis : OAB/SC Editora, 2003, 4a ed., pág. 59), o que significa dizer que no desempenho de seu augusto mister o advogado exerce uma função pública.

Já no art. 6o do referido Estatuto da Advocacia e da OAB, temos que “Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do ministério público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos”.

No tocante às prerrogativas, na lição de Hely Lopes Meirelles, “são atributos do órgão ou do agente público, inerentes ao cargo ou à função que desempenha na estrutura do Governo, na organização administrativa ou na carreira a que pertence. São privilégios funcionais, normalmente conferidos aos agentes políticos ou mesmo aos altos funcionários, para a correta execução de suas atribuições legais. As prerrogativas funcionais erigem-se em direito subjetivo de seu titular, passível de proteção por via judicial, quando negadas ou desrespeitadas por qualquer outra autoridade.” (Justitia, 123:188, n. 17.)

Pois bem, sendo o advogado “indispensável à administração da justiça”; prevendo a lei que mesmo “no seu ministério privado” “seus atos constituem munus público”, portanto exercente de função pública, nada há a impedir que aos advogados seja atribuído o mesmo privilégio de foro decorrente da prerrogativa de função dispensado aos magistrados e membros do Ministério Público.

Nada há justificar o diferente tratamento conferido aos advogados, magistrados e membros do Ministério Público (todos operadores do direito e da justiça) no tocante à questão aqui explanada.

Aliás, as razões que levaram o legislador a estabelecer o direito de membros do Ministério Público e da magistratura serem submetidos a julgamento por instância superior, são as mesmas que devem imperar quando a parte for advogado que, no desempenho do exercício profissional, se vê processado.

Tal regramento, uma vez criado, garantirá maior imparcialidade e independência do órgão julgador, porquanto o juiz natural para apreciar eventual demanda no qual o advogado seja réu, por fatos ocorridos no desempenho da atividade profissional, será, no mínimo, um órgão do tribunal.

Alie-se a isso que, com a criação da lei aqui proposta, reparada restará a injustiça a que até hoje estão submetidos os advogados, posto não terem em seu favor o mesmo tratamento dispensado aos magistrados e membros do Ministério Público.

Com estas considerações, submeto o anteprojeto de lei à apreciação de Vossas Excelências esperando que a proposição mereça a mais ampla acolhida para ser encaminhada ao Poder Legislativo, a fim de se converter em lei ordinária federal.

Anteprojeto de lei n /2004

Dispõe sobre o foro por prerrogativa de função para os advogados que no exercício da profissão forem processados por seus atos e dá outras providências.

O Presidente da República

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º – São prerrogativas do advogado:

I – ser processado e julgado pelos tribunais de justiça, nos crimes comuns, praticados no desempenho do exercício profissional perante juízos de primeira instância, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;

II – ser processado e julgado pelos tribunais regionais federais, nos crimes comuns, praticados no desempenho do exercício profissional perante juízos federais de primeira instância, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;

III – ser processado e julgado, nos crimes comuns, praticados no desempenho do exercício profissional perante tribunais de justiça e tribunais regionais federais, pelo Superior Tribunal de Justiça

Art. 2º — Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

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