Mudança de tempo

Liminar que garantia matrícula de estudante inadimplente é cassada

Autor

22 de março de 2004, 16h12

A liminar concedida a uma estudante para se rematricular no curso de Administração na Universidade do Grande ABC (UniABC) foi cassada por decisão da juíza Audrey Gasparini, da 1ª Vara Federal de Santo André (SP).

A liminar, proferida pelo desembargador Sérgio Nascimento, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, garantia à estudante a continuidade dos estudos, mesmo estando inadimplente com as mensalidades.

O departamento jurídico da universidade recorreu. A juíza entendeu que “a recusa da rematrícula não é uma penalidade pedagógica. Ao contrário, é um ato administrativo praticado pela instituição que visa aumentar os fundos econômicos da escola”.

A universidade foi representada pelos advogados Pompeu José Alves Filho, Mônica Molinari e Renata Melocchi. Eles alegaram que a “lei determina que ‘são proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas, por motivo de inadimplemento’, e nenhuma dessas sanções foi aplicada no caso da estudante”. O que a lei prevê é que “o desligamento do aluno por inadimplência somente poderá ocorrer ao final do ano letivo ou, no ensino superior, ao final do semestre letivo quando a instituição adotar regime didático semestral”.

A juíza acolheu os argumentos da universidade. Segundo ela, “é permitido à UNIABC a recusa da matrícula na metade ou no final do ano. (…) Na verdade, o aluno estabelece um contrato com a escola, tendo a obrigação de pagar o preço e a escola, a obrigação de dar aulas. Se uma das partes não cumpre com sua obrigação, não pode exigir que a outra cumpra a sua. Este é um dos princípios básicos do Direito Civil Brasileiro”.

Leia a íntegra da decisão:

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL

Subseção Judiciária de Santo André

Autos nº 2004.61.26.000251-9

Primeira Vara Federal de Santo André

Impetrante: VIVIANE FERREIRA DA SILVA

Impetrado: DIRETOR DA UNIVERSIDADE DO GRANDE ABC – UNIABC

Trata-se de Mandado de Segurança, impetrado por VIVIANE FERREIRA DA SILVA, devidamente qualificada na inicial, contra ato praticado pelo ILMO. SR. DIRETOR DA UNIVERSIDADE DO GRANDE ABC –UNIABC, o qual impediu a rematrícula da Impetrante por estar ela com várias mensalidades em atraso.

Com a inicial, vieram documentos (fls. 17/23)

A liminar foi indeferida às fls. 26/27. Desta decisão foi interposto Agravo de Instrumento com pedido de liminar (fls. 35/53). Às fls. 56/57 consta decisão proferida pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região -SP, concedendo a liminar e determinando a rematrícula da Impetrante.

Às fls. 59/70 constam as informações da Autoridade Impetrada. Juntou os documentos de fls. 71/85.

Às fls. 87/91 consta parecer do Ministério Público Federal, opinando pela não concessão da segurança.

Em 17 de fevereiro de 2004, vieram os autos conclusos para sentença.

É o relatório. Decido.

De acordo com o exposto na inicial, a matrícula da Impetrante no 7° semestre do curso de Administração da UNIVERSIDADE DO GRANDE ABC – UNIABC não foi aceita porque a Impetrante estava com cinco mensalidades atrasadas, conforme ela mesma confessa.

A UNIABC é uma instituição de ensino privada. Desta condição estava ciente a Impetrante quando prestou o exame vestibular. Era clara a condição de contra-prestação de serviços de ensino, ou seja, a aluna estava ciente que para ter aulas, era necessário pagar o preço.

O estabelecimento de ensino privado mantém-se através de recursos advindos das mensalidades de seus alunos, bem como das respectivas taxas de matrículas. Sem estes recursos, não há como subsistir, posto não ser subsidiada pelo Poder Público.

A recusa da rematrícula não é uma penalidade pedagógica. Ao contrário, é um ato administrativo praticado pela instituição que visa aumentar os fundos econômicos da escola. Por meio da matrícula, a pessoa se toma aluno. A partir de então, uma vez que aceita a matrícula e consequentemente, a condição de aluno, a instituição de ensino não pode aplicar penalidades pedagógicas ( v.g. suspensão de provas escolares, retenção de documentos) em razão de comprovada inadimplência, por vedação expressa pelo art. 6° da Lei n o 9.870, de 23 de novembro de 1999.

Diante de uma situação de inadimplência, cabe à escola apreciar se é interessante ou não a continuidade do aluno em seus quadros: No caso em questão, percebe-se que a UNIABC permitiu que a Impetrante estudasse por, pelo menos, cinco meses durante o ano letivo de 2003 sem o pagamento das mensalidades. Pela redação do §1º do art. 6° da Lei n.o 9.870/99, (… “o desligamento do aluno por inadimplência somente poderá ocorrer ao final do ano letivo ou, no ensino superior, ao final do semestre letivo quando a instituição adotar regime didático semestral..) é permitido à UNIABC a recusa da matrícula na metade ou no final do ano. A Impetrante não pode alegar que a recusa de sua matrícula era inesperada, pois era notória e confessa sua situação de inadimplência. Na verdade, o aluno estabelece um contrato com a escola, tendo a obrigação de pagar o preço e a escola, a obrigação de dar aulas. Se uma das partes não cumpre com sua obrigação, não pode exigir que a outra cumpra a sua. Este é um dos princípios básicos do Direito Civil Brasileiro.

A matrícula é uma renovação do contrato de ensino e portanto, as partes devem estar de acordo. No caso em questão, é plausível que a UNIABC não queira renovar a matrícula da Impetrante, pois ela não cumpriu a sua parte no contrato celebrado anteriormente. Repiso, a não renovação da matrícula não é sanção pedagógica, pois a pessoa só é considerada aluna após a matrícula. Assim, não existe sanção pedagógica para quem não é aluno. É direto da Universidade privada aceitar ou não a matrícula de seus alunos. O art. 5° da Lei n o 9.870/99 é claro ao dispor que “os alunos já matriculados. salvo quando inadimplentes, terão direito à renovação da matrículas, observando o calendário escolar da instituição, o regimento da escola ou cláusula contratual.” Uma vez aceita, aí sim, incabíveis são as sanções pedagógicas por motivo de inadimplência.

Também não cabe ao Juízo a análise da proposta de parcelamento, pois isto acarretaria em interferência no contrato celebrado entre as partes.

Isto posto e o que mais dos autos consta, DENEGO A SEGURANÇA, não tendo direito, a Impetrante, a matricular-se no sétimo semestre do curso de Administração sem o pagamento das mensalidades ou eventual parcelamento, aceito por ambas as partes, das prestações em atraso.

Indevidos os honorários advocatícios, face a Súmula 105 do E. Superior Tribunal de Justiça.

Oficie-se à Turma Julgadora do Agravo de Instrumento noticiado nos autos, do teor desta sentença.

Custas conforme a lei.

P.R.I.O.

Santo André, 20 de fevereiro de 2004

Audrey Gasparini

Juíza Federal

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!